Carlos Castilho: O Facebook
não é uma rede social e isto afeta o jornalismo
Facebook, X, TikTok, Instagram e YouTube não
funcionam como redes sociais. Estas empresas e outras do gênero são plataformas
digitais que usam dados, fatos, eventos e ideias obtidos gratuitamente de seus
usuários e que, depois de processados, são vendidos por quantias milionárias a
anunciantes na internet. Neste ponto, seguem o mesmo modelo de negócios da
imprensa tradicional que usa a notícia para atrair a atenção do público e
orientá-la para anúncios pagos.
A grande maioria dos
usuários das plataformas acha que está participando de redes sociais, porque
manda e recebe mensagens, combina iniciativas e divulga realizações com outras
pessoas. Mas tudo isto é matéria-prima para algoritmos que identificam
tendências, preferências e perfis sociais que serão depois vendidos a terceiros
ou usados pelas próprias plataformas para incrementar seus negócios e também os
seus lucros. Facebook e Instagram (ambas do
conglomerado Meta), por exemplo, lucraram 15,69
bilhões de dólares no terceiro trimestre, enquanto seu dono
acumulou uma riqueza pessoal estimada em aproximadamente 215 bilhões de dólares
pela revista
Forbes.
As redes sociais
surgiram no final do século XX, quando a internet e os computadores ainda
estavam num estágio bem primitivo, se comparado com o que são hoje. As
redes foram criadas como estruturas sociais, sem fins lucrativos,
autogovernadas e centradas no diálogo livre, horizontal entre seus
usuários. A primeira rede a ter relevância mundial foi a WELL (Whole
Earth Eletronic Link – Rede Global de Conexões Eletrônicas), lançada
em 1985 pelo ativista digital Howard Rheingold, na Califórnia. Seis anos mais
tarde surgiu em Amsterdã, na Holanda, a rede Cidade Digital (De
Digital Stad) que foi a pioneira na prestação de serviços aos seus membros,
como por exemplo ajudar contribuintes a pagar impostos, orientando no acesso
aos serviços públicos ou com informações sobre horários de cinemas, ônibus e
trens.
Marc Zuckerberg,
criador do Facebook, Larry Page e Sergei Brin, fundadores
do Google e Jack Dorsey, idealizador do Twitter,
hoje X, só para citar os exemplos mais conhecidos, começaram montando redes
sociais, mas depois descobriram como ganhar dinheiro usando o conteúdo de
mensagens deixadas por usuários. Ao monetizar dados alheios sem pagamento,
estes empreendedores digitais acumularam fortunas, prestígio político e uma
enorme visibilidade pública.
O sucesso da monetização
foi tão grande que as plataformas praticamente se apossaram da expressão redes
sociais, que apesar disto continuaram a existir, assumindo em muitos casos a
denominação de comunidades sociais digitais (1), a maioria delas aglutinada em
torno de temas específicos como educação, finanças, saúde, direitos humanos e
questões de gênero. Mais recentemente surgiram as redes sociais centradas na
informação, como é o caso da CHAY, uma
rede formada por mulheres que trocam dados sobre como combater a violência
doméstica e o feminicídio. No âmbito acadêmico e corporativo, surgiram versões
específicas de redes sociais chamadas de comunidades de prática e, aqui no
Brasil, temos as redes de programadores, como Guru-SP, Grupy, PHPSP e Rails
Girls, todas focadas na troca de informações visando o desenvolvimento de
novos aplicativos e softwares.
<><> A guerra entre imprensa e plataformas
Como boa parte das
interações entre usuários tem origem em notícias publicadas por jornais, revistas
e telejornais, os donos destes veículos de comunicação começaram a exigir o
pagamento de direitos de republicação, numa guerra financeira que ainda está em
curso e que já envolve governos nacionais. Facebook, X, Instagram,
YouTube, Google e outras plataformas alegam que são estruturas
tecnológicas e que não produzem informação, logo não podem ser cobradas.
A guerra financeira
entre plataformas e a imprensa é complicada porque envolve diferentes
abordagens de questões chaves como o caráter social do noticiário jornalístico,
a produção de conhecimento na internet, as novas funções da informação em
ambiente digital e o crescente protagonismo do público alimentado pela
avalanche informativa nas plataformas digitais. São questões afetadas
diretamente pela diferença na maneira de tratar a informação como, por exemplo,
o fato de a notícia ter deixado de ser um produto físico em papel, áudio ou
vídeo, para se tornar um conjunto de códigos digitais altamente mutáveis e
fluidos.
Criou-se assim um
paradoxo curioso. De um lado, uma tecnologia velha e ultrapassada (como a das
mídias impressas) preconizando uma nova relação entre produtores e consumidores
de notícias. De outro, uma nova tecnologia (plataformas digitais) defensora do
velho colonialismo informativo, que se baseia na captura sem remuneração de
bens alheios. Temos, assim, uma tecnologia velha propondo algo novo e uma
tecnologia nova defendendo algo velho.
A relação da imprensa
convencional com as plataformas digitais é igualmente complexa porque apesar de
compartilharem a mesma estratégia de negócios, as tecnologias sobre as quais
apoiam seus sistemas operacionais levam a resultados financeiros opostos. A
notícia publicada em papel não consegue mais atrair publicidade suficiente para
ser rentável diante da concorrência desigual com informações online. Com isto,
as tentativas da imprensa de controlar as plataformas através de regulamentação
governamental dificilmente passarão de meros paliativos.
<><> Porque o jornalismo precisa das redes de informação
Por volta de 2010, a
maioria dos grandes jornais achava que sua salvação estava nas plataformas.
Muitos, inclusive o The New York Times, disponibilizaram seu
conteúdo no Facebook, achando que isto aumentaria a audiência
e assinantes. Mas aconteceu justamente o contrário. A plataforma ficou com os
leitores do NYT e com os anunciantes, levando o jornal a
admitir o fracasso da estratégia. As redes são essenciais ao exercício do
jornalismo em ambiente digital não para aumentar o seu faturamento, mas para
atender às necessidades informativas de públicos cada vez mais desorientados
pela quantidade e diversidade de notícias que recebem diariamente.
O jornalismo não
consegue mais dar conta do processamento, edição e disseminação de novos
dados, fatos e eventos publicados na internet. Nada menos que 402,72 milhões de
terabites em dados são agregados à web por dia. Ainda segundo estatísticas
internacionais, cada usuário da internet é bombardeado diariamente por 74
gigabytes de novos dados. A recombinação destes dados numa plataforma digital
cria uma massa de informações tão grande que supera em muito a capacidade de um
jornalista processar apenas o que é mais relevante e atual.
Portanto, o exercício
do jornalismo profissional torna inevitável a colaboração e participação de
pessoas comuns aglutinadas em redes ou comunidades, cujo objetivo é produzir
informações, e não lucros, como nas plataformas digitais. Só que a parceria
entre jornalistas e usuários de redes sociais vai exigir uma série de mudanças
na cultura profissional:
- O
jornalismo deixará de ser a atividade que sabe o que é bom para o público;
- O
jornalista terá que desenvolver um novo tipo de relacionamento com as
pessoas para poder identificar suas verdadeiras necessidades informativas
e poder funcionar como um curador de notícias, na hora de flagrar fake
news ou desinformação;
- A
sustentabilidade do jornalismo dependerá da parceria, inclusive
financeira, com o público e não dos anúncios;
- Será
indispensável existir uma confiança total entre as pessoas e o jornalismo,
porque sem ela ninguém vai querer tirar dinheiro do próprio bolso para
pagar por notícias;
- Caberá
ao jornalismo mostrar às pessoas comuns porque a informação se tornou tão
importante na era digital e como elas poderão usá-la em benefício próprio.
A busca de um novo tipo
de relacionamento entre jornalismo e as pessoas ganha uma relevância ainda
maior porque donos de plataformas digitais como Elon Musk já não se contentam
apenas em acabar com a influência da imprensa convencional, outrora conhecida
como o ‘quarto poder’. Ao se associar a Donald Trump, próximo presidente dos
Estados Unidos, Musk já deixou claro que seu objetivo é transformar as
plataformas em um poder político alternativo, numa outra internet, só que
privatizada.
¨ A
influência da IA na produção e revisão de conteúdo. por Guilherme
Henrique da Silva
A Inteligência
Artificial (IA) tem se consolidado como uma aliada em diversas áreas, da
medicina à advocacia, passando pela produção e revisão de textos. Ferramentas
como ChatGPT e Grammarly são exemplos dessa evolução, prometendo agilidade e
precisão na escrita e correção de conteúdos. Contudo, a discussão sobre o
futuro da revisão com o olhar humano frente a essas inovações vai além da
eficiência: ela envolve ética, cultura e criatividade.
De acordo com os dados
apresentados por análises de mercado de Processamento de Linguagem Natural
(PLN), o setor deve crescer a uma taxa composta
anual (CAGR) de cerca de 20% até 2030, impulsionado pela adoção de tecnologias
como Grammarly e ChatGPT. Essas ferramentas otimizam a correção gramatical e
adaptam textos para diferentes públicos, sendo aplicadas em áreas como
educação, saúde e negócios. Além disso, soluções de tradução automática e
assistentes virtuais têm aumentado a eficiência e acessibilidade, evidenciando
o impacto da IA na transformação digital. E, ao mesmo tempo reforçam a
necessidade de supervisão humana para atender às nuances culturais e
linguísticas.
Porém, máquinas ainda
enfrentam desafios importantes. Questões culturais e contextuais, por exemplo,
são áreas em que as IAs mostram limitações. Um estudo da Universidade
de Stanford destacou que ferramentas automatizadas
frequentemente falham em compreender expressões idiomáticas ou nuances
semânticas, além de terem dificuldades em lidar com ironias e sarcasmos. Esse
cenário é crítico em textos que demandam precisão emocional ou cultural, como
artigos jornalísticos, obras literárias ou materiais publicitários.
Existem relatos
demonstrando que, ao usar o ChatGPT sem revisar o conteúdo, usuários acabaram
publicando trechos contendo comandos ou prompts usados para gerar o texto. Com
frequência temos notado que, ao fim, na introdução ou mesmo ao longo do texto,
instruções como “escreva de maneira clara e formal” são encontradas. Isso
simplesmente porque o usuário copiou e colou o conteúdo gerado pela IA sem uma
análise cuidadosa. Esses erros não apenas comprometem a qualidade do texto, mas
também podem prejudicar a credibilidade do autor.
Outra limitação diz
respeito à ética e à sensibilidade. A IA aprende a partir de grandes volumes de
dados e, muitas vezes, reproduz vieses existentes nesses conjuntos de
informações. Revisores humanos, por outro lado, têm o discernimento para
adaptar o texto ao contexto, evitar perpetuar estereótipos e criar conteúdos
mais inclusivos.
Apesar dessas
barreiras, a Inteligência Artificial não deve ser vista como substituta, mas
como uma ferramenta que complementa o trabalho humano. Com a automatização de
tarefas repetitivas, revisores podem dedicar mais tempo ao aspecto criativo e
analítico do trabalho. Assim, o uso combinado de tecnologia e supervisão humana
garante que erros sejam corrigidos, sem comprometer a qualidade e a
intencionalidade do texto.
Desse modo, enquanto a
tecnologia oferece velocidade e precisão, cabe aos profissionais preservar a
alma do texto, entendendo as nuances, contextos e culturas. O revisor do futuro
será, mais do que nunca, um artesão da palavra, que une técnica e criatividade,
tendo a tecnologia como parceira.
No fim das contas, a IA
não ameaça a relevância dos revisores; pelo contrário, ela os fortalece,
permitindo um trabalho mais estratégico e impactante. Essa coexistência é o
caminho mais promissor para um campo que exige, antes de tudo, sensibilidade e
excelência.
Fonte: Observatório
da Imprensa
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