sexta-feira, 27 de dezembro de 2024

PDT vai ao Supremo para que Copom se submeta à Constituição e aprimore mecanismo de definição da Selic

Está nas mãos do ministro Luís Roberto Barroso uma ADPF (Ação de Descumprimento de Preceito Fundamental) apresentada pelo PDT na segunda (23/12/24), que argumenta que o Copom tem feito sucessivas majorações na taxa básica de juros preocupado exclusivamente com o cumprimento da meta inflacionária e desconsiderando que o aumento da Selic tem o condão de colocar a economia em recessão, prejudicando a população em geral e o desenvolvimento do País.

Assinada pela banca Walber Agra Advogados Associados, a ADPF sustenta que o STF deve debater a inconstitucionalidade das decisões do Copom, questionando se “a autoridade monetária está livre do dever de concretizar, com máxima efetividade, os direitos fundamentais” e os “preceitos da Constituição Econômica”. O partido quer que o Copom se submeta à Constituição e aprimore os mecanismos de definição da Selic.

A ação de 60 páginas, a que o GGN teve acesso, defende que a Selic tem “evidente feição político-constitucional”. “Se utilizado de forma coerente com os objetivos da Constituição, pode promover estabilidade econômica e contribuir para a justiça social. No entanto, se empregada de forma dissociada das necessidades concretas da população brasileira e da realidade produtiva, converte-se em verdadeiro mecanismo de exclusão e de perpetuação de desigualdades, teratológico instrumento de apropriação orçamentária por parte do sistema financeiro.”

No dia 11 de dezembro, o Copom elevou a Selic para 12,25% ao ano e sinalizou que haverá novos aumentos de 1 ponto percentual em janeiro e março de 2025. “Esses aumentos injustificados da taxa de juros poda o desenvolvimento nacional, provocando uma retração do PIB, no que se constitui um empecilho para a diminuição da dívida interna”, afirmam os autores da ação.

E acrescentam: “Em um contexto de inflação controlada, a manutenção de juros altos constitui desnecessário entrave ao desenvolvimento nacional, pois reduz a capacidade de implementar políticas públicas e o desenvolvimento da atividade produtiva nacional, enquanto beneficia o capital de investimento especulativo.”

Para o PDT, o Copom vem atuando de forma “alienada da sociedade real”, descumprindo os preceitos constitucionais da garantia do desenvolvimento nacional, da valorização do trabalho humano, da livre iniciativa, da redução das desigualdades sociais e regionais, da busca do pleno emprego, do equilíbrio orçamentário, da moralidade administrativa e da publicidade.

 “Uma aplicação hermética da teoria monetária não pode desconsiderar as peculiaridades do tecido produtivo brasileiro e das necessidades de sua população. Num país historicamente marcado por desigualdades sociais e regionais dramáticas, o BCB [Banco Central do Brasil] tem o dever de atuar para mitigá-las”, afirmam os advogados do PDT.

Entre os pedidos feito ao STF, os autores da ADPF requerem “que seja reconhecida a lesão aos preceitos fundamentais indicados nesta exordial, determinando ao Banco Central do Brasil que aprimore o processo decisório na definição da taxa básica de juros, através de parâmetros razoáveis, que possam ser efetivamente afetados pela política monetária, levando em consideração os princípios
incidentes da Constituição Econômica”.

Além disso, que “as decisões do Copom levem em consideração, necessariamente, os seus impactos sobre o crescimento econômico, o mercado de trabalho, a erradicação da pobreza e a redução das desigualdades sociais.”

 

¨      Galípolo terá de acalmar mercado para promover mudanças na política monetária

A chegada de Gabriel Galípolo à presidência do Banco Central (BC) marca uma nova fase na economia brasileira. Após a gestão neoliberal de Roberto Campos Neto, o economista terá a missão de conciliar as expectativas do mercado com a necessidade de promover mudanças na condução da política monetária.

Para se diferenciar do antecessor, conhecido por seus interesses alinhados à extrema-direita, o economista Paulo Nogueira afirma que Galípolo deverá adotar uma comunicação mais estratégica e cautelosa.

“Ele tem que falar com muito cuidado, ele não deve improvisar, dar palestras, ficar fazendo piada, não. Tem que ler e orientar as palavras para estabilizar expectativas e torná-las mais favoráveis ao país e ao governo”, afirmou Nogueira em entrevista ao jornalista Luis Nassif no programa TVGGN 20 Horas.

<>< Herança maldita: autonomia do BC não funciona

A autonomia do Banco Central também foi alvo de críticas do economista, que questionou a eficácia do modelo atual e defendeu uma maior sintonia entre a política monetária e os objetivos do governo. 

 “Nós podemos acrescentar essa experiência brasileira de dois anos com o Banco Central independente no governo Lula como mais um elemento na teoria de por que o Banco Central independente não funciona”, disse Nogueira.

Paulo se refere à politização do Banco Central “independente”, que é o contrário do que a teoria do Banco Central independente preconiza e, na prática, só traz benefícios à classe dominante.

“Qual é o sentido? Vamos criar uma instituição protegida das pressões políticas, que possa resolver tecnicamente. Olha o que aconteceu. A politização do Banco Central é sem precedentes na gestão do Roberto Campos Neto. Então, saiu tudo errado nesse Banco Central independente. Tudo errado. Agora, esse vai ser o desafio do Galípolo, chegou o momento”.

<><> Deformação ideológica

O economista também criticou o convencionalismo da equipe econômica e a influência de ideologias neoliberais nas decisões do governo. “Eu vejo, na equipe econômica do Lula, um problema de deformação ideológica. Os sujeitos foram absorvidos por um ideário que é incompatível com os objetivos políticos do governo e do Brasil”, opinou o economista.

Para Nogueira, a combinação de ajuste fiscal e altas taxas de juros é uma política que prejudica a base social do governo. “Olha, nem os abutres mais insaciáveis do mercado esperavam um aumento de um ponto, seguido de promessa de duas sucessivas reuniões com aumentos adicionais de um ponto percentual, em cima de uma taxa de juros que já é altíssima, das maiores do mundo”.

“Olha o absurdo disso, o que você quer com um pacote de ajuste fiscal? Impressionar o mercado? Não conseguiu. Aí vem o Banco Central, não conseguimos impressionar com ajuste fiscal, aí deixou dar uma pancada na taxa de juros. O que aconteceu depois? Os mercados reagiram mal […] O que nós temos é uma classe rentista predatória que reproduz ideologias furadíssimas que já não são mais praticadas nos Estados Unidos e na Europa. O neoliberalismo foi enterrado lá”.

 

¨      As tarifas de Trump abrem possibilidades para o Brasil. Por Eduardo Vasco

As relações do Brasil com os Estados Unidos tendem a observar uma piora significativa a partir da posse de Donald Trump. E não apenas do presidente Lula ou de seu governo com o republicano e seu governo, mas também da própria burguesia nacional brasileira com a norte-americana.

A balança comercial de Brasília com Washington (nosso segundo maior parceiro comercial) é deficitária. Entre janeiro e novembro, nossas exportações alcançaram o valor de R$ 221,26 bilhões (US$ 36,57 bilhões), enquanto as importações chegaram a R$ 226 bilhões (US$ 37,36 bilhões). Tivemos um prejuízo de R$ 4,8 bilhões (US$ 790 milhões).

Até a implantação e consolidação do regime neoliberal no Brasil, na década de 1990, o comércio com os Estados Unidos havia sido superavitário. Porém, a partir de 1995 passamos a importar mais e exportar menos aos norte-americanos, sendo o comércio deficitário entre 1995 e 1999, no auge das privatizações e entrega das grandes propriedades nacionais ao capital estrangeiro. Em 2000 a balança voltou a ser positiva, mas a partir de 2009 – e desde então, ou seja, há 15 anos – tivemos novamente déficit atrás de déficit comercial com os EUA. O nosso déficit acumulado, nesses últimos 15 anos, é de R$ 231,4 bilhões (US$ 67,9 bilhões).

A razão disso é que o caráter do comércio bilateral é, a rigor, semicolonial. Nesses últimos 15 anos, nós vendemos aos EUA basicamente petróleo bruto e combustíveis, produtos agrícolas e alimentícios para que depois os norte-americanos os refinassem e nos vendessem de volta, com um alto valor agregado, junto com adubos e fertilizantes. O que salva são as exportações de aeronaves e equipamentos de alta tecnologia, mas também compramos máquinas e equipamentos industriais. Para variar, como toda relação entre um país desenvolvido e um país atrasado, os EUA compram de nós, majoritariamente, commodities (de baixo valor agregado) e nos vendem manufaturados (de alto valor agregado).

Trump vai manter essa tradição e já anunciou que quer aplicar tarifas contra produtos brasileiros. No dia 16 de dezembro, ele citou o Brasil nominalmente como exemplo de país que sofrerá novas taxas. “Quem nos taxar, taxaremos de volta”, disse. Mas os EUA já taxam uma série de produtos do Brasil. Em 2023, o valor de produtos brasileiros importados pelos EUA que ficaram sujeitos a sobretaxa de importações foi de US$ 233 milhões. E há uma pressão das grandes companhias siderúrgicas contra a revogação do direito antidumping sobre a importação de determinados tipos de aço brasileiros, feita no início de 2024 após 32 anos. Os EUA já são o país com mais medidas protecionistas contra o Brasil e, em 2018, Trump classificou nossas exportações de aço como uma “ameaça à segurança nacional dos EUA”.

Após ser eleito pela segunda vez presidente dos Estados Unidos, Trump também anunciou a intenção de impor tarifas de 100% aos produtos importados dos países do BRICS, caso eles concretizem as ideias de desdolarização de suas transações comerciais.

As ameaças de Trump, contudo, se aplicadas, poderiam ter resultados positivos para o Brasil. O governo brasileiro provavelmente retaliaria e imporia tarifas recíprocas às importações provenientes dos EUA. Além disso, o dólar valorizado em relação ao real encarece ainda mais as nossas importações. É uma chance de investir na produção doméstica e colocar efetivamente em prática o plano de reindustrialização de Lula, que ainda deixa muito a desejar e não pretende, de fato, reverter a destruição histórica da indústria nacional pela implantação do neoliberalismo – que segue sendo o pilar da estrutura econômica brasileira. O incentivo do Estado ao mercado interno também poderia contrabalançar as vantagens dos produtores locais em exportar com o dólar mais caro, para que comercializem mais dentro do Brasil e não aumentem os preços para os consumidores brasileiros.

Além disso, é uma chance para elevar o nível da diversificação das relações comerciais do Brasil. Os países BRICS são parceiros com os quais boa parte do comércio com os EUA, desigual há anos e afetado pelas medidas de Trump, poderia ser substituída. O Mercosul e os demais vizinhos também poderiam cumprir um papel importante nessa diversificação, bem como as nações asiáticas, levando em consideração que o porto de Chancay, no Peru, já está em funcionamento, e que ele poderia ser ligado por trem e rodovias com o porto de Santos. Se o acordo Mercosul-UE não tivesse o mesmo caráter das relações históricas com as potências capitalistas, também poderia servir ao Brasil para reduzir a dependência dos EUA. Analistas consultados pelos jornais brasileiros têm mesmo previsto que vários produtos que até agora são vendidos aos EUA deverão ser destinados à China e à Europa.

No mesmo período (2009-2024) em que teve um déficit de quase US$ 70 bilhões com os EUA, o Brasil teve com a China um superávit de mais de US$ 300 bilhões. Em 2019, o saldo comercial com a China chegou a representar 83% do saldo total do Brasil em sua balança comercial com o mundo, conforme estudo de Pedro Garrido da Costa Lima para a Câmara dos Deputados. Porém, devido à implantação do neoliberalismo, a qualidade das exportações caiu (74% eram produtos da indústria de transformação em 1997, mas em 2022 eram apenas 22,5% do total, com mais de 37% sendo da agropecuária e 40% da indústria extrativa). Por isso a urgência da reindustrialização, a fim de que não apenas haja uma diversificação de parceiros, mas também uma qualificação do comércio.

Mais do que tudo, no entanto, a diversificação e qualificação das relações comerciais tem um papel estratégico na geopolítica brasileira. Os EUA sempre trataram o Brasil – bem como toda a América Latina, mais ainda do que o resto do mundo – como uma colônia. Não só do ponto de vista comercial, senão também político e cultural. Mas isso só é possível porque dominam as nossas relações econômicas. Se o Brasil quiser ser um país realmente independente, precisa necessariamente deixar para trás essa relação de subordinação econômica com os Estados Unidos.

 

Fonte: Jornal GGN/Brasil 247

 

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