Controle de preços
e redução de incertezas: saiba o que é meta de inflação e como ela funciona no
mundo
O
Conselho Monetário Nacional (CMN) se reúne nesta quinta-feira (29) para debater
a possibilidade de mudanças nas metas da inflação, que, entre tantas
finalidades, dá mais segurança à sociedade e permite um maior controle dos
preços.
Mas
você sabe o que é, na prática, a meta de inflação?
A
professora de economia do Insper, Juliana Inhasz Kessler, explica que a
política da meta de inflação se trata do estabelecimento de um valor
considerado “aceitável” e “razoável” para a inflação dentro de um país.
“O
Banco Central (BC), que é o guardião da política monetária e responsável pela
estabilidade monetária no país, estabelece qual é o valor da taxa de inflação
que nós estamos dispostos a suportar num determinado período”, explica.
Juliana
acrescenta que, uma vez que a meta é estabelecida, o BC cria uma espécie de
compromisso com a sociedade, que espera que os números sejam cumpridos.
Porém,
como nem sempre isso acontece, existe uma “banda” — margem de tolerância — que
determina a variação aceitável para cima ou para baixo da meta.
“Entende-se
que uma inflação muito mais baixa do que aquele mínimo pode significar uma
desaceleração muito grande da atividade econômica, e que uma taxa de inflação
muito alta prejudica a sociedade, porque traz um aumento de desigualdade, por
exemplo”, afirma.
Para
2023, a meta de inflação no Brasil é de 3,25%, com margem de tolerância de 1,5
ponto percentual para baixo ou para cima — ou seja, entre 1,75% e 4,75%.
Kessler
explica que a meta de inflação existe porque é uma forma do governo mostrar à
sociedade compromisso e estabilidade.
“Mas,
mais do que isso, é uma forma dele criar o hábito na sociedade de se formar de
uma maneira adequada à expectativa para a economia”, diz.
“Quando
uma taxa de inflação baixa é anunciada, o governo está dando um recado para a
sociedade de que ele irá fazer aquilo que está ao alcance dele, um esforço
grande, para que a inflação fique naquele valor”, acrescenta.
A
professora diz ainda que, num cenário de inflação alta, é esperado que a
autoridade monetárias faça o esforço necessário para que os números baixem.
“Para
isso, ele vai aumentar a taxa de juros e apertar as rédeas da parte monetária,
o que pode causar uma desaceleração, inclusive, econômica”.
“O
contrário também é verdade: se o governo está para baixo dessa meta, a gente
sabe que ele vai poder, então, permitir mais flexibilidade na política
monetária”, explica Kessler.
Todas
essas políticas adotadas pelas autoridades monetárias visam reduzir as
incertezas da sociedade.
No
Brasil, o regime de metas de inflação é definido pelo CMN, que é o responsável
pela definição da meta. O Banco Central, por sua vez, define a taxa de juros,
que é o que garante o cumprimento dessa meta.
“De
forma hierárquica, o CMN aponta para onde devemos ir, e o Banco Central se coloca
à disposição com a política monetária para atingir esse objetivo”, afirma
Kessler.
Em
casos de economia desaquecida, por exemplo, é esperado que o BC diminua a taxa
de juros por meio de operações de compra e venda de títulos, para que a
economia volte a acelerar. “A taxa de juros é um resultado de uma política
monetária para atingir um determinado resultado”, explica.
O
regime de metas de inflação deve ser de conhecimento público, uma vez que ela
influencia diretamente a vida e a tomada de decisão das pessoas físicas e
jurídicas.
• Brasil mais errou do que acertou o alvo
Nos
24 anos desde 1999, quando o Banco Central implementou o sistema de metas para
a inflação no Brasil, foram bem poucas oportunidades em que a economia do país
conseguiu cumprir o alvo que deveria perseguir.
Em
alguns momentos, o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), o indicador
oficial de inflação do país, caiu demais e errou as metas para baixo.
Mas
foi em desvios para cima que a inflação brasileira passou a maior parte das
últimas duas décadas — incluindo as vezes em que furou completamente o teto,
que é a margem de tolerância máxima de flutuação que o sistema prevê.
Levantamento
feito pela CNN mostra que, até janeiro deste ano, dos 282 meses corridos desde
que o sistema de metas passou a operar no país, em julho de 1999, em 212 deles
a inflação errou o centro da meta para cima. O número representa 75% do tempo
total.
Em
102 desses meses, o erro extrapolou, inclusive, o teto da meta. É o equivalente
a 36%, ou um terço do período com a inflação rodando acima do limite máximo
tolerado pelas bandas estipuladas pelo governo.
Por
outro lado, foram 69 meses, ou um quarto do tempo (24,5%), com a inflação
rodando abaixo da meta. Isso aconteceu entre 2006 e 2007 e depois, de 2017 a
2020.
Desde
a criação do sistema, o Brasil encerrou o ano em sete oportunidades fora dos
limites. Desses, em seis o estouro foi para cima – 2001, 2002, 2003, 2015 e
2021, além de 2022.
Somente
em 2017 o descuido foi para baixo: naquele ano, o IPCA ficou em 2,95%, para uma
meta que era de 4,5%, com tolerância entre 3% e 6%.
• Meta de inflação no mundo
Além
do Brasil, outros países também adotaram o sistema de meta de inflação, como os
Estados Unidos, Canadá, África do Sul, México, Turquia e Reino Unido.
Nos
Estados Unidos e na Coreia do Sul, por exemplo, o sistema de meta de inflação é
de longo prazo e sem margem de tolerância. Ambos os países têm meta
estabelecida de 2% ao ano.
Já
países como o Canadá e Reino Unido devem sempre manter a inflação dentro da
banda de tolerância, que varia de 1% a 3% ao ano.
Na
África do Sul, o sistema de metas é focado no intervalo, e não no objetivo
central — no país, a inflação deve sempre ficar entre 3% e 6%. Isso dá maior
liberdade ao banco central para conseguir qualquer objetivo dentro dessa
margem.
Por
fim, alguns países possuem metas de inflação mais altas, como é o caso da
Turquia, cuja meta é de 5% com dois pontos de tolerância. O Brasil também pode
ser citado no exemplo, já que passou muito tempo com meta de 4,5%.
Juliana
afirma que a política é bem sucedida em diversas economias mundo afora, e diz
que o Brasil é um caso de sucesso deste tipo de programa.
“É
uma política que realmente tem mostrado efeitos para conter a inflação e
avanços inflacionários”, afirma.
“Por
aqui, a meta deu certo e ajudou a garantir a estabilidade econômica”,
acrescenta.
• O que esperar da reunião do CMN
A
respeito da reunião desta quinta-feira (28), a professora Juliana Kessler diz
não acreditar que haverá mudanças na meta de inflação para este ano.
“3,25%
é um valor que parece bem ajustado à realidade de países como o Brasil e, ao
contrário do que muito se falou, não acho que a meta é excessivamente baixa.
Temos visto essa política dar efeito agora mais do que nunca”, disse.
Além
disso, ela afirma que a ata da última reunião do Comitê de Política Monetária
do Banco Central (Copom) reforça essa ideia.
“Talvez
isso gerasse uma incerteza muito grande, que não seria bem-vinda nesse momento
em que a gente está conseguindo chegar perto de um cenário de inflação baixa e
de uma taxa de juros que começa a cair”, pontua.
Para
o também professor de economia do Insper, Roberto Dumas, uma possível mudança
na meta de inflação por parte do CMN faria com que o governo perdesse
credibilidade.
“Se
por acaso mudarem a meta de 3,25% para 4,25%, isso irá prejudicar a ancoragem,
já que a precificação de bens e serviços foram feitas baseadas em outro valor.
E se ano que vem não atingirem a meta também, vão mudar a meta de novo?”,
questiona.
Dumas
também acredita que uma possível solução para o CMN seria criar uma meta de
inflação contínua, de pelo menos 12 meses.
Fonte:
CNN Brasil
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