Entenda como a
contagem da população pelo IBGE influencia o orçamento das cidades
A
população contabilizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) é um dos critérios
usados para calcular quanto dinheiro a União deve transferir a determinado
município. Dados do Censo 2022, divulgados na quarta-feira (28), mostram
que o Brasil tem
203.062.512 habitantes.
Os
dados do Censo, que incluem o número de habitantes de cada cidade, são
essenciais para o desenho e manutenção de políticas públicas, além de servirem
de parâmetro para várias obrigações do estado, como o repasse de receitas para
estados e municípios.
A
transferência de recursos da União para governos estaduais e para as
prefeituras está prevista na Constituição e se explica pelo regime tributário
brasileiro. Nesta reportagem você vai entender por que e como essa divisão
acontece.
Segundo
a economista Vilma Pinto, diretora da Instituição Fiscal Independente (IFI) do
Senado Federal, o principal objetivo dos repasses é "equalizar receitas e
responsabilidades dos diferentes entes da federação".
"Na
questão tributária, por exemplo, os impostos sobre a renda e sobre os produtos
industrializados são arrecadados pela União, mas pertencentes também aos
estados e municípios", explica a economista.
"Por
meio dos fundos de participações, a União redistribui a parcela de
recursos que pertence aos outros entes da federação."
"O
rateio da receita proveniente da arrecadação de impostos entre os entes
federados representa um mecanismo fundamental para amenizar as
desigualdades regionais, na busca incessante de promover o equilíbrio
socioeconômico entre Estados e Municípios", afirma o Tesouro Nacional
No
caso dos municípios, o principal mecanismo para a realização dessa
redistribuição de recursos arrecados pela União é o Fundo de Participação dos Municípios (FPM),
formado pela receita proveniente do Imposto de Renda e do Imposto sobre
Produtos Industrializados (IPI).
O
FPM, por sua vez, redistribui o dinheiro da seguinte forma:
- 10% são
destinados para as capitais;
- 86,4% são
transferidos para os demais municípios, os chamados municípios "de
interior";
- 3,6% respondem
pela chamada "reserva" para municípios interioranos com mais de
142.633 habitantes.
Caso
um município atenda o critério para ser classificado como de
"reserva" (ou seja, ter mais de 142.633 habitantes), ele receberá
repasses tanto por ser um município "de interior" quanto por ser
"de reserva".
No
caso das capitais e dos municípios da chamada "reserva", os critérios
utilizados para definir quanto cada um deles vai receber são o tamanho da
população e a renda per capita do estado. É feito um cálculo para que os
estados mais pobres tenham mais peso na composição. Assim, capitais mais pobres
recebem, proporcionalmente, mais do que capitais mais ricas.
"É
a única transferência constitucional com caráter redistributivo", diz o
economista Eduardo Stranz, consultor da Confederação Nacional dos Municípios
(CNM).
Já
para a grande maioria dos municípios – todos aqueles que não são capitais e têm
menos de 142.633 habitantes –, o
critério utilizado é populacional. O número de habitantes contabilizado
no Censo define em qual coeficiente a cidade se enquadra. O coeficiente é
um número usado para calcular qual será a participação de determinado município
no fundo.
Quanto menor a população, menor o coeficiente e,
portanto, menor também o valor do repasse realizado pela União.
Por
exemplo, cidades com população entre 13.585 e 16.980 habitantes possuem
coeficiente 1,0. Já municípios com 37.357 a 44.148 habitantes tem coeficiente
1,8 – esses municípios recebem 80% a mais do que aqueles com coeficiente
1,0.
A
localização da cidade também faz diferença, já que os estados possuem
percentuais diferentes de participação no total distribuído, a partir de uma
resolução do Tribunal de Contas da União de 1990.
·
Impacto no cofre
Quando
uma cidade perde habitantes por fenômenos como migração e queda no número de
nascimentos, ela pode mudar de faixa de coeficiente e, assim, passar a receber
menos dinheiro da União.
Segundo
cálculos da Confederação Nacional dos Municípios, cada mudança de faixa de
coeficiente representa cerca de R$ 5 milhões anuais a mais ou a menos de
repasse.
Imagine
uma cidade que, pela estimativa anterior do IBGE, tenha cerca de 11 mil
habitantes (coeficiente 0,8). Caso essa cidade tenha perdido pouco mais de
1.000 habitantes nos últimos anos, ela passará a ter coeficiente 0,6 e receberá
por volta de R$ 5 milhões a menos no ano.
"Para
municípios menores, que não têm muita receita, esse dinheiro faz muita
diferença", explica Stranz.
"Alguns
municípios dependem muito dessas transferências da União para fazer frente às
suas despesas em várias áreas, como na de saneamento, por exemplo", diz
Pinto, da IFI.
Um
caso ilustrativo é o de Cumaru, no interior de Pernambuco, a 138 km da capital.
Em 2000, o Censo contabilizou cerca de 27 mil habitantes (coeficiente 1,4). Já
no Censo 2010, o IBGE contou pouco mais de 17 mil habitantes, o que representou
uma queda de coeficiente.
A
cada ano, mesmo naqueles em que o censo nacional não é realizado, o IBGE estima
a população das cidades com base, inclusive, nos censos anteriores. No caso de
Cumaru, o número estimado de habitantes continuou caindo, acarretando em quedas
no coeficiente e, portanto, em menos dinheiro repassado.
A
redução estimada pelo IBGE se confirmou no Censo de 2022. Pelos dados,
Cumaru passou a ter
15.920 moradores (coeficiente 1,0).
"Foi
criada uma estrutura para determinado coeficiente. Depois, caiu. Virou uma
terra arrasada. Faltou dinheiro para infraestrutura, para saúde", disse a
atual prefeita da cidade, Mariana Medeiros (PP), em entrevista ao g1.
"Penaliza
a população", afirma ela.
·
Nova lei atenua perdas
Neste
mês, o Senado aprovou um projeto de lei que prevê uma transição de dez anos
para as cidades serem reenquadradas no coeficiente de distribuição do Fundo de
Participação dos Municípios.
O
texto, que aguarda sanção presidencial, impede uma queda brusca de receita no
caso de cidades que apresentem redução de população no Censo 2022.
A
Confederação Nacional dos Municípios estima que cerca de 600 municípios podem
ter redução de população no Censo 2022, acarretando coeficientes menores para
essas prefeituras.
O
projeto de lei cria uma regra de transição, que prevê que, a partir de 2024,
cidades que teriam uma queda automática de recursos passem a contar com uma
transição gradativa dos repasses do fundo: 10% ao ano ao longo de dez anos.
Segundo
o Senado, essa transição gradual já foi aplicada em três outros momentos da
história brasileira (1997, 2001 e 2019).
Ø Lula sanciona lei
que ameniza corte em repasses a municípios com perda populacional no Censo
O
presidente Luiz Inácio
Lula da Silva (PT) sancionou nesta quarta-feira (28) uma lei
que impede a redução imediata de repasses por meio do Fundo de Participação dos
Municípios (FPM) a cidades que
registraram perdas populacionais no Censo, produzido pelo Instituto
de Geografia e Estatística (IBGE).
O
texto prevê um período de transição para os cortes (veja mais abaixo).
A
sanção da lei ocorreu horas após a divulgação dos dados populacionais do Censo
Demográfico de 2022.
De
acordo com o levantamento, dos 5.570 municípios do Brasil, 2.399
perderam habitantes entre 2010 e 2022 — o que representa 43% do total.
<<<<
Os números servem de parâmetro para o cálculo de distribuição de recursos do
FPM:
- O fundo é
resultado da arrecadação federal com o Imposto de Renda e o Imposto sobre
Produtos Industrializados (IPI). A fatia destinada ao fundo desses
recursos é de 22,5%.
- Cada município
tem direito a uma parcela do montante. Os recursos entram para o Orçamento
dos municípios e podem ser utilizados pelos prefeitos.
- Para
municípios com menos de 142.633 habitantes, o tamanho da população é
utilizado para o cálculo de um coeficiente, que será levado em conta para
a distribuição do dinheiro.
- Quanto menor a
população, menor o coeficiente e menor o valor do repasse realizado pela
União.
- Essa parcela
de municípios, classificada como "interior", representa quase
87% dos recursos distribuídos pelo fundo.
O
texto sancionado por Lula, na prática, impede que os resultados apresentados do
Censo de 2022 sirvam de parâmetro para o cálculo de 2024.
A
lei prevê que os coeficientes utilizados para a distribuição em 2023 deverão
ser mantidos para todos os municípios que apresentarem redução do índice.
·
Transição
Aos
municípios com perda populacional, a norma estabelece um período de transição
para a perda de repasses, que ocorrerá nos 10 anos seguintes à publicação do
Censo.
A
cada ano, o excedente de recursos — diferença entre o que o município recebeu
com o congelamento do coeficiente e o que deveria receber — sofrerá redução
percentual:
- 1º ano após publicação do Censo: 10% de redução dos ganhos
- 2º ano após publicação do Censo: 20% de redução dos ganhos
- 3º ano após publicação do Censo: 30% de redução dos ganhos
- 4º ano após publicação do Censo: 40% de redução dos ganhos
- 5º ano após publicação do Censo: 50% de redução dos ganhos
- 6º ano após publicação do Censo: 60% de redução dos ganhos
- 7º ano após publicação do Censo: 70% de redução dos ganhos
- 8º ano após publicação do Censo: 80% de redução dos ganhos
- 9º ano após publicação do Censo: 90% de redução dos ganhos
- 10º ano após publicação do Censo: 100% de
redução dos ganhos
O
dinheiro que for retirado desses municípios será redistribuído, de forma
automática, aos demais participantes do fundo.
Segundo
o governo, a medida "visa evitar bruscas quedas de arrecadação,
estabelecendo uma transição de dez anos para os municípios migrarem para uma
faixa de coeficiente inferior do FPM".
·
O que acontece depois
Com
o término da transição, no 10º ano, o coeficiente utilizado para distribuir os
recursos aos municípios será feito com base no Censo de 2022.
Além
disso, a lei estabelece que, quando houver novo levantamento do IBGE, todo o
processo deverá ser refeito com base na pesquisa mais recente.
Dessa
forma, a norma seguirá válida a cada novo ciclo do Censo, e não somente para o
realizado em 2022.
"Com
efeito, a nova lei pretende equacionar em definitivo a questão, prevenindo
eventuais quedas bruscas de arrecadação e consequente risco de inviabilizar a
prestação das políticas públicas", destacou o Planalto em nota.
A
nova lei tem origem em um projeto apresentado pelo então deputado federal
Efraim Filho (União-PB) a pedido da Confederação Nacional de Municípios (CNM).
Na
justificativa, Efraim afirmou que o objetivo da proposta é garantir uma
"regra de transição para aqueles municípios que terão perda de recursos
com a redução do coeficiente do Fundo de Participação dos Municípios a cada
novo Censo".
"Sabe-se
que o FPM atua como fator preponderante na saúde financeira da maioria dos
entes municipais, sendo assim é indispensável uma previsibilidade da capacidade
financeira e operacional para conferir viabilidade às inúmeras tarefas.
Portanto, a presente regra permitirá aos municípios se readequarem e adaptarem
a nova realidade financeira, planejando formas alternativas de custeio e
arrecadação para compensar a perda de receita com o repasse do FPM sem,
contudo, prejudicar a prestação de serviços básicos essenciais para as
populações locais", escreveu.
·
Recursos em 2023
O
texto determina que o Tribunal de
Contas da União (TCU), responsável pelo cálculo do coeficiente
e distribuição do FPM, deverá publicar instrução normativa com atualização do
valor dos repasses a partir do Censo de 2022.
Isso
deverá ocorrer em até 10 dias a partir da publicação do resultado definitivo do
levantamento. A nova distribuição dos recursos terá efeito imediato ainda para
2023.
Fonte:
g1
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