quarta-feira, 9 de outubro de 2024

Mario Sabino: O PT pode definhar como o PSDB. Ambos pagam para morrer

O PT pode ter o mesmo destino do PSDB, o seu maior adversário até 2014, e definhar a ponto de se tornar irrelevante?

A resposta é sim. O PT é o PSDB amanhã. Está certo que, nestas eleições municipais, o partido saltou de 183 prefeituras para 251. Mas isso é muito pouco para o partido que está na presidência da República. Nas eleições de 2012, os petistas amealharam 651. Ou seja, está muito aquém do seu período de ouro.

No segundo turno, o PT disputará 13 prefeituras: em 4 capitais e 9 cidades com mais de 200 mil habitantes, patamar a partir do qual a lei obriga a que haja outra votação se nenhum candidato tiver obtido mais de 50% das preferências.

Para não dizer que a conta embute má vontade, São Paulo seria a quinta capital, já que Guilherme Boulos, do PSOL, linha auxiliar nacional do PT, passou suado ao segundo turno. Guilherme Boulos está para Lula, assim como o Hezbollah está para o Irã: é candidato por procuração do chefão petista, tanto na alegria da vitória, como na tristeza da derrota.

O PSDB foi alvejado pela Lava Jato, mas a sua dêbacle se tornou visível desde que o partido se perdeu em disputas fratricidas pelo trono vacante deixado por Fernando Henrique Cardoso, deu espaço a oportunistas como João Doria e perdeu a identidade social-democrata, sem migrar com convicção para a centro-direita, espectro no qual se situa hoje a maioria dos brasileiros, na sua espessa névoa mental.

O PT vinha contornando o seu anacronismo ideológico por meio da fantasia (alegremente engolida pelos ingênuos) de que detinha o monopólio da ética, pela adoção do assistencialismo eleitoreiro massificado e, principalmente, graças à popularidade de Lula, com o seu carisma de amigo de bar.

O assistencialismo eleitoreiro de massa deixou de ser prerrogativa petista e a Lava Jato queimou a fantasia ética do partido, além de abalroar a popularidade de Lula. Popularidade ferida também pelo surgimento do rival Jair Bolsonaro, populista como ele, mas de sinal trocado.

Lula venceu Jair Bolsonaro em 2024, mas por margem insignificante de votos, apesar de todos os desvarios cometidos pelo adversário durante o mandato presidencial, e com o sistema jogando todo o seu peso a favor do chefão petista, que foi ressuscitado não por questão de Justiça, mas de conveniência política. Ressuscitou por aparelhos, já que passou a depender da rejeição a Jair Bolsonaro para se manter vivo politicamente, como se fosse o menos ruim para a democracia, e o seu partido se vê obrigado a entrar em concubinatos eleitorais por falta de quadros.

A paisagem é nítida: o envelhecimento cronológico do chefão petista é inexorável, embora os seus acólitos lhe atribuam divindade, a senilidade ideológica do PT é indisfarçável, a sua base sindical desapareceu e os contínuos atestados de óbito do bolsonarismo assinados pela imprensa são desmentidos pela realidade. Até no Nordeste, bastião petista, o PL de Jair Bolsonaro se espraia.

O PT fenece e não há substituto para Lula, cuja árvore mais frondosa a crescer à sua sombra é Fernando Haddad, que tem o carisma de um prato de tabule.

Mesmo que Lula se reeleja em 2026, o que está muito longe de ser uma garantia, ao contrário do que pensa Gilberto Kassab, o seu partido continuará definhando, enquanto o Centrão cresce alimentado pela bufunfa das emendas parlamentares. É tudo só por dinheiro, e cada vez mais, desde que o tucano Fernando Henrique Cardoso comprou a emenda da reeleição e Lula instituiu o mensalão para conseguir votos no Congresso. PSDB e PT também pagaram para morrer.

 

•        O transe provocado pelo vasto mundo do emendão. Por Moisés Mendes

Em busca de calmantes, as esquerdas se agarram a informações que já foram transformadas em manchetes e rendem análises fáceis e rápidas, tão perfeitas como se fossem produzidas por inteligência artificial.

A primeira manchete, do Estadão de ontem, informava: “Centrão domina eleições e elege prefeitos nas cidades que mais receberam emendas parlamentares”.

E outra manchete, na mesma linha, é essa de hoje do Globo: “Emenda Pix turbina taxa de reeleição de prefeitos, que foi de 89% nas 178 cidades mais beneficiadas”.

A conclusão mais elementar: o governo, submetido à extorsão das emendas, acabou engordando o porco do centro, da direita e da extrema direita, ou disso tudo que cabe no que se chama de centrão ampliado e expandido.

Mas o estrago da dinheirama das emendas explica tudo o que aconteceu na eleição? Ajuda a explicar, mas serão ingênuos os que se agarrarem apenas a esse consolo.

As emendas só existem sob controle da direita porque a direita tem a maior base política, agora aumentada em todo o país. E essa base só existe a partir das eleições, começando pelas municipais, que formam quadros, vereadores, prefeitos.

As eleições para governadores, assembleias, Congresso e presidente da República completam o serviço. Funciona assim desde muito antes das emendas PIX e secretas.

A base do centrão e da extrema direita é montada a partir das eleições municipais, que são, claro, diferentes das eleições para legislativos, governadores e presidente.

São diferentes, mas são o começo, a base paroquial de tudo o que vem depois. O que a direita conseguiu agora foi aumentar esse poder, que repercute mais adiante em representação no Congresso.

E, com mais poder no Congresso, mais capacidade de extorsão, mais emendas, mais dinheiro, há mais votos, mais poder municipal, estadual e nacional. E mais formação de líderes e fortalecimento das estruturas que os sustentam.

Essa direita à la Kassab pode até não eleger o presidente da República, como vivem repetindo como consolo. Mas mantém um governo, como faz agora com Lula, sob controle quase absoluto das suas vontades, na coalizão dentro do Planalto e nas sabotagens dentro do Congresso.

Essa direita forte começa com a eleição do vereador dono do mercadinho de Cacequi e do prefeito criador de bois em campos de queimadas na região de Piracicaba. É assim nessas cidades e em pelo menos 80% do território nacional sob comando dessa gente.

O eleitor médio do PSD, que não liga muito para ideologia numa disputa municipal, pode não imaginar Kassab como presidente. Mas a maioria torce para que Kassab tenha base e muito poder para interferir na escolha do presidente e participar depois dos mecanismos de controle do governo. Como já tem hoje em Brasília e terá muito mais amanhã.

Mas se as emendas não explicam tudo, o que afinal desvenda por completo o crescimento do que ainda chamam de centro e da velha direita na eleição? São respostas que dependem muito de pesquisa e estudo e menos de chutes e calmantes.

Nos chutes possíveis, podem dizer que a eleição municipal, com suas feições próprias, finalmente livrou a direita da sombra de Bolsonaro e mostrou que o eleitor pouco quis saber de Lula.

Que a polarização se diluiu. Que o Brasil redescobriu o centro e que as esquerdas, por cansaço, envelhecimento, omissões e desgaste, vão se conformando, desde 2020, com o tamanho que tinham antes do PT.

Poderemos estar entrando numa distopia regressiva, no vasto mundo fumacento do centrão-emendão de Kassab, com um cenário próximo do que existia nos tempos de Arena e MDB, com as suas muitas nuances e graduações.

Estamos no meio de um transe do que parece ser um mundo pré-PT, com as muitas Arenas paroquiais 1, 2 e 3, com os variados MDBs dos autênticos, moderados e infiltrados e com as turmas do entorno, nas esquerdas que já foram classistas e agora são fortes por suas vozes identitárias.

Esse é o cenário. As emendas que engordaram o porco de Kassab na eleição só existem porque a direita já é forte, impositiva e faminta e fica com quase tudo. E as esquerdas se encolhem.

Essa direita apenas se fortaleceu um pouco mais agora na base de onde emerge, nos municípios de todos os tamanhos, incluindo as capitais. Que não se subestime o tamanho desse estrago daqui a dois anos.

 

•        PT vai apoiar 'forças antibolsonaristas' no segundo turno, mesmo que candidato seja de direita

O PT vai apoiar o que chama de "forças antibolsonaristas" no segundo turno das eleições municipais. Nas cidades onde foi derrotado na primeira rodada da disputa, como em Belo Horizonte (MG), o partido orientará o voto e participação em campanhas de candidatos que se opõem ao ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), mesmo que o nome seja de direita.

A estratégia será discutida nesta terça-feira, 8, em reunião da Executiva Nacional do PT. Na capital mineira, o partido recomenda o apoio ao prefeito Fuad Noman (PSD), que concorre à reeleição e tem como adversário o deputado Bruno Engler (PL), aliado de Bolsonaro.

O deputado Rogério Correia, candidato derrotado do PT, ficou em sexto lugar na eleição em Belo Horizonte. Saiu magoado com a ausência do presidente Luiz Inácio Lula da Silva em sua campanha. Dias antes do primeiro turno, Correia disse ao Estadão que o vereador Álvaro Damião (União Brasil), vice na chapa de Fuad, é um fervoroso "anti-Lula".

Mas o acordo entre o PT e o PSD de Gilberto Kassab - que em São Paulo respalda a candidatura de Ricardo Nunes (MDB) - tem na mira as eleições de 2026. Lula também quer apoiar um nome do PSD - o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco - ao governo de Minas, segundo maior colégio eleitoral do País. Em contrapartida, tenta fechar uma aliança com o PSD para sua campanha a novo mandato, daqui a dois anos.

Neste primeiro turno, o PT elegeu 248 prefeitos, em todo o País, e sofreu derrotas importantes. Nas eleições de 2020, por exemplo, conquistou 183 prefeituras, mas, após trocas partidárias, chegou a 265, como conta de documento produzido pelo Grupo de Trabalho Eleitoral (GTE) em setembro.

Das quatro capitais onde agora disputa o segundo turno, o PT tem chance de vitória em Fortaleza, de acordo com pesquisas de intenção de voto. Lá, Evandro Leitão, que trocou o PDT pelo PT, enfrenta o bolsonarista André Fernandes (PL), investigado por participar dos ataques de 8 de janeiro de 2023.

Lula desembarcará na sexta-feira, 11, em Fortaleza, para entregar moradias do Minha Casa, Minha Vida. A cúpula do PDT até hoje critica o presidente por ter ido à convenção que oficializou Leitão, quando o prefeito da cidade, José Sarto, filiado ao partido, concorria a novo mandato. O PDT compõe a base de sustentação do governo Lula no Congresso. Sarto ficou em terceiro lugar e foi o primeiro prefeito de Fortaleza a não ser reeleito no cargo.

As outras capitais onde o PT concorre são Porto Alegre, Natal e Cuiabá. A maior aposta do PT, porém, está em São Paulo, onde a sigla se aliou ao candidato do PSOL, Guilherme Boulos, contra Ricardo Nunes. Trata-se de uma eleição difícil para o campo da esquerda.

A presidente do PT, Gleisi Hoffmann, avalia que a campanha de Boulos também deve ir atrás dos eleitores de Pablo Marçal (PRTB), candidato que ficou em terceiro lugar, com 1.719.274 votos.

"A eleição em São Paulo será fratricida e a gente tem de disputar esse eleitor. Não podemos deixá-lo largado", disse Gleisi. Na avaliação da deputada, nem todos os que optaram por Marçal são bolsonaristas. "Tem pessoas que votaram nele não pela questão ideológica, mas, sim, pelo estilo mais anarquista", observou ela.

Marçal apresentou um laudo médico falso, a dois dias da votação, para sustentar que Boulos consumia drogas. Na disputa mais acirrada dos últimos tempos, na capital paulista, uma diferença de apenas 56 mil votos separou Boulos de Marçal.

Gleisi discorda da avaliação de que o PT teve desempenho desastroso neste primeiro turno. "Quando a esquerda foi a grande vencedora das eleições municipais?", perguntou. "Quem sempre fez mais votos nas eleições locais foram partidos de centro para a direita porque é onde eles têm força política."

O PL de Bolsonaro, porém, passou de 4,7 milhões de votos para prefeito, em 2020, para R$ 15,7 milhões nesta primeira rodada da disputa, um crescimento de 236,2%. O PT, por sua vez, saiu de 6,9 milhões para 8,9 milhões de votos.

"Eu não estou dizendo que a gente não tenha problema nem tapando o sol com a peneira. Sei que teremos de virar a estratégia para combater a direita. Mas também não acho que o nosso resultado tenha sido uma catástrofe", afirmou Gleisi.

A deputada elogiou a declaração de voto de Tabata Amaral (PSB) em Boulos e espera que ela grave vídeo e compareça a atos de campanha. Tabata, porém, resiste a subir no palanque do candidato. Há pedidos para que o vice Geraldo Alckmin e o ministro do Empreendedorismo, Márcio França, do PSB, tentem convencê-la a mudar de ideia.

•        Partido cobra fatura de Eduardo Leite

Em Porto Alegre, o PT vai cobrar a fatura do apoio dado ao governador do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite (PSDB), quando ele era candidato, em 2022. A disputa do segundo turno na capital gaúcha é entre o prefeito Sebastião Melo (MDB) e a deputada Maria do Rosário (PT).

Agora, Lula e seu partido querem que Leite ajude na campanha da petista. O PL de Bolsonaro está no páreo em nove das quinze capitais que terão segundo turno: Belo Horizonte, Belém, Manaus, Goiânia, João Pessoa, Aracaju , Palmas, Cuiabá e Fortaleza. Nas duas últimas, enfrenta o PT de Lula.

O governador de Goiás, Ronaldo Caiado, disse estar disposto a conversar com o PT para que o partido entre na campanha de Sandro Mabel (União Brasil) à Prefeitura de Goiânia. O adversário de Mabel é Fred Rodrigues (PL), candidato de Bolsonaro. Adriana Accorsi (PT) saiu do primeiro turno em terceiro lugar, com 24,44% dos votos.

Em Cuiabá, Gleisi acha possível fazer uma "frente com a direita responsável" para eleger Lúdio Cabral (PT) e derrotar o candidato bolsonarista Abílio Brunini (PL). Rafaela Fávaro, filha do ministro da Agricultura, Carlos Fávaro (PSD), é vice na chapa do petista Lúdio.

 

Fonte: Metrópoles/Brasil 247/Agencia Estado

 

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