Marco Piva: ‘Eleição em São Paulo vira
lamaçal’
O surgimento das redes
sociais criou um novo tipo de comportamento na sociedade. Como diria Norberto
Bobbio, é a chance para uma legião de idiotas se manifestar e vomitar todos os
seus traumas e preconceitos sem o mínimo compromisso com a responsabilidade.
Daí a necessidade, mais do que urgente, de haver uma regulamentação para esse
verdadeiro ataque cibernético que semeia ódio e atrai o que é de pior do ser
humano. Países europeus já se movimentam para dar um basta a esse modo de
promoção da barbárie. O presidente Lula, em discurso de abertura da Assembleia
Anual da ONU, chamou a atenção para essa necessidade, obtendo o apoio inclusive
de Bill Gates.
O resultado da
incivilidade digital mostra toda as suas garras na atual campanha eleitoral
para a prefeitura de São Paulo. Ao entrar na corrida sem tempo algum de rádio e
TV, o candidato Pablo Marçal lançou mão daquilo que lhe rendeu dinheiro na vida
profissional: enganar otários.
Mas, não poderia fazer
isso sem usar estrategicamente o sentimento que vigora em boa parte da
população: se apresentar como um combatente do sistema que está aí. E a qual
sistema ele se refere exatamente? A uma indignação difusa de que tudo que vem
da política está manchado de sujeira. A isso ele agrega uma verborragia
ilimitada de insultos e agressões contra tudo e contra todos. Não é à toa que
boa parte do eleitorado que admira Jair Bolsonaro vê em Marçal o “Mito 2.0”, um
robocop avançado da mediocridade.
A cadeirada de José
Luiz Datena em Pablo Marçal foi consequência natural de uma trama pensada,
assim como o soco de um assessor do “M” no marqueteiro de Ricardo Nunes. A
ideia é essa mesma: aproveita-se o sentimento de indignação contra o sistema
político – validado pelos próprios eleitores, registre-se – para expor de forma
grosseira e torpe uma suposta alternativa para “arrumar a casa”.
Ora, uma eleição exige
dois bons ingredientes: candidato e programa. Se haverá cumprimento ou não das
promessas do vencedor, é outra história que, aliás, contribui para aumentar a
desconfiança na política. Porém, o que Pablo Marçal apresenta é apenas um amontoado
de frases construídas para saciar o apetite do mais baixo senso comum.
Diante disso, os
demais candidatos demoraram a perceber como enfrentar a voz dissonante da
disputa. E que ninguém se engane. O objetivo era “chacraniano”, ou seja, “eu
não vim para explicar, eu vim para confundir”.
Ao fazer isso e deixar
os demais candidatos atônitos, Marçal surfou na onda do sucesso, aproveitando,
inclusive, para vender mais de seus produtos. O problema é que não ficou
somente nisso. Ao baixar o nível do debate de forma intencional, acabou levando
a eleição para o ringue e até mesmo para a esfera criminal produzindo a
sensação de que “todos os candidatos são iguais”.
Agora, na eleição,
caberá ao cidadão saber distinguir entre a farsa e a verdade. De qualquer
maneira, o estrago está feito.
• Do Macunaíma, Pedro Malasartes ao Coach:
A malandragem que se reinventa. Por Josué de Souza
Escrevo esta crônica a
pouco menos de duas semanas do pleito municipal de 2024. Desde o início da
pré-campanha, porém, o assunto nas editorias de política não tem sido outro: o
"surgimento e ascensão" do coach Pablo Marçal em São Paulo. Independentemente
do resultado das urnas, a eleição já carrega consigo um tema central: o
"fenômeno Marçal".
Seu sucesso não se
deve apenas aos bons números que sua candidatura para prefeito da maior cidade
da América Latina exibe nas pesquisas. Ele também é alimentado por métodos
pouco ortodoxos, que flertam com a ilegalidade, a violência e a quebra das
regras sociais estabelecidas. A própria fortuna pessoal declarada por Marçal se
tornou uma fonte constante de questionamentos sobre sua origem, gerando
inquietação na imprensa e entre adversários políticos.
No alarido dos
especialistas, que se apressam em tentar explicar o fenômeno, disputam-se
conceitos e nomenclaturas que tentam dar conta do inexplicável. Como em um
supermercado, há teorias para todos os gostos: “infoproduto”,
"marçalização da política", "política do tiktoker",
"política de cortes", "neobolsonarismo", “voto ideológico
de direita”, entre outras.
Nesta algazarra de
explicações, destacam-se dois grupos: os “tecnólatras”, que demonstram uma
intensa admiração, ou dependência, da tecnologia. Para eles, o coach, ou
ex-coach, inaugurou uma nova forma de fazer política, agora restrita ao meio
digital. De outro lado, estão os "ludistas", que defendem a regulação
dos meios digitais e atribuem o aparente sucesso de Marçal ao uso
indiscriminado dessas tecnologias e ao mundo sem regras em que ele se
movimenta.
Contribuindo para o
falatório, vou propor aqui mais uma explicação. Sem pretensões definitórias ou
convicções ortodoxas, mas apenas como quem observa o cenário com curiosidade.
Marçal é, simplesmente, ou quem sabe também, mais um Pedro Malasartes. Aquele
típico personagem da cultura popular que, com astúcia e lábia, percorre os
caminhos da vida enganando uns, seduzindo outros, sempre escapando das
armadilhas que ele próprio parece criar.
No Brasil, a figura do
malandro é um arquétipo recorrente tanto na literatura quanto na sociologia. A
começar por Macunaíma, o "herói sem nenhum caráter" de Mário de
Andrade, que transita entre a esperteza e a preguiça, adaptando-se aos percalços
do mundo com criatividade e descompromisso. Temos também Leonardo, de Memórias
de um Sargento de Milícias, de Manuel Antônio de Almeida, o malandro carioca
que sobrevive às avessas da sociedade do Império, sempre se esquivando das
normas.
Roberto DaMatta aponta
que Pedro Malasartes é o paradigma do malandro, “frequentemente vestido com sua
camisa listrada, anel com esfinge de São Jorge e sapato de duas cores, em sua
caracterização urbana” (DaMatta, 1997). Malasartes, na interpretação do antropólogo
brasileiro, é o arquétipo do indivíduo que, resignado com sua posição na
estrutura social, utiliza as regras, ou a falta delas, para ascensão social e
vingança contra aqueles que o desprezam.
Marçal é o malandro
contemporâneo. Mesmo que seus crimes e deslizes sejam escancarados pela
imprensa e pelos adversários, seu eleitor se identifica com ele e sua
trajetória. Percebeu que, por aqui, as regras não valem para todos. É o
"homem cordial", com traços ambíguos, que, com simpatia e astúcia,
sobrevive nos bastidores das relações sociais. Todos, em maior ou menor grau,
são expressões dessa malandragem.
Ele encontra maneiras
de navegar pelas complexidades do nosso tempo, reinventando o jogo à medida que
avança. Não usa camisa listrada; veste roupa de operador da Faria Lima, com
linguajar de pastor neopentecostal, exibindo elementos da sociedade de consumo
e do mundo fitness. No caminho, enrola incautos e manés.
• Marçal fez sinal para capanga atacar.
Por Eduardo Guimarães
A sede de audiência da
mídia e a sonolência da Justiça Eleitoral pós-Alexandre de Moraes deram a Pablo
Marçal estatura que jamais teria se as redes de TV e o TSE, mais do que o
TRE-SP, tivessem tido um mínimo de capacidade de detectar riscos inaceitáveis.
A eleição paulistana
envergonha os munícipes de uma cidade cujo cosmopolitismo chegou a iluminar o
Brasil um dia e que, hoje, a coloca abaixo do nível de civilidade e de
responsabilidade política dos mais longinquos grotões.
Amigo nordestino
ponderou comigo, com propriedade, que se algo como a cadeirada, os sopros de
farinha e a agressão covarde de um capanga ocorresse no Nodeste, a região
estaria sendo chamada inteirinha de "selvagem" e
"atrasada".
Na terça-feira,
finalmente a Justiça Eleitoral deu sinal de vida e a nova presidente do mesmo
Tribunal que, em 2022, cassou celeremente a elegibilidade de Jair Bolsonaro,
mandou a Polícia Federal se mexer.
Que falta nos faz o
Xandão...
Todavia, há assuntos
mais prementes a requerer nossa atenção.
Assuntos que podem fazer a eleição municipal de 2024 terminar em tragédia
histórica.
A ministr Cármen Lúcia
só pediu que as autoridades judiciárias e policiais tomem providências contra
as violências retóricas e físicas marsalescas e datenescas após se tornar
previsível que, nesssa toada, debates acabarão terminando em tiroteios entre os
exércitos de "seguranças" dos candidatos. Estamos à beira do abismo.
Falando em seguranças
e/ou capangas, vale notar que o vídeo da agressão covarde contra o
ex-marqueteiro de Bolsonaro Duda Lima, hoje trabalhando para o prefeito, revela
que tudo que aconteceu no Clube Sírio Libanês, durante o debate do Grupo Flow,
foi arquitetado.
Marçal chegou
agressivo ao local do debate, bateu boca com Nunes já na entrada, fez ataques e
ameaças aos concorrentes no "esquenta" do evento, portou-se
tranquilamente ao longo de 99% do tempo e, ao fim, faltando segundos para
concluir suas considerações finais, passou a desrespeitar as regras acordadas e
a debochar do mediador, Carlos Tramontina.
Após ser expulso do
debate, enquanto deixava o púlpito fez um sinal com a cabeça tão evidente que a
pessoa que filmou a agressão que se seguiria desviou o foco da câmera desde o
gesto de Marçal até o do capanga enquanto este desferia golpe tão violênto que
produziu um baque surdo.
Agora, a pergunta que
não quer calar: se Pablo Marçal foi capaz de organizar o que poderira ter
terminado em um confronto generalizado entre os seus capangas e os de Ricardo
Nunes, o que esse energúmeno não está arquitetando para pôr em prática no dia
da eleição?
Após deixar o debate,
Marçal fez uma live incitando a população a cometer atos de violência "no
primeiro turno". Será que a sonolenta Justiça Eleitoral e a Polícia vão
esperar isso acontecer para colocarem o ex-coach em prisão preventiva até o fim
da eleição?
• Fascista quer sempre ganhar na porrada.
Por Alex Solnik
Estamos vivendo um
lamentável momento histórico, nasce um fascista nas nossas barbas, sem que a
maioria dos políticos e dos jornalistas de política perceba, sem que os
veículos de comunicação, sempre zelosos defensores da democracia, impeçam que
ele ocupe espaços nos quais invariavelmente achincalha os valores democráticos
e o mais impressionante é que ele não esconde seus métodos, usa e abusa da
sordidez, da calúnia, da injúria, do baixo calão, do desrespeito às regras, da
mentira, sem provocar o repúdio e a aversão que merece.
A campanha hostil
contra todos os demais candidatos, explícita desde o início e cada vez mais
truculenta, nos remete imediatamente às cenas de violência dos integralistas
nas ruas do Rio de Janeiro nos anos 30, inspiradas nos fascistas de Mussolini
dos anos 20, e é fato que Marçal já tem uma milícia digital nas redes sociais,
que reproduz para milhões de pessoas as aleivosias que ele lança contra todos,
e, como vimos no último debate, tem uma robusta equipe de seguranças própria,
treinada para provocar tumulto, outra marca fascista, com a intenção de
desestabilizar ou tirar os candidatos da disputa, assustar, ganhar na porrada,
seja o debate, seja a pesquisa, seja a eleição.
Convidar para debate
propositivo alguém que não quer debater e sim impor as suas ideias, goela
abaixo, na porrada, não é homenagear o estado democrático de direito e sim
aviltá-lo, é transformar o momento do voto, que diferencia uma democracia de
uma ditadura num espetáculo deprimente e repulsivo. “Se a democracia é esse
lixo, melhor a ditadura” poderão pensar alguns.
Alguns pontos que o
caracterizam como fascista:
1. ele não respeita
partidos, pretende governar sem eles, o que lembra o Estado Novo de Getúlio
Vargas;
2. atua apoiado por um
bando de seguidores que reproduzem seus ataques nas redes sociais e nas ruas,
já tem milícias de fanáticos e prega, em seus cursos, que o homem tem que ser
violento;
3. despreza a
imprensa;
4. o dia da eleição,
para ele, não é o dia da democracia, mas o dia da vingança;
5. seu ídolo político
é Bukele, o ditador sanguinário de El Salvador.
Marçal não é apenas
bolsonarista, como pensam alguns, ele está quilômetros à direita de Bolsonaro,
São Paulo é um trampolim para Brasília e, se chegar lá, é para ficar não pelo
tempo regulamentar (ele respeita alguma regra?) e sim até exterminar o “consórcio
comunista” de que tanto fala.
Na base da porrada.
Quem faz campanha na
base da porrada, governa na base da porrada.
Fonte: Jornal
GGN/Brasil 247
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