Ofensiva de Israel no Líbano está
provocando 'carnificina', alerta ministro
O ministro da Saúde do
Líbano disse que o que está acontecendo em seu país é uma
"carnificina", com hospitais tendo dificuldades para lidar com o
número de mortes provocado pelos dois dias de ataques aéreos de Israel contra o grupo Hezbollah.
Firass Abiad disse à
BBC que está "claro" que muitas das 550 pessoas mortas no ataque de
segunda-feira eram civis, incluindo crianças e mulheres.
Israel disse que
atingiu centenas de locais ligados ao Hezbollah, acusando o grupo de esconder armas em zonas residenciais.
Nesta quarta-feira
(25/9), o exército israelense diz que está realizando uma nova onda de ataques
no sul do Líbano e na área de Beqaa. Dez pessoas foram mortas nos ataques, diz
o Ministério da Saúde do Líbano.
Os ataques ao Líbano
acontecem depois que Israel disse ter interceptado um míssil balístico
disparado pelo Hezbollah em direção a Tel Aviv. Esta foi a primeira vez que um
foguete do Hezbollah atingiu a maior cidade de Israel, dizem autoridades
israelenses.
O Hezbollah diz que o
ataque foi direcionado à sede da agência de inteligência israelense Mossad.
Na terça-feira (24/9),
o exército de Israel matou o comandante das forças de mísseis do Hezbollah. O
premiê israelense, Benjamin Netanyahu, disse que o grupo está levando o Líbano
para a "beira do precipício".
O Hezbollah respondeu
com mais de 300 foguetes disparados em direção ao norte de Israel, ferindo seis
pessoas, segundo o Exército.
Apesar de nenhum dos
lados demonstrar sinais de recuo, o presidente dos Estados Unidos, Joe Biden,
disse à Assembleia Geral da ONU que um conflito amplo "não é do interesse
de ninguém" e insistiu que "uma solução diplomática ainda é possível".
O secretário-geral da
ONU, António Guterres, disse que o mundo "não pode aceitar que o Líbano se
torne outra Gaza".
A violência entre
Israel e Hezbollah, provocada pela guerra em Gaza, já dura quase um ano e matou
centenas de pessoas — a maioria combatentes do Hezbollah — e deixou dezenas de
milhares sem casa em ambos os lados da fronteira.
O Hezbollah disse que
está agindo em apoio ao Hamas e que não vai parar até que haja um cessar-fogo
em Gaza. Ambos os grupos são apoiados pelo Irã e classificados como
organizações terroristas por Israel, Reino Unido e outros países.
Os ataques de Israel
na segunda-feira (25/9) ao sul do Líbano e no Vale do Bekaa foram o dia com
maior número de mortes no país desde pelo menos 2006 — a última vez que o
Hezbollah e Israel travaram uma guerra.
O ministro Firass
Abiad disse à uma coletiva de imprensa na terça-feira que 50 crianças, 94
mulheres e alguns trabalhadores do setor de saúde estavam entre os 558 mortos.
Mais de 50 hospitais estão tratando 1.835 pessoas, segundo Abiad.
Em entrevista para a
BBC, o ministro da Saúde disse que o que aconteceu foi uma
"carnificina".
"Se você olhar
para as pessoas trazidas às salas de emergência, está claro que elas eram
civis. Elas não são os combatentes que os israelenses dizem que são",
disse.
"Nós sabemos das
vítimas dos ataques porque foram nossas ambulâncias que as transferiram para os
hospitais. [Elas eram] civis que estavam fazendo coisas normais."
Ao comparar a
violência de agora com a guerra de 2006, Abiad disse: "Definitivamente
estamos olhando para uma guerra mais cruel, especialmente na forma como civis
estão sendo atacados".
O escritório dos
Direitos Humanos da ONU também expressou preocupação com o número de vítimas
nos ataques de segunda-feira, dizendo que eles podem ter violado leis
internacionais.
Quando perguntado por
jornalistas sobre mensagens de áudio e texto enviados por militares israelenses
ao povo do Líbano pedindo a evacuação de áreas próximas a prédios usados pelo
Hezbollah para armazenar armas, a porta-voz Ravina Shamdasani disse: "Dizer
a civis para que saiam não faz com que seja ok atacar essas áreas, quando se
sabe perfeitamente que o impacto nos civis será enorme".
Estradas no sul do
Líbano ficaram congestionadas pelo segundo dia, com milhares de pessoas
seguindo para o norte, para fugir dos ataques israelenses. Viagens que costumam
durar uma hora estavam demorando mais de 12.
Em um abrigo em
Beirute, a libanesa Maryam, de 65 anos, disse para a BBC que tinha passado a
noite toda viajando com 12 parentes em um carro pequeno.
"Nós nos juntamos
e partimos. Não queríamos deixar nossas casas, porque deixar sua casa é algo
difícil. Chegamos às quatro da manhã. Com nossas crianças. Foi por causa de
nossas crianças que fomos embora."
Durante uma visita a
uma base de inteligência, o premiê Benjamin Netanyahu disse que Israel vai
"continuar atacando o Hezbollah" até que conquiste seu objetivo de
guerra que é fazer com que israelenses voltem para suas casas na fronteira
norte do país.
Ele também falou ao
povo do Líbano, insistindo que "nossa guerra não é com vocês", e
alertando que o líder do Hezbollah, Hassan Nasrallah, está "levando vocês
à beira do precipício".
"Eu disse a vocês
ontem para evacuarem as casas onde há um míssil na sala de estar e um foguete
na garagem. Quem tiver um míssil na sala de estar e um foguete na garagem não
terá mais uma casa", disse.
O porta-voz do
Exército de Israel, Daniel Hagari, disse em uma entrevista coletiva que o
Hezbollah transformou o sul do Líbano e o Vale do Bekaa em uma "zona de
combate" e que os ataques seguiram na terça-feira.
Ele também divulgou
vídeos que, segundo ele, mostraram explosões secundárias durante ataques a
prédios residenciais, o que indicaria que mísseis e foguetes estavam sendo
guardados ali.
Hagari também disse
que o comandante da unidade de mísseis e foguetes do Hezbollah, Ibrahim
Qubaisi, foi morto no ataque aéreo nos subúrbios de Beirute na tarde de
terça-feira, junto com pelo menos dois comandantes que estavam com ele.
Qubasi era uma
"pessoa chave na ativação dos mísseis" e foi "responsável por
uma série de ataques ao território israelense", disse ele.
O Hezbollah confirmou
em uma postagem no Telegram que Qubaisi virou um "mártir" no ataque.
O ministro da Saúde do
Líbano disse que seis pessoas morreram e outras 15 ficaram feridas em um
"ataque inimigo de Israel" que parcialmente destruiu dois andares de
um prédio no bairro de Ghobeiry.
O Hezbollah disse que
seus combatentes dispararam foguetes contra mais de uma dúzia de cidades
israelenses e bases militares, além de uma fábrica de explosivos. O grupo
também disse que usou um novo tipo de foguete para atacar as Forças de Defesa
de Israel.
Sirenes soaram ao
longo do dia no norte de Israel. Foguetes interceptores do sistema israelense
de defesa Domo de Ferro foram vistos no céu.
Ceca de 300 foguetes
atingiram o solo, provocando danos e ferimentos em seis civis e soldados, a
maioria deles leve, segundo Hagari.
·
Israel está estendendo
sua guerra genocida ao Líbano
Israel está
desencadeando o inferno no Líbano.
Na segunda-feira, os
ataques aéreos israelenses que já tinham matado mais de 558 pessoas no
sul e leste do Líbano, incluindo mulheres e crianças, agora estão deslocando milhares de pessoas que fugiram para o
norte em busca de segurança após os avisos das Forças de Defesa de Israel (IDF)
para evacuar. Pelo menos 1.835 civis foram feridos.
Imagens mostram forças
israelenses bombardeando casas de civis no sul do Líbano e no Vale do Bekaa,
atingindo pelo menos 58 cidades e vilas. De acordo com o Ministério da Saúde do
Líbano, o bombardeio israelense teve como alvo casas, centros médicos, ambulâncias
e carros de pessoas tentando fugir. Famílias libanesas inteiras foram
dizimadas. Imagens horríveis mostram
crianças presas sob os escombros.
Este é um flagrante
crime de guerra.
O ataque na
segunda-feira aconteceu em meio a temores de uma iminente invasão terrestre
israelense no Líbano, que ameaça se transformar em uma guerra regional
generalizada. Em uma entrevista à CNN no domingo, o secretário-geral da ONU,
António Guterres, alertou que uma guerra
total arriscaria “a possibilidade de transformar o Líbano em outra Gaza”, o que
ele disse que seria “uma tragédia devastadora para o mundo”.
Mas uma guerra
regional é precisamente o que Israel quer. Armado com um suprimento infinito de
armas dos EUA, Israel está estendendo sua guerra genocida ao Líbano com clara
intenção de uma escalada regional que poderia implicar diretamente os EUA. Após
o massacre de segunda-feira, o Pentágono despachou tropas adicionais para a
região em antecipação a um conflito mais amplo. O ataque também ocorre poucas
horas depois que o Secretário de Defesa dos EUA, Lloyd Austin, expressou seu “apoio ao
direito de Israel de se defender dos ataques do Hezbollah libanês”.
“Sob o pretexto de
combater o terrorismo, Israel continua a agir com impunidade na região,
encorajado pelo apoio incondicional dos EUA e pelo fluxo incessante de
carregamentos de armas.”
Seguindo seu roteiro
de Gaza, o exército israelense caracterizou o massacre como um ataque
“extensivo” ao Hezbollah, enquanto repetia a lógica genocida de que não há
civis no Líbano. O primeiro-ministro israelense Benjamin Netanyahu sinalizou no
domingo que o ataque da IDF no Líbano está apenas começando, gabando-se de que
“nos últimos dias, atingimos o Hezbollah com uma série de golpes que eles não
haviam imaginado”. Em um vídeo postado nas redes sociais, um
porta-voz das IDF descreveu o bombardeio como um ataque preventivo lançado em
meio a “indicações de que o Hezbollah estava se preparando para atirar em
direção ao território israelense”. Outro oficial israelense descreveu o ataque como
“desescalada por meio de escalada”.
O primeiro-ministro
interino do Líbano, Najib Mikati, chamou na segunda-feira a onda de ataques
aéreos de Israel de um ato de genocídio, declarando: “A contínua agressão
israelense ao Líbano é uma GUERRA DE GENOCÍDIO em todos os sentidos da palavra
e seu objetivo é DESTRUIR VILAS libanesas!” Enquanto isso, o governo libanês
solicitou uma reunião de emergência do Conselho de Segurança da ONU após o
último ataque israelense em Beirute, acusando Israel de realizar atos
“semelhantes a genocídio” em solo libanês.
Os próprios ministros
israelenses têm clamado abertamente por genocídio no Líbano, enquanto outros agora pedem que as IDF “assumam o controle” e
estabeleçam uma “zona-tampão” no sul do Líbano.
Em resposta aos
ataques israelenses, o Hezbollah disparou uma saraivada de foguetes no norte de
Israel, que foram interceptados em sua maioria e não causaram vítimas. O
Hezbollah prometeu repetidamente interromper seus ataques a Israel se houver um
cessar-fogo em Gaza.
O massacre na segunda
aconteceu logo após os serviços de inteligência israelenses terem lançado um
ataque terrorista em massa dentro do Líbano, fazendo com que milhares de dispositivos eletrônicos detonassem remotamente, matando pelo menos 40 e ferindo e mutilando milhares de
pessoas, enquanto “desencadeava medo, pânico e horror generalizados entre o
povo no Líbano”, para citar um alto funcionário da ONU. A investida seguiu com o mortal ataque aéreo israelense no
Líbano na sexta-feira, que matou mais de 30 civis, junto com um comandante de
alto escalão do Hezbollah.
Israel tem uma longa
história de massacres civis no Líbano. O massacre de segunda-feira coincide com
o aniversário do massacre de Sabra e Shatila. Em setembro de 1982, as forças da
IDF invadiram o campo de refugiados de Sabra e Shatila em Beirute, permitindo
que falangistas maronitas entrassem no campo e massacrassem milhares de
refugiados palestinos indefesos a sangue frio, principalmente mulheres e
crianças. O massacre ocorreu mesmo depois que o campo se rendeu às forças
israelenses e os membros da Organização para a Libertação da Palestina (OLP)
deixaram Beirute.
“Por 12 meses, os EUA
fabricaram e enviaram para Israel as bombas que massacraram mais de 40 mil
palestinos em Gaza e quase mil civis no Líbano.”
Em 18 de abril de
1996, Israel realizou um massacre horrível perto de Qana, uma vila no sul do
Líbano então ocupado por Israel, onde os militares israelenses bombardearam um
complexo das Nações Unidas, que abrigava mais de 800 civis libaneses, matando
pelo menos 106. Um relatório da Anistia Internacional concluiu mais tarde que
“as IDF atacaram intencionalmente o complexo da ONU”. O massacre de Qana foi
saudado por Israel como “Operação Vinhas da Ira”, em referência ao romance do
autor norte-americano John Steinbeck.
Sob o pretexto de
combater o terrorismo, Israel continua a agir com impunidade na região,
encorajado pelo apoio incondicional dos EUA e pelo fluxo incessante de
carregamentos de armas. Por 12 meses, os EUA fabricaram e enviaram para Israel
as bombas que massacraram mais de 40 mil palestinos em Gaza e quase mil civis
no Líbano. De acordo com a organização sem fins lucrativos Armed Conflict
Location and Event Data (ACLED), Israel lançou mais de 8.000 ataques no Líbano
desde outubro passado. Desde o início de sua guerra genocida em Gaza, Israel
cometeu crimes de guerra quase todos os dias, e cada crime de guerra carrega as
marcas inegáveis da cumplicidade dos EUA.
Após o massacre de
segunda-feira no Líbano, um grupo de políticos norte-americanos pediu ao
governo Biden que suspendesse o fornecimento de armas a Israel. A deputada
Rashida Tlaib escreveu nas redes sociais: “É mais fácil parar de enviar armas
ao governo de Israel para conduzir suas guerras genocidas do que evacuar todos
os americanos no Líbano.”
Sem uma interrupção
imediata do fornecimento de armas pelos EUA a Israel, é difícil entender por
que Israel deveria parar de massacrar civis em Gaza e no Líbano, enquanto
ameaça desencadear uma guerra regional total que seria “uma tragédia
devastadora para o mundo”.
Fonte: Por Seraj
Assi, com tradução de Caue Segine Ameni, para Jacobin Brasil
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