Jair de
Souza: Genocídio na Palestina - Jesus, a religião e o uso da razão
Entre
os que militam em política no campo popular de esquerda, sempre esteve presente
a questão do papel da religião nos processos de transformação social.
Por
isso, ao abordar este tema no presente texto, não estamos fazendo nada que já
não tenha sido feito no passado.
Entretanto,
o que deveras esperamos que venha a ser uma novidade é a maneira como
pretendemos analisar e sobrepesar os aspectos mais relevantes do sentimento
religioso em contextos de lutas em favor das causas do povo trabalhador.
O
primeiro ponto que convém que deixemos evidente é que toda e qualquer crença
religiosa só deveria ser aceita como eticamente válida se seu objetivo básico
for a busca do bem para o conjunto da humanidade.
Isto
quer dizer que nenhuma religião que se dedique a pregar e defender pensamentos
ou ações que atentem contra a ética do bem geral mereceria ser tomada como
modelo a ser emanado e seguido em sua plenitude, sem contestação.
Partimos
do princípio de que a convicção na existência ou não existência de um ser
supremo, criador e regente de tudo e de todos, a quem chamaríamos de Deus, não
se constitui no ponto mais relevante, até mesmo para o próprio ser supremo em
quem se crê.
Explicando:
para aquele que incorporaria todas as qualidades associadas à bondade, o que de
fato deveria ser a essência de sua preocupação só poderia ser o desejo e a
determinação de garantir que as ações e os pensamentos dos humanos se
desenvolvessem com o propósito de fazer prevalecer seus postulados, que não
poderiam ser outros que os da prevalência da justiça, da bondade e da
solidariedade entre todos, sem discriminações arbitrárias.
Em
vista disto, é condição sine qua non que esse ser supremo ao
qual estamos comprometidos a seguir seja fundamentalmente bom e justo.
Em
consequência, isto implica que seria incompatível que ele tivesse como sua
preocupação central o propósito de garantir a devoção total e exclusiva a sua
própria figura, e sim almejar um apego real de todos às causas por ele
simbolizadas.
Em
outras palavras, por ser justo e bondoso, ele nunca se deixaria levar por um
sentimento tão egoísta e mesquinho a ponto de considerar que nada teria
validade pelo mero fato de não haver sido executado em seu nome, ou seja, toda
prática do bem estaria sempre intrinsecamente associada a ele.
Também,
por outro lado, seria lógico entender que ele não toleraria nenhuma maldade,
por mais que seu praticante invocasse seu nome ao cometê-la.
Assim,
diante da hipótese de que tenhamos de nos submeter a um juízo final após nossa
morte física, não nos parece fazer nenhum sentido nutrirmos receio de que a
crença ou não crença na existência de Deus venha a ter algum peso significativo
em nossa eventual condenação ou absolvição.
Os
motivos para esta convicção são muito fáceis de entender. É que não seria
eticamente aceitável que alguém que em vida tenha se dedicado a praticar o bem
não seja reconhecido como tendo de fato dado provas de ter sido fiel aos
desígnios do supremo ser da bondade.
A
maior demonstração de concordância com este Deus da bondade só poderia ser a
prática efetiva do bem.
Sendo
assim, entendemos que nossa preocupação prioritária deveria sempre ser a de
fazer o bem, e não em nome de quem isso esteja sendo feito. É neste contexto
que Jesus adquire enorme relevância.
E
isso se deve a que temos em sua figura um dos exemplos mais cristalinos de que
é possível manter sentimentos religiosos sinceros sem precisar violentar nosso
senso da razão e da ética.
Em
todas as instâncias constantes nos relatos de sua vida, Jesus sempre atuou em
plena sintonia com sua crença religiosa e aquilo que sua capacidade de
raciocinar coerentemente lhe orientava.
Por
isso, ele não hesitou em ressignificar várias das passagens do Velho Testamento
quando sua razão lhe deixava patente que não seria correto que os escritos
fossem seguidos acriticamente ao pé da letra em quaisquer contextos.
Dentre
os vários exemplos da ressignificação feita por Jesus a pontos até então
considerados como verdades absolutas pelos seguidores do judaísmo podemos citar
a afirmação de que os judeus eram o povo escolhido de Deus, ao qual uma
determinada terra estaria reservada com exclusividade.
Apelando
para o uso de sua razão e coerência, Jesus jamais poderia concordar com a ideia
de que Deus fosse tão racista e sem sentimento a ponto de atribuir valor
absoluto a uma questão fortuita, como a de nascer em um ou outro grupo étnico
ou nacional, para merecer privilégios não concedidos a todos.
Por
isso, ele logo se deu conta da imensa injustiça que estava embutida naquela
interpretação do Antigo Testamento.
Aceitá-la
como válida seria admitir que Deus pudesse ser um discriminador racial tão
perverso e insensível, assim como injusto.
Exercendo
sua grandiosa capacidade de raciocinar e ponderar, Jesus concluiu que aquilo
nunca poderia ter vindo mesmo de Deus.
Seria
tão somente mais uma das deturpações que os humanos costumam praticar e
atribuir a Deus, como forma de eliminar ou suavizar as resistências de seus
adversários diante de suas espertezas.
Deve
ter sido devido a isto que Jesus se empenhou em elucidar a questão com toda
clareza. Assim, ele nos esclareceu que a pertinência ao povo de Deus não se
derivaria de nenhum privilégio em função de ser originário de um ou outro grupo
humano.
O
fator determinante para fazer parte deste povo escolhido dependeria,
primeiramente, do engajamento de cada um de nós na luta pela construção de um
novo mundo, mais justo e solidário.
Em
outras palavras, para Jesus, o povo escolhido se formaria a partir de nossa
própria escolha em seguir o caminho do bem por ele traçado, e não por termos
nascido neste ou naquele grupo.
O
certo é que Jesus nunca se deixou levar por aquela compreensão de que se algo
está escrito nos textos ditos sagrados, ele deve ser aceito e defendido como
verdade absoluta e eterna, sem nenhuma contestação.
Esta
inspiração no exemplo do comportamento de Jesus é de enorme valor nos tempos
atuais, em que temos inúmeros casos de atrocidades sendo praticadas com a
anuência de muita gente que se diz cristã com base na argumentação de que se
está respeitando o que consta nos textos bíblicos.
O
caso do monstruoso genocídio em curso contra o povo palestino é um dos mais
abomináveis exemplos que podemos citar de interpretações contrárias ao espírito
de Jesus.
É
muito doloroso encontrar pessoas que usam o nome de Jesus para justificar os
crimes horrendos que estão sendo cometidos pelas forças militares do sionista
Estado de Israel contra o humilde e desamparado povo palestino.
Nenhum
cristão de verdade pode dar seu aval a tanta crueldade e perversidade.
Nestes
momentos de muito sofrimento e dor, com tantas crianças sendo massacradas por
um dos exércitos mais bem armados do mundo, é imperativo que o nome de Jesus
sirva para ajudar aqueles que de verdade precisam de seu apoio justo e
misericordioso.
Se
você é um seguidor sincero de Jesus, é importante ter sempre em mente que Jesus
representa acima de tudo o valor da bondade, da justiça e da solidariedade.
Não
permita que oportunistas caçadores de fortuna continuem recorrendo ao uso de
seu nome para apoiar crimes dignos do senhor das trevas, já que eles nada têm a
ver com Deus, e muito menos com Jesus.
¨
A humanidade e o
horror da “guerra” sionista, Por Roberto Amaral
Elemento
essencial do conceito de guerra é o confronto de exércitos, assim designadas as
fileiras de profissionais adestrados para o ofício de enfrentar e matar quem
seu comandante indica como inimigo a eliminar, ou território a conquistar ou
preservar. O inimigo da vez pode ter sido um aliado de ontem, um antigo
vizinho, ou mesmo um irmão de sangue. Como o inimigo de ontem pode tornar-se o
grande aliado estratégico de hoje: o Japão da II Guerra Mundial, inimigo mortal
abatido com a violência da bomba atômica, é hoje um dos principais aliados
estratégicos dos EUA.
Os
judeus, como os árabes, mais do que outros povos, conhecem essa danação. No
Oriente Médio presente, porém, embora haja judeus perseguidores e árabes
perseguidos, não há guerra, eis que não há confronto de tropas, não há embate
entre guerreiros, senão o puro e simples massacre de populações civis,
indefesas e por definição desarmadas, na sua maioria gente idosa, mulheres e
crianças, contra as quais ruge e vomita bombas um exército luciferino comandado
pelo ódio; um exército todavia moderno, excepcionalmente equipado, armado até
os dentes pelo que há de mais mortífero na tecnologia fria da indústria da
morte.
A
luta entre tropas militares e civis desarmados não é guerra, mas, simplesmente
um massacre sem sursis, pois sua essência é mistura de vindita e covardia. Mais
ainda quando os alvos preferidos são centros médicos, escolas e campos de
refugiados. Segundo as estatísticas possíveis nas circunstâncias, já morreram
mais de 40 mil palestinos desde o primeiro ataque israelense a Gaza que foi
reduzida à condição de terra-arrasada, um monturo de nada. Conta-se em torno de
1,7 milhão o número de desabrigados.
Na
retaguarda de Israel, hoje um fora-da-lei, pois nenhuma lei ou código, ou
tradição de convivência internacional respeita, está o mais poderoso Estado
beligerante já conhecido pela humanidade, o mais longevo dos impérios (militar,
econômico, tecnológico e cultural) registrados pela idade moderna: os EUA. Um
país, aliás, tanto quanto o Estado israelense, muito afeito aos massacres de
civis e à rapina de terras estrangeiras: os mexicanos no final do século XIX
perderam para seu vizinho algo como 2,3 milhões de km², ou seja, 55% de seu
território. O desprezo pela vida humana conhece seu extremo no final da II
Guerra Mundial, quando duas bombas atômicas massacraram as populações civis de
Hiroshima e Nagasaki, no Japão.
Na
“guerra da Coreia”, invadida pelos EUA com o respaldo da ONU em 1950, morreram
2 milhões de civis. Por fim, mas não fechando o ciclo que compreende ainda um
sem-número de guerras de caráter colonialista espalhadas pelos quatro cantos da
Terra – como as invasões do Afeganistão e do Iraque, a guerra do Vietnã é o
grande destaque da história contemporânea. A agressão dos EUA, iniciada em 1965
e só encerrada em 1975 com a queda de Saigon, custou as vidas de 2 milhões de
civis. O império, que desesperadamente luta pela hegemonia mundial que conheceu
entre o fim da Guerra Fria e a emergência da China, encontra no Estado-tampão
de Israel o aliado perfeito.
Na
verdade, suas políticas de guerra se completam, desempenhando, cada uma segundo
suas características e circunstâncias, papel estratégico na atual política de
guerra do dito Ocidente: 1) a guarda do Oriente Médio por Israel; 2) a guarda
da Europa (governada majoritariamente por partidos protofascistas) e a
contenção da Rússia, pela OTAN; 3) o Japão, virtual porta-aviões do Pentágono
posto a vigiar a China, e, por fim, 4) os próprios EUA, policiando o mundo, com
suas cerca de 800 bases militares em mais de 70 países.
Não
é obra do acaso que desde 1947, quando, para existir, ocupou parte da
Palestina, o Estado de Israel tenha tomado para si a Cisjordânia, o Sinai e as
colinas de Golã, e ainda administra ou controla cerca de 85% dos territórios
originários da Palestina. Em nome de sua “autodefesa” Israel destruiu a
possibilidade do Estado palestino – a contraparte da ONU para o Estado judeu.
Atendendo a interesses próprios de Estado de alma colonialista, de que decorrem
o belicismo e a fome de territórios (um dos pontos em que Israel e EUA se
encontram com a Alemanha de Hitler, obcecada com seu Lebensraum), o Estado
sionista mata civis em Gaza, na Cisjordânia, no Líbano, no Iêmen, voltou a
matar na Síria e voltará a matar no Irã e onde mais se fizer necessário à
geopolítica da destruição. Em quase todos os eventos agiu como procurador do
imperialismo.
A
OTAN não é peça ausente nesta arquitetura. Sob o comando estratégico e os
recursos militares, táticos e financeiros dos EUA, cumpre papel crucial no
conflito Ucrânia-Rússia, que traz a Europa e uma grande potência nuclear para o
epicentro da crise. Ao mesmo passo em que garante um enclave bélico nas
fronteiras da antiga república soviética, a presença da OTAN logra paralisar em
seu território aquele que já foi considerado o maior exército do mundo, e que
hoje guarda o paiol do maior estoque de ogivas nucleares.
Esses
conflitos são cruciais para o Pentágono, pois constituem peças decisivas no
projeto (de vida ou de morte) estadunidense: recuperar a hegemonia mundial,
mesmo que ao preço de um conflito que, hoje, para o bem e para o mal, sabemos
como começa e já podemos prever como terminará. Podemos, mesmo, anunciar como
será seu sucessor: “Eu não sei com quais armas a Terceira Guerra Mundial será
lutada, mas a Quarta Guerra Mundial será travada com paus e pedras” (Albert
Einstein. Liberal Judaism, 1949).
A
lenta decadência do império ainda cobrará sacrifícios impensáveis à humanidade.
Roma, desta feita, se prepara para a guerra. O confronto de nossos dias tem na
sua ante sala a explosão do Oriente Médio, projeto que remonta aos idos do
imperialismo britânico; o atual teatro de operações deve estender-se em pouco
tempo, e toda guerra, antes da paz, é a mãe de outra, como a II Guerra Mundial
foi o desdobramento inevitável do conflito desencadeado em 1914.
Por
isso, o conflito Rússia-Ucrânia jamais se circunscreveu aos dois países, e logo
se transformou no embate EUA-OTAN versus Rússia, com os olhos dos EUA voltados
para a ameaça real: a emergência de uma Eurásia liderada por uma China
industrializada, em condições de pleitear o cetro da hegemonia mundial.
A
imprensa brasileira, perdidamente parcial, porta-voz que é da Hasbará (a
máquina de propaganda do enclave sionista), noticia a invasão do Líbano como se
estivéssemos diante de uma gincana de fim de semana. Não se dá ao dever de
informar que se trata de mais uma agressão ao território de um país soberano,
como foi, na sequência, a incursão dos bombardeiros na Síria, violando as
regras da convivência internacional e a Carta das Nações Unidas, que não se
peja em desrespeitar, como desrespeita a Corte Internacional de Justiça.
O
desafio de Israel à chamada comunidade internacional se expressa, ainda, pelo
desplante com que seu chanceler declarou persona non grata no Estado ninguém
menos que o secretário-geral da ONU.
O
objeto da violência sionista, armada e financiada pelos EUA, não é a legítima
defesa de um Estado ameaçado, posto que sabidamente o Estado-tampão de Israel
não o é; ameaçada, e, ademais, ocupada, é a Cisjordânia, é parte de Jerusalém e
para tal tragédia parece condenado o Líbano.
Sob
o terror estadunidense-israelense, Gaza foi reduzida a escombros; e desde o
primeiro dia da agressão sionista seu povo, indefeso, à míngua da solidariedade
internacional, é exterminado a sangue-frio: fuzilado, bombardeado, mutilado,
deixado à míngua de assistência médica, privado de comida, de medicamentos, de
eletricidade, de água. A fúria luciferina não se detém diante de hospitais e
escolas. Seus mortos são civis que não oferecem combate ao agressor, nem sequer
esboçam o legítimo direito à resistência (anatemizado como terrorismo pela
imprensa ocidental, macaqueada pela brasileira).
Matar
o desarmado é covardia, mesmo segundo os códigos de honra dos marginais. Matar
de tocaia, sem dar ao outro o direito de defesa é, ademais, crime hediondo. Mas
o sionismo não está só; sabidamente dispõe de apoio bélico, político,
logístico, econômico, estratégico e tecnológico dos EUA, de quem recebe
respaldo absoluto, diante uma comunidade internacional cúmplice e de uma ONU
sem qualquer serventia, que, quando muito, protesta nas redes sociais. Ao seu
lado, a União Europeia e a direita hidrófoba de todos os quadrantes. Esta de
hoje, é filha do nazifascismo que nos legou a II Guerra Mundial, com seu
inventário de miséria que chega aos nossos dias.
A
Europa – agora com a significativa adesão da Áustria – começa a fechar o
círculo do avanço da extrema-direita. A ascensão do protofascismo e o ímpeto
das políticas de guerra não podem ser vistos como fatos isolados. Desse veneno
a humanidade já provou. Se a peça de hoje, cujo enredo também detestamos, não é
a mesma de ontem, e nunca é, o diferencial de hoje é que alguns atores trocaram
de papel. Os alemães também invadiram seus vizinhos porque alegadamente
precisavam de “espaço vital”, isto é, mais terras e mais recursos para levar a
cabo o projeto do III Reich: assim, foram avançando, invadindo, anexando:
Renânia, Áustria, Tchecoslováquia, Polônia... Hoje, Israel tenta justificar seu
expansionismo em nome da necessidade de mais território para assegurar-se de
sua defesa.
Não
há guerra no Oriente Médio. Mas naquele barril de pólvora chafurdado pelos
grandes impérios coloniais, hoje protetorados político-militares dos EUA, pode
estar sendo gestado o próximo grande conflito, certamente universal, porque já
envolve a economia mundial, e tem presença efetiva em todos os continentes,
seja na versão clássica, seja na versão conhecida como guerra híbrida, que já
nos atinge.
Fonte:
Viomundo/Brasil 247
Nenhum comentário:
Postar um comentário