O que a Fitch disse foi que a retomada da Democracia pelo Brasil é um
enorme trunfo político-econômico
A prestigiosa agência de classificação de riscos
Fitch, mais especializada em fazer análises macroeconômicas de países e
examinar balanços e comunicações de bancos e empresas, para emitir pareceres,
surpreendeu meio mundo da economia ao elevar esta semana a nota de risco do
Brasil. O país, que perdeu, em 2018, o grau de investimento conquistado em
2008, foi elevado da nota BB- para BB. Ainda faltam dois degraus para
conquistar a nota BBB-, que já permite receber investimentos de fundos de
pensão e outros investidores institucionais em projetos de infraestrutura.
O dado curioso, pelo menos para os analistas de
economia, foi que a Fitch valorizou muito mais os avanços institucionais, do
ponto de vista político do governo Lula, do que da agenda econômica que avança
pelo Congresso e pela inflação que caiu para um terreno mais palatável. A Fitch
parodiou o marqueteiro de Bill Clinton, James Carville, que respondeu, quase de
modo rude, à perplexidade do presidente George Bush (pai) sobre sua derrota
para o quase desconhecido governador de Arkansas.
“É a economia, estúpido”, disse Carville, que
também era economista. (“stupid”, no original, em inglês, tinha mais o sentido
de tolo e idiota). Mas, o fato é que o presidente-herói de um ano atrás, quando
liderou a coalizão dos aliados que expulsou Saddam Hussein do Kuwait, mas não
teve mandato para marchar até Bagdá para destituir o ditador do Iraque, perdeu
nas urnas para o fraco desempenho da economia. Clinton botou a economia nos
trilhos e foi reeleito. Coube ao filho, George W. Bush. Retomar o controle da
Casa Branca para os Republicanos e marchar sobre Bagdá, mas isso é uma longa
história de mentiras.
No caso brasileiro, o que agência quis dizer foi
que a retomada institucional da Democracia é um enorme trunfo
político-econômico para o Brasil. De que adianta fazer reformas e ter
economistas liberais à frente do governo – caso dos quatro anos de Jair
Bolsonaro – se o líder do Executivo está em pé de guerra permanente com o
Congresso (Poder Legislativo) e o Supremo Tribunal Federal (STF) que representa
o Poder Judiciário.
Os quatro anos do governo Bolsonaro colocaram o
país em sobressalto permanente, situação agravada pelo desastre descomunal da
gestão da pandemia da Covid-19. De pouco adiantava ter uma agenda ultraliberal
na economia, com afronta aos direitos das minorias, índios e ao meio ambiente,
se tudo isso era malvisto entre os investidores institucionais.
Nenhum fundo de pensão ou grandes empresas que
respeitam os princípios ESG (de governança socioambiental) irá investir em país
que não respeita a agenda climática global e nem os princípios democráticos. A
estabilidade das regras do jogo começa pelo bom funcionamento institucional.
Cada Poder no seu quadrado, com autonomia, interdependência e respeito ao
espaço do outro. Todos sob a égide da Constituição Federal de 1988, cujo
intérprete é o STF.
·
Os limites de cada um
Tem toda razão o presidente Lula de querer buscar
reforçar a base política de seu governo no Congresso, sobretudo na Câmara, para
poder avançar, sem sobressaltos, na sua agenda de propostas. A composição da
Câmara foi bem maior no sentido da prevalência de propostas conservadoras e de
direita do que do Senado, onde houve a renovação de apenas um dos três mandatos
de senadores. Por isso, Lula está disposto a sacrificar anéis para preservar os
dedos. Os piadistas de plantão diriam que ele tem de ser cuidadoso, para não
perder mais um.
A questão é que a iniciativa das agendas do governo
tem de partir do governo e de sua base aliada, e não de decisões monocráticas
do presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL). Lira é um dos
próceres do “centrão”, mas a negociação política do governo se dá com os
partidos políticos e suas respectivas lideranças. Os acertos entre o Executivo
e o Legislativo (Lira pela Câmara e Rodrigo Pacheco pela presidência do Senado
e do Congresso) devem correr pela via institucional.
Não cabe a Lira ser o interlocutor e o fiador dos
partidos que vão aderir ao governo, pois quem tem de gerir o governo e o
desempenho dos novos aliados é o presidente Lula. Muito menos podem ser o
presidente da Câmara (e o presidente do Senado) os senhores da agenda do
Senado. Tudo tem de ser discutido entre as lideranças do governo e dos partidos
que formam sua aliança, com as mesas diretoras das duas casas. Do contrário, um
Poder estará interferindo na seara alheia.
Infelizmente, tudo tem a ver com o desarranjo entre
a forma e o conteúdo da Constituição de 1988. O presidente da Câmara (e da
Assembleia Nacional Constituinte), deputado Ulysses Guimarães, desenhou com
seus pares uma Constituição para um regime parlamentarista de poder, ao estilo
europeu. Um presidente com menor representação e um primeiro-ministro eleito
pelos partidos que compunham a base eleitoral do governo (num sistema com
número limitado de partidos, que só teriam representação no Parlamento se
cumprissem um mínimo de desempenho eleitoral.
Na última hora, Ulysses Guimarães foi cauteloso e
deixou para que um plebiscito, cinco anos depois, escolhesse a forma de regime
e de governo, entre monarquia e presidencialismo parlamentarista e regime
presidencialista. A prática das medidas provisórias, que são instrumentos de
gabinetes parlamentaristas, ficou. Mas, com bases parlamentares tão
fragmentadas, elas viram bombas prestes a explodir às vésperas de caducar o
tempo para aprovação na Câmara.
Sobretudo quando o presidente da Câmara é o senhor
da ampulheta e dos funis de encaminhamento das MPs à votação. Faz parte da
cultura do governo Bolsonaro, que só pensava naquilo: o exercício do poder
absoluto, com subserviência do Congresso e do Poder Judiciário ao poder da
força, que julgava encarnar ao invocar “o meu Exército” e “as minhas forças
armadas”, cujo conceito espraiou ao autorizar o porte de armas a tortos e à
direita.
O presidente Lula não pode perder a oportunidade de
uma arrumação institucional duradoura nessa questão. Sob pena de mais
sobressaltos adiante.
·
A dupla dinâmica
As últimas revelações do assassinato brutal da
vereadora Marielle Franco (PSol-Rio) e do motorista Anderson Gomes, em março de
2018, mostram que quando o Ministério Público atua em conjunto com a Polícia
Federal há um enorme salto de qualidade nas investigações policiais. Quando meu
tio, Geraldo de Menezes Côrtes, comandava a Polícia Federal no então Distrito
Federal (1954, após a posse do presidente Café Filho, vice que assumiu em
seguido ao suicídio de Getúlio Vargas, até 1955, quando foi preso por ordem do
ministro do Exército, Henrique Teixeira Lott, que o nomeara, sob suspeita de
ligação com os coronéis que se insurgiam contra a vitória de JK), ele
encomendou estudo para que o Ministério Público fizesse o Juízo de Instrução
nas Delegacias Policiais.
Quem se acostuma a ver séries policiais nos Estados
Unidos, sobretudo o seriado “Lei e Ordem”, percebe que quem conduz os
inquéritos e as investigações são os promotores do MP. Eles instruem a polícia
civil para colher as provas (tudo é feito com o rigor científico – nos filmes,
a precisão é absoluta, na vida real, nem, tanto).
Mas o fato é que o Juízo de Instrução resolve 80%
dos casos no nascedouro, sem que os processos se arrastem, atravancando as
pautas do Judiciário para questões mais importantes. E o fundamental é que a
resolução da maior parte de Registros de Ocorrência (de colisões no trânsito,
com ou sem vítimas), brigas nas ruas ou no recesso do lar, agressões sexuais e
crimes de racismo pode ser resolvida com a rápida acareação dos envolvidos na
delegacia, com imediata homologação de acordos ou de início de processos, som
eventual soltura dos indiciados mediante fianças pesadas.
Só o afastamento da sensação de impunidade – que é
a praxe no Brasil – substituída pela sensação de que a cada crime há um
castigo, muda o horizonte de forma fundamental. O atual ministro da Justiça e
da Segurança Pública, Flávio Dino, à parte estar liderando as investigações de
forma exemplar, pela Polícia Federal, sob seu comando, dos atentados à
Democracia no 8 de janeiro, é uma prova viva da mudança de rumo do Ministério
no governo Lula. Mas, como Juiz de Direito que é, precisa levar adiante a
mudança dos inquéritos policiais no Brasil.
A comparação com os antecessores chega até a
desabonar o atual ministro, pelo simples fato de sermos obrigados a fazer a
comparação. O primeiro ministro de Bolsonaro, o também Juiz de Direito de
Bolsonaro, Sérgio Moro, a despeito de sua fama na Operação Lava-Jato, que
Bolsonaro ajudou a sepultar para evitar investigações sobre os aliados
políticos, ficou tolhido no ministério pela agenda bolsonarista de liberação
das armas e seguidas interferências na Polícia Federal, para evitar que
investigações de surpresas atingissem seus amigos e parentes (a história está
mostrando que havia muitos motivos para o ex-presidente algemar as mãos da PF).
E não era só o caso das rachadinhas no gabinete do
ex-deputado estadual e atual senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ), que teve vários
inquéritos anulados com destruição (para efeitos legais) de provas já colhidas
nas sucessivas trocas de policiais que dirigiram os inquéritos na Polícia Civil
do Estado do Rio de Janeiro e no Ministério Público do RJ e do próprio Tribunal
de Justiça do Estado do Rio de Janeiro. Muitas estranhas reviravoltas.
Mas nada se compara ao caso Marielle. A mudança da
água para o vinho na gestão de Flávio Dino mostra que havia uma cúmplice
omissão da máquina Policial-Judiciária anterior. No caso do sucessor de Sérgio
Moro, que teve a hombridade de renunciar ao cargo, no dia seguinte, depois da
descompostura pública que foi a reunião ministerial de 22 de abril de 2020,
quando Bolsonaro disse que trocaria os superintendentes, o diretor (da PF) e
até o ministro para não “fazerem sacanagens com os meus”, mas se recompôs com
Bolsonaro em 2022..., a omissão parece ser a palavra de ordem de Anderson
Torres.
Policial federal, Torres, era secretário de
Segurança do Distrito Federal, com jurisdição sobre Brasília, e voltou ao
cargo, em dezembro do ano passado, após a derrota de Bolsonaro para Lula. Mas,
estranhamente, enquanto bolsonaristas acampavam tranquilamente em frente aos
quartéis das forças armadas em Brasília, sobretudo diante do “Forte Apache”,
apelido do QG do Exército (se fossem índios ou sem terras, imediatamente seriam
detidos), Anderson Torres ignorou (!) e abandonou o serviço antecipando férias
para os Estados Unidos em 6 de janeiro, quando era imensa a mobilização dos
golpistas marchando de vários cantos do Brasil sobre Brasília.
Torres foi se juntar (não oficialmente) ao
ex-presidente na Flórida, até ser intimado e preso em fevereiro. As pontas de
uma investigação fecham mais facilmente quando há uma força-tarefa do
Ministério Público conduzindo as diligências e acionando o braço policial para
colher provas. Há exageros, como ficou patente nos abusos da Lava-Jato, mas o
risco de um Boletim de Ocorrência cair no vazio será bem menor com o juízo de
instrução. E a impunidade deixará de ser incentivo ao crime. Antes de agir (na
certeza da impunidade que existe hoje), o cidadão há de pensar duas vezes e
perceber que o crime não compensa.
Ø Haddad: Informalidade é subproduto da desaceleração econômica causada
por política monetária
Na defesa por juros mais baixos no País, o ministro
da Fazenda, Fernando Haddad, afirmou que apesar da queda da taxa de desemprego,
a desaceleração econômica causada pela política monetária se manifesta no
aumento da informalidade no mercado de trabalho. As declarações foram feitas ao
jornalista Luis Nassif, em entrevista neste sábado, 29.
Ele argumentou que os pedidos de seguro-desemprego
e a informalidade aumentaram, mesmo com a queda no desemprego, que chegou a 8%
no segundo trimestre, menor taxa para o período desde 2014. Já o mercado de
trabalho formal registrou um saldo positivo de 157.198 postos com registro em
carteira em junho, de acordo com Ministério do Trabalho, abaixo das
expectativas.
O ministro voltou a falar que o orçamento é
suficiente para acabar com fome e extrema pobreza no Brasil. Ele citou que é
necessário, para isso, “ir atrás de quem realmente está precisando”. Para ele,
isso passa pela reorganização do CadÚnico, sistema de cadastro de famílias que
recebem auxílios, que está sob a gestão do ministro do Desenvolvimento e
Assistência Social, Família e Combate à Fome, Wellington Dias.
·
Pauta legislativa
No marco de garantias, Haddad disse que espera que
os dispositivos de penhorabilidade de bens de família, excluídos no Senado, não
sejam inseridos pela Câmara. Já no Projeto de Lei das Fake News, o titular da
Fazenda comentou que dará trabalho ao Congresso encontrar a “linha fina” entre
liberdade de expressão e censura, mas que o governo está debruçado em criar uma
cadeia de responsabilização.
“Eu que vivi eleições de 2018,
como vítima do processo, sei que não é fácil lidar com fake news, que tem efeito
rápido. Responsabilização vem depois”, disse, em referência à disputa com Jair
Bolsonaro na qual saiu perdedor.
Segundo Haddad, o presidente Luiz Inácio Lula da
Silva determinou que a Fazenda apresente soluções para incorporação de
tecnologia para as empresas brasileiras. “O presidente quer que a transferência
de tecnologia seja uma questão central do plano de transição ecológica”, disse
Haddad.
O plano que o ministério vai apresentar tem um
capítulo dedicado ao assunto, segundo o ministro. Haddad aponta que a
importância do tema gerou, inclusive, a revisão da cláusula de compras
governamentais do acordo do Mercosul com a União Europeia.
Fonte: Por Gilberto Menezes Côrtes, no Jornal do
Brasil/Jornal de Brasilia
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