segunda-feira, 1 de maio de 2023

ESPECIALISTA APONTA PONTOS FORTES E FRACOS DO PL DAS FAKE NEWS

Nesta terça-feira (2), será votado em plenário da Câmara o relatório final do PL das Fake News, elaborado pelo deputado Orlando Silva (PCdoB-SP). Apesar do nome, o texto não se limita ao enfrentamento à desinformação, mas configura um novo marco regulatório para a atividade das plataformas de rede social no Brasil. De acordo com a pesquisadora Helena Martins, professora de comunicação da Universidade Federal do Ceará, o projeto traz uma série de inovações para o ambiente virtual brasileiro, mas ainda tende a ser aprovado com algumas falhas.

Helena Martins é uma das especialistas que prestam consultoria ao Comitê Gestor da Internet (CGI), estrutura interministerial que hoje estabelece as diretrizes técnicas para o funcionamento da rede no Brasil. Por tratar de um assunto que afeta diretamente a atividade do CGI, o órgão acompanhou todo o processo de elaboração do PL das Fake News, desde sua proposição no Senado, em 2019, à conclusão do relatório.

Em sua observação, alguns aspectos do texto se destacam em seus efeitos positivos sobre a comunicação digital no Brasil. O principal deles, na sua avaliação, é o impacto sobre como se dará a operação das big techs no Brasil. “É um projeto que busca garantir transparência na operação das plataformas digitais, que se transformaram em espaços tão relevantes mas que operam de forma muito opaca. Nesse sentido, temos a implementação de uma série de mecanismos de transparência algorítmica, transparência nos termos de uso e outras medidas bem importantes para gerar uma apropriação por parte da sociedade sobre o funcionamento dessas estruturas”, explica.

Outro ponto visto com bons olhos por elas é a reforma nos processos internos das plataformas para que usuários possam recorrer caso sofram uma sanção indevida ou queiram fazer denúncias de irregularidades, bem como questionar políticas de conteúdo das empresas. “São mecanismos bem importantes para que as decisões tomadas pelas plataformas não sejam estritamente unilaterais, mas que haja um envolvimento dos usuários das redes sociais na observação dos conteúdos que circulam na internet”, defendeu.

Existem, porém, detalhes do projeto que a pesquisadora avalia como potencialmente nocivos. Entre eles, se destaca um que, se não for mantido, corre o risco do relatório não ser aprovado: a extensão da imunidade parlamentar no meio digital. “Isso é bastante preocupante. Várias pesquisas mostram que, muitas vezes, os parlamentares estão envolvidos na promoção de desinformação. Inclusive, passa por eles a amplificação de campanhas de desinformação. Isso não pode significar um salvo-conduto para que parlamentares continuem operando campanhas desse tipo”, alertou. Esse trecho, porém, é amplamente defendido pelo presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL).

A pesquisadora também considera que, apesar do projeto trazer muitos avanços na responsabilização das plataformas pelo conteúdo em circulação, a forma como consta no texto ainda apresenta brechas. “A proposta do relator, vinda de uma série de conversas, coloca que há um dever de cuidado, mas cria um mecanismo de responsabilização apenas quando há a instauração de um protocolo. As plataformas só são responsabilizadas caso não desenvolvam as medidas instituídas em um protocolo”, explica. Helena afirma preferir a proposta enviada pelo governo, que estabelece uma ação permanente das plataformas no cuidado com seu conteúdo.

O aspecto central do texto, porém, Orlando Silva delegou às lideranças partidárias, que deverão se reunir durante a semana para decidir qual órgão ficará encarregado de fiscalizar a aplicação da nova lei. O melhor modelo, na visão de Helena Martins, seria o de criação de uma nova entidade autônoma, como acontece em outros países onde existem regulações do tipo, a exemplo da França, Austrália e Inglaterra.

Essa possibilidade, porém, foi descartada pelo relator, que identificou uma forte resistência no parlamento para esse modelo. “Eu considero muito ruim que o Brasil não avance no sentido da criação de um modelo regulatório público e participativo, que envolva os mais variados agentes na tomada de decisões”, lamenta. O pior caminho, para ela, seria o modelo de autorregulação das plataformas. Esse segue na mesa de discussões.

·         ANATEL PODERÁ ASSUMIR REGULAÇÃO DA INTERNET, DIZ ORLANDO SILVA

Em entrevista ao vivo para o fundador do Congresso em Foco, Sylvio Costa, o relator do PL das Fake News, deputado Orlando Silva (PCdoB-SP), disse que a Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) poderá, dependendo da evolução das conversas sobre o assunto, cuidar da regulação da internet. Na live, o deputado explica outros pontos polêmicos da proposta e acusa as big techs de fazerem críticas despropositadas ao projeto porque no fundo não querem mudar a situação atual, na qual ganham dinheiro com a desinformação e com atos de incitação à violência, hoje frequentes em suas plataformas.

O PL das Fake News passa por uma longa tramitação. Sua origem foi em 2019, no Senado, onde foi aprovado em três meses. Na Câmara, já se tornou tema de um amplo debate que se iniciou em 2020. Na última terça-feira (25), seu requerimento de urgência foi aprovado em plenário, e seu mérito será discutido no dia 2. Abordando um amplo leque de aspectos do funcionamento das redes sociais no Brasil, o relator optou por deixar para que os líderes partidários decidam em conjunto qual será o órgão responsável por fiscalizar o cumprimento da lei por parte das plataformas digitais. Entre as opções, Orlando mantém na mesa a possibilidade da Anatel assumir o papel.

Por enquanto, o relator acredita em dois possíveis caminhos para essa discussão: ou será criado um departamento na Anatel para fiscalização das redes digitais, ou essa atividade será realizada por meio de autorregulação das plataformas, cabendo à justiça penalizar irregularidades. “Acredito que, até terça-feira, teremos oportunidades para afunilar o caminho que crie o mecanismo para fiscalizar a lei e, eventualmente, aplicar sanções”, anunciou.

 

Ø  PL das Fake News prejudicará o jornalismo, diz Google

 

PL 2630 “desconsidera a troca de valor existente entre plataformas e veículos de notícias e cria um desincentivo para novos investimentos”. A afirmação é de Henrique Matos, diretor do Google na América Latina para a área de parcerias de notícias.

Em texto que o Congresso em Foco publica com exclusividade, ele defende um fundo privado para remunerar o jornalismo, à semelhança do que foi feito em Taiwan.

Com votação marcada para terça-feira (2) na Câmara dos Deputados, o chamado PL das Fake News altera profundamente a legislação para a internet, as redes sociais, o jornalismo e os direitos autorais.

Além da repercussão interna, o assunto é acompanhado com atenção por empresas e profissionais de tecnologia e de mídia de outros países. O peso do mercado brasileiro, afinal, pode influenciar o tratamento dos diversos temas envolvidos nesse debate em outras nações.

LEIA O TEXTO DO DIRETOR DO GOOGLE:

Compartilhamos o objetivo do governo de combater a desinformação e reconhecemos que fortalecer o jornalismo de qualidade é uma parte importante para isso. Infelizmente, o Projeto de Lei 2.630 que tramita na Câmara, colocará em risco os investimentos para combater a desinformação e fortalecer o jornalismo ao criar obrigações sem precedentes para as plataformas de tecnologia que “usam” notícias. A proposta coloca preço em links em buscadores e agregadores de notícias, impactando diretamente na sua capacidade de encontrar e acessar livremente páginas na Internet.

A capacidade de acessar e compartilhar informações livremente na web aberta tem sido fundamental para a internet. Quando você faz uma pesquisa e o conteúdo das notícias é exibido, você clica no link para a página da web de um editor de notícias. O Google envia brasileiros para sites de notícias mais de dois bilhões de vezes por mês – de graça. Esse tráfego valioso é o que os editores de notícias usam para monetizar seu conteúdo com publicidade e assinaturas.

Além desse tráfego valioso, somos um dos maiores financiadores do jornalismo no mundo por meio de nossos programas, parcerias e produtos. Desde 2018, por meio da Google News Initiative, investimos milhões de reais em treinamentos e parcerias, incluindo organizações de checagem de fatos e iniciativas que promovem a educação midiática para jornalistas, associações e profissionais do setor. E, desde 2020, estamos remunerando diretamente mais de 150 veículos de notícias, em mais de 20 estados brasileiros, por meio do Google Destaques, um programa de licenciamento de conteúdo.

PL 2630 deveria reconhecer e estimular investimentos como esses, mas, ao contrário, desconsidera a troca de valor existente entre plataformas e veículos de notícias e cria um desincentivo para novos investimentos. Acreditamos que essa discussão precisa ser baseada em fatos e que não favoreça alguns grupos de mídia em detrimento de outros. Assim, pensamos em soluções construtivas para fazer isso:

Propomos que um artigo sobre remuneração jornalística deve reconhecer o investimento existente no ecossistema noticioso brasileiro e incentivar o desenvolvimento de modelos de inovação que apoiem o jornalismo Blog do Google Brasil por meio de características de produtos, programas de compartilhamento de receitas, licenciamento de conteúdo ou outras formas de criação de valor acordadas com as organizações de notícias ou entidades representativas.  Sem reconhecimento explícito, haverá pouco incentivo para que esses esforços de parceria continuem existindo.

Também incentivamos o governo, veículos jornalísticos, associações, plataformas e outros a trabalharem juntos para buscar alternativas à proposta de remuneração presente no texto, incluindo a possibilidade de um fundo de inovação para o jornalismo, administrado de forma independente, que inclua contribuições de empresas de tecnologia. Um fundo como esse pode ajudar a garantir a sustentabilidade e independência ao modelo de fomento do jornalismo de qualidade no Brasil. Esse fundo poderia oferecer financiamento de acordo com critérios mensuráveis e claramente definidos, benefícios para toda a indústria – em vez de apenas alguns veículos ou grupos específicos, e pode estar sujeito a supervisão independente, impedindo a tomada de decisões políticas.

Fundos como este foram introduzidos recentemente em outros países. Em Taiwan, no início deste ano, em parceria com o governo e a indústria local de notícias, lançamos o Taiwan News Digital Co-prosperity Fund, uma iniciativa dedicada a apoiar o futuro do jornalismo digital na região. O fundo demonstra como, por meio da colaboração, plataformas digitais e organizações de notícias podem se unir para promover um futuro sustentável para as notícias.

No Brasil, temos conversado com gestores do legislativo, associações e organizações do setor jornalístico, buscando soluções que contribuam para o futuro do jornalismo, e não o contrário. Acreditamos que as propostas que fazemos oferecem um caminho sustentável para continuar a apoiar o futuro do jornalismo no país.

·         Como o PL 2630 pode prejudicar o jornalismo, se não for revisado

Temos sérias preocupações de que, se o Projeto de Lei 2630 não for revisado, isso prejudicaria o jornalismo no Brasil como consequência não intencional de disposições amplas e vagas no artigo que trata da remuneração das
organizações de notícias.

<<< Especificamente:

·         Põe em risco os atuais e desencoraja novos investimentos em organizações de notícias 

O texto não reconhece o valor e apoio existentes que plataformas como o Google oferecem às organizações de notícias e ao ecossistema jornalístico. Pior ainda, o projeto de lei desincentiva plataformas e veículos de notícia a inovar maneiras de ajudar mais pessoas a acessar conteúdos de notícia. Esse é justamente o efeito oposto ao pretendido pelo projeto de lei.

·         Exige que as plataformas veiculem conteúdo potencialmente desinformativo e prejudicial 

O projeto de lei restringe a capacidade das plataformas de remover conteúdo publicado de qualquer suposta fonte jornalística que se enquadre na definição ampla de organização de notícias, mesmo quando o conteúdo é identificado como desinformação. Como consequência, isso pode dificultar a busca de conteúdo jornalístico de qualidade e, assim, prejudicar o combate à desinformação.

·         Reduz acesso e receita para os sites jornalísticos, especialmente os menores. 

Como efeito dos impactos descritos acima, o resultado será a redução do tráfego gerado – hoje, gratuitamente – aos veículos de notícias pelos buscadores e agregadores de notícias, além de comprometer a capacidade das pessoas de descobrir novos sites de notícias, com uma variedade de pontos de vista e opiniões no país.

 

Fonte: Congresso em Foco

 

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