Como o novo bloco
do Sahel desafia o neocolonialismo ocidental?
Mali, Burkina Faso
e Níger assinaram um pacto de defesa mútua, a Aliança dos Estados do Sahel, em
16 de setembro de 2023. O trio também decidiu se retirar da Comunidade
Econômica dos Estados da África Ocidental (CEDEAO) em janeiro.
A Aliança dos Estados
do Sahel,
composta por Mali, Burkina Faso e Níger, rejeitou firmemente uma proposta
da CEDEAO de adiar sua retirada do bloco regional por seis meses.
Resoluto em sua
decisão de sair em janeiro de 2025, o trio rotulou o cronograma da CEDEAO
como desestabilizador.
<>< O que
é a Nova Confederação do Sahel?
A confederação é
uma aliança de antigas colônias
francesas —
Mali, Níger e Burkina Faso — que pediu a retirada das tropas francesas e
norte-americanas, citando sua ineficácia no combate ao terrorismo na região.
Estabelecido sob o
pacto do Sahel de 2023, o bloco visa fortalecer as capacidades de
defesa, colaborar na luta contra grupos
jihadistas, estabelecer um banco de investimento conjunto e compartilhar
recursos para projetos de desenvolvimento econômico.
<><> Quão
forte é seu exército?
As capacidades
militares das
três nações são as seguintes:
# Níger: 30.000
soldados no Exército, Força Aérea e forças paramilitares.
# Burkina Faso:
16.500 soldados, incluindo pessoal da Milícia Popular.
# Mali: 44.800
soldados no Exército, Força Aérea e Guarda Nacional.
Eles utilizam uma
variedade de equipamentos militares, incluindo tanques da era soviética,
caças russos Su-25, helicópteros do tipo Mi, tanques chineses Tipo 62, drones
Bayraktar e outros sistemas avançados.
<><> O
que motivou o pacto?
Vários fatores
impulsionaram a formação da Aliança do Sahel. Primeiro, a retirada das tropas
do Ocidente da África, o que prejudica o controle dos EUA e da Europa
sobre os recursos regionais. Também havia a ameaça iminente de intervenção militar da CEDEAO
após o golpe no Níger.
Embora as forças
ocidentais tenham sido oficialmente mobilizadas para combater o Daesh
(organização terrorista proibida na Rússia e em vários outros países) no Sahel,
elas também buscaram explorar os ricos recursos da região. O Mali é o
quarto maior produtor de ouro da África e
possui reservas significativas de lítio. O Níger é o sétimo maior produtor
mundial de urânio. Burkina Faso é abundante em ouro, cobre e terras aráveis.
<><> Quais
são as relações da Rússia com o trio?
Moscou está
ativamente aprimorando as capacidades militares das nações do Sahel
e fornecendo treinamento de pessoal. O embaixador Igor Gromyko observou
que instrutores militares russos chegaram ao Níger em abril, e a Rússia
está aumentando sua
mobilização de
especialistas em contraterrorismo em Burkina Faso.
A Rússia vai
buscar desenvolver comércio mutuamente benéfico e cooperação
econômica com esses países, acrescentou Gromyko.
¨ As cicatrizes do apartheid.
Por Flávio Aguiar
Há exatos 30 anos o regime do Apartheid chegou ao fim na África do Sul.
Os principais personagens deste final pacífico para um dos regimes mais odiosos
de segregação racial da história humana foram o líder do Congresso Nacional
Africano (CNA), o negro Nelson Mandela, depois de amargar 27 anos na prisão, e
o líder do Partido Nacional da África do Sul (PN), o branco Frederik William De
Klerk, que foi presidente do país entre 1989 e 1994. Neste ano, na primeira
eleição realmente universal e democrática no país, Nelson Mandela foi eleito
presidente, cargo que ocupou até 1999.
O regime do Apartheid foi oficialmente instituído na África do Sul a
partir de 1948, quando o Partido Nacional, liderado por Daniel Malan, venceu as
eleições comprometendo-se a manter a supremacia política, econômica e cultural
da minoria branca, constituída sobretudo pelos então chamados de Boers,
descendentes dos colonos holandeses, hoje chamados de Afrikaaners.
É verdade que o regime segregacionista voltado contra a maioria negra
tinha antecedentes longínquos, promovidos pelo colonialismo europeu dos
portugueses, da Companhia das Índias Orientais e do Império Britânico, que
dominou a maior parte da região até quase o começo da Primeira Guerra Mundial.
Entretanto o regime de discriminação racial instituído a partir de 1948 e
conhecido com o nome de Apartheid chegou a um alcance e um requinte cruel
raramente vistos na história humana, “aperfeiçoando” as segregações anteriores.
Consta que seu principal arquiteto foi Hendrik Verwoerd, que chegou a
ser primeiro ministro entre 1958 e 1966. Um exemplo daquele “aperfeiçoamento”:
o chamado “Ato de Imoralidade”, de 1927, proibia o casamento entre pessoas
brancas e negras. Já o Ato de Proibição de Casamentos Mistos, de 1949, proibia
o casamento de pessoas brancas com pessoas de qualquer outra raça.
O Apartheid reconhecia a existência de quatro raças no país: os brancos,
os asiáticos, inicialmente chamados de indianos, os “coloured”, que no
Brasil o IBGE chamaria de “pardos”, e os negros. Curiosamente, os documentos de
identidade de brancos, asiáticos e “coloured” registravam a raça de seu
proprietário; os dos negros não, condenados que eram a uma espécie de anonimato
humano.
A legislação do Apartheid era vasta e abrangente, e sua violação era
considerada um crime contra o Estado, ou lesa-pátria, com punições extremamente
severas. Estabelecia a segregação racial em todas as dimensões da vida, da
intimidade sexual aos locais de trabalho. Abrangia a licença para o
estabelecimento de residência, os locais de trabalho, os serviços públicos, o
transporte, a educação, a saúde, o lazer e tudo o mais que a vida pudesse
compreender.
Apesar da forte resistência interna e internacional, os governos do
Apartheid estiveram longe de permanecerem isolados. Devido à Guerra Fria,
contaram com fortes apoios entre políticos conservadores, como Ronald Reagan
nos Estados Unidos, Margareth Thatcher na Inglaterra, no sistema bancário e
financeiro internacional, na indústria de armamentos e nos serviços de
inteligência policial de diversos países em todos os continentes, inclusive
africanos. Tornou-se um forte defensor dos remanescentes do colonialismo
europeu na África e apoiador de políticos de direita nos países que dele se liberavam.
Preso em 5 de agosto de 1962, Nelson Mandela tornou-se o principal líder
e símbolo da resistência contra o regime, sendo condenado por alta traição
algum tempo depois. Passou por algumas prisões durante o pouco mais de 27 anos
que ficou no cárcere. Era submetido a um regime duríssimo. Podia escrever
apenas duas cartas por ano, cada uma com no máximo 500 palavras e submetidas à
censura antes de serem enviadas.
De Klerk foi o político branco que chegou à conclusão de que os dias do
Apartheid estavam contados, e se dispôs a apressar o seu fim antes que fosse
tarde demais para uma solução negociada. Entre outras providências, apressou a
libertação de Mandela, o que aconteceu no começo de fevereiro de 1990. Quatro
anos depois, Mandela saia de sua casa no bairro de Soweto, em Johannesburgo,
direta e triunfalmente para o Palácio Presidencial.
Se a legislação do Apartheid foi varrida do mapa e hoje ele é
considerado um crime contra a humanidade, as suas cicatrizes estão longe de
desaparecer. Um relatório do Banco Mundial de 2022 deu à África do Sul a
incômoda posição de ser o país mais desigual do mundo. Por exemplo, os traços
remanescentes da divisão de bairros residenciais são claramente visíveis, além
de outros. Organizações não governamentais e agências do governo reconhecem a
existência de racismo e de diferenças graves de oportunidades, emprego e
serviços em prejuízo da população negra, que perfaz mais de 80% dos 62 milhões
de habitantes do país, sendo que aqueles que têm mais de 30 anos conheceram a vida
sob o Apartheid.
Entretanto, apesar das dificuldades, o sentimento que se percebe no
tratamento cotidiano com quase todas as pessoas é de alegria e de um otimismo
comedido. Claro: viver sob Apartheid devia ser algo tão horrível que qualquer
outra forma de vida é bem-vinda.
¨ O que pode estar por trás da medida que quer dar parte
do lucro do petróleo à população no Suriname?
O presidente do
Suriname, Chan Santokhi, anunciou um programa para que os cidadãos surinameses
recebam uma parte dos lucros do petróleo descoberto nas costas do país. Para
analista, medida aparenta ser eleitoreira.
"Royalties
para todos", o programa anunciado por Santokhi, vai destinar aos
surinameses cerca de US$ 700 (R$ 4,3 mil) anuais. O presidente está no
final do seu mandato, e para Iuri Cavlak, professor de teoria da história
na Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), a medida parece "questão
de uma tática política, de fazer propaganda política com a exploração do
petróleo".
O professor afirma
que esta é a primeira vez que vê uma medida desse nível, destinando para toda a
população um valor direto dos lucros a serem ganhos pelo Estado. Geralmente há
nos países, relembra, programas de renda básica, como no Brasil há o Bolsa
Família.
"Eu não
conheço essa questão de agregar uma atividade econômica específica com o
dinheiro que vai diretamente para o auxílio financeiro. Conheço essas questões
de renda mínima", destaca em declarações ao Mundioka, podcast
da Sputnik Brasil.
Ele reconhece
também que a medida pode servir para evitar grandes revoltas e manter o tecido
social organizado, afinal o Suriname é um país que pode ser considerado pobre,
segundo o especialista, que aponta também que Paramaribo só conseguiu sua
independência dos Países Baixos em meados dos anos 1970.
Além disso, Cavlak
avalia a medida do governo surinamês como um sinal deste tempo.
"Vai muito do
espírito da nossa época, das coisas imediatas e do poder do dinheiro. Se eu
falar assim: 'Olha, eu vou pegar esse dinheiro, mas eu vou melhorar a escola,
daqui a dez anos a universidade, a escola, o trânsito vai estar melhor'. Você
quer isso ou você quer o dinheiro agora? Se você colocar nesse ponto de vista,
as pessoas vão dizer: 'Não, eu quero agora'", avalia.
A prospecção do
petróleo no
Suriname, relembra o professor, já estava no radar desde meados da década de
2010, mas o custo para a exploração ainda era muito alto. Como o recurso no
território surinamês está no mar, há necessidade de alta tecnologia para
explorá-lo sem causar danos ambientais.
Outro imbróglio do
"Royalties para todos" — que pode fazer pensar que a medida serve
apenas para angariar votos — é que a empresa que ganhou o direito de explorar o
petróleo do Suriname, a TotalEnergies, só começará suas atividades em
2028. Com Santokhi em fim de mandato, caso ele não seja eleito, o projeto pode
minguar, segundo o analista.
"Pode ser que
o quadrante que eles vão explorar tenha menos petróleo do que imaginam, ou
tenha a quantidade de petróleo [desejada], mas ele esteja mais difícil [de
obter], esteja em uma profundidade maior", descreve, listando fatores que
podem interferir na promessa.
<><> Suriname:
democracia com histórico problemático
Cavlak avalia que
muitos governos regados essencialmente pelo dinheiro do petróleo costumam
apresentar problemas em suas formas de governança, uma vez que o dinheiro
injetado tende a deixar as autoridades mais poderosas.
O Suriname, por sua
vez, tem como lastro ocorrências que ligam autoridades a atividades ilícitas,
como o tráfico de drogas.
"Há uma rota
do tráfico de drogas que passa por Colômbia, Suriname e vai até os Países
Baixos, e dos Países Baixos [a droga] é distribuída para a União Europeia.
Então, por exemplo, tem mandado da Interpol para o vice-presidente do Suriname,
Ronnie [Brunswijk], e o filho do antigo presidente, o Dési Bouterse, foi preso
já por questão de […] tráfico de drogas."
No contexto de um
país pobre e de economia dependente
do garimpo e
do cassino — ambos legalizados no Suriname —, além do dinheiro enviado das
pessoas que estão fora, a solução imediata se sobrepõe, sobretudo no mundo
capitalista.
"Se distribui
uma quantia X para a população é porque está ganhando o triplo ou o quádruplo —
via de regra é assim. Ainda mais em países pequenos, porque aí você tem uma
democracia menos desenvolvida, os jornais mais controlados, fica difícil a
sociedade pressionar os seus agentes políticos para uma transparência mais
efetiva", avalia o especialista.
¨ Haiti declara estado de emergência por ameaça de grupos
armados
O governo
provisório do Haiti decretou
estado de emergência no domingo (22/12), devido às ameaças de grupos criminosos
armados.
O Conselho de
Ministros do Haiti lançou uma série de ações para combater a escalada da
violência, incluindo o estabelecimento de um estado de emergência em todo o
país de 22 de dezembro de 2024 a 21 de janeiro de 2025.
Na última
quarta-feira (18/12), foi realizada uma reunião na Villa de Bienvenida, com a
presença do Conselho de Ministros, liderado por Leslie Voltaire, presidente do
Conselho Presidencial de Transição (CPT), e do primeiro-ministro para tomar
medidas sobre a delicada situação que o país está vivendo.
Na reunião, foi
enfatizado que o estado de emergência tem o objetivo de ajudar as ações policiais
contra a insegurança e
abordar a crise agrícola e alimentar que está afetando o país.
O objetivo, segundo
o governo, é apoiar o trabalho da Polícia Nacional do Haiti e a missão multinacional
liderada pelo Quênia e
apoiada pela ONU e pelos Estados Unidos.
A missão teve pouco
impacto sobre a frequência dos ataques de grupos armados, que controlam
aproximadamente 80% do território de Porto Príncipe, a capital do Haiti e são
acusados de cometer assassinatos, estupros, saques e sequestros para resgate.
Os ataques também
têm como alvo edifícios e infraestrutura importantes, o que forçou o fechamento
do aeroporto da capital para voos comerciais em novembro.
No início de
dezembro, cerca de 200 pessoas foram
mortas em um massacre liderado por uma gangue criminosa contra
praticantes da religião vodu, de acordo com as Nações Unidas e a ONG local
Comitê para a Paz e o Desenvolvimento.
Segundo a ONG, o
líder da gangue convencido de que um feitiço vodu teria feito seu filho
adoecer, atacou seguidores desta religião. As Nações Unidas estimaram o número
de mortos em 184, dos quais 127 seriam homens e mulheres idosos.
Segundo as Nações Unidas, o número de
mortes este ano no Haiti atingiu a marca de 5 mil pessoas.
A organização
Médicos sem Fronteiras (MSF) anunciou, no início do mês a retomada de suas
atividades em Porto Príncipe, menos de um mês depois de suspender suas
operações por ameaças contra seu pessoal.,
<><> Crise
política no Haiti
Em meio a uma grave
crise no Haiti, o governo interino do país encontra-se imerso num espiral
crescente de disputas internas pelo controle da administração.
A tensão política
se agravou na segunda semana de novembro, quando a maioria do Conselho
Presidencial de Transição decidiu destituir o primeiro-ministro interino Garry
Conille e nomear como seu
substituto o empresário Alix Didier Fils-Aimé.
O conselho é um
órgão colegiado que exerce os poderes do presidente. Após extensas negociações
entre diferentes setores políticos do Haiti, junto com a Comunidade do Caribe,
Estados Unidos, Canadá e a França, o CTP foi estabelecido em abril, após as
pressões para a renúncia do impopular primeiro-ministro Ariel Henry.
O órgão é formado
por nove pessoas, sete com direito a voto e dois observadores, representando
diferentes setores políticos do Haiti.
Sua função é
organizar e garantir as próximas eleições do país para eleger um presidente e
um Parlamento para assumir o cargo em fevereiro de 2026. A última vez que foram
realizadas eleições presidenciais foi em 2016.
Também é
formalmente o órgão (juntamente com o primeiro-ministro interino) responsável
pela polêmica Missão Multinacional de Apoio à Segurança (MSS), um destacamento de
forças policiais liderado pelo Quênia, no país desde junho.
A demissão de
Conille ocorreu depois que o primeiro-ministro interino deixou escapar o pedido
de renúncia de três membros do CPT (Gérald Gilles, Emmanuel Vertilaire e Smith
Augustin) que, em agosto, se envolveram num escândalo de corrupção.
Na ocasião, o
presidente do Banco Nacional de Crédito, Raoul Pascal Pierre-Louis, alegou que
esses três membros da CPT haviam exigido dele a quantia de US$ 758 mil (R$ 4,3
bi) para garantir sua continuidade no cargo.
Em resposta às
graves acusações, no início de outubro, a unidade anticorrupção do Haiti
(ULCC), um órgão oficial, emitiu relatório que aconselhava a abertura de
processos judiciais contra os três membros da CPT.
Essa situação
aumentou a pressão sobre a CPT para substituir os representantes, mas devido à
natureza sem precedentes do conselho de transição, criado fora da estrutura
constitucional e sem eleições, o órgão interino permaneceu em funcionamento.
Apesar da crescente
impopularidade do CPT entre a população haitiana e das afirmações de que a
demissão de Conille teria sido ilegal, o empresário Fils-Aimé tomou posse como
primeiro-ministro.
Alix Didier Fils-Aimé
é uma das figuras mais fortes do empresariado haitiano. Formado pela
Universidade de Boston, ele atuou como presidente da Câmara de Comércio e
Indústria do país e, em 2016, concorreu sem sucesso ao Senado.
Fonte: Sputnik
Brasil/A Terra é Redonda/Opera Mundi
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