Provas e
depoimentos que basearam a ação que tornou Jair Bolsonaro inelegível
Depoimentos
e provas basearam o voto de cerca de 400 páginas do ministro Benedito Gonçalves
que levou à condenação, por 5 votos a 2, do ex-presidente Jair
Bolsonaro (PL) por abuso de poder político e uso indevido dos
meios de comunicação no Tribunal
Superior Eleitoral (TSE). Bolsonaro também foi declarado nesta
sexta-feira (30) inelegível
por oitos anos, contados a partir da data das eleições de 2022.
Os
documentos compõem os autos da ação apresentada, em 2022, pelo PDT, que
questionou a legitimidade de uma reunião na qual Bolsonaro reuniu
embaixadores estrangeiros para fazer ataques sem fundamento ao sistema
eleitoral e às urnas eletrônicas.
O
encontro, ocorrido em julho passado, foi transmitido pela TV Brasil e usou a
estrutura pública do Palácio da Alvorada, residência oficial do presidente da
República.
Ao
ler seu voto na última terça (27), Gonçalves defendeu a
condenação do ex-presidente pela prática de abuso de poder
político e de uso indevido de meios de comunicação nas eleições de 2022. Em
consequência, votou para torná-lo inelegível por oito anos.
O
voto foi seguido pelos ministros Floriano de Azevedo e Marques, André Ramos
Tavares, Cármen Lúcia e Alexandre de
Moraes (relembre no vídeo abaixo).
·
Confira, a seguir, o conteúdo que baseou o voto de
Benedito Gonçalves:
<<<<<<< Provas
▶️ Transcrições e íntegras de lives de 2021 e 2022
A
ação conta como provas as íntegras e as transcrições de lives promovidas, entre
2021 e 2022, pelo então presidente Jair Bolsonaro a respeito de supostas
fraudes no sistema eleitoral brasileiro.
No
ano de 2021, foram colhidos conteúdos de lives de julho de agosto:
- julho: transmissão
na qual Bolsonaro afirmou que apresentaria provas de fraudes nas urnas
eletrônicas ao lado de um suposto especialista em segurança digital. Na
ocasião, porém, o então presidente disse
não ter provas para afirmar que houve fraude ou que havia
risco de fraude. O então ministro da Justiça, Anderson Torres, apresentou
um relatório da Polícia Federal a respeito das eleições de 2016 que, na
avaliação dele, indicariam sugestões para aprimorar a segurança das urnas.
- agosto: transmissões
antes e depois da derrota da proposta de emenda à Constituição (PEC) que
implantava o voto impresso. Em uma das transmissões, Jair Bolsonaro e o
deputado federal Filipe Barros (PL-PR) divulgam inquérito
da PF a respeito de um ataque hacker ao TSE nas eleições
de 2018. Na ocasião, os dois afirmaram que o documento apresentava
indícios de que votos poderiam ser fraudados.
Estão
presentes também conteúdos relacionados à reunião de
Bolsonaro com embaixadores, no Palácio da Alvorada, em julho de
2022. O encontro é o objeto central da ação.
Segundo
o relator, ministro Benedito Gonçalves, as lives protagonizadas por Jair
Bolsonaro em 2021 demonstram uma repetição e escalada do discurso contra o
sistema eleitoral até 2022.
▶️ Transcrições dos depoimentos
Constam
nos autos as transcrições de depoimentos tomados na ação entre 2022 e 2023.
Estão na lista:
- Carlos França,
ex-ministro das Relações Exteriores;
- Ciro Nogueira,
ex-ministro da Casa Civil;
- Anderson Torres, ex-ministro da Justiça;
- Flávio Augusto Viana Rocha, ex-secretário especial de Assuntos
Estratégicos da Presidência;
- Ivo de Carvalho Peixinho e Mateus de Castro Polastro, servidores da Polícia Federal;
- Filipe Barros (PL-PR), deputado federal;
- Vitor Hugo,
ex-deputado federal;
- e Augusto Nunes, apresentador.
▶️ Inquéritos
Os
autos da ação que condenou Jair Bolsonaro à inelegibilidade contam com
inquéritos em andamento no Supremo Tribunal Federal (STF),
no TSE e na Justiça Federal de São Paulo.
Em
relação ao STF, estão juntadas apurações conduzidas nos procedimentos que
apuram a existência milícia
digital contra a democracia e os atos antidemocráticos.
Os inquéritos são relatados na Corte pelo ministro Alexandre de Moraes, que
preside o TSE.
Está
presente também o inquérito
aberto no STF para apurar o vazamento, pelo então presidente Jair
Bolsonaro, de dados sigilosos relativos à apuração conduzida pela Polícia
Federal a respeito de um ataque hacker ao TSE nas eleições de 2018. A apuração
sobre o episódio conduzida pela Justiça Federal de São Paulo também foi
adicionada à ação.
Benedito
Gonçalves ainda juntou aos autos um inquérito administrativo do TSE que apura
"fatos que possam configurar abuso do poder econômico e político, uso
indevido dos meios de comunicação social, corrupção, fraude, condutas vedadas a
agentes públicos e propaganda extemporânea, relativamente aos ataques contra o
sistema eletrônico de votação e à legitimidade das eleições de 2022".
▶️ Minuta do golpe
Em
janeiro, o relator da ação adicionou aos autos, a pedido do PDT, a chamada
minuta do golpe.
O
documento foi obtido pela Polícia Federal em busca e
apreensão na residência do ex-ministro da Justiça Anderson Torres,
em Brasília.
A
minuta tratava da decretação de Estado de Defesa na Corte Eleitoral para
"apuração de suspeição, abuso de poder e medidas inconstitucionais e
ilegais levadas a efeito pela Presidência e membros do Tribunal, verificados
através de fatos ocorridos antes, durante e após o processo eleitoral
presidencial de 2022".
Perícia
realizada na minuta do golpe só identificou na minuta digitais do próprio
Anderson Torres, de um delegado e de um advogado que acompanharam a operação de
busca e apreensão, realizada alguns dias depois dos atos golpistas de 8 de
janeiro.
A
defesa de Bolsonaro questionou a inclusão do documento, aprovada pelo
plenário do TSE em fevereiro deste ano. Os advogados argumentaram
que a minuta é "apócrifa e não identifica efetiva intenção e
realidade/materialidade de seu conteúdo”.
Em
seu voto, na última terça (27), Benedito Gonçalves defendeu a
manutenção do documento na ação. "A admissibilidade minuta do
golpe não confronta, não revoga e não contraria a jurisprudência", disse.
Ele
foi seguido pelos ministros Floriano de Azevedo e Marques, André Ramos Tavares,
Cármen Lúcia e Alexandre de Moraes. Nunes Marques e Raul Araújo votaram pela
rejeição do documento.
<<<<<<< Depoimentos
▶️ Carlos França, ex-ministro das Relações Exteriores
O
embaixador Carlos França, então ministro das Relações Exteriores, foi ouvido em
19 de dezembro de 2022, a pedido da defesa de Bolsonaro. Ele prestou
informações a respeito da participação do Itamaraty na organização do encontro
com representantes estrangeiros no Brasil.
No
depoimento, segundo o relator, França afirmou “categoricamente” que a concepção
do encontro com embaixadores partiu da Presidência da República.
O
então ministro disse que o objetivo da reunião era permitir a Bolsonaro
“apresentar seu ponto de vista sobre o sistema de votação”. Isso porque o então
presidente é responsável pela condução da política externa.
“[Objetivo
era] manifestar a posição do Executivo em relação à busca [...] desses
critérios de transparência”, disse.
França
deixou claro que a reunião era “uma ideia do presidente, de se dirigir aos
chefes de missão”. Em seu voto, o ministro Benedito Gonçalves destacou ainda
que o ex-ministro associou o encontro ao contexto pré-eleitoral.
O
embaixador declarou que não sabe se as suas sugestões foram consideradas pela
equipe do cerimonial da Presidência.
Segundo
ele, o Itamaraty não participou da produção do conteúdo falso apresentado por
Jair Bolsonaro. A pasta somente foi acionada para fornecer equipamento e
tradutor para a tradução simultânea.
“Nós
não tivemos acesso a esse material, e nós não fomos acionados para revisar esse
material [...], não houve participação do Itamaraty na substância desse
evento.”
Carlos
França disse que, poucos minutos após o encerramento do encontro, não houve
reuniões reservadas ou perguntas dos representantes estrangeiros. De acordo com
ele, o Itamaraty não encaminhou material aos presentes e que não houve contato
de qualquer embaixada sobre o assunto.
Na
reunião, Jair Bolsonaro havia indicado que França seria responsável por enviar
o material divulgado aos embaixadores.
O
ex-ministro repetiu argumento da defesa do ex-presidente de que o encontro
teria sido consequência de reunião ocorrida no TSE com embaixadores. “Julgou-se
então que era papel da Presidência da República também se manifestar
diretamente aos chefes de missão aqui acreditados”, declarou Carlos França.
O
embaixador, no entanto, disse reconhecer que o sistema eleitoral brasileiro não
tem qualquer relação com a política externa. De acordo com ele, nenhum
embaixador estrangeiro em missão no Brasil chegou, em momento algum, a
questionar o funcionamento das eleições brasileiras.
“Talvez
não coubesse a uma embaixada nos inquirir [por ser tratar de um] assunto
interno [...] Não é função do Itamaraty, nem mesmo constitucional, de que nós
nos ocupemos de temas eleitorais.”
O
relator destacou que Carlos França disse desconhecer qualquer evento semelhante
em outros países.
“[Ele]
informou que conversas sobre sistemas eleitorais dos países ocorrem ‘num nível
hierárquico muito mais baixo’, nunca envolvendo ‘presidente, primeiro-ministro
ou chanceler’”, escreveu Gonçalves.
“Ao
descrever a participação da chancelaria na preparação do evento, Carlos França
indicou que lhe coube sugerir o perfil do público-alvo presente, mas enfatizou
que a decisão de fazer a reunião, em si, já estava tomada. Seu papel, conforme
explicou, foi apenas recomendar critérios para elaborar a lista de
representantes, com base em um ‘corte hierárquico’ compatível com a presença do
Presidente da República”, acrescentou.
Benedito
Gonçalves ainda apontou que, ao depor, o então ministro "ressaltou
positivamente a interação" entre o TSE e o Itamaraty "para assegurar
o exercício do voto no exterior e para fomentar as missões de observação
internacional".
▶️ Ciro Nogueira, ex-ministro da Casa Civil
Já
ex-ministro da Casa Civil, o senador Ciro Nogueira (PP-PI) foi ouvido como
testemunha de Bolsonaro, no dia 8 de fevereiro deste ano. Ciro também deveria
explicar a participação da pasta, à época comandada por ele, no desenvolvimento
do encontro com embaixadores.
Na
oitiva, Ciro Nogueira afirmou, de acordo com o relator da ação, que a Casa
Civil não teve “envolvimento substancial” na preparação do encontro.
“Na
verdade, o ex-ministro fez declarações que se distanciam da abordagem de Jair
Messias Bolsonaro sobre o tema das urnas eletrônicas. De saída, expressou
confiança no sistema eletrônico de votação e reconheceu a atuação da Justiça
Eleitoral para seu contínuo aperfeiçoamento”, escreveu Gonçalves.
O
senador disse não ter sido consultado a respeito de qualquer aspecto da
reunião. Ele disse também que, por conta disso, não teve oportunidade de dizer
a Bolsonaro que era contrário à ideia.
Ao
ser perguntado sobre a sua avaliação do encontro, Ciro Nogueira disse somente
que a reunião foi superdimensionada e evitável.
A
defesa do ex-presidente ainda questionou o ex-ministro a respeito da decisão de
transmitir o encontro na TV Brasil. Ciro somente concordou com a avaliação de
que o evento era considerado um “ato oficial” e que isso justificaria a
transmissão.
O
parlamentar afirmou que não teve conhecimento prévio do conteúdo falso
divulgado por Bolsonaro.
Ciro
Nogueira disse que, poucos minutos após o encerramento do encontro, não houve
reuniões reservadas ou perguntas dos representantes estrangeiros.
No
depoimento, Ciro declarou que havia preocupação de representantes estrangeiros
com uma possível instabilidade política no Brasil a partir de um movimento de
rejeição ao resultado legítimo das urnas.
“Eles
tinham preocupação sobre a situação dessas discussões políticas e conflitos,
né? [...] Mas sobre a funcionalidade do sistema, não.”
▶️ Anderson Torres, ex-ministro da Justiça
O
ex-ministro da Justiça Anderson Torres depôs em 16 de março de 2023. A decisão
foi tomada pelo ministro Benedito Gonçalves. À época, Torres já estava preso por
suposta omissão nos atos golpistas de 8 de janeiro.
Anderson
Torres foi convocado a explicar sua participação três elementos investigados na
ação:
- uma transmissão
ao vivo de julho de 2021, na qual Bolsonaro convidou a imprensa apresentar
provas que, segundo ele, comprovariam fraudes nas urnas eletrônicas. Na
ocasião, porém, o então
presidente disse não ter provas para afirmar que houve
fraude ou que havia risco de fraude. Por sua vez, Torres apresentou um
relatório da Polícia Federal a respeito das eleições de 2016 que, na
avaliação dele, indicariam sugestões para aprimorar a segurança das urnas;
- a reunião
com embaixadores em julho de 2022;
- e a chamada
minuta do golpe, encontrada na residência do ex-ministro, que
sugeria um plano para decretar Estado de Defesa após a derrota de
Bolsonaro em outubro.
No
depoimento a respeito da transmissão em 2021, Anderson Torres declarou somente
ter feito a leitura de trechos de documentos técnicos da Polícia Federal. O
ex-ministro disse também não ter conhecimento sobre o que Jair Bolsonaro
abordaria na live.
Ao
ser questionado sobre declarações de Bolsonaro de que havia “indícios” de
fraude em votos nos pleitos de 2014 e 2018, ele negou ter, na época, qualquer
relatório da PF que comprovasse a afirmação.
Em
seu voto para condenar Bolsonaro, o ministro Benedito Gonçalves indicou que as
falas de Torres evidenciaram uma tentativa de se “desvincular das informações
falsas passadas ao público”.
“Esse
esforço, contudo, é inócuo diante da análise de seu discurso no contexto da
live de 29/07/2021. [...] [Ele] não fez qualquer objeção ou contraponto aos
tópicos tratados”, escreveu.
“Fez,
na verdade, o inverso disso: em breves minutos, anunciou que dispunha de
relatórios que corroboravam as colocações feitas, e declarou, sem meias
palavras, que ‘exatamente tudo que foi falado, tudo que foi questionado, todas
as dúvidas levantadas pelos eleitores, a Polícia Federal também analisou’”,
acrescentou Gonçalves.
Torres
reconheceu ter manuseado e lido parcialmente a minuta. De acordo com o
depoimento, o ex-ministro afirmou que alguém teria feito a minuta chegar às
suas mãos, furtivamente.
O
ex-ministro indicou não ter tido curiosidade em descobrir o responsável pela
produção do documento.
“Muitas
vezes até deitado já, eu analisava ali o que era importante, o que não era
importante [...] E foi dessa maneira [...] que isso chegou até mim. [...] Eu
fui ver isso [...] à noite, ali na minha casa. Quando [...] tirei do envelope e
[...] comecei a ler e que vi o absurdo, imediatamente voltei e já coloquei para
descarte imediato uma coisa sem pé nem cabeça [...]”, afirmou.
Em
depoimento, Anderson Torres classificou o documento como “folclórico”, “lixo” e
“absurdo”. Ainda disse que “isso [o texto da minuta] andou aí pela Esplanada”.
“A
testemunha explicou que não tomou nenhuma providência sobre a minuta de decreto
de estado de defesa porque o tema não seria da alçada do Ministério da Justiça.
Outro aspecto que causa perplexidade: o à época Ministro da Justiça igualou uma
proposta golpista, que foi trazida por alguém com acesso a seu gabinete, a
anotações inúteis a serem descartadas ao final do governo. Disse, nesse
sentido: ‘eu realmente não joguei isso no lixo, no final do ano, como
deveria’”, destacou o ministro Benedito Gonçalves.
▶️ Flávio Augusto Viana Rocha, ex-secretário especial de Assuntos
Estratégicos da Presidência
Ex-auxiliar
de Bolsonaro na Presidência, Flávio Augusto Viana Rocha foi ouvido como
testemunha do ex-presidente. O depoimento ocorreu no dia 8 de fevereiro deste
ano. Ele foi convocado para explicar o envolvimento na organização
do encontro com embaixadores.
Segundo
o voto do ministro Benedito Gonçalves, Rocha negou ter auxiliado Bolsonaro na
preparação do material falso divulgado e ter participado da concepção do
encontro.
Questionado
sobre a transmissão na TV pública, o auxiliar do então presidente confirmou que
tinha ciência de que seria transmitido e avaliou que isso se deu para assegurar
transparência. Ele disse não saber, porém, que a reunião seria retransmitida
nas redes pessoais de Jair Bolsonaro.
▶️ Ivo de Carvalho Peixinho e Mateus de Castro Polastro, servidores da
Polícia Federal
Ivo
de Carvalho Peixinho e Mateus de Castro Polastro foram convocados a depor por
decisão do relator do caso. Servidores da Polícia Federal, eles foram ouvidos
em 16 de março deste ano.
Peixinho
e Polastro deveriam explicar sobre menções a eles durante a transmissão ao vivo
de julho de 2021, na qual Jair Bolsonaro disse ter “indícios” de fraude no
processo eleitoral e apresentou relatório técnico da PF a respeito das eleições
de 2016.
Ivo
de Carvalho Peixinho atuou em testes públicos de segurança, promovidos pelo
TSE, em 2017, 2019 e 2021, liderando a equipe de peritos da Polícia Federal que
examinou os códigos-fonte da urna eletrônica.
Ele
afirmou que a equipe nunca identificou indícios de fraude ou possibilidade de
manipulação de votos. Ao ser questionado sobre supostas “vulnerabilidades” nas
urnas, Peixinho declarou que não houve achados.
O
perito da PF afirmou que, em 2021, passou a ser abordado frequentemente por
representantes do governo federal para discutir o assunto. A declaração foi
corroborada por Mateus de Castro Polastro.
Uma
semana antes da live de 2021, Ivo de Carvalho Peixinho relatou ter recebido
ordem de sua chefia imediata para embarcar em avião da Força Aérea Brasileira
para uma reunião em São Paulo sobre urnas. Pouco depois, recebeu a informação
de que deveria se dirigir ao Planalto.
O
servidor disse que não foi informado em momento algum a respeito dos
participantes.
Peixinho
afirmou ter recebido sugestão de um assessor do Ministério da Justiça para se
reunir, antes do encontro no Planalto, com o então ministro Anderson Torres.
Ele negou e disse que iria por conta própria. Polastro, porém, o acompanhou.
Os
dois foram recebidos por Torres e depois encaminhados ao gabinete de Jair
Bolsonaro. Lá, foram apresentados a Bolsonaro e a um suposto especialista
em segurança das urnas. Durante o encontro, foram apresentados a uma tabela,
contendo dados da votação de Dilma Rousseff e Aécio Neves, que supostamente
poderia comprovar a ocorrência de fraude nas eleições 2014.
Polastro
e Peixinho sugeriram aos participantes do encontro que o conteúdo fosse enviado
à PF para análise. A sugestão não foi atendida.
“[Bolsonaro]
falou que queria que a gente tivesse lá pra que garantíssemos a lisura no
processo eleitoral de 2022”, afirmou Polastro.
Nos
dias que se seguiram, eles foram assediados por integrantes do governo. Em 29
de julho de 2021, o documento foi
exibido em live.
“A
partir do momento em que os peritos não corroboraram o material, a decisão por
simplesmente exibi-lo na live evidencia descompromisso com a verdade factual a
respeito do sistema eletrônico de votação”, escreveu o ministro Benedito
Gonçalves.
▶️ Filipe Barros (PL-PR), deputado federal
A
pedido da defesa de Bolsonaro, o deputado federal Filipe Barros (PL-PR) foi
ouvido em março deste ano.
Barros
foi convocado a depor para explicar sua participação em uma live de agosto de
2021 com Jair Bolsonaro. Na ocasião, em um programa da “Jovem Pan”,
o deputado e o então presidente divulgaram
inquérito da Polícia Federal a respeito de um ataque hacker ao TSE, em 2018.
Os
dois afirmaram que o documento indica que a invasão teria “fazer qualquer
coisa”, inclusive mudar votos em 2018. Também defenderam a aprovação de
uma proposta de
emenda à Constituição (PEC), relatada por Filipe Barros na Câmara, que
estabelecia o voto impresso.
Em
depoimento, o ex-ministro Anderson Torres afirmou ter sido procurado por Filipe
Barros para tratar do inquérito. Barros também havia tentado abordar o perito
Ivo de Carvalho Peixinho.
“Ele
foi ao Ministério da Justiça e disse que tinha tido acesso a esse inquérito e,
enfim, fez as considerações dele, a respeito do que ele achava...porque, na
verdade, Excelência, [...] ele foi fazer uma crítica, com todo respeito, à
condução do inquérito, às diligências adotadas ali no inquérito”, disse Torres.
Ao
depor, o deputado federal negou a reunião com o ex-ministro e disse ter sido
ele o primeiro a obter acesso ao inquérito da PF.
“O
que fica nítido é que o deputado federal buscava obter documentos oficiais que
permitissem levantar suspeitas sobre o sistema eletrônico de votação e, por
essa via transversa, lograr apoio à proposta de aprovação do voto impresso”,
avaliou Benedito Gonçalves.
"Ocorre
que, mesmo sem obter do perito e ou extrair da documentação qualquer dado que
fosse proveitoso ao seu objetivo político, o parlamentar e o primeiro
investigado cerraram fileiras para disseminar, na live de 04/08/2021, em escala
nacional, informações falsas a respeito de fraude nas urnas eletrônicas.
Fizeram crer que havia indícios substanciais de uma grotesca adulteração de
votos no pleito de 2018 e que o TSE vinha criando embaraços ao andamento da
investigação pela Polícia Federal", acrescentou.
▶️ Vitor Hugo, ex-deputado federal
Ex-líder
do governo Bolsonaro na Câmara, Major Vitor Hugo (PL-GO) depôs a pedido da
defesa do ex-presidente. Ele deveria explicar a sua participação em lives de
agosto de 2021.
Em
depoimento, Vitor Hugo afirmou que, em uma das transmissões, Bolsonaro estava
“tratando sobre segurança, transparência, processo eleitoral e sobre a vontade
do campo da direita de instituir o voto impresso, nos termos da PEC que a gente
tinha tentado aprovar, mas não tinha sido possível”.
“A
PEC havia sido rejeitada, e, ainda assim, o à época presidente da República
insistia que somente o comprovante impresso poderia prover a almejada segurança
de que votos não poderiam ser desviados. E, mais, disse isso enquanto afirmava
que haveria uma acordo com hackers, em 2018, para desviar 12 milhões de votos”,
escreveu o relator da ação.
Benedito
Gonçalves ainda avaliou que o depoimento do ex-deputado deixa “nítido” que
Bolsonaro não queria discutir se a PEC era “exequível”.
▶️ Augusto Nunes, apresentador
Em
março, o apresentador Augusto Nunes, da “Jovem Pan”,
foi ouvido a pedido da defesa de Jair Bolsonaro. Nunes foi convocado a explicar
a retransmissão, em programa comandado por ele, de live na qual Bolsonaro
apresentou o inquérito da
Polícia Federal a respeito de um ataque hacker ao TSE, em 2018.
Segundo
o ministro Benedito Gonçalves, Augusto Nunes reconheceu, no depoimento, que
perguntas foram feitas sem que a equipe do canal tivesse acessado os
documentos. Ele afirmou ainda que não buscou, após a live, realizar qualquer
tipo de checagem.
O
relator da ação que condenou Bolsonaro avaliou que o programa conduzido por
Nunes “mantém sua aparência jornalística, por meio da dinâmica de perguntas,
respostas e comentários dos diversos participantes, sem que, a qualquer
momento, seja sugerida a necessidade de alguma checagem dos fatos”.
“O
depoimento denota [...] que o arranjo entre a Jovem Pan e a Presidência da
República, pelo qual a emissora dava ampla difusão à live, em horário nobre,
sem que os jornalistas pudessem formular questionamentos substanciais, não era
percebido como um problema por Augusto Nunes, que considerou a fala do então
presidente e de Filipe Barros fonte fidedigna o bastante para a cobertura do
tema.”
Fonte:
g1
Nenhum comentário:
Postar um comentário