Tereza
Cruvinel: ‘Não é hora para auto-engano, mas não é caso para desespero...’
As
urnas falaram ontem mas não proclamaram vitoriosos absolutos ou derrotados sem
salvação. Nosso próprio sistema partidário não permite tanto. Mas, para a
esquerda e as forças aglutinadas pelo governo Lula, não vale tapar o sol com a
peneira e ignorar as vitorias colhidas pela direita e a extrema-direita.
E
muito menos ignorar o alerta contido na grande votação dada pelos paulistanos a
Pablo Marçal, ainda que seu último crime liquide com sua carreira,
Os
partidos conservadores, só com o resultado do primeiro turno, já comandarão a
maioria absoluta das prefeituras do país. Até agora, o maior vitorioso neste quesito foi o PSD,
com 888 prefeituras, seguido do MDB (863), do PP (752), do União Brasil (590) e
do PL (523).
Mas
também não é caso para desespero ou derrotismo no campo progressista: Boulos
chegou ao segundo turno em São Paulo, mesmo em desvantagem; o PT concorrerá em
outras quatro capitais no segundo turno e já garantiu 252, numa leve
recuperação das perdas acumuladas, que o fizeram cair de 638 em 2012 para 182
em 2020.
E,
mais importante, são aliados do presidente Lula os dois maiores vitoriosos
desta eleição: o prefeito reeleito de Recife, João Campos, do PSB, e o do Rio,
Eduardo Paes, do PSD, mas apoiado por PT, PC do B, PSB e PDT.
Por
ter derrotado o bolsonarismo em seu principal território, vencendo o candidato
por quem Bolsonaro mais se empenhou, a vitória de Paes ainda é mais expressiva.
Embora ele não seja de esquerda e tenha sido apoiado por grupos conservadores,
ele soube construir o que a conjuntura exige, a frente ampla antifascista. A
frente para derrotar o bolsonarismo em sua toca, onde tem as mais espúrias
alianças.
Voltando
aos números e ao que eles disseram, não pode a esquerda subestimar o fato de
que, nas 15 capitais onde haverá segundo turno, o PT só concorrerá em quatro, o
PSB em uma e o PDT em uma. Já o PL de Bolsonaro levou 9 candidatos ao segundo
turno, o União Brasil e o MDB, quatro cada um.
Aparentemente
este é um resultado catastrófico para o presidente da República e os partidos
que lhe dão sustentação. Mas, tirando-se o PL de Bolsonaro, os outros
vitoriosos são também apoiadores pragmáticos do governo Lula. E, nessa
condição, mais uma vez suas bancadas valeram-se dos recursos públicos, através
de emendas orçamentárias, par irrigar as bases eleitorais e reproduzir o mando
local, elegendo prefeitos de seus partidos, que os ajudarão a se reeleger em
2026. Esta é a engrenagem que está por detrás dos resultados de ontem.
A
rigor, as urnas falaram sobre mais do mesmo, sobre o que temos sido e
continuaremos sendo: um país estilhaçado, que segue dividido sem que um dos
lados tenha a hegemonia ou esteja subjugado. Em que o governo federal, com toda
a força que devia ter, não é associado a
um partido ou coalizão, mas a um cozido
de siglas pautadas por interesses e não por qualquer programa.
Eleição
municipal é uma coisa, presidencial é outra, dizem os políticos. Isso verdade
até certo ponto. Quando os partidos que sustentam o governo federal levam a
pior numa eleição municipal, alguma coisa está fora do lugar. Ou a população
está descontente com os resultados do governo ou o governo está se comunicando
muito mal com a população. Não estou falando de campanhas ou de marketing, mas
de se fazer entender mesmo.
Esta
é uma reflexão que Lula e seus aliados terão que fazer depois do segundo turno.
• Não há
Paris para todos. Por Moisés Mendes
Muitas
rotas de fuga estarão fechadas no segundo turno. Não há como ser neutro em São
Paulo e em outras capitais ou tentar se esconder em Paris, Sorocaba ou
Alegrete. Eis a realidade condensada diante de convictos e vacilantes em
relação ao desfecho das eleições em 27 de outubro:
1.
Bolsonaro é a figura que fica diante do maior dilema pós-primeiro turno.
Esnobou Ricardo Nunes desde o começo. Depois, quando o Datafolha colocou o
prefeito em melhor posição em setembro, correu, meio frouxo, para o lado do
esnobado. Quando as pesquisas mostraram que Marçal havia reagido, a partir da
base bolsonarista, saltou fora do apoio a Nunes mais uma vez. Sempre disse que
Nunes não era o seu preferido. Viu sua base raiz correr em direção a Marçal e
agora terá de fazer o que Tarcísio de Freitas pediu e ele desconsiderou, na
reta final do primeiro turno: que investisse no candidato do velho MDB para
manter um certo controle em São Paulo, sabendo que Nunes é muito mais da antiga
direita do que do bolsonarismo. O Bolsonaro que se vê obrigado a se agarrar a
Nunes sai avariado da eleição, principalmente com o vexame de Ramagem no Rio.
2.
Lula não foi escondido pelas esquerdas na campanha pela TV e pelas redes
sociais, mas se manteve numa distância analógica da eleição e do cenário mais
importante, o de São Paulo. Não foi participativo ao lado de Boulos. Mas agora
terá de correr riscos e se engajar à luta. Pode ficar marcado como derrotado,
principalmente se Bolsonaro se envolver na disputa? Ou paga pra ver como pode
ajudar ou será cobrado, com Boulos vencedor ou perdedor.
3.
Fora do campo da luta política, mas por essa contaminação, a Procuradoria-Geral
da República de Paulo Gonet terá de sair da hibernação e preparar o roteiro
pós-eleição, para abrir o período de denúncias contra Bolsonaro e seu entorno.
O Judiciário entra em recesso em 20 de dezembro, e aí para tudo, inclusive no
MP, e só volta em 6 de janeiro, cinco dias depois da posse dos eleitos. O
procurador calibrou o tempo do MP com o tempo da política até aqui, mas agora
não tem mais como adiar o que precisa ser feito. Nunca existirá Paris para
Gonet.
4.
Alexandre de Moraes, que nunca esteve com a cabeça em Paris, aguentou a carga
dos inquéritos que carrega nas costas, alguns há cinco anos, principalmente
aquele que começa com as fake news e tem tudo dentro, de civis a gente com
farda ou com pijama. O tempo para Moraes se esgota esse ano, porque 2025 já
terá o início da guerra para 2026. Toda a delinquência qualificada do fascismo
está em algum inquérito conduzido por Moraes, que enfrenta uma pergunta como
constrangimento: quem mais será alcançado além dos manés de 8 de janeiro?
5.
O povo, esse ente coletivo cada vez mais gasoso e indecifrável pela ciência
política, não tem como ir para a Paris de Ciro Gomes. Mas se protege do jeito
que dá nos seus biombos. O maior biombo numa eleição é o que acolhe os que se
abstêm, somados aos que votam em branco ou anulam ou voto. De cada cem
eleitores, 25 em média vão para essa Paris do distanciamento e das ausências,
pelos mais variados motivos, mas a maioria se esconde mesmo por gesto
deliberado contra a imposição do voto. Esse povo da negação se juntou ao povo
do desalento, correu para a extrema direita a partir de 2018, ensaiou a
reinvenção do bolsonarismo com Marçal, mas o que fez mesmo foi fortalecer a
velha direita nessa eleição. Esse povo é cada vez menos das esquerdas, na
maioria das cidades, das grandes aos vilarejos. E não há fuga para as esquerdas
que já não entendem o povo.
• Após
derrota em São Paulo, Marçal já mira nas eleições de 2026
Terceiro
colocado no primeiro turno das eleições municipais em São Paulo (SP), a apenas
80 mil votos do prefeito Ricardo Nunes (MDB) – que terminou em primeiro lugar
na rodada inicial –, o empresário e influenciador Pablo Marçal (PRTB)
classificou o desempenho como “extraordinário” e projetou alçar novos voos a
partir de 2026.
Em
conversa com jornalistas no fim da noite de domingo (6), algumas horas após o
fechamento das urnas, Marçal agradeceu pelos quase 1,8 milhão de votos na
capital paulista, mas disse que foi a primeira e última vez que ele disputa a
prefeitura de São Paulo. A partir de agora, o objetivo é um governo estadual
(não especificou em qual estado) ou a Presidência da República.
“São
Paulo perdeu a única oportunidade de me ver prefeito desta cidade. Meu coração
estava 100% entregue a isso, mas confesso que a vontade do povo nas urnas
prevalece. Eu sei de muitas pessoas que estão tentando construir algumas
teorias, mas eu respeito a vontade do povo. A gente chegou de última hora”,
afirmou o candidato derrotado.
Questionado
sobre seus planos na política, Marçal disse que espera permanecer na vida
pública pelos próximos 12 anos e afirmou que “2026 é logo ali”.
O
candidato do PRTB descartou concorrer a um cargo no Legislativo – foi candidato
a deputado federal em 2022, mas teve o registro indeferido pela Justiça
Eleitoral. Maçal não soube responder, no entanto, se pretende disputar o
governo de São Paulo, de outro estado (ele é natural de Goiás) ou a Presidência
da República.
“Para
mim, foi um resultado extraordinário [no primeiro turno em São Paulo]. Entramos
no dia 25 de maio nessa disputa, já estavam todos [os candidatos] fechados
desde outubro do ano passado. E, quando a gente entrou, a gente entrou com 5%
das intenções de voto. E conseguimos um resultado espetacular de 28,14%”,
observou.
“O
PSDB rejeita os extremos e a radicalização. Em São Paulo, o partido recomendará
o voto em Ricardo Nunes, do MDB, no segundo turno, contra o lulopetismo, por
uma questão de coerência ideológica”, diz a nota
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Apoio a Nunes
Na
entrevista coletiva, Pablo Marçal indicou que poderá apoiar a candidatura do
prefeito Ricardo Nunes, no segundo turno, contra Guilherme Boulos (PSOL),
apesar da série de ataques direcionados ao emedebista durante a campanha.
“Vai
depender do que ele [Nunes] falar sobre as propostas. Está nítido que ele pegou
muito pesado com a minha pessoa, foi muito injusto comigo. Eu entendo que é
coisa de marqueteiro isso. Eu não sou de carregar mágoa, de carregar raiva”,
minimizou Marçal.
Entre
as suas propostas que pretende ver incorporadas ao programa de governo de
Nunes, está o ensino de educação financeira nas escolas de São Paulo, além do
incentivo ao empreendedorismo.
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Idas e vindas
Inicialmente,
a assessoria da campanha de Marçal havia informado aos jornalistas que o
candidato do PRTB não faria nenhum pronunciamento, no domingo, sobre o
resultado das eleições.
Horas
depois, Marçal mudou de ideia e convocou uma entrevista coletiva para as 22
horas, em frente à sua residência.
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Personagem da eleição
Apesar
da derrota no primeiro turno, Pablo Marçal foi um dos principais personagens
das eleições de 2024. Desde que se colocou na disputa pela prefeitura da
capital, ele abalou as estruturas do establishment político, dividiu o
eleitorado bolsonarista na cidade e pautou o debate, sobretudo nas redes
sociais. Marçal foi o centro das atenções do início ao fim.
Na
largada da eleição em São Paulo, o candidato do PRTB pontuava entre 7% e 9% das
intenções de voto, e não demorou para que esses números crescessem
exponencialmente, catapultando o ex-coach às primeiras colocações nas
pesquisas, posição que manteve durante praticamente toda a campanha, dividindo
a ponta com o prefeito Ricardo Nunes (MDB) e o deputado federal Guilherme
Boulos (PSOL).
Sem
direito de participar do horário eleitoral no primeiro turno — seu partido não
tem nenhum representante no Congresso Nacional, exigência para que as
candidaturas tenham acesso ao tempo de TV –, Marçal sofreu um duro revés na
fase inicial da campanha. Em agosto, o candidato teve seus perfis oficiais
suspensos nas redes sociais pela Justiça Eleitoral, que acolheu uma ação
apresentada por Tabata Amaral (PSB). Foram autorizadas, no entanto, contas
“alternativas”.
A
adversária acusou o influenciador de remunerar usuários que publicassem
“cortes” de vídeos de Marçal nas redes, para que esses conteúdos virilizassem.
Antes do início da campanha, o candidato contava com 10 milhões de seguidores
apenas em seu perfil no Instagram.
O
comportamento agressivo de Pablo Marçal durante os debates foi outra marca do
primeiro turno da eleição paulistana. Desde o primeiro encontro na TV, o
candidato do PRTB não economizou nas ofensas aos adversários, aos quais se
referia por meio de apelidos jocosos: “Boules”, “Chatabata”, Dapena” e
“Bananinha” foram os mais utilizados contra Guilherme Boulos, Tabata Amaral,
José Luiz Datena e Ricardo Nunes.
Marçal
também protagonizou o episódio mais polêmico da campanha. No dia 15 de
setembro, em pleno debate da TV Cultura, Datena perdeu a paciência e deu uma
cadeirada no adversário, sendo expulso do programa. O empresário e
influenciador havia acusado o tucano de assediar sexualmente uma ex-funcionária
da TV Bandeirantes — o caso foi arquivado pelo Ministério Público.
Uma
semana depois, no dia 23, Nahuel Medina, cinegrafista e sócio de Marçal,
agrediu o marqueteiro de Ricardo Nunes, Duda Lima, com um soco no rosto, poucos
segundos depois da expulsão do candidato do PRTB do debate promovido pelo Grupo
Flow, por violar as regras do programa.
Com
sua postura disruptiva e um discurso “antissistema” que remonta à eleição
vitoriosa de Jair Bolsonaro em 2018, Pablo Marçal conquistou uma legião de fãs
– e de eleitores – que apoiam o ex-presidente, mas também acumulou detratores e
uma das maiores rejeições da eleição. O candidato do PRTB trocou farpas com o
vereador Carlos Bolsonaro (PL-RJ) e foi criticado pelo próprio Bolsonaro, que
declarou apoio a Nunes. Contudo, o “estrago” já estava feito e, como indicam as
pesquisas, grande parte do eleitorado bolsonarista de São Paulo “fez o M” nas
urnas.
As
polêmicas chegaram até o último dia da campanha, quando, na noite de
sexta-feira (4), Marçal divulgou em suas redes sociais um laudo comprovadamente
falso que diz que Boulos teria tido uma crise psicótica e ingressado em uma
clínica, onde teria testado positivo para cocaína em exame toxicológico.
Fonte:
Brasil 247/Infomoney
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