Mario Sabino: Com
Jair Bolsonaro neutralizado, o amor venceu o ódio e está tudo bem
Agora
que Jair Bolsonaro está inelegível, “o nosso
país mudou. Está trocando o ódio pelo amor. Os interesses pessoais pelos
coletivos. O Brasil quer voltar a ser grande. Acabar com a fome. Melhorar a
qualidade da educação. E quem quiser construir esse país, estamos juntos!”
As
aspas são da conta oficial de Lula
no Twitter.
A postagem é da noite em que o relator do julgamento no TSE proferiu o seu voto
favorável à inelegibilidade do ex-presidente. Missão dada é missão cumprida.
Afinal de contas, isto aqui, ô, ô, não é os Estados Unidos, onde até preso pode
ser eleito presidente da República.
Felizmente,
não chegamos a tamanho grau de democracia, e espero que o uso do advérbio não
me cause problemas. Aqui, somos menos maleáveis do ponto de vista das
instituições-que-estão-funcionando: o cidadão precisa ter a condenação criminal
anulada para poder se candidatar.
Os
interesses pessoais estão sendo substituídos pelos coletivos, não resta a menor
sombra de dúvida, como no caso da liberação, em um único dia, de 1,7 bilhão de
reais em emendas parlamentares, para o governo conseguir passar a MP dos
Ministérios no Congresso mais honesto do mundo. E a bufunfa das emendas
continuará jorrando para deputados e senadores, porque o ódio deixou quase 9
bilhões em restos para o amor pagar, e as raparigas em flor estão sempre em
busca da governabilidade perdida.
Os
interesses coletivos foram privilegiados, ainda, nas constantes viagens
internacionais de Lula, que já custaram 7,3 milhões de reais aos pagadores de
impostos, sem contabilizar a recente excursão à Itália e à França. Foi nos
palácios desses dois países sem tradição gastronômica que o pai dos pobres
afirmou ter comido mal, consolidando a sua imagem de amigo do Ocidente.
Erra
quem acha que o comentário foi um jeito de Lula alcançar maior repercussão com
o seu programa semanal no Youtube, que anda fraco de audiência. Não,
companheiro, o amor não precisa copiar o ódio nesse tipo de apelo cultural,
talquei? Lula sabe ser popular, ao contrário de Jair Bolsonaro, essa invenção
da Revolução Industrial e das elites brasileiras.
Nada
de cópias. O amor do MST, por exemplo, é original e lindo contra o direito à
propriedade do agro fascista. Precisamos conter o fascismo em todas as suas
formas, inclusive sem o “s”, sempre tendo presente que fascista é quem eles
acham que é fascista. A cruzada contra o fascismo, para trocar o ódio pelo
amor, é o que move as restrições à liberdade de expressão, ora a liberdade de
expressão.
Temos
agora, ainda bem, procuradores amorosos empenhados em tirar uma rádio de São
Paulo do ar, além da autocensura desprendida de jornais e jornalistas e da
suspensão de perfis de opositores nas redes sociais. Tudo vai melhorar ainda
mais quando finalmente aprovarem a lei contra as fake news, mas só as de um
lado, o lado do ódio. Como todo mundo sabe, o amor não comporta falsidades.
E
o que dizer, então, da defesa carinhosa das ditaduras de esquerda
latino-americanas autodeterminadas pelos seus povos? Do alinhamento
natural com a Rússia de Vladimir Putin?. Da indignação amorosamente seletiva com a
democracia americana por causa de Julian Assange? Da volta do Foro de São
Paulo, igualmente conhecido como Fofo de São Paulo, e do reflorescimento da
militância digital que enlameia gente honesta, mas sem perder a ternura?
Como
dizem os brasileiros na sua riqueza vocabular, estou sem palavras, sejam elas
censuráveis ou incensuráveis.
Só
sei dizer que, com Jair Bolsonaro neutralizado no páreo eleitoral, está tudo
resolvido, viva eu, viva tu, viva o rabo do tatu. Love is in the air, inclusive
em Lisboa neste momento. É tanto perfume no ar, que ele está irrespirável.
Ø
A marcha solitária
de Bolsonaro ao encontro da guilhotina. Por Ricardo Noblat
Para
que não se diga que os bolsonaristas abandonaram o seu guia quando ele mais
precisava deles – nenhum foi visto nas vizinhanças do prédio do Tribunal
Superior Eleitoral até agora; nenhum protestou indignado do alto das tribunas
da Câmara e do Senado; foram poucos os que se manifestaram nas redes sociais…
Para
que não se diga que Bolsonaro, o rei das multidões, o encantador de serpentes
pelo qual batia o coração de milhões de evangélicos, militares, caminhoneiros,
motoqueiros, invasores de terras indígenas, agenciadores de trabalho escravo,
empresários da Faria Lima, afortunados do agronegócio e outros negócios…
Para
que não se diga que ele, sozinho, subiu ao patíbulo para ser guilhotinado, o
deputado Sanderson (PL-RS), à caça de fama, apresentou projeto de lei que
anistia políticos condenados por crimes eleitorais em 2022. Por que não em
2021, 2020 ou 2019? Porque Bolsonaro será condenado pelo que fez em 2022.
Em
julho do ano passado, Bolsonaro convidou embaixadores estrangeiros para ouvi-lo
atacar o processo eleitoral brasileiro, tentando desacreditá-lo. E o fez dentro
do Palácio da Alvorada. Plantou, ali, a semente do golpe que pretendia aplicar
no 7 de Setembro com o apoio dos comandantes do Exército, da Marinha e da
Aeronáutica.
Abusou
do poder político ao usar o palácio e a TV estatal que transmitiu ao vivo suas
palavras, e atentou contra a democracia, cláusula pétrea da Constituição. A
democracia é imexível. Bolsonaro deixou de ser imbrochável. Sobre ele, em
resumo, disse o ministro Benedito Gonçalves em voto histórico:
“O
primeiro investigado [Bolsonaro] violou ostensivamente deveres de presidente da
República inscrito no artigo 85 da Constituição, em especial zelar pelo
exercício livre dos poderes instituídos e dos direitos políticos e pela
segurança interna, tendo em vista que assumiu antagonização injustificada ao
TSE, buscando vitimizar-se e desacreditar a competência do corpo técnico e a
lisura do comportamento de seus ministros para levar a atuação do TSE ao
absoluto descrédito internacional; e ainda despejou sobre as embaixadoras e
embaixadores mentiras atrozes a respeito da governança eleitoral brasileira”.
O
projeto de lei de Sanderson não dará em nada. Para que desse, teria de tramitar
com urgência na Câmara, ser aprovado pela Comissão de Constituição e Justiça,
presidida por um deputado do PT, depois em plenário pela maioria dos 513
deputados, mais tarde pelo Senado, e sancionado pelo presidente da República.
Imagine!
Não
será surpresa para este blog se, ao invés dos cinco votos a essa altura
garantidos para condená-lo, Bolsonaro amargue uma derrota por 7 x 0. É possível
que o ministro bolsonarista Nunes Marques limite-se a obrigá-lo a pagar uma
multa por julgar que a inelegibilidade por oito anos seria uma punição extrema.
Mas
se proceder assim, ao invés de simplesmente absolvê-lo, reconhecerá que
Bolsonaro infringiu a lei. É o que importa.
Ø
Bolsonaro:
de imbrochável a inelegível dentro das quatro linhas. Por Tânia Maria de
Oliveira
A
autodesignação de “imbrochável” feita pelo então presidente da República e
candidato à reeleição Jair Bolsonaro no palanque em Brasília no dia 07 de
setembro de 2022 entrou no topo da coleção de bizarrices por ele protagonizadas
a que assistimos nos quatro anos de seu mandato.
O
linguajar chulo, o neologismo de masculinidade tóxica, a “macheza” respondida
com gargalhadas pelos ali presentes, fazia parte do espetáculo cotidiano do
homem que deveria dirigir os destinos políticos da nação, onde coube também,
por todo o tempo em que ocupou a cadeira de presidente, toda sorte de ataques
às instituições da democracia, com discursos, criação e divulgação de notícias
falsas, ameaças. Tudo feito dentro da estrutura de governo, com o uso da
máquina pública.
Um
desses atos começou a ser julgado na quinta-feira (22) no Tribunal Superior
Eleitoral e tem continuidade hoje (29). O longo e denso voto do relator,
ministro Benedito Gonçalves, proferido na última terça-feira (27), não se
limitou a analisar o objeto específico dos autos sem antes pontuar toda a
trajetória que levou à reunião que Bolsonaro realizou com representantes de
embaixadas no mês de julho de 2022, em evidente abuso de poder político e uso
indevido dos meios de comunicação, onde atacou o sistema eleitoral brasileiro,
com transmissão ao vivo pela TV pública de comunicação.
O
ministro destacou a reunião com os embaixadores como um evento inserido em um
contexto de diversos ataques ao sistema de votação do país em entrevistas,
transmissões ao vivo e discursos proferidos durante o mandato. Um voto que se
expande para os demais processos que estão aguardando julgamento no TSE,
afirmando não ser possível fechar os olhos para mentiras e discursos violentos
na eleição. E criticou a banalização do golpismo nas atitudes do
ex-presidente.
Muito
significativa a análise do potencial deletério e violento dos discursos de
Bolsonaro, simbolizada na expressão “quatro linhas da Constituição”, fartamente
utilizada pelo ex-Presidente durante o seu mandato.
As
“quatro linhas” não eram explicadas, mas utilizadas para sugerir supostos
desvios do Poder Judiciário que deveriam ser enquadrados. A menção não vinha ao
acaso, pois toda a fala era guiada para atacar o sistema eleitoral de votação,
alimentando o sentimento de que uma ameaça pairava sobre as eleições de 2022,
acionando o conspiracionismo cultivado por seus correligionários, seguidores,
base radicalizada.
Jair
Bolsonaro usou um palanque para evocar sua credencial em matéria sexual, que
certamente a ninguém deveria interessar além dele mesmo e sua parceira, ao
mesmo tempo em que criava e alimentava a desconfiança, sem qualquer prova, nas
instituições e no sistema eleitoral, sempre utilizando a retórica de que se
encontrava respaldado pela liberdade de expressão e pelas prerrogativas
inerentes à posição de Chefe de Estado.
Improvável
que o julgamento seja concluído no dia de hoje, tendo em conta que serão mais
seis juízes a votar, e que existe a possibilidade de pedido de vistas. De todo
modo, difícil que haja argumentos jurídicos ou sociológicos contrários às teses
trazidas pelo relator do processo, que descortinam todas as etapas de um
golpismo militante que intencionava viabilizar um projeto autoritário de poder.
Fonte:
Metrópoles/Brasil 247
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