Moisés
Mendes: Os estragos que Braga Netto ainda pode causar
Braga Netto não conta com
uma só defesa incisiva, categórica e incondicional que o console na condição de
golpista encarcerado. Todas as figuras públicas que o defendem fazem volteios
para dizer que ele deveria estar em liberdade.
Há manifestações
protocolares, noticiadas sem destaque por não terem nem o componente de uma
certa indignação. São defesas sem vitalidade, como as que partiram de Bolsonaro
e de Hamilton Mourão.
Todos seguem a mesma linha
de que é uma prisão injusta, o que não diz nada. E alguns até admitem, como
Mourão, que um grupo de generais pode ter sonhado com o golpe, mas apenas como
delírio, e esse pessoal todo era da reserva.
O senador Mourão até
desqualificou os colegas, ao falar do que teria sido uma tentativa de golpe
tabajara. Jornalistas que dão suporte às ideias e ações da direita, da velha e
da nova, reforçam que a articulação envolvia só gente de pijama. E poderíamos
ter então um golpe culposo, mas sem dolo.
Uma dúvida sumária a partir
de agora, considerando-se as reações e um possível suporte de comparsas à
situação de Braga Netto, é esta: que estragos acontecerão na sequência que
possam mexer com o rumo das investigações e alterar a retórica frouxa dos que
fingem defendê-lo?
Braga Netto é uma bomba que
pode se implodir a qualquer momento? Qual a disposição do general em se livrar
de parte da carga que deveria ser carregada por outros, para tentar atenuar
suas culpas? Quem mais Braga Netto vai puxar para a cadeia?
O general é uma explosão
possível, pelo temperamento que os colegas conhecem. E é também muito mais do que
um arquivo. É o cabeça, o mais respeitável dos fardados e civis entre todos os
golpistas.
Foi o primeiro em tudo da
sua geração, teve uma formação que poucos tiveram, é talentoso e conheceu os
corredores, as cozinhas e os subterrâneos da política e do poder, desde o
momento em que comandou a intervenção de 2018 no Rio.
Sabe do que a maioria nunca
pensou saber. Ouviu coisas de Bolsonaro que nenhum outro deve ter ouvido.
Mostrou a cara, como naquele vídeo do ‘não percam a fé’, de 18 de novembro,
como alguém que acreditava no êxito do que estava fazendo e se dispunha a
correr riscos.
Braga Netto pode ir muito
além das informações do leva e traz de Mauro Cid. Pode contar o que o coronel
ajudante de ordens nem sabe direito.
E sabe como foi organizada e
transcorreu a reunião de 12 de novembro de 2022 em que os assassinatos de Lula,
Alckmin e Alexandre de Moraes teriam sido tramados. Tudo dentro da sua casa.
Uma informação de Braga
Netto, uma só, pode desatar nós decisivos para a compreensão da estrutura do
golpe e do envolvimento de Bolsonaro, incluindo os financiadores do plano. Mas
até quando o general vai aguentar?
Quanto irá durar sua prisão
preventiva, sabendo-se que a calibragem desse tempo depende de fatores
aleatórios e sempre questionáveis. São até agora 64 as prisões preventivas de
bolsonaristas determinadas por Moraes, todas com prazos de duração variados.
Braga Netto pode ser mantido
encarcerado por quantos meses? A prisão o submete ao teste de resiliência que,
por treinamento, os militares são obrigados a aguentar. Colegas que estavam
dentro ou fora do golpe devem saber quanto tempo ele aguenta.
¨
Noblat: A
lealdade do general Braga Netto a Bolsonaro não é retribuída
Uma
vez que a política é como uma nuvem que muda de forma a cada momento, não cobre
acertos em demasia a quem é obrigado a observá-la e a escrever a respeito. O
“Repórter Esso”, o primeiro noticiário de radiojornalismo do Brasil, se dizia
“testemunha ocular da história” entre os anos 1940 e final dos anos 1960.
Mas
isso era força de expressão acima de tudo. “Testemunha ocular” é quem presencia
diretamente um fato ou evento, podendo relatar em detalhes o que viu, ouviu ou
percebeu. Raramente, e não só aqui, assistimos de fato o que acontece. Ouvimos
muito sobre o que aconteceu depois do acontecido, e aí registramos.
Feita
a ressalva… Em off, sempre em off, parte dos que se oferecem como porta-vozes
informais do meio militar diz que por ali reina paz apesar da prisão de um
general de quatro estrelas, da detenção de oito altos oficiais e do indiciamento
de outros 25 por suspeita de terem tramado a derrubada do Estado Democrático de
Direito.
Outra
parte dos porta-vozes informais do meio militar, contudo, em off, sempre em
off, diz que não é bem assim. Reina muito nervosismo entre militares da ativa e
da caserna, e tanto mais porque espera-se, em breve, o indiciamento de novos
oficiais de alta patente, inclusive generais, implicados no golpe que
fracassou.
O
atual comando do Exército e da Aeronáutica é legalista; o da Marinha, há poucas
semanas, revelou-se menos ao postar em suas redes um vídeo que exaltava a vida
dura dos militares em contraste com a aparente boa vida dos paisanos. Lula
ficou furioso e cobrou explicações. Aguarda um pedido de desculpas do
comandante.
Quem
também aguarda é José Múcio Monteiro, ministro da Defesa, conhecido entre os
colegas como “ministro-do-deixa disso”. Múcio foi pego de surpresa pelo vídeo.
Desde que tomou posse, Lula já almoçou ou jantou com os comandantes quatro
vezes – uma única, na casa de um deles, justamente o da Marinha.
Presidente
da República não pede desculpas. Se não quiser ser substituído, então que o
comandante da Marinha peça desculpas. Não é humilhação admitir que errou. Múcio
já substituiu um comandante do Exército antes que Lula exigisse sua demissão.
Lula sabe ser bonzinho quando quer, ou mau como um pica-pau.
Bolsonaro
é useiro e vezeiro em abandonar quem lhe fez companhia e acabou mais tarde
caindo em desgraça. Deu sinais de que continuará se comportando assim ao saber
da prisão de Braga Netto, seu ex-ministro da Casa Civil e da Defesa, e
candidato a vice-presidente em sua chapa nas eleições de 2022.
Levou
12 horas para dizer algo. E quando disse, não foi para defender o general, mas
para reclamar da Polícia Federal que o teria indiciado depois do encerramento
do inquérito. Braga Netto notou a diferença. Se condenado, os crimes que lhe
são atribuídos poderão render uma pena de prisão superior a 30 anos.
Um
trecho da nota de defesa do general dá uma pista de como ele poderá reagir ao
abandono anunciado por Bolsonaro. Eis o trecho:
–
Durante o governo passado, [o general] foi um dos poucos, entre civis e
militares, que manteve lealdade ao presidente Bolsonaro até o final do governo,
em dezembro de 2022, e a mantém até os dias atuais, por crença nos mesmos
valores e princípios inegociáveis.
Que
valores e princípios inegociáveis são esses? A lealdade é um dos valores mais
cultuados pelos militares. A obediência é outro valor. Soldado algum obedece à
ordem de ir à guerra e arrisca-se a morrer se seu superior não for leal a ele,
e vice-versa. Não se abandonam feridos e mortos em campos de batalha.
Como
tudo isso acabará um dia? Não faço ideia. Torço para que acabe bem, com a
punição dos culpados e o fortalecimento da democracia. Mas aprendi há muito
tempo que não posso confundir o que desejo que aconteça com o que irá
acontecer. Daí porque sigo observando a nuvem com meu olho já cansado.
¨ Braga Netto
foi ao Alvorada em 44 dos últimos 60 dias do governo Bolsonaro
Nos dois meses finais do
governo Jair Bolsonaro (PL), o então ex-ministro da Defesa e general da reserva
Walter Braga Netto esteve no Palácio da Alvorada em 44 dos 60 dias entre 31 de
outubro e 30 de dezembro de 2022. Nesse período, ele realizou 55 visitas ao
local, número que ultrapassa até mesmo o do tenente-coronel Mauro Cid,
ex-ajudante de ordens do ex-presidente, com 53 idas registradas. A informação
foi divulgada originalmente pelo jornal O Globo, e posteriormente
utilizada pela Polícia Federal (PF) como evidência na investigação em curso.
Braga Netto, que chefiou a
Casa Civil e chegou a ser candidato a vice de Bolsonaro em 2022, foi preso no
último sábado sob suspeita de tentar obstruir as investigações da PF. De acordo
com a delação premiada de Mauro Cid, o general teria inclusive entregue dinheiro
para financiar as supostas operações do grupo criminoso com vistas a um golpe
de estado. A defesa de Braga Netto nega as acusações e afirma que provará não
ter havido qualquer ação para dificultar as apurações.
A movimentação de Braga
Netto no Alvorada, residência oficial da Presidência da República, sugere
intensa atividade nos bastidores após a derrota de Bolsonaro no segundo turno.
As visitas variaram em duração: algumas foram breves, de menos de uma hora,
enquanto outras chegaram a durar mais de onze horas. Em 4 de novembro, por
exemplo, o general permaneceu 11 horas e 24 minutos no local. Já no dia 22 do
mesmo mês, quando o Partido Liberal (PL) apresentou ao Tribunal Superior
Eleitoral (TSE) um pedido para anular votos de aproximadamente 60% das urnas
utilizadas no segundo turno, Braga Netto passou pouco mais de dez horas no
palácio, entre 9h06 e 19h14.
Além de tais permanências
prolongadas, há registros de declarações do general a apoiadores de Bolsonaro.
Em 18 de novembro, após passar mais de oito horas no Alvorada, ele foi gravado
dizendo: “Vocês não percam a fé. É só o que eu posso falar para vocês agora”.
Nesse contexto, a investigação também aponta que a presença do general no
palácio coincidiu com ao menos três reuniões com os comandantes das Forças
Armadas — em 1º, 14 e 22 de novembro. Segundo a PF, foram nesses encontros que
Bolsonaro teria apresentado aos chefes militares uma proposta para reverter o
resultado eleitoral que levou Luiz Inácio Lula da Silva (PT) à Presidência.
O último registro de entrada
de Braga Netto no Alvorada aconteceu em 26 de dezembro, quando permaneceu quase
onze horas, entre 8h46 e 19h25. No dia seguinte, ele ainda demonstrava
confiança em seguir no governo, ao escrever para um assessor de Bolsonaro: “Se
continuarmos poderia enviar para a Sec Geral (Secretaria-Geral)”.
Com a prisão do general e a
análise detalhada do material coletado, a Polícia Federal busca esclarecer os
reais objetivos dessas articulações, bem como o papel desempenhado por Braga
Netto e outros aliados de Bolsonaro na suposta intenção de minar o resultado
eleitoral e a posse do presidente Lula.
¨ PF vai
analisar celulares apreendidos antes de marcar depoimento de Braga Netto
A Polícia Federal pretende
concluir a análise de dois celulares apreendidos na casa de Walter Braga Netto
antes de marcar o depoimento do general, informa O Globo. Braga Netto foi preso no último sábado (14) por
tentar interferir nas investigações sobre uma tentativa de golpe de Estado no
país após as eleições de 2022.
O militar foi preso em
Copacabana, na Zona Sul do Rio. Em seguida, foi encaminhado à 1ª Divisão de Exército,
na Vila Militar, no Rio, onde está sob custódia do Exército.
No relatório em que pede a
prisão de Braga Netto ao Supremo Tribunal Federal (STF), a PF afirma que o
ex-ministro tentou conseguir "informações sobre o acordo de
colaboração" do tenente-coronel Mauro Cid, ex-ajudante de ordens do
ex-presidente Jair Bolsonaro (PL). Essa tentativa teria ocorrido por meio de
contatos com os pais de Cid.
Em sua delação, Mauro Cid
afirmou que Braga Netto entregou dinheiro para financiar operações de um grupo
composto por militares “kids pretos”. Esse grupo planejava a execução do plano
Punhal Verde e Amarelo, que visava os assassinatos do presidente Lula (PT), do
vice Geraldo Alckmin (PSB) e do ministro Alexandre de Moraes, do STF. Após os
homicídios, Braga Netto comandaria, junto ao general Augusto Heleno, um
gabinete de gestão de crise, dando início a uma ditadura bolsonarista no país.
Fonte: Brasil 247/Metrópoles
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