O impacto dos
desastres climáticos na saúde mental dos jovens
Os desastres
climáticos, como secas, inundações, furacões e incêndios florestais,
são eventos traumáticos que podem afetar profundamente a saúde mental dos jovens que os vivenciam.
Um
estudo da Universidade Estadual da
Pensilvânia (Penn State)
revelou que esses eventos podem ter efeitos de longo prazo na saúde mental dos jovens, aumentando
o risco de depressão, ansiedade, estresse pós-traumático e comportamentos de
risco.
O
estudo, publicado na revista Psychological Trauma: Theory, Research, Practice, and Policy, analisou os dados de mais de 2 mil jovens
entre 12 e 17 anos que participaram de uma pesquisa nacional sobre saúde
comportamental nos Estados Unidos.
Os
pesquisadores compararam os jovens que relataram ter vivenciado um desastre climático nos
últimos 12 meses com os que não relataram essa experiência. Eles também levaram
em conta outros fatores que poderiam influenciar a saúde mental dos jovens, como sexo, idade, raça, renda familiar e
histórico de abuso ou negligência.
Os
resultados mostraram que os jovens que
vivenciaram um desastre climático tinham
maior probabilidade de apresentar sintomas de depressão, ansiedade, estresse
pós-traumático e comportamentos de risco, como uso de álcool, tabaco e drogas
ilícitas. Esses efeitos persistiram mesmo após um ano do evento traumático.
Os
pesquisadores destacaram que os desastres climáticos podem afetar a saúde mental dos jovens de
várias formas. Por exemplo, eles podem causar perdas materiais e emocionais,
como a destruição da casa ou da escola, a separação da família ou dos amigos,
ou a morte de entes queridos.
Eles
também podem gerar medo, incerteza, insegurança e impotência diante da
situação. Além disso, eles podem afetar as condições socioeconômicas e ambientais das comunidades afetadas, reduzindo o acesso a
recursos básicos como água potável, alimentos, energia elétrica e serviços de saúde.
Choques
econômicos/agrícolas: Perda de emprego/fonte de renda/empresa familiar, pragas
nas lavouras, quebra de safra, pragas no armazenamento, pragas no gado, morte
do gado
Choques
ambientais: Seca, inundação, erosão, geada, terremoto
Choques
familiares: Morte de pai ou mãe, divórcio ou separação, morte de outro membro
da família.
Os
pesquisadores ressaltaram a importância de oferecer apoio psicológico aos jovens que vivenciam desastres climáticos, tanto no curto
quanto no longo prazo. Eles sugeriram que as intervenções devem ser adaptadas
às necessidades específicas de cada grupo etário, cultural e geográfico.
Eles
também enfatizaram a necessidade de prevenir e mitigar os efeitos das
mudanças climáticas, que estão aumentando a frequência e a
intensidade dos desastres
climáticos em todo o mundo.
Ø A mudança climática
piora a saúde mental
“A
solostalgia leva a um mal-estar generalizado, um sentimento de perda e dor que
provoca problemas de saúde mais graves, como abuso de drogas, doenças físicas e
doenças mentais. Esse novo conceito ajuda a compreender um impacto pouco
estudado até agora da crise climática: o psicológico e como processos que estão
ocorrendo em todo o mundo colocam novos desafios para o campo da saúde, os planos de vigilância e os
fenômenos de adaptação à mudança climática”, escrevem Cristina Linares e Julio Díaz, membros do Departamento de
Epidemiologia e Bioestatística da Escola Nacional de Saúde, no Instituto de
Saúde Carlos III, Espanha, em artigo publicado por Ctxt, 02-10-2019. A tradução é do Cepat.
<<<<< Eis o artigo.
A crise climática é o maior desafio global que a humanidade
enfrenta. Embora são muitos os aspectos que abarca e os setores afetados, de
ecológicos a econômicos, não menos importante são seus efeitos na saúde das pessoas. Em 2015, Chris Dye, diretor de estratégia da Organização Mundial da Saúde (OMS),
disse: “As mudanças climáticas não
causam doenças, mas ampliam
os efeitos de muitas delas”.
A OMS calcula que a mudança climática causará
250.000 mortes adicionais por ano, em todo o mundo, entre 2030 e
2050, como consequência de modificações nas características das doenças, muitas
delas muito sensíveis às mudanças de temperatura e pluviosidade. Em termos
de saúde, os efeitos das mudanças climáticas são notáveis em
diferentes âmbitos e são conhecidos e combatidos, especialmente nos países mais
desenvolvidos economicamente.
Os
maiores impactos, no entanto, são sofridos pelos países mais pobres. Entre as ameaças à saúde estão: os efeitos dos
extremos térmicos (ondas de calor e frio) cada vez mais intensos e frequentes
ao longo do tempo, o aumento de doenças
tropicais transmitidas por vetores (por exemplo, malária e dengue),
já que devido ao aquecimento
global esses vetores de transmissão atingiram áreas de alta
densidade populacional que historicamente estavam livres deles, o aumento
da mortalidade associada à má qualidade do ar que se
respira, principalmente nas zonas urbanas. O aumento de poluentes químicos se
intensifica devido às piores condições atmosféricas promovidas por situações de
maior insolação e estabilidade.
Outras
grandes causas da mortalidade atribuíveis às mudanças climáticas são
a desnutrição e a diarreia, devido a uma maior frequência e intensidade dos
fenômenos meteorológicos extremos, como furacões, ciclones, tempestades, inundações e secas, que conduzem à escassez de alimentos, má qualidade da água, alimentos contaminados e,
finalmente, deslocamentos
populacionais, principalmente nas áreas geográficas onde todos esses
impactos se juntam.
No
momento, um dos campos com maior interesse científico é o da influência
dos efeitos das mudanças climáticas sobre
a saúde mental das populações afetadas, constituindo uma
parte importante da carga de doenças a elas associadas. A percepção de um
estado de saúde mental ótimo deve ser entendida
não apenas como padecer ou não de uma doença mental diagnosticada, mas a partir
de um estado ótimo de saúde física e emocional. É necessário distinguir
duas escalas de incidência:
A
provocada por um maior número de frequências e intensidade de fenômenos meteorológicos
extremos, como inundações, secas, furacões, tornados, elevação do nível do mar, aumento de incêndios florestais etc. Todos esses eventos extremos
produzem um importante impacto na população: mudanças no uso do solo, na
produtividade agrícola e pesqueira, na disponibilidade e qualidade da água, e
no pior dos casos, perdas de infraestrutura e lares, aumento das desigualdades socioeconômicas e,
portanto, na saúde, além da
diminuição da segurança alimentar e fome, também uma situação de maior pobreza, e até conflitos
armados. Essas situações geram migrações populacionais massivas
conhecidas com o termo de refugiados
climáticos. Nos primeiros seis meses de 2019, estes somaram sete milhões
de pessoas, superando os deslocados por conflitos bélicos.
Nesta
primeira escala de impacto, é onde a saúde mental desempenha
um papel importante. Além do aumento de lesões e traumatismos causadas por
eventos extremos, essas situações de estresse muito intenso e ansiedade geram
na população afetada - especialmente entre os mais vulneráveis por idade ou
gênero - um gatilho importante de várias doenças mentais em diferentes faixas
de gravidade. O acompanhamento e a quantificação desse tipo de risco são
complicados, pois até agora não havia sido considerado em toda a sua magnitude,
ignorando aspectos importantes como, por exemplo, o abandono de tratamentos
médicos causados por essas situações graves específicas.
A
geração de registros confiáveis monitorados nessas circunstâncias é importante
para dimensionar o plano de ação, a vigilância e o monitoramento de situações
de emergência do ponto de vista da saúde. Portanto, as mudanças climáticas podem afetar diretamente a saúde mental pela
exposição a traumas psicológicos e situações estressantes da vida, como as
vivenciadas em desastres
climáticos cada vez mais frequentes, com lesões, traumatismos,
perda de vida de pessoas e propriedades, além de deslocamentos involuntários.
Afetam a percepção de saúde e segurança das pessoas, constituindo fator de
risco para estados de ansiedade, estresse pós-traumático, depressão e suicídio.
Dentre
o resto dos fatores de risco para a saúde mental investigados,
a próxima escala de incidência seria o impacto indireto. Por exemplo, devido
ao aumento da poluição atmosférica ou devido a um
acontecimento que não gera uma situação de emergência, como as mencionadas
acima. As evidências científicas estão se acumulando em torno de trabalhos que
encontram associações robustas entre episódios de ondas de calor e aumento de distúrbios emocionais e comportamentais (aumento da violência
e abuso de substâncias tóxicas: álcool, medicamentos, drogas), bem como um
aumento na taxa de suicídios durante episódios de temperaturas
extremas e secas.
Os
grupos populacionais altamente vulneráveis seriam, acima de tudo, pessoas que
já sofrem de uma doença mental e, principalmente, a população idosa que
fisiologicamente já sofre de uma pior termorregulação e também se encontra
polimedicada na maioria dos casos ao padecer de doenças associadas (diabetes,
hipertensão). Condições individuais que, por sua vez, são agravadas por viver em
piores condições de vida e suportar piores situações socioeconômicas.
Nesse
ponto, entra em jogo o conceito de pobreza
energética (Boardman 1991)
e suas implicações sobre a saúde mental das pessoas. A pobreza
energética é a incapacidade econômica de manter uma temperatura adequada à
habitação, tanto no verão (refrigerada) quanto no inverno (aquecida), de modo
que as ondas de calor e frio (cada vez mais frequentes e intensas) são o fator
precipitante de um agravamento e o desencadeamento de diversas condições
mentais (incluindo suicídio).
Nesse
âmbito são especialmente importantes as diferenças de gênero. A feminização da pobreza energética é
objeto de pesquisas recentes, uma vez que as mulheres são, em muitos casos, as
sustentadoras econômicas dos lares, seja por idade (aposentadas) ou por ser a
única pessoa com capacidade de contribuir economicamente com o lar.
Outra
questão é como a qualidade do
ar afeta a saúde
mental, especialmente em cidades que excedem constantemente os valores
de referência de proteção à saúde da OMS. Na última década, surgiram vários
estudos que relacionam distúrbios psiquiátricos à poluição atmosférica [1]. Em
geral, o mecanismo biológico capaz de relacionar a associação entre esses
fatores ambientais e os suicídios é que 90% das pessoas que cometem suicídio
têm histórico prévio de distúrbios psiquiátricos, como ansiedade, depressão e
transtornos de personalidade, e sabe-se que existe uma associação entre níveis
de poluição atmosférica e aumento de casos de episódios depressivos e doenças
neuropsiquiátricas.
A poluição atmosférica afeta o organismo através de um
mecanismo de estresse oxidativo (muitos poluentes contêm substâncias tóxicas
como metais pesados) e isso leva à neuroinflamação. A exposição constante e
contínua a altos níveis de contaminação pode ser o estressor neuropsicológico
que leva ao agravamento dos sintomas. Em um estudo publicado recentemente para
a cidade de Barcelona [2],
é estatisticamente significativo que o aumento da exposição a longo prazo
à poluição atmosférica pode
aumentar as probabilidades de depressão e o uso de antidepressivos e
benzodiazepínicos.
Por
último, dentro do conceito de saúde global, entendido como um estado
ótimo, tanto físico, como mental, o termo solastalgia foi cunhado (Albrecht, 2005) para descrever uma
nova classe de angústia psíquica e estresse existencial provocada pela presença
de ambientes degradados e deteriorados, particularmente no entorno mais próximo
e agravado pelo sentimento de incapacidade e impotência para solucioná-lo. A
solostalgia leva a um mal-estar generalizado, um sentimento de perda e dor que
provoca problemas de saúde mais graves, como abuso de drogas, doenças físicas e
doenças mentais. Esse novo conceito ajuda a compreender um impacto pouco
estudado até agora da crise
climática: o psicológico e como processos que estão ocorrendo em todo o
mundo colocam novos desafios para o campo da saúde, os planos de vigilância e
os fenômenos de adaptação à mudança climática.
Fonte:
Por Katie Bohn, emr PennState - tradução de Henrique Cortez, para Ecodebate
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