quarta-feira, 30 de outubro de 2024

Extrema direita cresce em estados estratégicos e fortalece planos de Tarcísio, Nikolas e Gayer para 2026

O centrão foi o grande vencedor das eleições municipais. Marcado pelo fisiologismo e por muito dinheiro de emendas que irrigam suas bases eleitorais, vai comandar seis em cada 10 cidades brasileiras a partir de 2025. Mas os partidos de direita e extrema direita também saíram fortalecidos e ganharam terreno em quatro das cinco regiões do país, com vitórias em estados estratégicos que fortalecem os planos de Tarcísio Freitas, Nikolas Ferreira e Gustavo Gayer para 2026.

Enquanto isso, os partidos de esquerda perderam força no Norte, no Sul e no Centro-Oeste. No Sudeste, o avanço foi tímido: 7,5%. Já no Nordeste houve um crescimento de 38,2% na quantidade de prefeituras em relação a 2020. Esse resultado, além de garantir o saldo positivo da esquerda no desempenho nacional, reforçou a região como principal reduto para uma provável candidatura do presidente Lula à reeleição.

Esses cenários são resultado de um levantamento feito pelo Intercept Brasil. Nele, foram considerados como partidos de direita Agir (ex-PTC), DC, Novo, PL, PMB, PP, PRD, PRTB e Republicanos — a análise de dados das eleições de 2020 ainda incluiu siglas que não existem mais: PSC (incorporado pelo Podemos); PSL (virou União Brasil após fusão com o DEM); PTB e Patriota (a fusão de ambos gerou o PRD).

Já os partidos de esquerda foram PT, PC do B e PSOL. Os demais foram classificados como de centro-direita ou centro-esquerda. Vale ressaltar que há 41 eleições municipais sub judice, ou seja, aguardam decisão da Justiça Eleitoral para confirmar o resultado. Destas, 15 envolvem candidatos da direita, sendo sete do Republicanos, cinco do PP e um de PL, União e PRD.

No primeiro turno, mostramos que a maioria dos candidatos apoiados publicamente pela tropa de choque da extrema direita no Congresso — Nikolas, Carla Zambelli, Gayer, Damares Alves e Eduardo Bolsonaro — não foi eleita. Agora, os resultados finais mostram que, apesar da declaração de voto não garantir a eleição, os partidos de direita saem bem-sucedidos na estratégia de criar uma base para se fortalecer para 2026. 

•        Republicanos abocanhou o dobro de prefeituras

O Republicanos, partido ligado à Igreja Universal e sigla do governador de São Paulo Tarcísio de Freitas, foi a sigla de direita que mais cresceu no país: conquistou 223 novas prefeituras em 2024, uma alta de 102,8%. Com isso, passou de 217 vitórias em 2020 para 440 neste ano.

No mesmo período, o PL avançou de 349 para 517 (+48,1%), enquanto o PP foi de 701 para 752 (+7,3%). Outro destaque foi o Novo, que saiu de uma para 19 prefeituras (+1.800%).

Vale ressaltar que o partido de Tarcísio, ao qual também pertence a senadora Damares Alves, do DF, cresceu nas cinco regiões do país. Foram 184 vitórias no Sudeste (+132,9% em relação a 2020), 82 no Norte (+355,6%), 124 no Nordeste (+31,9%), 36 no Sul (+176,9%) e 14 no Centro-Oeste (+7,7%).

No estado de São Paulo, o salto foi de 23 para 87 prefeituras — crescimento de 278,3%. Com isso, o Republicanos comandará 13,5% dos municípios paulistas. Juntos, os partidos de direita venceram em 249 cidades no estado, contra 172 em 2020.

Mais do que aumentar a força partidária em seu reduto eleitoral, Tarcísio ainda comemorou a vitória de Ricardo Nunes na capital. Apesar do prefeito reeleito ser do MDB, o governador bancou sua candidatura desde o início, diferentemente de Jair Bolsonaro, do PL, que o apoiou mais timidamente e chegou a levantar dúvidas sobre quem seria seu favorito em meio à disputa no primeiro turno entre Nunes e Pablo Marçal, do PRTB.

•        PL cresce e fortalece Nikolas, Eduardo Bolsonaro e Gayer

Outro partido de direita que ampliou suas bases nesta eleição municipal foi o PL. O salto de 349 para 517 prefeituras (+48,1%) em relação ao desempenho de 2020 é ainda mais significativo porque se traduziu, também, em mais prefeitos conquistados nos redutos de nomes importantes da sigla que flertam com uma candidatura a governador ou ao Senado.

Em Minas Gerais, apesar da derrota no segundo turno em Belo Horizonte, o PL aumentou de 41 para 53 o total de prefeituras (+29,3%) na comparação com as eleições de 2020. Além disso, os partidos de direita e centro-direita, juntos, comandarão 768 municípios a partir do ano que vem, o equivalente a 90% das cidades mineiras.

Um dos principais líderes do PL no estado, o deputado federal Nikolas Ferreira, que apoiou publicamente 21 das 53 vitórias da sigla, tem feito mistério sobre uma candidatura a governador.

Recentemente, em entrevista ao jornal O Tempo, ele disse que não sabe ainda que rumo tomar em 2026, mas pontuou que “não quer queimar cartucho” e governar Minas tendo Lula como presidente, por temer que o petista o prejudique. Outro nome em ascensão na direita no estado é o senador Cleitinho, do Republicanos, que é próximo de Nikolas.

Já em São Paulo, o PL mais do que dobrou suas prefeituras. Passou de 41 em 2020 para 105, um avanço de 156,1%. O desempenho também reforça os planos de figuras como Eduardo Bolsonaro, por exemplo, de tentar trocar a Câmara pelo Senado. Além disso, caso Tarcísio mire a presidência em 2026, abre caminho para que o partido lance um nome próprio para concorrer ao governo estadual.

Em Goiás, em que pese a derrota no segundo turno em Goiânia, o PL também ganhou terreno. Passou de 14 prefeituras em 2020 para 26 (+85,7%). A ampliação das bases faz com que o deputado federal Gustavo Gayer ganhe força em uma futura disputa ao governo, hoje comandado por Ronaldo Caiado, do União Brasil, que não pode disputar a reeleição.

•        Esquerda só amplia força no Nordeste

Em números absolutos, os partidos de direita venceram em 1.819 municípios, o que representa um aumento de 3,7% em relação ao desempenho nas eleições de 2020. Já as siglas de esquerda ganharam em 271 cidades (+14,8%) — mas o ganho percentual não significa uma ascensão proporcional nas cinco regiões do país.

Enquanto os partidos de direita aumentaram o número total de prefeituras nas regiões Sul (+22,3%), Sudeste (+22,9%), Centro-Oeste (+6,9%) e Norte (+35,2%), a esquerda teve um leve avanço no Sudeste, com 43 vitórias (+7,5%) e só se fortaleceu no Nordeste, onde passou de 136 para 188 municípios (+38,2%).

Foi na região, inclusive, que houve a única vitória de uma sigla de esquerda em capitais, em Fortaleza, no Ceará. Evandro Leitão, do PT, obteve 50,38% e venceu André Fernandes, do PL – uma diferença apertada de 10.838 votos em cerca de 1,5 milhão de eleitores.

No Norte, a queda foi de 50%, com apenas sete eleitos em 450 municípios. Além disso, a esquerda amargou uma derrota acachapante em Belém, no Pará, onde o atual prefeito Edmilson Rodrigues, do PSOL, sequer conseguiu chegar ao segundo turno.

Já no Sul, a redução foi de 26,8%, com apenas 30 eleitos em 1.191 cidades — ao menos a candidata Cristina Graeml, do PMB, foi derrotada na disputa de segundo turno em Curitiba, no Paraná. No Centro-Oeste, a esquerda caiu de 5 eleitos em 2020 para apenas 3 em 2024 (-40%).

O PT, entretanto, registrou um crescimento no total de prefeituras no Brasil na comparação com quatro anos atrás. Passou de 182 para 252, uma alta de 38,5%. Por outro lado, 170 dessas vitórias foram em municípios do Nordeste, o equivalente a 67,5% do total.

Vale pontuar que o número de prefeituras não é garantia de transferência direta de votos para esquerda ou direita na disputa presidencial. Lula é um exemplo disso: ganhou em 2022 e, dois anos antes, a esquerda só havia eleito 236 prefeitos no país.

Por outro lado, os resultados reforçam o peso do Nordeste para a esquerda, como foi na vitória sobre Jair Bolsonaro em 2022 — na região, Lula ganhou em 98,9% das cidades no segundo turno.

•        Prefeituras são a base para 2026

No início de outubro, pouco antes do primeiro turno, o deputado Gustavo Gayer fez um post em que revelou parte da estratégia da extrema direita nestas eleições: tentar eleger o maior número possível de prefeitos. Gayer disse que “serão esses prefeitos que vão usar toda a máquina e estrutura em 2026 para eleger senadores”.

Ele ainda disse que a extrema direita “errou no passado” ao “não se preocupar” em formar uma base de prefeitos e vereadores. E que a estratégia de “aumentar os prefeitos de direita” pelo Brasil passa por escolher nomes “muito bem selecionados” e que tenham um posicionamento em comum em “pautas específicas” para apoiar a campanha de 2026.

No primeiro turno, no entanto, mostramos que essa transferência de votos não é tão direta assim: a maioria dos candidatos a prefeito apoiados publicamente pela tropa de choque da extrema direita no Congresso saiu derrotada. Dos 117 políticos que receberam o aval dos deputados Carla Zambelli, Eduardo Bolsonaro, Gustavo Gayer e Nikolas Ferreira, do PL, e da senadora Damares Alves, do Republicanos, só 31% foram eleitos em 6 de outubro — dos 12 que avançaram para o segundo turno, apenas 4 venceram (33,3%).

“Se você estabelece vínculo de base com um prefeito eleito não deixa de ser um recurso político e uma vantagem para chegar em 2026 visando obter uma votação expressiva para o Congresso ou até tentar se lançar em uma eleição majoritária”, disse, na ocasião, o cientista político Jorge Chaloub ao Intercept.

 

Fonte: por Leandro Becker, em The Intercept

 

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