Banco do
BRICS sai do marasmo e fortalece moedas locais sob Dilma Rousseff, diz analista
Condecoração
da presidenta do Novo Banco de Desenvolvimento (NBD) do BRICS, Dilma Rousseff,
por Xi Jinping aumenta prestígio da instituição e do Brasil, avalia analista.
Saiba quais os avanços e desafios do banco e se o Brasil se beneficia de fato
do mandato de Dilma.
A
presidenta do Novo Banco de Desenvolvimento (NBD), também conhecido como Banco
do BRICS, Dilma Rousseff, foi condecorada pelo presidente chinês Xi Jinping com
a Medalha da Amizade, neste domingo (28). A honraria atesta o bom desempenho da
brasileira à frente do banco, confirmado por especialistas ouvidos pela Sputnik
Brasil.
"Nos
últimos 75 anos, houve muitos velhos e bons amigos no mundo que compartilham as
mesmas aspirações e permanecem juntos com o povo chinês nos bons e maus
momentos; a sra. Dilma Rousseff [...] é uma representante notável entre
eles", disse Xi Jinping durante a cerimônia.
O
presidente Xi ainda disse que "o povo chinês nunca esquecerá aqueles
amigos internacionais que fizeram contribuições extraordinárias para o
desenvolvimento da China e a amizade entre o povo chinês e o povo de outros
países", reportou o jornal Brasil de Fato.
"É
uma grande honra receber a Medalha da Amizade da China, um país com uma rica
história milenar e que hoje se destaca como uma potência econômica
global", declarou Dilma Rousseff durante o seu discurso. "O
compromisso assumido pela China com a reforma e abertura não apenas permitiu a
retirada de centenas de milhões de pessoas da pobreza, como contribuiu, de
forma significativa, para o crescimento econômico e a estabilidade
globais."
A
ex-presidenta do Brasil assumiu o banco em 2023, substituindo o também
brasileiro Marcos Troyjo. O mandato de Rousseff, marcado sobretudo pelo esforço
por reduzir o papel do dólar no comércio entre os países-membros, deve terminar
em julho de 2025.
"A
condecoração de Dilma é uma sinalização política de que a China tem interesse
no aumento do prestígio do banco, em reforçar a posição dele como alternativa
ao FMI [Fundo Monetário Internacional]", disse o professor de finanças e
controle gerencial do COPPEAD/UFRJ, Rodrigo Leite, à Sputnik Brasil.
"Também é um sinal positivo de Pequim em relação ao atual governo
brasileiro. É uma forma de apontar para os seus aliados quais são as suas
prioridades."
A
liderança de Dilma Rousseff no NBD retirou o banco de certo marasmo
institucional, no qual poucos avanços eram realizados, acredita a professora da
PUC-Rio e pesquisadora do BRICS Policy Center, Maria Elena Rodriguez.
"Acho
que o banco tem melhorado bastante, porque até poucos anos atrás ele estava
acanhado, com desempenho aquém do planejado", disse Rodriguez à Sputnik
Brasil. "Havia um exercício e número de empréstimos muito pequeno, e o
banco crescia pouco."
A
entrada de novos membros, como Egito, Emirados Árabes Unidos, Uruguai e
Argélia, aliada à expansão nos investimentos e empréstimos do banco, deu nova
tração à instituição. Fortalecido, o NBD tem maior capacidade para avançar na
agenda voltada para o Sul Global, com ênfase em investimentos verdes.
"O
Banco do BRICS pode ser pensado como uma nova geração de bancos de
desenvolvimento. Em sua constituição, ele se coloca como um banco voltado para
países em desenvolvimento, determinado a investir em projetos de infraestrutura
e desenvolvimento sustentável", explicou Rodriguez.
A
especialista ainda nota a ausência de condicionalidades impostas pelo Banco do
BRICS, "o que respeita a autonomia e soberania dos países". Nesse
sentido, o banco contrasta com as longas listas de condicionantes impostas aos
Estados devedores por instituições tradicionais, como o Fundo Monetário
Internacional (FMI) e o Banco Mundial.
"Agendas
importantes como o pagamento em moedas locais foram colocadas como objetivos
estratégicos na administração de Dilma Rousseff, e estão sendo impulsionadas
bastante", disse Rodriguez. "Temos propostas para que até 30% do
financiamento do banco seja realizado em moedas locais, o que contribui para
superar a primazia do dólar."
A
atuação de Rousseff também foi bem avaliada pela especialista nos quesitos
sustentabilidade, inclusão social e luta contra a desigualdade. O acesso do
próprio Brasil aos recursos do banco também foi visivelmente ampliado durante a
gestão da ex-presidenta.
"Por
outro lado, ainda podemos avançar na transparência das operações, assim como em
políticas sociais mais avançadas, como política de gênero, políticas voltadas
para comunidades afetadas e o estabelecimento de mecanismos de queixa dentro do
banco", propôs Rodriguez.
O
professor de finanças Leite expressa certo ceticismo quanto ao papel do banco,
em função do volume de capital disponível, ainda reduzido quando comparado com
os seus pares. O capital subscrito inicial do Banco do BRICS atualmente é de
US$ 50 bilhões (R$ 273 bilhões), enquanto o capital estimado do Banco
Internacional para Reconstrução e Desenvolvimento (BIRD), ligado ao Banco
Mundial, era de US$ 278 bilhões (cerca de R$ 1,5 trilhão) em 2021.
"Na
minha opinião, o Banco do BRICS tem uma importância ainda preponderantemente
política. O capital do banco ainda é insuficiente. E, conforme o banco se
expande, esse capital ainda por cima será diluído em várias economias,
restringindo a atuação do banco ainda mais", disse Leite. "Por isso,
o peso da imagem pode ser maior do que o peso concreto do banco."
O
especialista nota que o governo brasileiro está buscando alternativas
domésticas para o financiamento do Projeto de Aceleração do Crescimento (PAC),
o que atestaria a ainda baixa capacidade financeira do Banco do BRICS.
"O
governo está precisando recorrer à emissão de dívidas por meio da ENGEA
[Empresa Gestora de Ativos], o que é uma forma de financiamento menos
sustentável no longo prazo", disse Leite. "Se houvesse maior
capacidade no Banco do BRICS, o governo brasileiro não precisaria recorrer a
esse tipo de mecanismo."
As
dificuldades orçamentárias brasileiras, agravadas pela imposição de tetos e
arcabouços fiscais, levam o governo a buscar alternativas de financiamento. No
entanto, há uma memória negativa quanto ao endividamento externo junto a bancos
como o FMI, recordou Leite. Nesse contexto, o Banco do BRICS se coloca como
alternativa de baixo risco para captação de recursos pelo Palácio do Planalto.
"O
Brasil está rodando no limite do orçamento, com muito pouco espaço para atuar.
Esse é um problema que outros países não têm. Estamos recorrendo ao Banco
Nacional de Desenvolvimento (BNDES) para realizar políticas públicas, como se
fosse um instrumento parafiscal", disse Leite. "Nesse contexto, o
Banco do BRICS está sendo útil para nós, em casos como o financiamento para o
Rio Grande do Sul. E a presidência de Dilma ajudou bastante."
Em
abril deste ano, o vice-presidente Geraldo Alckmin e a presidenta do NBD, Dilma
Rousseff, acordaram empréstimo de R$ 5,750 bilhões para a reconstrução do
estado do Rio Grande do Sul, duramente castigado por chuvas atípicas. Os
recursos foram não só alocados diretamente para o estado gaúcho, mas também
para instituições brasileiras como o BNDES, o Banco do Brasil e o Banco
Regional de Desenvolvimento do Extremo Sul (BRDE), informou a Secretaria de
Comunicação Social do governo.
"Agradeço
ao NBD, por meio da presidenta Dilma, por todo apoio que vem oferecendo ao povo
gaúcho diante desta catástrofe sem precedentes", afirmou o vice-presidente
Alckmin na ocasião. "Tenho convicção de que a reconstrução do estado será maior
que a destruição."
Na
ocasião, Dilma Rousseff notou a flexibilidade do banco ao conceder o
empréstimo, em função da dificuldade de prever os critérios de reconstrução
necessários ao Rio Grande do Sul. A presidenta relacionou a vocação do banco
para atividades sustentáveis à necessidade de atender populações vítimas de
catástrofes ambientais.
"Na
minha opinião, Dilma tem saído muito bem, deixando suas pautas bastante claras
e colocando um selo no banco. Colocou a máquina para funcionar e [...] garantiu
respostas rápidas, como, por exemplo, diante da crise no Rio Grande do
Sul."
Outros
projetos do NBD no Brasil estão relacionados à proteção ambiental da Petrobras,
nos estados de Minas Gerais e Rio de Janeiro, da SABESP, em São Paulo, e na
expansão de acesso a água e saneamento no estado de Pernambuco.
"O
banco está em processo avançado e pronto para se consolidar como uma
instituição do Sul para o Sul. Estou otimista quanto à consolidação de um
sistema alternativo de pagamentos. É uma agenda muito clara, que vai mostrar
nossa autonomia diante do sistema internacional", concluiu Rodriguez.
O
Novo Banco de Desenvolvimento (NBD) foi criado em 2014 pelos primeiros cinco
membros do BRICS, Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul. Com sede em
Xangai, na China, o banco possui escritórios regionais em São Paulo,
Joanesburgo, Moscou e Guajarat, na Índia.
¨
China inverte lógica
da assistência internacional e impulsiona crescimento da África
Ao
podcast Mundioka, da Sputnik Brasil, analistas explicam que Pequim aposta em
uma forma de assistência que incentiva o desenvolvimento para depois criar
mercados — diferentemente da usada pelo Ocidente, que explora e cria dívidas
para depois abandonar países do continente à deriva.
Com
um histórico de exploração por potências ocidentais e atualmente preterida por
esses mesmos países, a África é tratada pela China como uma oportunidade
política e econômica.
Em
setembro, durante o Fórum para Cooperação China-África, realizado em Pequim, o
presidente chinês, Xi Jinping, firmou o compromisso de aumentar para US$ 51
bilhões (R$ 286 bilhões) a assistência financeira ao continente africano ao
longo dos próximos três anos.
Em
entrevista ao podcast Mundioka, da Sputnik Brasil, especialistas explicam por
que a África atrai tanto interesse da China e quais os principais setores de
investimento de Pequim no continente.
Marcos
Cordeiro, professor de relações internacionais da Universidade Estadual
Paulista (Unesp), com pós-graduação em ciências sociais na mesma universidade e
no Programa de Pós-Graduação San Tiago Dantas, explica que os principais
destinos dos investimentos da China na África são os setores de infraestrutura,
ferrovias, hidrelétricas, estradas, mineração e, mais recentemente, a criação
de parques industriais em diversos países.
Ele
rechaça a ideia propagada por alguns analistas de que os investimentos chineses
são uma forma de Pequim dominar a África, afirmando que essa tese é dita por
aqueles que querem desviar o foco do projeto chinês, que são justamente os
mesmos que por séculos espoliaram o continente e agora creem que as iniciativas
chinesas serão iguais às do Ocidente, ou seja, espoliar, criar dívidas,
implementar reformas liberais e depois deixar a África à deriva.
"A
maior parte dos países da África em 2024 […] teve taxa de crescimento superior
a 5%. Grande parte do impulso para esse crescimento, com certeza, está
vinculado a uma série de projetos chineses na África."
Segundo
ele, uma das principais características dos investimentos chineses é inverter a
lógica da assistência internacional — em primeiro lugar, fazendo investimentos
que criam bases para o desenvolvimento, que depois possibilitarão a criação de
uma demanda.
"Se
a China financia uma ferrovia grande, bonita, moderna, como a do Quênia, é
porque ela tem a tecnologia, […] projetos de engenharia, capacidade [para
realizar a obra]. […] Por outro lado, quando se cria uma infraestrutura de
transporte, viabiliza economicamente a produção agrícola, mineral, industrial,
então a China faz um investimento olhando o longo prazo, a criação de renda, a
criação de novos mercados e também aquilo que ela necessita de forma mais
urgente, que é garantir sua soberania ou abastecimento de alimentos e
matérias-primas."
Cordeiro
afirma que desde que a China ascendeu como uma República Popular, em 1949,
"ela sempre esteve, do ponto de vista concreto, apoiando os países
recém-saídos do colonialismo".
"A
China foi uma grande liderança na Conferência de Bandung, que reuniu os países
da África e da Ásia como uma estratégia de se reerguer depois do colonialismo.
[…] No começo dos anos 50, a China ajudou, mesmo muito pobre, mesmo sem
recursos, a fazer uma ferrovia ligando a Zâmbia até a Tanzânia. É uma ferrovia
emblemática, que contribuiu, dentre outras coisas, para garantir a própria
independência da Zâmbia e da Tanzânia", afirma.
Outro
ponto importante na corrida da China pela África, segundo o especialista, é a
não interferência, a capacidade de fazer negócios sem impor "um pacote
completo de modelo político, de modelo de sociedade, de valores, de
religião".
"A
China não exporta o próprio modelo, não tem uma religião para exportar, não diz
o que é certo ou o que é errado em assuntos internos de outros países. Talvez
ela até seja criticada justamente por esse tipo de pragmatismo, porque ela
respeita a própria ordem nacional de cada país e vai lidando com o país do
jeito que ele realmente é, não daquele que a China gostaria que fosse."
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Energia limpa e difusão da cultura chinesa
Amabilly
Bonacina, bacharel em relações internacionais pela Universidade Federal do Rio
Grande do Sul (UFRGS), mestre em ciência política pela Universidade de Montreal
e pesquisadora do Centro Brasileiro de Estudos Africanos da Faculdade de
Ciências Econômicas (CEBRAFRICA) da Universidade Federal do Rio Grande do Sul
(UFRGS), enfatiza que o principal alvo dos investimentos chineses, hoje, na
África, é o setor de energia, que afirma ser o maior gargalo para o
desenvolvimento do continente.
Bonacina
afirma que hoje a tecnologia chinesa é quase um monopólio na produção de
energia solar no continente africano. Segundo ela, "apesar da existência
de recursos como vento e luminosidade solar para as fazendas de produção de
energia solar, ainda tem pouca infraestrutura nesse sentido" no
continente.
"Hoje,
os painéis e tudo que compõe a cadeia de produção de energia solar [...] é mais
ou menos 75% produzido na China. Então, eles acabam sendo o parceiro natural
porque eles têm essa tecnologia e estão dispostos a cooperar com termos
interessantes para os países em desenvolvimento e para os países africanos em
específico", explica.
Ela
afirma ainda que a China tem investido em difundir sua cultura na África,
aumentando exponencialmente o número de institutos Confúcio pelo continente.
"Penso
também no caso dos programas de rádio, que rádio ainda é um dos meios de
comunicação mais utilizados pelos africanos e existem programas de rádio que
são desenvolvidos para tentar ampliar o acesso dos africanos à cultura
chinesa."
Bonacina
sublinha que outro dado interessante no investimento em longo prazo da China na
África é a explosão demográfica prevista para acontecer em 2050 no continente
africano.
"Essa
explosão demográfica significa pessoas jovens. E essas pessoas jovens elas são
um grande mercado consumidor para os produtos excedentes da economia chinesa.
Então, eu acho que, mesmo que não seja tão evidente agora, o fator demográfico
vai ser muito importante no futuro e eu acho que não vai ter outro lugar que
nem o continente africano daqui a 50 anos nessas questões de demografia",
explica.
Fonte:
Sputnik Brasil
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