sexta-feira, 28 de julho de 2023

Governo Lula barra pedido dos EUA para extraditar espião russo, diz fonte

Uma fonte graduada do governo brasileiro confidenciou à coluna, sob reserva, que o Ministério da Justiça negou preliminarmente o pedido feito pelo governo de Joe Biden para extraditar para os Estados Unidos o espião russo Sergey Vladimirovich Cherkasov.

Cherkasov foi preso pela Polícia Federal em abril do ano passado no aeroporto de Guarulhos, em São Paulo. Já condenado por uso de documentos falsos, ele está recolhido em uma área especial da penitenciária federal de segurança máxima de Brasília.

Integrante do GRU, braço da inteligência militar russa, o espião viveu durante anos no Brasil e havia assumido uma identidade brasileira, a qual foi usada, inclusive, para viajar e fazer um curso nos Estados Unidos, motivo pelo qual ele passou a ser investigado também em território americano.

A prisão de Cherkasov se deu depois que autoridades holandesas desarticularam um plano para infiltrá-lo, usando a identidade brasileira, na Corte Penal de Haia, na Holanda, onde correm processos contra o presidente russo, Vladimir Putin.

Flagrado ao chegar na Holanda em um voo que havia partido de Guarulhos, ele foi enviado de volta ao Brasil e a PF, acionada pelas autoridades holandesas, o prendeu no desembarque.

O governo de Joe Biden pediu a extradição de Cherkasov para os Estados Unidos em razão das suspeitas de que ele, usando a identidade brasileira falsa, teria operado em solo americano no período em que esteve por lá.

Pedido barrado na origem

Como manda a legislação, o pedido dos Estados Unidos foi feito ao DRCI, o Departamento de Recuperação de Ativos e Cooperação Internacional, vinculado ao Ministério da Justiça. O órgão é responsável pelas tratativas com países estrangeiros sobre, entre outros temas, extradição e colaboração em investigações criminais.

Cabe ao DRCI fazer uma análise prévia para avaliar se os pedidos que chegam, como o que foi enviado neste ano por Washington, cumprem os requisitos administrativos e legais. É uma primeira fase do processo, portanto.

Quando o departamento entende que sim, os casos são enviados em seguida ao Supremo Tribunal Federal, que julga o pedido. Mesmo com veredicto favorável da Corte, a decisão final sobre extraditar ou não é sempre exclusiva do presidente da República, que pode, caso a caso, usar critérios políticos para atender ou negar as solicitações.

No caso do pedido americano para extraditar Cherkasov, o processo parou na primeira etapa. Foi barrado já na análise do departamento subordinado ao ministro Flávio Dino, sob a alegação de que não estariam presentes os pressupostos necessários. Com isso, nem chegou a ser remetido ao Supremo.

Rússia também quer extradição

A Rússia de Putin já havia pedido a extradição de Cherkasov, alegando tratar-se de um criminoso comum. Essa é uma tática usada frequentemente pelos russos para repatriar seus espiões quando eles são pilhados no exterior. As autoridades brasileiras, porém, já sabem que a alegação é falsa e, nos bastidores, se opõem à ideia de mandá-lo de volta para Moscou.

O pedido feito pelo governo russo já havia recebido o ok do Ministério da Justiça e está há meses em tramitação no Supremo, sob a relatoria do ministro Edson Fachin.

Na prática, a negativa do Ministério da Justiça para o pedido do governo americano facilita a vida de Lula, que, caso as duas solicitações — a de Moscou e a de Washington avançassem — teria que dar a palavra final, em um complicado enrosco diplomático.

A história, porém, ainda terá muitos capítulos. Até porque, teoricamente, o governo Biden poderá refazer a solicitação ao Brasil, preenchendo as lacunas que fizeram o governo Lula dizer não neste primeiro momento.

 

Ø  Espião russo: caso Allan dos Santos pesou para “não” do governo Lula aos EUA

 

A postura americana em relação à ordem de prisão do blogueiro radical bolsonarista Allan dos Santos pesou na decisão do Ministério da Justiça de Lula de barrar o pedido feito pela administração de Joe Biden para extraditar para os Estados Unidos o espião russo Sergey Vladimirovich Cherkasov.

Condenado por uso de documentos falsos, Cherkasov está preso em uma área especial da penitenciária federal de segurança máxima de Brasília e é alvo de uma segunda investigação, por lavagem de dinheiro.

Assim como o governo russo, os Estados Unidos solicitaram a extradição do espião, sob a alegação de que ele atuou em território americano no período em que usou uma identidade brasileira falsa.

Como a coluna informou ontem, em primeira mão, o pedido americano foi rejeitado sumariamente pelo governo brasileiro, já na primeira análise, no Ministério da Justiça.

Embora tenha sido justificada com argumentos técnicos, o fator político teve grande peso na decisão, dizem fontes graduadas do governo a par do assunto.

Segundo uma dessas fontes, um dos motivos principais para a negativa foi a falta de reciprocidade dos americanos em pedidos similares que são feitos pelo Brasil a Washington.

O caso do radical bolsonarista Allan dos Santos é não apenas lembrado como o maior exemplo disso como apontado como uma das razões do “veredicto”, avalizado pela alta cúpula do governo.

Morando nos Estados Unidos, de onde dispara ataques até hoje contra as instituições brasileiras em eventos e em lives transmitidas pela internet, o blogueiro tem contra si uma ordem de prisão expedida pelo ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal. Ele é acusado de ameaçar autoridades, praticar crimes contra a honra e de incitar a prática de crimes.

O governo americano, porém, nunca se dispôs a extraditá-lo para o Brasil, queixa-se um importante integrante do governo Lula.

“Você sabe quando os EUA vão extraditar o Allan dos Santos? Pau que dá em Chico também dá em Francisco”, afirma, sob reserva, um dos envolvidos na decisão.

A prisão do espião

Sergey Cherkasov foi preso pela Polícia Federal em abril do ano passado no aeroporto de Guarulhos, em São Paulo.

Apontado como integrante do GRU, braço da inteligência militar russa, o espião viveu durante anos no Brasil. Ele havia assumido uma identidade brasileira: Victor Muller Ferreira.

Sob a máscara do personagem construído ao longo de quase uma década, chegou a viajar para os Estados Unidos, motivo pelo qual passou a ser investigado também em território americano.

A prisão de Cherkasov se deu depois que autoridades holandesas desarticularam um plano para infiltrá-lo na Corte Penal de Haia, na Holanda, onde correm processos contra o presidente russo, Vladimir Putin.

Flagrado ao chegar na Holanda em um voo que havia partido de Guarulhos, ele foi enviado de volta ao Brasil e a PF, acionada pela inteligência holandesa, o prendeu no desembarque.

·         Dois pedidos de extradição

O governo de Joe Biden pediu a extradição do espião para os Estados Unidos em razão das suspeitas de que ele, com a identidade brasileira falsa, teria operado em solo americano no período em que fez um curso em uma das mais prestigiosas universidades de Washington.

A solicitação foi feita ao DRCI, o Departamento de Recuperação de Ativos e Cooperação Internacional, vinculado ao Ministério da Justiça. Cabe ao órgão avaliar se os pedidos de extradição cumprem os requisitos administrativos e legais, em uma primeira fase do processo. Preenchidos os requisitos, os casos são enviados ao Supremo Tribunal Federal, que os julga antes de o presidente da República dar a palavra final.

No caso do pedido americano, o processo parou já na primeira etapa. Foi barrado durante essa análise prévia no departamento subordinado ao ministro Flávio Dino. Com isso, nem chegou ao STF.

A Rússia já havia pedido a extradição de Cherkasov, alegando que ele é um criminoso comum condenado pela justiça local e que, por isso, precisa ser enviado de volta ao país para cumprir pena. Trata-se de uma tática usada frequentemente por Moscou para repatriar seus espiões quando eles são pilhados em atividade no exterior. As autoridades brasileiras já sabem, porém, que a alegação é falsa.

O pedido de extradição feito pelo governo russo já havia recebido o aval do Ministério da Justiça e está em tramitação no Supremo, nas mãos do ministro Edson Fachin.

 

Ø  Por que o governo esconde o caso do espião russo preso no Brasil

 

O Palácio do Planalto baixou uma ordem de silêncio para os órgãos de investigação e de inteligência envolvidos na prisão de Sergey Vladimirovich Cherkasov, cidadão russo preso pela Polícia Federal e apontado pelo serviço de inteligência da Holanda como um espião a serviço do regime de Vladimir Putin que usava identidade brasileira falsa para tentar se infiltrar no Tribunal Penal Internacional, em Haia.

Desde que as primeiras informações sobre Cherkasov chegaram ao governo brasileiro, ainda em abril, o caso ganhou contornos que beiram um roteiro de filme hollywoodiano.

Auxiliares diretos da Presidência da República foram convencidos pela área de inteligência de que, por trás do caso, haveria um movimento oculto do governo americano — da CIA, em especial — para criar uma crise diplomática entre o Brasil e a Rússia e contrapor Jair Bolsonaro e Putin.

·         O fator fertilizantes

Na contramão da maior parte da comunidade internacional, o governo brasileiro mantém relação amistosa com Moscou mesmo após a deflagração, pelos russos, da guerra contra a Ucrânia. O país adota posição politicamente neutra quanto ao conflito, condenado pela maioria das democracias ocidentais.

No início desta semana, Bolsonaro falou por telefone com Putin. O presidente russo garantiu ao colega brasileiro a continuidade do fornecimento de fertilizantes, cujo mercado mundial foi fortemente afetado a partir do início da guerra.

A Rússia é um dos maiores fornecedores globais de adubos e fertilizantes, e a interrupção das exportações para o Brasil poderia afetar sensivelmente o agronegócio.

Esse é um dos motivos pelos quais, desde o início da guerra, Jair Bolsonaro faz questão de não se indispor com Vladimir Putin, contrariando pressões vindas especialmente do governo americano.

Tarja de secreto

Foi justamente essa orientação geral que guiou a postura brasileira no caso do espião russo. Tão logo recebeu os primeiros relatórios sobre o assunto, o general Augusto Heleno Ribeiro, chefe do Gabinete de Segurança Institucional da Presidência, sob o qual está a Agência Brasileira de Inteligência (Abin), ordenou que todas as informações passassem a ser tratadas como secretas.

Sobreveio, então, a ordem do Planalto para que todos os órgãos envolvidos — a própria Abin, a Polícia Federal e o Itamaraty — falassem o menos possível acerca do tema. Tanto foi assim que, sobre o assunto, a PF limitou-se a divulgar uma nota sucinta confirmando a prisão, sem quaisquer detalhes.

Outra diretriz foi para que o Brasil não admitisse, em nenhum momento, tratar-se de um caso de espionagem.

Dentro da mesma estratégia, optou-se por enquadrar Cherkasov por uso de documentos falsos, um crime de menor potencial ofensivo. Admitir a prisão de um espião russo, na visão dos mesmos integrantes do governo que optaram por colocar panos quentes no assunto, automaticamente criaria de imediato um desconforto na relação com a Rússia.

·         A prisão

Segundo o serviço secreto holandês, Sergey Cherkasov, de 36 anos, passou 12 anos construindo a identidade falsa: Viktor Muller Ferreira, 33 anos, nascido em Niterói, no Rio de Janeiro.

Ele teria chegado ao Brasil em 2010. Depois, já usando a identidade brasileira, morou nos Estados Unidos e na Holanda, onde tinha conseguido uma vaga de estágio no Tribunal Penal Internacional (TPI), também conhecido como Corte Penal de Haia.

Já sob monitoramento, ele veio recentemente ao Brasil e, em abril, embarcou em um voo daqui para a Holanda. Ao chegar lá, teve a entrada negada pelo governo holandês, que apontou a falsidade documental, o mandou de volta para o Brasil e avisou as autoridades brasileiras, às quais não restou alternativa a não ser prendê-lo no desembarque.

Junto com o alerta, os holandeses compartilharam toda a história com os órgãos de inteligência e investigação do Brasil. O governo passou a saber, desde então, que por trás dos documentos falsos havia um homem apontado por um país estrangeiro como um espião russo que tentava se infiltrar no tribunal penal — um caso, evidentemente, de repercussão internacional.

A estratégia do Brasil, porém, foi manter tudo sob o mais absoluto segredo. Era para ficar assim. Até que, tempos depois da prisão, e diante do silêncio brasileiro, no último dia 16 de junho o próprio serviço secreto da Holanda fez um comunicado público em que anunciou ter desmascarado o agente russo.

Teoria da conspiração ou realidade?

É quase impossível estabelecer em que medida a leitura feita pelos chefes da inteligência brasileira está calcada na realidade ou se baseia em teorias da conspiração. Mas os argumentos que definiram a sequência da trama são, no mínimo, interessantes.

Junto com o general Augusto Heleno, a cúpula da Abin avaliou que era preciso manejar o caso com todo o cuidado para não melindrar a Rússia. E daí se desenrolaram os passos seguintes: manter discrição e não “comprar” a versão da espionagem.

Foi ao fazer a avaliação que levou a essa decisão que a Abin e o GSI enxergaram o dedo dos Estados Unidos na história. No entender dos oficiais encarregados de analisar o caso, o serviço secreto holandês, que não tem atuação relevante em território brasileiro, não teria condições de descobrir sozinho a história do espião.

A leitura foi a de que a CIA estaria por trás da operação, em parceria com os holandeses, e estaria aproveitando o caso para provocar um estresse diplomático capaz de minar a relação de Brasília com Moscou.

O gabinete de Bolsonaro comprou a avaliação — e avalizou a proposta de não morder o que, para a Abin e para Heleno, seria uma “isca”.

Até hoje, a Abin e o GSI entendem que foi feita a coisa certa. Para os envolvidos na condução do caso, um indício do suposto plano mirabolante de americanos e holandeses é o fato de a Holanda não ter dado publicidade imediata à descoberta.

“Eles, na verdade, esperavam que o Brasil anunciasse a prisão de um espião russo, o que faria barulho e poderia gerar uma crise com Putin. Só que não caímos. E como não anunciamos nada, depois eles mesmos vazaram”, diz, sob reserva, uma fonte a par do caso.

·         A prova

A ordem é deixar o caso na surdina e continuar dando à trama ares de caso ordinário, embora a cúpula da inteligência brasileira acompanhe com máxima atenção os desdobramentos do episódio na Justiça, onde Sergey Cherkasov responderá pelo crime de falsificação de documentos.

Até dias atrás, mesmo nas comunicações reservadas com os serviços secretos estrangeiros, a Abin seguia negando ter elementos para enquadrar o russo como espião. Não está, porém, contando tudo.

A agência dificilmente admitirá, mas já sabe que ele é, sim, um agente a serviço de Moscou. A coluna apurou que os oficiais da inteligência brasileira já têm provas de que, depois de preso, Cherkasov pediu socorro a integrantes dos serviços de inteligência russos.

·         A ficha do espião

No comunicado feito em junho, o serviço secreto holandês afirmou que Sergey Cherkasov trabalha para o GRU, a maior agência de inteligência da Rússia com operações no exterior. O GRU é ligado às Forças Armadas russas.

“Esta foi uma operação do GRU de longo prazo e de vários anos, que custou muito tempo, energia e dinheiro”, declarou Erik Akerboom, do Serviço Geral de Inteligência e Segurança Holandês, o AIVD.

Os holandeses disseram que resolveram dar publicidade ao caso para evidenciar as estratégias da inteligência russa que põem em risco instituições internacionais como o Tribunal Penal Internacional.

Em nota, a agência afirmou que, se o oficial de inteligência tivesse conseguido entrar no TPI, poderia coletar informações, recrutar fontes e até ter acesso aos sistemas digitais da Corte.

O Tribunal Penal Internacional investiga possíveis crimes de guerra cometidos pela Rússia — e por Putin — na Ucrânia.

·         O silêncio continua

A coluna procurou os órgãos brasileiros que tratam ao caso em busca de manifestações oficiais. A Abin afirmou que não comenta. O Itamaraty — indagado, inclusive, se Moscou pediu para que o espião seja devolvido — não respondeu. A Polícia Federal silenciou.

 

Fonte: Metrópoles

 

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