Cassação de
Bolsonaro empurra direita para o centro
A
condenação de Jair Bolsonaro a ficar fora de eleições até 2030 consolida a
influência do ministro Alexandre de Moraes sobre o Tribunal Superior Eleitoral
(TSE) e sobre o Judiciário, após uma guerra aberta de anos com o ex-presidente
da República em torno da disseminação de fake news sobre a confiabilidade do
sistema eleitoral e de iniciativas golpistas que culminaram nos atos de 8 de
janeiro.
Consolida,
também, as regras para os próximos julgamentos (só sobre Bolsonaro há outros 15
ações no TSE) e para as próximas eleições. E, ao fazer isso, empurra a direita
brasileira mais para o centro – já que, como disse Moraes em seu voto, essa
decisão servirá de base para 2024 e 2026. “Para que candidatos não se utilizem
de seus cargos públicos para disseminar notícias fraudulentas sobre fraude
eleitoral e para, com isso, atingir o eleitor”.
O
fato de Bolsonaro ter sido declarado inelegível por 5 votos a 2 pode sugerir
que foi uma vitória fácil para Moraes, mas quem acompanhou nos bastidores sabe
que o presidente do TSE em nenhum momento relaxou a vigilância sobre os
movimentos do adversário e nem dos próprios colegas.
Ele
mesmo rememorou esse histórico em seu voto, que teve efeito semelhante ao de um
“discurso da vitória”.
Depois
de chamar a campanha de Bolsonaro contra as urnas eletrônicas de “desinformação
divulgada por verdadeiros milicianos digitais”, e de defini-la como fruto de um
“degradante populismo renascido a partir das chamas dos discursos de ódio”,
Moraes disse que o desfecho da condenação podia ter sido previsto desde junho
passado, quando o TSE cassou e tornou inelegível o deputado estadual do Paraná
Fernando Francischini (União).
“A
Corte já havia definido de forma pública e para todos os candidatos
independentemente de partido e ideologia tinham consciência dos parâmetros
estabelecidos e que deveriam ser rigorosamente observados”, disse Moraes.
Francischini
foi punido por afirmar em uma live durante o primeiro turno das eleições de
2018, com a votação em andamento e sem apresentar nenhuma prova, que as urnas
eletrônicas tinham sido adulteradas para impedir a eleição do presidente Jair
Bolsonaro. Desde a cassação, Moraes trabalhou para garantir que o entendimento
adotado naquele julgamento permanecesse válido, apesar de alguns percalços
processuais e da troca de dois ministros do TSE que poderia ter tornado a
missão bem mais difícil.
No
primeiro caso, seu colega de Supremo Kassio Nunes Marques, nomeado por
Bolsonaro para o cargo, deu uma liminar suspendendo a cassação — que um mês
depois foi derrubada pela Segunda Turma do STF.
Em
razão do mal estar gerado por essa decisão, circulou nos bastidores do Supremo
a especulação de que Gilmar Mendes e outros aliados de Moraes estavam
preparando uma manobra para que Nunes Marques não se tornasse titular do TSE. A
iniciativa não se confirmou, mas a guerra de nervos parece ter ajudado a
suavizar o comportamento do ministro.
Bolsonaro
ajudou — e muito. Desde que a ação do PDT julgada nesta sexta ingressou no
tribunal, o então presidente da República promoveu uma escalada de ataques à
credibilidade do sistema eleitoral que fez a preleção aos embaixadores parecer
brincadeira de criança.
As
lives, as repetidas ameaças de resistência a uma eventual derrota nas eleições,
a denúncia sem provas de que rádios estivessem suprimindo suas propagandas na
campanha e, por fim, a descoberta de uma “minuta do golpe” na casa do
ex-ministro da Justiça Anderson Torres, demonstraram que Bolsonaro e seus
seguidores simplesmente não respeitariam nenhum limite para tentar impor sua
vontade sobre a do resto do eleitorado.
Ainda
assim, até recentemente a prevalência de Moraes sobre o plenário do TSE não era
garantida. A aposentadoria de Ricardo Lewandowski, em abril, abalou a
correlação de forças dentro da Corte.
Antes,
Moraes contava com o apoio incondicional de Lewandowski, Cármen Lúcia e do
corregedor Benedito Gonçalves, sempre formando uma maioria de ao menos quatro
votos em julgamentos cruciais do plenário.
Com
a saída de Lewandowski, a divisão dos votos ficou mais apertada. Além de Raul
Araújo, mais alinhado ao bolsonarismo, pelo menos dois ministros não seguiam
automaticamente o presidente do TSE – Carlos Horbach, que votou contra a
cassação de Francischini, e Sergio Banhos, que foi voto vencido pela retirada
do ar de videos em que Lula chamava Bolsonaro de genocida.
Foi
só com o final dos mandatos de Banhos e Horbach que o presidente do TSE conseguiu
emplacar em seu lugar dois aliados – Floriano de Azevedo Marques e André Ramos
Tavares, que estrearam no TSE já votando pela condenação do ex-presidente.
A
partir dessa troca, Moraes pôde ficar mais à vontade. Só faltava garantir que
os dois ministros mais alinhados a Bolsonaro restantes no tribunal, Raul Araújo
e Kassio Nunes Marques, não tentariam adiar o julgamento por mais dois meses,
pedindo vista do processo.
Foi
o que o presidente do TSE fez nas últimas semanas, em conversas fechadas com os
colegas em que apelou para que se encerrasse de vez o processo contra o
ex-presidente. Moraes não conseguiu virar o voto dos colegas, mas demonstrou
nesta sexta-feira que detém de fato o poder sobre o plenário.
Em
maio, diante de uma roda de convidados ilustres do casamento do filho de seu
aliado Luis Felipe Salomão, Moraes fez uma previsão quase profética: em seis
meses estaria “tudo resolvido”. Na interpretação de interlocutores do ministro,
por “tudo resolvido” entenda-se condenar Bolsonaro à inelegibilidade e encerrar
os inquéritos sobre os atos de 8 de janeiro.
Daqui
por diante, as centenas de ações no Supremo contra os golpistas que invadiram a
sede dos três poderes serão acelerados.
Se
a estratégia for tão eficiente quanto a que levou à condenação de Bolsonaro
nesta sexta-feira, até o final do ano o Judiciário terá encerrado pelo menos a
parte que importa sobre o rescaldo das eleições de 2022.
Estará
aberta então oficialmente uma nova disputa para ver quem assumirá o legado do
bolsonarismo e da extrema-direita, agora sob as regras de Moraes no TSE.
• Eduardo Bolsonaro se vitimiza e
"chora" nas redes ao falar da condenação do pai no TSE
Desde
que ascenderam ao cenário político, a família Bolsonaro e seus apoiadores
acusam a esquerda de ser "vitimista" e de fazer "mimimi"
nas redes. No entanto, agora eles fazem uso desses "mecanismos
retóricos" quando se sentem acuados.
Como
é sabido, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) condenou nesta sexta-feira (30) o
ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) por abuso de poder político, tornando-o
inelegível por oito anos, ou seja, até 2030.
Diante
dessa realidade, a claque bolsonarista iniciou um chorume interminável de
lamentações nas redes, acusando a Justiça brasileira de perseguir o
ex-presidente Jair Bolsonaro.
Quem
também se juntou a esse derramamento foi o deputado Eduardo Bolsonaro (PL-SP),
o filho "02" do ex-presidente Bolsonaro. Com discurso vitimista,
Eduardo afirmou que "não é na glória que conhecemos nossa verdadeira
força, mas sim nas adversidades. No final, vence aquele que consegue suportar a
dor", lamentou.
"Não
se esqueçam de quem venceu o mundo numa cruz e cuja mensagem persiste até hoje.
Não somos perfeitos, mas somos sinceros, e nosso sonho continua mais vivo do
que nunca. BRASIL ACIMA DE TUDO! DEUS ACIMA DE TODOS!", concluiu Eduardo
Bolsonaro.
Inelegível, Bolsonaro cita Lula 5 vezes
em 1 minuto e invoca até Massacre do Carandiru
Jair
Bolsonaro, além de extremamente irritado, deu uma declaração confusa na noite
desta sexta-feira (30) ao desembarcar no Aeroporto de Brasília, que estava
lotado de pessoas comemorando sua inelegibilidade por 8 anos.
Em
rápida conversa com a imprensa, que o questionou sobre a decisão do Tribunal
Superior Eleitoral (TSE) que cassou seus direitos políticos, Bolsonaro citou o
presidente Luiz Inácio Lula da Silva cinco vezes em pouco menos de um minuto e
misturou assuntos totalmente diferentes, como o Massacre do Carandiru.
"Onde
vamos parar? O que querem? Me tirar. Ao que tudo indica, me tiraram. O Lula é
democrata? Nem vou falar em corrupção. O Lula é democrata? O Lula é paz e amor?
O Lula é a solução para o Brasil? O Lula é menos ódio? Não basta ele falar o
que falou do Sergio Moro?", questionou o ex-presidente.
"Eu
dei a graça para o Daniel Silveira, derrubaram o decreto. Nunca se viu isso. É
competência do presidente. É a mesma coisa o pessoal do Carandiru. O que diz a
lei? Pra citar no caso o indulto do caso do Carandiru. O fato ter ocorrido há
mais de 30 anos. Eu dei o indulto em dezembro de 2022. Mais de 30 anos. Vão
derrubar isso também?", disparou ainda.
Bolsonaro diz que Brasil está de luto; a
festa, no entanto, se espalha por toda parte
O
ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) afirmou, logo após a decisão do Tribunal
Superior Eleitoral (TSE) de declarar a sua inelegibilidade, que o Brasil fica
de luto
“Acho
que o Brasil fica de luto, mas alguém vai soltar fogos, obviamente”, declarou.
A
frase de Bolsonaro, no entanto, contrasta com o que se viu em vários lugares do
país na noite desta sexta-feira (30. A festa para comemorar sua inelegibilidade
explodiu em bares, shows, pelas ruas, enfim, por todas as partes.
Veja
alguns exemplos abaixo:
• Facada nas costas
O
lamento de Bolsonaro não parou por aí. Ele afirmou também que a sua declaração
de inelegibilidade pelo TSE foi uma ‘facada nas costas’.
“Não
gostaria de me tornar inelegível. Há pouco tempo tomei uma facada na barriga,
hoje uma facada nas costas”, disse o ex-capitão.
Perguntado
sobre possíveis nomes para substituí-lo na arena eleitoral, o ex-presidente
tergiversou. “Eu não estou morto, vamos continuar trabalhando. Não é o fim da
direita no Brasil. Antes de mim ela existia, mas não tinha forma. Começou a
ganhar materialidade”, prosseguiu.
Lágrimas bolsonaristas: veja as
"melhores" lamentações à inelegibilidade de Bolsonaro
O
Brasil está em festa. Nesta sexta-feira (30), o Tribunal Superior Eleitoral
(TSE), por 5 votos a 2, condenou Jair Bolsonaro e o ex-presidente se tornou
inelegível por 8 anos e, caso queira voltar à vida política, só poderá ser
candidato novamente em 2023 - isso se até lá ele não for preso a partir de um
dos inúmeros processos e inquéritos dos quais é alvo.
A
maior parte dos usuários das redes sociais vêm celebrando a decisão. Uma
minoria de parlamentares bolsonaristas, entretanto, estão esboçando reação
contrária. Entre os apoiadores do ex-presidente, há um misto entre lamentação,
raiva e frieza - o que já vem fazendo essas publicações contra o julgamento do
TSE virarem motivo de chacota.
O
deputado federal Nikolas Ferreira (PL-MG), por exemplo, deixou a habitual
estridência de lado e se limitou a dizer: "Vence o sistema". As
respostas à publicação do bolsonarista são puro deboche. A deputada estadual
Laura Sito (PT-RS), respondeu ironizando: "Vence o sistema eletrônico de
votação?".
Já
a deputada federal Carla Zambelli (PL-SP), apontada como a próxima a ter o
mandato cassado, fez uma postagem em tom de ameaça: "A semeadura do
Presidente Bolsonaro não desaparecerá".
O
deputado Gustavo Gayer (PL-MG), por sua vez, que é acusado de duplo homicídio
ao dirigir embriagado e que se tornou alvo de ministros do governo Lula após
fala racista contra a população africana, disse que "o sistema é foda
nessa democracia relativa".
Há
também aqueles que, abalados, não conseguiram ainda esboçar reação, como é o
caso de um dos filhos do ex-presidente inelegível, o deputado Eduardo Bolsonaro
(PL-SP). Conhecido como "Bananinha", o parlamentar vem mantendo o
silêncio desde a sentença do TSE.
Por
fim, o próprio condenado, Jair Bolsonaro, reagiu com chilique em entrevista à
CNN Brasil. O ex-presidente não conseguiu esconder a irritação com a decisão.
“Há pouco tempo tentaram me matar em Juiz de Fora, levei uma facada na barriga.
Hoje, levei uma facada nas costas com a inelegibilidade”, reclamou.
• Fim do “Trump dos Trópicos”, diz
Washington Post
A
decisão do Tribunal Superior Eleitoral (TSE)
para tornar o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) inelegível por oito anos
teve ampla repercussão na imprensa internacional.
O
Washington Post se referiu a Bolsonaro como “Trump dos Trópicos”.
“Como
presidente, o ‘Trump dos Trópicos’ repetidamente afirmou sem provas que os
sistemas de votação no maior país da América Latina eram vulneráveis a fraudes.
Com o voto da juíza Cármen Lúcia na tarde desta sexta-feira, os sete membros do
Tribunal Superior Eleitoral chegaram a uma maioria para condenar o populista de
direita por abuso de poder por minar a fé na jovem democracia do país!”,
destacou um dos trechos da matéria.
“A
decisão significa que Bolsonaro, 68 anos, não poderá concorrer à presidência
até a eleição de 2030, quando ele terá 75 anos. É a primeira vez em 90 anos de
história que o tribunal aplica a proibição a um ex-presidente. O veredicto
desta sexta-feira foi o primeiro de várias investigações contra Bolsonaro. Ele
continua acusado em vários processos criminais e eleitorais”, acrescentou o
Washington Post.
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Veja a reação de outros veículos
The
New York Times: “A decisão é uma repreensão afiada e rápida do Sr. Bolsonaro e
seu esforço para minar as eleições do Brasil. Há apenas seis meses, o Sr.
Bolsonaro era presidente de uma das maiores democracias do mundo. Agora, sua
carreira como político está em risco”.
Bloomberg:
“Os esforços de Bolsonaro para semear dúvidas sobre as eleições de 2022 agora
colocam em risco seu futuro político”.
The
Guardian: “A marginalização de Bolsonaro, a figura dominante na direita
brasileira, gerou especulações sobre quem pode herdar os formidáveis 58 milhões
de votos que recebeu no ano passado”.
Diários
de Notícias, de Portugal, sobre as eleições de 2024: “Eles devem criar uma
campanha sob o mote ‘perseguição política’ para angariar mais votos”.
BBC,
CNN e Al Jazeera ressaltaram que a defesa de Bolsonaro ainda pode recorrer ao
Supremo Tribunal Federal (STF), embora seja muito difícil uma reviravolta na
decisão.
Fonte:
O Globo/Fórum
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