Lula prioriza economia e elevação da receita na volta do Congresso
O governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva
(PT) manterá a economia no topo de suas prioridades no Congresso Nacional no
segundo semestre. Atenção especial será destinada a projetos que buscam elevar
a arrecadação federal e contribuir para o plano do ministro Fernando Haddad
(Fazenda) de zerar o déficit e reequilibrar as contas públicas.Senadores e
deputados voltam aos trabalhos nesta terça-feira (1) ainda tendo sobre a mesa a
conclusão da análise das três prioridades da área no primeiro semestre: os
projetos do novo arcabouço fiscal, o que devolve ao Executivo o voto de minerva
na análise de conflitos tributários e a PEC (propostas de emenda à
Constituição) da Reforma Tributária.
O governo também deve enviar um novo bloco de
medidas consideradas necessárias para fechar o Orçamento de 2024, mas que podem
enfrentar resistências entre parlamentares.
A retomada da discussão da pauta econômica ocorre
em meio às tratativas entre Lula e o centrão para selar o embarque no governo
do PP, do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e do Republicanos, com a
ocupação de ministérios por representantes dessas siglas na Esplanada.
Embora Haddad mantenha boa interlocução com Lira,
membros do governo reconhecem que a agenda tem sido usada para ampliar o poder
de barganha do bloco nessas negociações. Em julho, o presidente da Câmara
inverteu a pauta para dar preferência à Reforma Tributária, apesar de a
prioridade do governo ser o novo arcabouço fiscal –que acabou ficando para
agosto.
Agora, o foco número um da equipe econômica é
garantir a conclusão da votação dessa nova regra para as contas públicas, que
será mais flexível do que o atual teto de gastos. É ela que balizará o
Orçamento de 2024, a ser enviado até 31 de agosto. O arcabouço já foi aprovado
na Câmara e no Senado, onde sofreu alterações. Por isso, precisa passar
novamente pelos deputados.
A expectativa é que Lira convoque uma reunião logo
no início da próxima semana para discutir com o relator, deputado Claudio
Cajado (PP-BA), e lideranças na Casa os pontos modificados no Senado e a data
de votação. No governo, espera-se que a etapa final da proposta seja concluída
ainda no mês de agosto.
A Reforma Tributária, por sua vez, foi aprovada na
Câmara graças aos interesses compartilhados entre o governo e Lira, que se
colocou como fiador da proposta de olho numa espécie de “selo de qualidade” que
o avanço da medida pode conferir à sua gestão.
O texto ainda não chegou oficialmente ao Senado,
mas já tem relator, o senador Eduardo Braga (MDB-AM). Ainda não há um
cronograma de trabalho, mas as negociações já começaram. Uma das maiores
polêmicas é qual será a alíquota futura dos novos tributos, que vão substituir
os atuais PIS, Cofins, IPI, ICMS e ISS.
O governo tem alertado que o elevado número de
exceções ao regime padrão aprovado na Câmara –que contemplou de times de
futebol a igrejas– pode tornar a tributação mais pesada para todos. O lobby dos
setores, porém, vai justamente na direção de buscar para si um tratamento
favorecido ou diferenciado, ampliando a lista de flexibilizações.
Haddad tem dito publicamente que aposta no Senado
para limitar as concessões feitas na Câmara, mas técnicos experientes comparam
o impasse a um dentifrício: uma vez que a pasta saiu do tubo, não há como
recolocá-la para dentro.
Outro projeto na pauta de prioridades da equipe
econômica é o devolve ao governo o chamado voto de qualidade no Carf (Conselho
Administrativo de Recursos Fiscais). Esse mecanismo dá ao governo o poder de
desempate em julgamentos de litígios tributários, o que poderia assegurar parte
das receitas que ajudariam a zerar o déficit.
O governo projeta uma arrecadação de cerca de R$ 40
bilhões com a proposta, embora a Câmara tenha incluído uma série de jabutis que
podem reduzir esse potencial. O texto ainda precisa ser analisado pelo Senado.
Relator da proposta, o senador Otto Alencar
(PSD-BA) disse que se reunirá nesta semana com o relator da medida na Câmara,
Beto Pereira (PSDB-MS). Ele disse esperar que o tema seja aprovado ainda em
agosto.
Além desses três temas, os parlamentares precisam
analisar o PLDO (projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias) de 2024, que fixa
formalmente a meta fiscal de déficit zero para o ano que vem, e o novo bloco de
medidas de Haddad para ampliar a arrecadação e reequilibrar as contas públicas.
O governo calcula precisar de um adicional de R$
130 bilhões (já incluindo nesse valor o projeto do Carf), mas trabalha com um
amplo cardápio de medidas para ter margem de manobra.
Uma das iniciativas é a MP (medida provisória) que
regulamenta o mercado de apostas esportivas, que estabelece taxação de 18%
sobre as receitas obtidas com jogos, descontados os prêmios pagos. A estimativa
preliminar da Fazenda é arrecadar R$ 2 bilhões, mas a expansão do mercado pode
elevar esse valor a algo entre R$ 6 bilhões e R$ 12 bilhões.
Líderes partidários afirmam que a MP deve virar
alvo de diferentes segmentos com representação no Congresso, em uma briga para
aprovar emendas que lhes direcionem alguma fatia da receita. O projeto vem,
inclusive, aguçando o interesse do centrão pela pasta do Esporte, que é
destinatária de 3% da alíquota de 18%.
Outra ideia para elevar o bolo de receitas federais
é o envio, pela equipe de Haddad, da proposta de taxar os rendimentos em fundos
exclusivos de investimentos, usados por super-ricos para manter suas aplicações
sem necessidade de recolher impostos anualmente.
O tema será um relevante ponto de divergência, por
se tratar da taxação de um segmento com forte poder de pressão no Legislativo.
Tentativas passadas de taxar fundos exclusivos esbarraram nas resistências de
parlamentares, insufladas por investidores. A medida também já foi criticada
por Lira, para quem a mistura desse tema com a Reforma Tributária em discussão
no Senado pode “embolar esse meio de campo”.
Alguns parlamentares, porém, avaliam haver apoio da
população à medida, o que dificultará oposição ferrenha à pauta.
Ainda distante do foco de prioridades do governo, a
reforma administrativa também foi apresentada por Lira como um dos temas a que
a Câmara deve se dedicar neste segundo semestre.
Parlamentares dizem que, apesar do apoio do
parlamentar, a falta de interesse do governo e a resistência histórica ao tema
por parte do PT, que tem no setor sindical um de seus pilares de sustentação,
são forças contrárias. Além disso, a reforma administrativa que interessa ao
governo é totalmente diferente da PEC que tramita na Câmara e que foi
apresentada ainda na gestão de Jair Bolsonaro (PL).
Por outro lado, o sucesso da aprovação da Reforma
Tributária, que tinha um histórico de décadas de idas e vindas, leva alguns
congressistas a dizer ser possível a costura de um acordo para também
desbloquear a administrativa.
Outro projeto que irá a discussão em agosto é o do
Desenrola, programa de renegociação de dívidas e promessa de campanha de Lula.
O deputado Alencar Santana (PT-SP), relator da
proposta, afirmou que irá manter no texto a previsão de um limite para os juros
cobrados no rotativo do cartão de crédito. Em maio, os juros dessa modalidade
atingiram a média de 455% ao ano, o maior patamar em mais de seis anos. Os
bancos são contra e tentam barrar esse ponto.
Em todos esses temas, o jogo de forças no Congresso
exige a atenção do governo. Lula foi eleito com a mais estreita margem da
história e, além disso, viu a base de esquerda ocupar apenas cerca de um quarto
das cadeiras do Congresso, o que o obrigou a buscar composição com partidos de
centro e de direita.
Após amarrar o apoio de MDB, PSD e União Brasil,
esse último com consideráveis focos de dissidência, o petista busca agora
atrair o PP de Lira e o Republicanos. Isso lhe proporcionaria uma folga formal
considerável de 374 dos 513 votos na Câmara, mas a conta real é incerta devido
às prováveis dissidências.
AS PROPOSTAS DE INTERESSE DO GOVERNO NO CONGRESSO
< Novo arcabouço fiscal: aprovado por Câmara e
Senado e agora pendente de nova votação na Câmara
< Recriação do voto de qualidade do Carf:
aprovada na Câmara e pendente de votação no Senado (caso haja mudanças, volta
para a Câmara)
< PEC da Reforma Tributária: aprovada na Câmara
e pendente de votação no Senado (caso haja mudanças, volta para a Câmara)
< Projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias de
2024: já enviado, precisa ser aprovado na CMO (Comissão Mista de Orçamento) e
no plenário do Congresso Nacional (votação conjunta)
< MP das apostas esportivas: já enviada, precisa
ser aprovada nas duas Casas
Tributação de offshores: texto que muda regras de
taxação de recursos mantidos por brasileiros em paraísos fiscais já foi enviado
por meio de MP e precisa de aprovação nas duas Casas, mas ainda pode ser
inserido em outra proposta
< Mudança nas regras do JCP (mecanismo vantajoso
usado pelas empresas para remunerar seus acionistas): governo quer enviar até
31 de agosto para compor projeto de Orçamento; precisa ser aprovada nas duas
Casas
< Proposta de Orçamento de 2024: precisa ser
enviada até 31 de agosto e aprovada na CMO e no plenário do Congresso
< Proposta para taxar fundos exclusivos: governo
quer enviar até 31 de agosto para compor projeto de Orçamento; precisa ser
aprovada nas duas Casas
< Proposta do Desenrola: será inserida em outro
projeto e precisa ser aprovada nas duas Casas
Congresso
retoma trabalhos mirando conclusão de propostas econômicas
O Congresso Nacional retoma nesta terça-feira (1º)
os trabalhos, após um período de recesso informal. Deputados e senadores devem
mirar a conclusão de votações importantes na área econômica.
Estão na lista de projetos prioritários a reforma
tributária, o novo marco fiscal e as alterações em regras de julgamento do
Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf).
As sessões plenárias da Câmara e do Senado ainda
não foram convocadas, mas costumam ser realizadas às terças, quartas e
quintas-feiras. Os deputados também podem deliberar remotamente às segundas e
sextas.
Além das pautas previstas para o plenário das duas
casas, as Comissões Parlamentares de Inquérito (CPIs), como a dos Atos Golpistas
e a das Americanas, voltam às atividades com depoimentos.
Ainda nesta semana, a Câmara deve instalar uma
comissão especial para analisar a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que
anistia partidos políticos por não cumprir cotas a mulheres e negros. O texto
também perdoa irregularidades em prestações de contas.
Também podem ser levados à votação neste segundo
semestre projetos enviados pelo governo durante o recesso. O Planalto já
anunciou pacote para impulsionar o crédito aos estados, regulamentar apostas
esportivas e endurecimento de penas em crimes contra o Estado Democrático de
Direito e escolas.
• Prioridades
do governo
Alinhado ao presidente da Câmara, Arthur Lira
(PP-AL), o governo pretende aumentar a base de apoio político no Congresso e
ganhar mais força em negociações de pautas de interesse do Planalto.
O governo pretende negociar e trocar comandos de
ministérios para elevar o número de aliados.
Durante o recesso, o presidente Luiz Inácio Lula da
Silva (PT) deu início à acomodação de pedidos das siglas do chamado Centrão. O
deputado Celso Sabino (União-PA) foi nomeado ao comando do Ministério do
Turismo.
Lula já sinalizou que novas trocas devem ocorrer
somente em agosto, com o término do recesso parlamentar.
Entre as prioridades do Planalto neste segundo
semestre estão:
• concluir
a reforma tributária;
• aprovar
propostas consideradas fundamentais para a economia, como o "Desenrola
Brasil", a nova política de salário mínimo e a isenção do Imposto de
Renda;
• aprovar
o marco regulatório do crédito de carbono e transição ecológica;
• e
aprovar projeto que trata sobre a retomada de obras na educação.
>>> CPIs
5 CPIs estão em funcionamento neste momento no
Congresso. Quatro estão vinculadas à Câmara — das Americanas, da Manipulação no
Futebol, das Pirâmides Financeiras e do MST. A CPI dos Atos Golpistas é mista —
ou seja, reúne deputados e senadores.
A CPI dos Atos Golpistas retomará os trabalhos na
terça-feira (1º) com o depoimento do ex-diretor-adjunto da Agência Brasileira
de Inteligência (Abin) Saulo Moura da Cunha.
Estão previstas ainda reuniões das comissões de
inquérito das Americanas e das Pirâmides Financeiras:
• terça
(1º): CPI das Americanas ouve executivos da KPMG, da PricewaterhouseCoopers e
ex-diretores da empresa
• quinta
(3): CPI das Pirâmides Financeiras ouve Francisley Valdevino da Silva,
proprietário da Rental Coins
• PEC
da Anistia
Está agendada para quarta-feira (2) a instalação de
uma comissão especial que vai analisar a PEC que anistia partidos políticos por
prestação de conta irregular e descumprimento de cota para mulheres e negros
nas últimas eleições.
A proposta foi aprovada na Comissão de Constituição
e Justiça (CCJ) da Casa e, agora, terá o mérito discutido no colegiado.
Após o término da análise na comissão, o projeto
deve ser levado ao plenário, onde precisará do apoio de, no mínimo, 308
deputados para ser aprovado em dois turnos de votação.
• Marco
Legal das Garantias
Abordado em reunião entre Lira e o ministro
Fernando Haddad (Fazenda), o projeto que muda as regras para o uso de bens como
garantia para empréstimos também deve estar na pauta deste semestre.
O texto, chamado de Marco Legal das Garantias, já
foi aprovado no Senado e trata das condições exigidas para realização de
penhora, hipoteca ou em caso de transferência de imóvel para pagamento de
dívida (alienação fiduciária).
De acordo com a proposta, um mesmo bem poderá ser
usado como garantia em mais de pedido de empréstimo.
O texto deve ser analisado pelos deputados, em uma
nova rodada de discussões na Casa.
Fonte: FolhaPress/g1
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