Quais são
os principais grupos que fazem resistência a Israel no Oriente Médio
O
mês de outubro de 2024 começa com Israel atacando militarmente quatro frentes, Líbano, Gaza, Síria e Iêmen. Nenhuma
dessas operações é autorizada pela ONU ou outros órgãos internacionais, embora Tel Aviv tenha o
aval que mais faça a diferença: o da maior potência mundial, os EUA.
Alguns
cientistas políticos acreditam que um constante estado de guerra é fundamental
para a manutenção de Benjamin Netanyahu no poder. O premiê israelense já era duramente criticado dentro e fora de Israel, mesmo antes dos ataques do Hamas
em 7 de outubro do ano passado, por planejar desestabilizar o equilíbrio entre
os poderes ao tentar subjulgar a Suprema Corte ao Legislativo.
Já
os enormes protestos contra ele do último ano foram motivados pelo fracasso em recuperar
reféns feitos pelo Hamas. Esses analistas acreditam que, passada a união
nacional gerada pelo combate a inimigos externos, Netanyahu perderá sustentação
e corre risco, inclusive, de ser preso.
Militarmente
o país é a única potência nuclear da região e investe mais que o dobro
anualmente (cerca de US$ 19 bilhões ou R$ 103 bi) no setor do que o Irã, por
exemplo (US$ 7 bilhões ou R$ 38 bi), mas o que torna o país incomparável
regionalmente é sua enorme vantagem tecnológica (com recursos como o Domo de Ferro, que repele ataques
balísticos e os mísseis Arrow) e sua aliança com
os EUA e demais potencias ocidentais.
Mesmo
assim, movimentos armados organizam resistência contra o que consideram ser a
"ocupação sionista" no território, ocupando o lugar de defesa que não
são exercidos pelas forças armadas convencionais. Entenda abaixo quem são e
como atuam alguns desses movimentos:
·
Hezbollah
Criado
no Líbano para resistir à invasão israelense de 1982 (Tel Aviv invadiu o
vizinho para combater a Organização para a Liberação da Palestina, OLP, que
tinha sede no país) o grupo é um misto de partido político, organização militar
e movimento religioso xiita. Aliado e apoiado financeiramente pelo também xiita
Irã, o Hezbollah já enfrentou e causou perdas significativas a Israel durante o
conflito de 33 dias em 2006.
Calcula-se
que o Hezbollah tenha entre 40 mil e 100 mil soldados, o que o torna a maior
organização guerrilheira do mundo. Considerado um grupo terrorista pelos EUA e
a União Europeia, o Hezbollah não tem apoio da maioria da população libanesa,
segundo pesquisas (em especial após o ataque ao porto de Beirute em 2020,
atentando não solucionado, mas que boa parte dos libaneses acredita ter sido
obra do grupo), mas conta com forte apoio político da Síria e financeiro do
Irã. Apesar disso, é a maior força militar do Líbano, país que conta com um
exército fraco.
Desde
o século passado o Hezbollah teve como objetivo declarado a destruição de
Israel e vem lançando foguetes desde o sul do Líbano (seu reduto) em direção ao
norte israelense com constância desde 7 de outubro, em solidariedade ao
genocído sofrido pelos palestinos e seu aliado Hamas na Faixa de Gaza. Esses
foguetes levaram milhares de israelenses a deixarem suas casas na região e os
atuais ataques de Israel tem como justificativa alegada enfraquecer o grupo
para permitir a volta desses cidadãos.
O
recente assassinato por Israel do líder do grupo, Hassam Nasrallah, foi o
estopim da crise atual, por gerar uma resposta balística do Irã e precipitar a
invasão israelense do Líbano
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Hamas
Surgido
nos anos 1980 com ligações com o movimento egípcio Irmandade Muçulmana, desde o
início se posicionou como um dos mais conservadores grupos palestinos,
rejeitando a existência de Israel (posição abrandada em 2018, quando indicou
aceitar a solução de dois estados e retificando ser antisionista e não
antissemita), usando homens-bomba, rejeitando o Acordo de Oslo e abandonar a
luta armada.
Com
sede na Faixa de Gaza, o Hamas surpreendeu a comunidade internacional ao vencer
- contra todas as estimativas - as primeiras e únicas eleições gerais
palestinas, em 2006. Apesar de vitória ter sido considerada legítima, ela não
foi reconhecida pelos EUA e União Europeia, que aprovaram o bloqueio do
território palestino.
No
ano seguinte, entrou em guerra civil contra o Fatah, levando a divisão dos
palestinos, com o Fatah governando a Cisjordânia e o Hamas, Gaza. Desde então,
além do bloqueio que asfixia os mais de 2 milhões de palestinos em Gaza, o
grupo sofre com campanhas militares regulares de Israel, como em 2008-09, 2012,
2014, 2021 e a atual, desde 2023.
Esta
última foi precipitada pela invasão do Hamas em território israelense em 7 de
outubro, na operação que causou o maior número de baixas da história de Israel,
cerca de 1,2 mil e fazendo mais de 200 reféns, muitos deles já declarados
mortos.
É
difícil precisar o número de combatentes da ala militar do grupo, as Brigadas
de Al-Qassam, já que o Hamas aposta em guerra assimétrica, ou táticas de
guerrilha urbana, com o uso de uma enorme rede de túneis para fuga e chegada de
munições. Apesar de ser um grupo sunita, é também aliado do xiita Hezbollah e
seu líder, Ismail Haniyeh, foi morto por Israel na capital iraniana, Teerã, em
fins de julho.
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Fatah
Principal
grupo palestino, foi criado pelo maior líder do povo, Yasser Arafat, em fins da
década de 1950. Secular e laico, tem postura mais branda em relação a Israel,
mas vem sofrendo com as ilegalidades cometidas por autoridades israelenses na
Cisjordânia - território que governa desde a guerra civil com o Hamas em 2007 -
como os constantes confiscos de terra.
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Houthis
Grupo
xiita ligado ao Hezbollah que atua no Iêmen, o paíse mais pobre do Oriente
Médio. Surgido no final do século passado, participou ao lado da Al Qaeda dos
levantes da chamada "Primavera árabe" que, no Iêmen, derrubaram o
governo de Abdrabbuh Mansur Hadi, acusado de subserviência à Arábia Saudita e
ao Ocidente.
Desde
2015, forças sauditas e de outros países do norte africano e árabes combatem o
grupo, que controla boa parte do território do Iêmen, incluindo a capital,
Sanaa.
Guerrilheiros
houthis declararam solidariedade aos palestinos de Gaza em 2023 e vêm atacando
embarcações no Mar Vermelho rumo ao Canal de Suez, local estratégico onde passa
cerca de 70% do comércio mundial. A atuação do grupo vem encarecendo esse
transporte, prejudicando interesses dos EUA, maior aliado de Israel.
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Exército do Líbano
revida ataque israelense ao país
O
exército libanês respondeu a um ataque das forças israelenses após a morte de
um soldado libanês, marcando a primeira vez que a tropa oficial do Líbano
participa diretamente dos combates contra Israel. O confronto eleva a tensão na
região, onde até o momento o Hezbollah, grupo armado xiita financiado pelo Irã,
vinha liderando as ações militares contra Israel, mantendo-se separado das
Forças Armadas libanesas.
Segundo
o jornal O Estado de S. Paulo, através de uma publicação na rede social X, antigo Twitter, os
militares libaneses confirmaram que retaliaram após uma instalação militar na
vila fronteiriça de Bint Jbeil ter sido alvo de Israel.
No
entanto, ainda não está claro se esse incidente resultará em uma escalada dos
combates entre Israel e o exército libanês. O governo do Líbano tem reiterado
sua posição de neutralidade no conflito e pedido o fim das hostilidades entre
Hezbollah e Israel, declarando não querer guerra.
O
Hezbollah, que controla o sul do Líbano, posiciona suas forças, armas e mísseis
na região, agindo de forma independente do exército libanês. Em resposta às
alegações de que suas tropas teriam recuado antes da invasão terrestre
israelense na última segunda-feira (30), o exército do Líbano negou a retirada,
reforçando que suas forças mantêm posição na fronteira.
Nesta
quinta-feira (3), Israel emitiu ordens de evacuação para residentes de
vilarejos e cidades no sul do Líbano, ao norte da fronteira. A região está
localizada dentro de uma "zona tampão" declarada pelas Nações Unidas
após a guerra de 2006, sinalizando uma possível ampliação da incursão
israelense no território libanês, que até então estava limitada às áreas
fronteiriças.
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'Gostemos ou não do
Hezbollah, somos todos alvos de Israel', diz brasileira no Líbano
“A
sensação é de que ninguém está seguro, o alvo é o Líbano e a população
libanesa”, afirma Leila Salim Leal, que acompanha os bombardeios de Israel
contra o país do apartamento onde vive no centro de Beirute, capital do país.
O bombardeio de Israel na região na segunda-feira (30), o primeiro desde a
invasão ao país realizada em 2006, aconteceu a cerca de 3 km de sua casa.
“Eu
nunca tinha passado por nada parecido e a situação se agrava a cada dia. O que a
gente está vendo é uma carnificina”, disse ao Brasil de Fato nesta
terça-feira.
A
escalada militar de Israel contra o Líbano nas últimas semanas evidenciou,
considera, que o objetivo dos ataques não é atingir o Hezbollah. “Essa alegação
reproduz o mesmo discurso cínico e cruel que vem sendo implementado desde o ano
passado no genocídio [em Gaza]: de que seria uma tentativa de defesa
direcionada ao Hamas. Isso não é verdade, está claro para todos nós que,
independente se concordam ou não com o Hezbollah, toda a população do Líbano é
alvo nesse momento.”
Jornalista
e pesquisadora em comunicação política, Leal tem família de origem libanesa, e
vive no Líbano desde 2023, onde se casou com um cidadão libanês. Quando Israel
começou os ataques a distância por meio de pagers e walkie talkies contra integrantes
do Hezbollah, ela estava a caminho do aeroporto, junto com seu marido, para
resolver uma pendência em relação ao visto de residência no país.
“De
repente as ruas começaram a ficar muito tensas, um engarrafamento muito grande,
ambulância pra todo lado, algumas ruas fechadas”, conta. “Naquele momento a
gente desistiu de ir pro aeroporto, tentou voltar pra casa, mas havia um
trânsito horrível, uma sensação horrível porque as pessoas começaram a explodir
em todos os lugares, nas ruas, em supermercado, em hospitais, em escolas,
dentro de casa. Parecia que qualquer pessoa podia explodir à sua volta a
qualquer momento, foram momentos muito tensos, de muito pânico.”
Desde
o início da escalada israelese contra o país, ela aponta que aumentaram as
quebras de barreira do som por parte dos aviões que invadem o espaço aéreo do
Líbano em uma velocidade que provoca um estrondo, semelhante a uma explosão.
“No
momento da explosão a gente não sabe se é só uma explosão sonora, que já é
muito grave, ou se é realmente um bombardeio. Da primeira vez foram dois
estrondos muito altos, eu estava em casa e aí tremeu tudo: janela, porta, é uma
situação de muito medo. Eu fui pro chão, não sabia se era uma explosão
real, uma bomba ou não, depois de um tempo não vi fumaça nem nada,
entendi que era uma quebra de barreira de som.”
Na
última sexta-feira (28) quando ouviu um estrondo próximo de sua casa, ela não
teve dúvida: tratava-se de uma explosão.
“Foram
estrondos muito altos, era um barulho diferente. Tremeu tudo também, eu tentei
me proteger, proteger minha cabeça, ficar longe dos vidros, veio mais um outro
estrondo muito forte. Começaram a chegar as notícias de que tinha sido essa
explosão. É uma sensação de vulnerabilidade terrível.”
Desde
segunda-feira (30), ela relata que escuta com frequência o barulho de drones.
“Estão sobrevoando Beirute com drones permanentemente, da última semana pra cá
quase o tempo todo, é uma guerra psicológica e é também uma forma também de
vigilância, a gente sente”.
O
Exército israelense confirmou nesta terça-feira que suas tropas iniciaram "ataques
terrestres seletivos" no sul do
Líbano. Um militar de alta patente israelense afirmou que os ataques
tiveram alcance limitado, mas fontes do Hezbollah disseram à AFP que "não
foi observada nenhuma incursão de forças inimigas israelenses em território
libanês", mas não foi possível confirmar essas afirmações.
Os
militares israelenses anunciaram que mobilizaram mais quatro brigadas para
serem enviadas à fronteira com o Líbano.
O
secretário-geral da ONU, António Guterres, pediu cessar-fogo
"imediato" e destacou que "a soberania e a integridade
territorial do Líbano devem ser respeitadas", segundo uma declaração do
seu porta-voz, Stéphane Dujarric.
Também
nesta terça-feira, Israel bombardeou o sul de Beirute, reduto do Hezbollah, os
arredores de Damasco, na Síria, e a Faixa de Gaza. A Agência Nacional de
Notícias do Líbano (ANI) disse que os ataques aéreos israelenses atingiram
subúrbios ao sul de Beirute, enquanto Israel anunciou um ataque à capital
libanesa.
O
Hezbollah informou que disparou foguetes contra a principal base de
inteligência militar israelense, Glilot, e a base aérea de Sde Dov, ambas perto
de Tel Aviv, após atacar soldados israelenses com artilharia e disparar
foguetes contra Avivim e Metula, norte de Israel. Sirenes de ataque aéreo
soaram no centro de Israel.
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Jornal francês teme
'guerra mundial' por falta de racionalidade de 'líderes inconsequentes'
A
expressão "guerra total" vem sendo utilizada por cientistas políticos para
designar um confronto direto entre os grupos paramilitares e as Forças Armadas
dos países envolvidos no conflito israelo-palestino, associados aos seus
respectivos aliados externos.
Em
seu editorial, o Libération afirma que o
"todo-poderoso" e "sempre impune" primeiro-ministro
israelense, Benjamin Netanyahu, estava convencido de que o Irã não
retaliaria a morte do líder do Hezbollah, Hassan Nasrallah, grande aliado de Teerã. O
regime dos aiatolás já havia adotado o mesmo comportamento em julho, após a
eliminação do líder político do Hamas, Ismal Haniyeh, morto em uma operação israelense em Teerã.
Mas,
segundo o editorialista, desta vez, a humilhação foi muito grande para o Irã.
"Não responder significaria se dobrar diante do poder israelense",
avalia. A resposta de Israel não demorou a chegar, "alimentando uma
engrenagem louca de líderes inconsequentes, ameaçando a região de uma guerra
total que pode se tornar mundial, caso todos os dirigentes não recuperem a
razão rapidamente", afirma o texto.
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Maioria dos mísseis foi interceptada
O
ataque iraniano também figura na capa do jornal Le Figaro:
"Uma chuva de mísseis sobre as maiores cidades de Israel", diz o
diário. Os projetéis visaram Tel Aviv, Jerusalém, Bersebá (sul), as colônias
da Cisjordânia, enumera o texto, lembrando que a maioria dos cerca de 200
projéteis foram interceptados pelo célebre "Domo de Ferro", o sistema antimísseis israelense.
"Uma
noite de horror em Israel", afirma o título de uma matéria do
jornal Le Parisien. "Bastam 20 minutos para mergulhar um país
inteiro no medo", afirma o diário. Os enviados especiais do jornal
a Tel Aviv destacam que às 19h32 do horário local, centenas de
sirenes soaram e o país inteiro se refugiou em abrigos durante pelo menos uma
hora. Ao menos dois mísseis tocaram terra, ferindo dois israelenses e matando
um palestino na Cisjordânia, destaca o Le Parisien.
O Le
Monde indica que o Irã utilizou,
pela primeira vez, mísseis hipersônicos, "que podem planar e ser
manobrados, o que torna suas trajetórias dificilmente previsíveis" para
serem abatidos pelos sistemas de defesa antiaérea. O jornal também destaca
que Teerã ameaça repetir a agressão, "de forma mais intensa e
contra todas as estruturas israelenses", caso Israel resolva retaliar. O
anúncio foi feito na manhã desta quarta-feira pelo chefe das Forças Armadas
iranianas, Mohammad Bagheri, que classificou o governo israelense de
"louco".
Fonte:
Brasil de Fato/Brasil 247/RFI
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