Reuters aponta onda de direita no Brasil
após eleições municipais
Candidatos de partidos
de centro e da direita sagraram-se vencedores na maioria das cidades que
tiveram segundo turno das eleições municipais neste domingo, consolidando tendência
que já havia sido estabelecida na primeira rodada da votação.
A disputa mostrou
força de nomes de direita que não necessariamente são vinculados a Jair
Bolsonaro (PL) e de candidatos que firmaram alianças mais amplas, revelando uma
preferência do eleitorado por fugir da polarização.
Partido que ao mesmo
tempo faz parte do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva e da
administração estadual de São Paulo do governador Tarcísio de Freitas, o PSD
encerrou a eleição municipal como o principal ganhador, com 887 prefeituras.
Em segundo lugar ficou
o MDB -- outro partido que está no governo federal, mas que faz oposição a Lula
em outros Estados, como São Paulo -- com 853 prefeituras, seguido pelo PP, em
terceiro, com 746 prefeituras.
O quarto lugar foi o
União Brasil, com 583 prefeituras, e depois o PL do ex-presidente Bolsonaro,
com 516 municípios. O PT de Lula ficou com o nono maior número de prefeituras,
com 252 vitórias.
Das 26 capitais
brasileiras, o PSD e o MDB venceram em cinco cada. União Brasil e PL
conquistaram cada um quatro capitais, enquanto PP e Podemos ficaram com duas
cada.
O PT venceu somente na
capital do Ceará, em uma disputa muito apertada vencida por Evandro Leitão
contra o bolsonarista André Fernandes (PL) -- 50,38% a 49,62%.
O resultado também
indicou a força da máquina na disputa. Dos 20 prefeitos de capital candidatos à
reeleição, somente quatro não venceram.
A disputa mais
importante deste domingo terminou com a reeleição do prefeito de São Paulo,
Ricardo Nunes (MDB), que teve como principal padrinho político o governador
Tarcísio -- que é apontado como um dos importantes nomes para a sucessão
presidencial em 2026.
A eleição na maior
cidade do país representou um revés para o presidente Luiz Inácio Lula da Silva
por ter apoiado o candidato do PSOL à prefeitura, o deputado federal Guilherme
Boulos.
O presidente, de
maneira geral, não chegou a entrar de cabeça nas corridas municipais, mas São
Paulo foi a cidade onde mais investiu nessa eleição. Lula participaria de um
ato de campanha com Boulos na véspera da votação, mas uma queda no banheiro
sofrida no fim de semana passado impediu o presidente de viajar.
Bolsonaro, por sua
vez, chegou a ir pessoalmente a Goiânia para acompanhar a votação do
correligionário Fred Rodrigues (PL), que perdeu a disputa final para o
ex-deputado Sandro Mabel (União).
O ex-presidente também
foi derrotado em Belo Horizonte, onde o prefeito Fuad Noman (PSD) foi reeleito
ao cargo derrotando o bolsonarista Bruno Engler (PL). Noman obteve 53,73% dos
votos válidos contra 46,27% de Engler.
Ainda que esteja
inelegível até 2030, Bolsonaro trabalhou na corrida municipal para tentar
ampliar sua influência política.
Em outra capital
importante do país, Sebastião Melo (MDB) se reelegeu prefeito vencendo a
deputada federal Maria do Rosário (PT). Melo, que foi alvo de críticas pela
gestão das enchentes enfrentadas pela cidade no primeiro semestre, teve 61,53%
dos votos válidos, ante 38,47% de Rosário.
<><>
Gleisi cobra de partidos da base apoio à reeleição de Lula
A presidente do PT,
Gleisi Hoffmann (PR), disse esperar que as vitórias dos partidos aliados que o
governo federal tem contabilizado como suas sejam convertidas em apoio para o
presidente Lula em 2026,.A declaração de Gleisi embute a expectativa de que a
vitória de partidos com assento no governo reforce a base governista, destaca
reportagem do jornal Folha de S.Paulo.
A presidente do PT
lembrou que o PT só lançou candidatos em 13 capitais em prol de uma política de
alianças.
"Espero que a
vitória dos partidos que compõem a base, que está sendo computada como vitória
do governo, possa se traduzir em apoio em 2026, para além do que já havia em
2022", disse Gleisi.
Gleisi destacou o
crescimento do partido em comparação a quatro anos atrás e lembrou ainda que,
em nome da governabilidade, o partido optou por apoiar candidaturas de aliados
em 88 municípios com mais de 100 mil eleitores.
Gleisi elogiou o
empenho do candidato do PSOL à Prefeitura de São Paulo, Guilherme Boulos, e da
candidata do PT em Natal, Natália Bonavides. Ela ressaltou o bom desempenho dos
candidatos petistas, ainda que derrotados.
Nesta segunda-feira
(28), o comando do PT se reunirá para avaliação do resultado do partido.
¨ Deslocamento do eixo gravitacional da política brasileira, Por
Aldo Fornazieri
Definidos todos os
vencedores e perdedores, as eleições municipais de 2024 definiram algumas novas
características e tendências da política brasileira. A mais notável
característica é o fim da bipolarização entre bolsonarismo e lulismo (esquerda,
petismo etc.). As eleições marcaram o fortalecimento da multipolarização e do
pluripartidarismo, com uma clara inclinação para a centro-direita.
Os candidatos
bolsonaristas radicais, com exceção de Fortaleza, foram derrotados por
candidatos de partidos de centro-direita (Belo Horizonte, Curitiba e Goiânia),
com o apoio velado ou explícito da esquerda. E a centro-direita, em algumas
cidades (São Paulo, Porto Alegre etc.), disputou com candidatos de esquerda. Há
um limite eleitoral para o discurso extremado do armamentismo, do machismo e de
preconceito, principalmente entre as mulheres.
A mais notável
tendência consiste no processo de deslocamento do eixo gravitacional da
política brasileira para a centro-direita. A derrota de Bolsonaro para Lula em
2022 havia enfraquecido o bolsonarismo. Esse enfraquecimento agora se amplia e
Bolsonaro perde capacidade de atração de aliados porque a sua perspectiva de
poder futuro minguou.
Com a vitória de 2022,
Lula havia se tornado o novo eixo gravitacional da política brasileira. Mas
nesses quase dois anos de governo sofrível e confuso, sem capacidade de
conferir um sentido e um rumo estratégicos ao país, e com o resultado das
eleições municipais, Lula ficou enfraquecido na perspectiva de poder futuro e
enquanto centro de atração de aliados. Lula, ao contrário do PT e da esquerda,
não saiu propriamente derrotado das eleições, mas saiu enfraquecido pelas
derrotas de seus apoiadores mais fiéis e históricos.
A centro-direita,
contudo, tem dois grandes problemas: 1) não tem um líder que a unifique e nem
tende a tê-lo; 2) Não há coesão nem entre os partidos e nem dentro dos
partidos. Por exemplo: tanto no MDB, quanto no PSD, seus representantes do
Nordeste e Norte tendem mais para o campo progressista, enquanto que no
centro-sul, tendem mais para o campo conservador. A questão que se coloca é se
o Tarcísio de Freitas poderia ser esse líder agregador. Ele saiu fortalecido
com a vitória de Nunes, mas com a imagem arranhada ao cometer crime de abuso de
poder contra a campanha de Boulos. Mostrou que não tem afeição com a
democracia.
O PL, o quinto em
número de prefeituras conquistadas, fará uma opção de extrema-direita em 2026.
Assim, o PSD, o MDB, o PP e o União Brasil, os quatro primeiros colocados pela
ordem, terão papeis importantes na definição do cenário das eleições presidenciais
no campo de centro-direita. Gilberto Kassab, que já declarou que estará com
Tarcísio em qualquer circunstância, será um dos grandes caciques nesse
processo.
Mesmo com todo esse
cenário, a questão central da sucessão presidencial de 2026 ainda se concentra
em Lula. Mas Lula está numa encruzilhada. Em primeiro lugar, para garantir a
governabilidade dos dois últimos anos terá que ceder ainda mais espaço nos ministérios
aos partidos de centro-direita. Caso contrário terá grande dificuldade de
aprovar qualquer coisa no Congresso.
Em segundo lugar, o
governo se mostra fraco, extraviado, sem capacidade de indicar um rumo
estratégico. Mesmo que a economia continue num ritmo de crescimento até 2026,
não há nenhuma garantia de que isto se traduza em dividendos políticos e
eleitorais, exatamente por conta da fraqueza política do governo.
Em terceiro lugar,
incidirá sobre a possível candidatura Lula em 2026 o fator idade. Ele terá 81
anos, a mesma idade que o presidente Biden tem em 2024. Esta é uma variável
sobre a qual não se terá muito controle para a definição do cenário de
candidaturas para a sucessão presidencial. Na hipótese de Lula não ser
candidato, o cenário tenderá a ser mais complexo, com a pulverização de várias
candidaturas de centro e de direita.
De modo geral, as
eleições marcaram a força do instituto da reeleição associado ao orçamento
secreto. Alguns governadores saíram politicamente fortalecidos: Ronaldo Caiado,
Ratinho Júnior, Elder Barbalho e Tarcísio, este chamuscado pelo crime eleitoral
que cometeu.
Mesmo com a vitória em
Fortaleza, o PT e as esquerdas reiteraram sua derrota. Não dá para comparar o
resultado de 2024 com o resultado de 2020. Naquele ano, Lula recém tinha saído
da prisão. Agora, o PT está no governo com Lula.
As eleições
aprofundaram o processo de mediocridade da política. Foram marcadas mais por
ataques pessoais do que por discussão de saídas para as cidades e as
dificuldades dos cidadãos. O tema do meio ambiente, que expressa a maior crise
do nosso tempo e a maior ameaça que paira sobre o presente e o futuro, pouco
foi abordado. As altas abstenções indicam a exaustão da sociedade com os
partidos e com os políticos, que se insularam no poder e só aparecem nas
periferias nas campanhas eleitorais.
Os programas de
governo, incluindo os dos candidatos de esquerda, foram pobres. Não inovaram.
Não souberam articular os temas das transições ecológica, da transição digital
e da transição socioeconômica numa perspectiva inovadora em termos de serviços
públicos, de nova economia do bem comum, de oferta de plataformas de
desenvolvimento local articuladoras de conexões, empreendedorismo, serviços e
fortalecimento de soluções locais.
A candidatura de
Boulos foi a mais significativa do campo da esquerda. No primeiro turno foi uma
campanha extraviada, confusa, ingênua. Não projetou liderança e nem marca. Não
preparou o segundo turno. Boulos entrou no segundo turno praticamente derrotado.
Houve uma melhora no desempenho dele nos debates. Mas já era tarde. Em 2020,
Bruno Covas fez 59,68% de votos e Boulos 40,62%. Agora Nunes fez 59,35% e
Boulos 40,65%. Naquele ano de pandemia, a abstenção foi de 30,81%. Neste ano
foi de 31,4%. Tudo praticamente se repetiu. Isto indica que Boulos terá que
rever seu perfil de liderança e sua prática política.
A campanha pessolista
mostrou-se tributária de algumas propostas de Marçal, o que prova a tibieza do
programa do candidato. Sem entrar no juízo moral, a participação de Boulos na
live de Marçal mais serviu para lavar a imagem deste. Boulos justificou a participação
com o argumento de que dialoga com todos. Mas se deve dialogar com fascistas?
Parece um equívoco a tese de que se ameniza a imagem ao dialogar com um radical
de direita que não tem escrúpulos, cuja principal método consiste na mentira
sistemática.
As esquerdas estão
fora do tempo. Erram na forma e nos conteúdos e narrativas. Não dialogam com os
anseios e com as aflições do povo, com novo tipo de relações sociais e de
trabalho que vem se constituindo com a revolução digital. Propõem soluções
velhas para cidades que agridem a vida dos cidadãos, que destroem as formas de
vida coletivas.
Não percebem que o
enfrentamento do individualismo, da solidão, das incertezas e da desesperança
requer novas formas de articulação da cidadania, da articulação de espaços e de
proposição de novas modalidades de prestação de serviços públicos. Não conseguem
sair das armadilhas retóricas impostas pela direita. E não conseguem superar as
suas próprias armadilhas que se autoimpuseram por uma sucessão de discursos
equivocados.
Este vazio de
inovações e de soluções, essa ausência de acolhimento e de cuidado, esse
desprezo pelos afetos e pelos valores vêm aprisionando os políticos e os
partidos de esquerda no seu próprio insulamento em face da sociedade. As
esquerdas perderam as ruas e os territórios. Os sindicatos já não têm força. Os
partidos e os políticos de esquerda precisam se submeter ao crivo da crítica
pública através de um debate aberto, ouvindo e dialogando com a sociedade, para
que possam se reinventar.
Fonte: Reuters/Brasil
247
Nenhum comentário:
Postar um comentário