Encontros e
desencontros: a crítica brasileira à Europa no discurso de Lula em Paris
No
último dia 23 de junho, o presidente brasileiro Luiz Inácio Lula da Silva
proferiu discurso no âmbito da Cúpula para um Novo Pacto Financeiro Global,
evento que ocorreu na França sob a tutela de Emmanuel Macron.
Durante
o encontro, as posições do mandatário brasileiro causaram certo ruído em
diversos círculos políticos europeus, assim como na mídia, ao demonstrarem a diferença
de interpretações entre o Brasil e a Europa sobre alguns dos principais
problemas da agenda internacional.
A
cúpula, que foi dedicada a discussões sobre a necessidade de reformas nas
instituições financeiras globais e sobre o combate à crise climática nos países
em desenvolvimento, teve no pronunciamento de Lula um de seus pontos altos.
No
início de seu discurso, Lula fez um chamamento à comunidade internacional para
participar da reunião da COP-25 no Pará, ao mesmo tempo criticando de forma
velada aqueles que falam da Amazônia sem realmente conhecê-la.
Desde
tempos, críticas europeias (e sobretudo da própria França) sobre a gestão
brasileira da Amazônia, especialmente quando incêndios de grande porte são
noticiados na região, suscitam no governo brasileiro certa desconfiança.
Interpreta-se
que, por detrás dessas críticas, escondem-se intensões insidiosas de questionar
a soberania do Brasil sobre a sua porção do território amazônico e, com isto,
justificar uma intervenção externa em assuntos domésticos do país.
Nesse
contexto, Lula fez menção de reunir em agosto todos os chefes de Estado da
América do Sul e representantes dos países que compõem a região amazônica, no
intuito de formularem uma proposta comum para futuras reuniões da COP.
Mais
uma vez restou demonstrada a intenção do governo brasileiro de priorizar o
multilateralismo em sua política externa, advinda da percepção de que as nações
sul-americanas devem atuar em conjunto no cenário internacional a fim de
proteger seus interesses, envolvendo inclusive a questão ambiental.
Trata-se
de movimento importante. Afinal, no período de expansão do colonialismo europeu
na África, Ásia e nas Américas a partir do século XV, uma de suas principais
motivações era justamente o desejo pela obtenção de matérias-primas e recursos
naturais presentes nessas regiões.
Logo,
ao mesmo tempo em que proteger estes biomas torna-se algo fundamental num mundo
em que as preocupações climáticas ganharam holofote, resguardar-se quanto a
tentativas de se relativizar a soberania dos Estados por parte dos países
europeus é tarefa também da mais alta importância.
Outro
tema que esteve presente no discurso de Lula foi a questão da desigualdade
mundial entre os Estados. A análise de Lula acerca das dificuldades de se
enfrentar a concentração da riqueza nas mãos de um pequeno punhado de pessoas
no âmbito doméstico dos países acabou ressoando também na posição internacional
do Brasil de diminuir o vão que separa os países desenvolvidos dos países em
desenvolvimento.
Nesse
quesito, Dilma Rousseff, a quem Lula adereçou suas palavras iniciais antes de
começar seu discurso, há muito tempo já chamava a atenção para a necessidade de
se eliminar "a disparidade entre a crescente importância dos países em
desenvolvimento na economia global e sua insuficiente representação e
participação nos processos decisórios das instituições financeiras
internacionais".
Essa
é sem dúvidas uma questão muito cara para os países latino-americanos como o
Brasil que tiveram experiências desagradáveis no passado com as instituições de
governança global dominadas pelos países europeus, como o Fundo Monetário
Internacional.
Sobretudo
nos anos 1980, na medida em que suas receitas de exportação diminuíam, grande
parte dos Estados na América do Sul viram suas dívidas aumentar para com o FMI,
deixando-os numa verdadeira condição de falência financeira.
Tratou-se
de um período em que o Brasil precisou utilizar grande parte de seus ganhos com
o comércio internacional apenas para pagar os juros de sua dívida, ao invés de
usá-los para o seu desenvolvimento econômico e social.
A
armadilha da dívida, como essa situação passou a ser conhecida, representou um
desastre humanitário para cerca de 700 milhões das pessoas dos países em
desenvolvimento em todo o mundo.
Na
África, por exemplo, essa condição gerou verdadeira queda na expectativa de
vida, diminuição da renda nacional, deterioração nos níveis de investimento e
aumento nas taxas de mortalidade no continente.
Foi
em vista disso que Lula criticou as instituições de Bretton Woods, por não
atenderem mais "às aspirações e nem aos interesses da sociedade",
mencionado que o Banco Mundial e o FMI deixam "muito a desejar naquilo que
as pessoas esperam" deles.
Parte
daí a posição do Brasil pela necessidade da mudança das instituições de governança
global sob controle dos países europeus, a fim de evitar uma situação em que,
nas palavras do mandatário brasileiro, os países ricos continuem ricos e os
países pobres continuem pobres.
Outra
das questões trazidas por Lula em seu discurso foi a visão brasileira sobre a
obsolescência da atual composição dos membros permanentes do Conselho de
Segurança das Nações Unidas, que conta com duas potências europeias em seu
quadro: Reino Unido e a própria França.
Há
não muito tempo atrás, o ministro das Relações Exteriores do Brasil Mauro
Vieira também tocou nesse ponto, reafirmando as intenções do Brasil de se
tornar um membro permanente do Conselho de Segurança, aspiração política de
longa data do país.
No
âmbito do BRICS, vale lembrar, o Brasil já conta com os apoios de Rússia e
China no que se refere a desempenhar um papel mais ativo na ONU, de forma que a
organização se torne mais efetiva e legítima internacionalmente.
Posteriormente,
Lula criticou o mundo desenvolvido pelo seu desinteresse em financiar infraestruturas
que atendam às necessidades de continentes como a África. Novamente aqui
presencia-se a importância do papel do Brasil no âmbito do BRICS, ajudando a
fundar o Novo Banco de Desenvolvimento, instituição destinada justamente ao
financiamento de projetos de infraestrutura sustentável em países emergentes.
Sem
sombra de dúvidas, o banco do BRICS representou também a insatisfação do grupo
para com a lentidão das reformas nos organismos de Bretton Woods, nos quais os
países europeus estão sobrerepresentados.
Por
fim, o presidente brasileiro aludiu ao fato de que os principais fóruns
internacionais não podem se transformar apenas numa reunião de um pequeno
"grupo de luxo" (em velada alusão talvez ao G7).
Para
Lula, estes fóruns devem servir para "atender a pluralidade dos problemas
que o mundo tem", e não só os problemas que concernem à América do Norte
ou à Europa.
Pensamento
similar já fora expressado pelo ministro das Relações Exteriores indiano
Subrahmanyam Jaishankar quando disse que os europeus precisam "superar a
mentalidade de achar que os problemas da Europa são os problemas do mundo, mas
que os problemas do mundo não são os problemas da Europa".
Tudo
isso serve para demonstrar que, apesar dos muitos convites que Lula vem
recebendo recentemente para participar de fóruns internacionais capitaneados
pelos países europeus, diferenças políticas e de interpretação de mundo
continuarão existindo entre o Brasil e a Europa.
Bem
pudera, afinal não é de hoje que as relações entre o Norte e o Sul Global são
marcadas por encontros e desencontros. Pelo visto as relações exteriores da era
Lula continuarão seguindo essa mesma tradição.
Ø
Era
do heroísmo individual acabou, o mundo precisa agir em conjunto, diz premiê
chinês
O
mundo não deve e não pode retornar a um estado de isolamento e afastamento
entre os países, afirmou o primeiro-ministro da China, Li Qiang, na cerimônia
de abertura da 14ª reunião anual dos novos líderes mundiais do Fórum Econômico
Mundial nesta terça-feira (27).
"A
globalização econômica é uma tendência histórica e, embora estejamos
enfrentando muitos abalos nesse processo, a tendência geral da globalização
econômica e seu desenvolvimento nunca mudou, especialmente no atual
desenvolvimento acelerado de novas tecnologias, representadas pelas tecnologias
digitais e pela inteligência artificial, que criaram condições mais favoráveis
à globalização econômica", disse Li Qiang.
Além
disso, o premiê chinês ressaltou que "o mundo não deve e não pode retornar
a um estado de isolamento e afastamento".
"Devemos
seguir as marés dos tempos, construir mais consenso sobre o desenvolvimento e
construir de forma constante uma economia mundial aberta. Nós nos opomos
fortemente à politização artificial das questões comerciais e econômicas",
acrescentou o político.
Entretanto,
ele ressaltou a necessidade de "proteger conjuntamente a segurança, a
estabilidade e a continuidade das cadeias globais de produção e cadeias de
suprimentos, para que os frutos da globalização econômica possam beneficiar
diferentes países e diferentes grupos de pessoas de forma mais
equitativa".
Assim,
o político chinês declarou que a era do heroísmo individual já passou, diante
dos inúmeros e sérios desafios globais para a humanidade é necessário agir em
conjunto, e observou que nos últimos três anos todos os países do mundo fizeram
enormes esforços para enfrentar os desafios da pandemia, demonstrando a
poderosa força da solidariedade e da assistência mútua da humanidade.
Ele
acrescentou que os destinos das pessoas estão intimamente ligados, por isso é
necessário continuar desenvolvendo o conceito de cooperação mutuamente
benéfica, trabalhar juntos para resolver os problemas globais e promover o
progresso da civilização humana.
"Todo
mundo sabe que a época atual não é uma época de luta individual, em certo
sentido a época do heroísmo individual já passou, a época atual requer
cooperação mútua", enfatizou Li Qiang.
·
Políticos
americanos pedem fim de pacto com China: 'EUA devem parar de alimentar própria
destruição'
Em
requerimento enviado ao Departamento de Estado norte-americano nesta
terça-feira (27), parlamentares republicanos solicitam ao governo Biden que um
acordo de décadas de cooperação científica entre Estados Unidos e China não
seja renovado.
Na
carta encaminhada ao secretário de Estado, Antony Blinken, o presidente do
comitê seleto da Câmara dos Representantes dos EUA para a China, Mike
Gallagher, e outros nove representantes republicanos disseram que o acordo
deveria ser descartado uma vez que o governo chinês tentará usá-lo para ajudar
seus militares.
"Os
Estados Unidos devem parar de alimentar sua própria destruição. Deixar o STA
expirar é um bom primeiro passo", diz o texto da carta segundo a Reuters.
O
pacto, nomeadamente Acordo de Ciência e Tecnologia (STA, na sigla em inglês),
expira em 27 de agosto deste ano e foi assinado quando Pequim e Washington
estabeleceram relações diplomáticas em 1979. Renovado a cada cinco anos desde
então, resultou em cooperação em áreas desde ciência atmosférica e agrícola até
pesquisa básica em física e química.
"A
China usa pesquisadores acadêmicos, espionagem industrial, transferências
forçadas de tecnologia e outras táticas para obter vantagem em tecnologias
críticas, o que, por sua vez, alimenta a modernização do Exército de Libertação
Popular [ELP]", diz o texto.
A
carta também cita preocupações sobre o trabalho conjunto entre a Administração
Meteorológica dos EUA e da China em "balões instrumentados", bem como
mais de uma dúzia de projetos do Departamento de Agricultura norte-americano
com entidades chinesas que, segundo os parlamentares, incluem tecnologias com
"aplicações claras de uso duplo", incluindo técnicas para analisar
imagens de satélite e drones para gestão de irrigação.
Segundo
a mídia, as autoridades chinesas disseram publicamente que pretendem estender o
pacto e que abordaram os EUA no ano passado para discutir a renovação, mas que
Washington está conduzindo uma revisão do acordo.
Ø
América
Latina, após restrições recorde, pode liderar redução das taxas de juros,
aponta análise
Os
principais bancos centrais da América Latina, que efetuaram algumas das mais
agressivas restrições monetárias nos últimos dois anos, podem agora estar
prontos para liderar a tendência de redução da taxa de juros, em meio a sinais
claros de desaceleração da inflação em lugares como o Chile e Brasil, relata a
agência britânica Reuters.
O
potencial ponto de inflexão aconteceu quando a Reserva Federal dos Estados
Unidos e o Banco Central Europeu sinalizam que novos aumentos da taxa de juros
podem estar no horizonte, e o Banco da Inglaterra surpreendeu muitos
investidores ao subir as taxas de juros meio ponto percentual na semana
passada.
A
América Latina embarcou no início de 2021 em um dos ciclos de restrição
monetária mais acentuados do mundo para conter a inflação desenfreada,
alimentada por gargalos nas cadeias produtivas globais, aumento dos preços dos
alimentos e os efeitos indiretos das medidas de estímulo fiscal usadas para
aliviar os problemas econômicos da pandemia da COVID-19.
Isso
significa que as taxas já estão altíssimas – 11,25% no Chile e no México,
13,75% no Brasil - e têm espaço para baixar.
"Esperamos
que os bancos centrais latino-americanos sejam os primeiros a cortar as taxas
globalmente porque há várias dinâmicas domésticas que beneficiaram a região",
disse Joan Domene, economista sênior da Oxford Economics, citando uma atividade
econômica melhor do que o esperado e a baixa da inflação.
Alberto
Ramos, analista do Goldman Sachs, escreveu em junho que a região estava vendo
um progresso "gradual, mas constante" na inflação, incluindo preços
dos produtos básicos.
"Os
bancos centrais estarão procurando sinais de consolidação da desinflação e
reequilíbrio macro antes de começar a reduzir de forma credível o nível de
restrição da política monetária", disse ele.
O
Uruguai já reduziu as taxas em 25 pontos base em abril. O Chile poderá também
flexibilizar a sua política monetária no próximo mês, com o Brasil
potencialmente seguindo de perto.
O
Banco Central do Chile manteve sua principal taxa de juros em 11,25% na semana
passada, mas disse que, se as recentes tendências positivas continuarem, poderá
começar a cortar a taxa no curto prazo.
As
previsões apontam para um corte das taxas no próximo mês, disse Cesar Guzman,
analista macroeconômico do Grupo Securities, com sede em Santiago.
"O
mercado já está a contar com um corte de 100 pontos base", disse ele.
No
Brasil, o Banco Central manteve as taxas estáveis na última quarta-feira (21)
pela sétima vez consecutiva, embora tenha adotado um tom mais apaziguador em relação
a passos futuros, excluindo a possibilidade de próximos aumentos das taxas.
Os
mercados financeiros brasileiros mostraram que muitos traders estão apostando
que o banco iniciará um ciclo de flexibilização monetária em agosto, já que o
presidente Luiz Inácio Lula da Silva pediu novamente à autoridade monetária que
cortasse as taxas para estimular o crescimento.
·
Renda
de 80% das famílias no Reino Unido desce em meio à crise dupla de taxas de juro
e da inflação
A
grande maioria das famílias britânicas cada vez mais não consegue pagar as
contas essenciais, com o oposto acontecendo aos domicílios mais ricos, escreve
a Bloomberg.
Cerca
de 80% das famílias britânicas sofreu uma queda em sua renda disponível em
maio, com o aumento do custo de vida continuando a pesar sobre os gastos,
informou nesta segunda-feira (26) a agência norte-americana Bloomberg.
A
mídia citou o rastreador de renda da cadeia de supermercados Asda como dizendo
que 40% das famílias são incapazes de pagar as contas e os itens essenciais, com
um déficit médio para essas famílias de £ 42,5 (R$ 268) por semana em maio.
Segundo
a Asda, em média, as famílias tinham £ 207 (R$ 1.255) de renda disponível por
semana, o segundo valor mais baixo desde outubro. Em contrapartida, referiu, as
famílias de renda mais alta viram a renda disponível aumentar em maio, pelo
segundo mês consecutivo, para uma média de £ 754 (R$ 4.570) por semana.
Um
aumento maior do que o esperado da taxa de juros do Banco da Inglaterra na
semana passada provocou ondas de choque na economia e aumentou o custo das
hipotecas. Ela está agora em 5%, o nível mais alto desde 2008, e sobe desde
dezembro de 2021, quando registrava 0,5%.
A
inflação no Reino Unido tem sido das mais altas na Europa, e cai menos que nos
outros países europeus. Ela estava em um valor anualizado de 8,7% em maio, o
mesmo que em abril. A causa disso é geralmente atribuída à gestão da economia e
aos efeitos do Brexit, que restringiu o comércio com a União Europeia.
Fonte:
Sputnik Brasil
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