quarta-feira, 18 de dezembro de 2024

Moisés Mendes: Os estragos que Braga Netto ainda pode causar

Braga Netto não conta com uma só defesa incisiva, categórica e incondicional que o console na condição de golpista encarcerado. Todas as figuras públicas que o defendem fazem volteios para dizer que ele deveria estar em liberdade.

Há manifestações protocolares, noticiadas sem destaque por não terem nem o componente de uma certa indignação. São defesas sem vitalidade, como as que partiram de Bolsonaro e de Hamilton Mourão.

Todos seguem a mesma linha de que é uma prisão injusta, o que não diz nada. E alguns até admitem, como Mourão, que um grupo de generais pode ter sonhado com o golpe, mas apenas como delírio, e esse pessoal todo era da reserva.

O senador Mourão até desqualificou os colegas, ao falar do que teria sido uma tentativa de golpe tabajara. Jornalistas que dão suporte às ideias e ações da direita, da velha e da nova, reforçam que a articulação envolvia só gente de pijama. E poderíamos ter então um golpe culposo, mas sem dolo.

Uma dúvida sumária a partir de agora, considerando-se as reações e um possível suporte de comparsas à situação de Braga Netto, é esta: que estragos acontecerão na sequência que possam mexer com o rumo das investigações e alterar a retórica frouxa dos que fingem defendê-lo?

Braga Netto é uma bomba que pode se implodir a qualquer momento? Qual a disposição do general em se livrar de parte da carga que deveria ser carregada por outros, para tentar atenuar suas culpas? Quem mais Braga Netto vai puxar para a cadeia?

O general é uma explosão possível, pelo temperamento que os colegas conhecem. E é também muito mais do que um arquivo. É o cabeça, o mais respeitável dos fardados e civis entre todos os golpistas.

Foi o primeiro em tudo da sua geração, teve uma formação que poucos tiveram, é talentoso e conheceu os corredores, as cozinhas e os subterrâneos da política e do poder, desde o momento em que comandou a intervenção de 2018 no Rio.

Sabe do que a maioria nunca pensou saber. Ouviu coisas de Bolsonaro que nenhum outro deve ter ouvido. Mostrou a cara, como naquele vídeo do ‘não percam a fé’, de 18 de novembro, como alguém que acreditava no êxito do que estava fazendo e se dispunha a correr riscos.

Braga Netto pode ir muito além das informações do leva e traz de Mauro Cid. Pode contar o que o coronel ajudante de ordens nem sabe direito.

E sabe como foi organizada e transcorreu a reunião de 12 de novembro de 2022 em que os assassinatos de Lula, Alckmin e Alexandre de Moraes teriam sido tramados. Tudo dentro da sua casa.

Uma informação de Braga Netto, uma só, pode desatar nós decisivos para a compreensão da estrutura do golpe e do envolvimento de Bolsonaro, incluindo os financiadores do plano. Mas até quando o general vai aguentar?

Quanto irá durar sua prisão preventiva, sabendo-se que a calibragem desse tempo depende de fatores aleatórios e sempre questionáveis. São até agora 64 as prisões preventivas de bolsonaristas determinadas por Moraes, todas com prazos de duração variados.

Braga Netto pode ser mantido encarcerado por quantos meses? A prisão o submete ao teste de resiliência que, por treinamento, os militares são obrigados a aguentar. Colegas que estavam dentro ou fora do golpe devem saber quanto tempo ele aguenta.

 

¨         Noblat: A lealdade do general Braga Netto a Bolsonaro não é retribuída

Uma vez que a política é como uma nuvem que muda de forma a cada momento, não cobre acertos em demasia a quem é obrigado a observá-la e a escrever a respeito. O “Repórter Esso”, o primeiro noticiário de radiojornalismo do Brasil, se dizia “testemunha ocular da história” entre os anos 1940 e final dos anos 1960.

Mas isso era força de expressão acima de tudo. “Testemunha ocular” é quem presencia diretamente um fato ou evento, podendo relatar em detalhes o que viu, ouviu ou percebeu. Raramente, e não só aqui, assistimos de fato o que acontece. Ouvimos muito sobre o que aconteceu depois do acontecido, e aí registramos.

Feita a ressalva… Em off, sempre em off, parte dos que se oferecem como porta-vozes informais do meio militar diz que por ali reina paz apesar da prisão de um general de quatro estrelas, da detenção de oito altos oficiais e do indiciamento de outros 25 por suspeita de terem tramado a derrubada do Estado Democrático de Direito.

Outra parte dos porta-vozes informais do meio militar, contudo, em off, sempre em off, diz que não é bem assim. Reina muito nervosismo entre militares da ativa e da caserna, e tanto mais porque espera-se, em breve, o indiciamento de novos oficiais de alta patente, inclusive generais, implicados no golpe que fracassou.

O atual comando do Exército e da Aeronáutica é legalista; o da Marinha, há poucas semanas, revelou-se menos ao postar em suas redes um vídeo que exaltava a vida dura dos militares em contraste com a aparente boa vida dos paisanos. Lula ficou furioso e cobrou explicações. Aguarda um pedido de desculpas do comandante.

Quem também aguarda é José Múcio Monteiro, ministro da Defesa, conhecido entre os colegas como “ministro-do-deixa disso”. Múcio foi pego de surpresa pelo vídeo. Desde que tomou posse, Lula já almoçou ou jantou com os comandantes quatro vezes – uma única, na casa de um deles, justamente o da Marinha.

Presidente da República não pede desculpas. Se não quiser ser substituído, então que o comandante da Marinha peça desculpas. Não é humilhação admitir que errou. Múcio já substituiu um comandante do Exército antes que Lula exigisse sua demissão. Lula sabe ser bonzinho quando quer, ou mau como um pica-pau.

Bolsonaro é useiro e vezeiro em abandonar quem lhe fez companhia e acabou mais tarde caindo em desgraça. Deu sinais de que continuará se comportando assim ao saber da prisão de Braga Netto, seu ex-ministro da Casa Civil e da Defesa, e candidato a vice-presidente em sua chapa nas eleições de 2022.

Levou 12 horas para dizer algo. E quando disse, não foi para defender o general, mas para reclamar da Polícia Federal que o teria indiciado depois do encerramento do inquérito. Braga Netto notou a diferença. Se condenado, os crimes que lhe são atribuídos poderão render uma pena de prisão superior a 30 anos.

Um trecho da nota de defesa do general dá uma pista de como ele poderá reagir ao abandono anunciado por Bolsonaro. Eis o trecho:

– Durante o governo passado, [o general] foi um dos poucos, entre civis e militares, que manteve lealdade ao presidente Bolsonaro até o final do governo, em dezembro de 2022, e a mantém até os dias atuais, por crença nos mesmos valores e princípios inegociáveis.

Que valores e princípios inegociáveis são esses? A lealdade é um dos valores mais cultuados pelos militares. A obediência é outro valor. Soldado algum obedece à ordem de ir à guerra e arrisca-se a morrer se seu superior não for leal a ele, e vice-versa. Não se abandonam feridos e mortos em campos de batalha.

Como tudo isso acabará um dia? Não faço ideia. Torço para que acabe bem, com a punição dos culpados e o fortalecimento da democracia. Mas aprendi há muito tempo que não posso confundir o que desejo que aconteça com o que irá acontecer. Daí porque sigo observando a nuvem com meu olho já cansado.

 

¨      Braga Netto foi ao Alvorada em 44 dos últimos 60 dias do governo Bolsonaro

Nos dois meses finais do governo Jair Bolsonaro (PL), o então ex-ministro da Defesa e general da reserva Walter Braga Netto esteve no Palácio da Alvorada em 44 dos 60 dias entre 31 de outubro e 30 de dezembro de 2022. Nesse período, ele realizou 55 visitas ao local, número que ultrapassa até mesmo o do tenente-coronel Mauro Cid, ex-ajudante de ordens do ex-presidente, com 53 idas registradas. A informação foi divulgada originalmente pelo jornal O Globo, e posteriormente utilizada pela Polícia Federal (PF) como evidência na investigação em curso.

Braga Netto, que chefiou a Casa Civil e chegou a ser candidato a vice de Bolsonaro em 2022, foi preso no último sábado sob suspeita de tentar obstruir as investigações da PF. De acordo com a delação premiada de Mauro Cid, o general teria inclusive entregue dinheiro para financiar as supostas operações do grupo criminoso com vistas a um golpe de estado. A defesa de Braga Netto nega as acusações e afirma que provará não ter havido qualquer ação para dificultar as apurações.

A movimentação de Braga Netto no Alvorada, residência oficial da Presidência da República, sugere intensa atividade nos bastidores após a derrota de Bolsonaro no segundo turno. As visitas variaram em duração: algumas foram breves, de menos de uma hora, enquanto outras chegaram a durar mais de onze horas. Em 4 de novembro, por exemplo, o general permaneceu 11 horas e 24 minutos no local. Já no dia 22 do mesmo mês, quando o Partido Liberal (PL) apresentou ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) um pedido para anular votos de aproximadamente 60% das urnas utilizadas no segundo turno, Braga Netto passou pouco mais de dez horas no palácio, entre 9h06 e 19h14.

Além de tais permanências prolongadas, há registros de declarações do general a apoiadores de Bolsonaro. Em 18 de novembro, após passar mais de oito horas no Alvorada, ele foi gravado dizendo: “Vocês não percam a fé. É só o que eu posso falar para vocês agora”. Nesse contexto, a investigação também aponta que a presença do general no palácio coincidiu com ao menos três reuniões com os comandantes das Forças Armadas — em 1º, 14 e 22 de novembro. Segundo a PF, foram nesses encontros que Bolsonaro teria apresentado aos chefes militares uma proposta para reverter o resultado eleitoral que levou Luiz Inácio Lula da Silva (PT) à Presidência.

O último registro de entrada de Braga Netto no Alvorada aconteceu em 26 de dezembro, quando permaneceu quase onze horas, entre 8h46 e 19h25. No dia seguinte, ele ainda demonstrava confiança em seguir no governo, ao escrever para um assessor de Bolsonaro: “Se continuarmos poderia enviar para a Sec Geral (Secretaria-Geral)”.

Com a prisão do general e a análise detalhada do material coletado, a Polícia Federal busca esclarecer os reais objetivos dessas articulações, bem como o papel desempenhado por Braga Netto e outros aliados de Bolsonaro na suposta intenção de minar o resultado eleitoral e a posse do presidente Lula.

¨      PF vai analisar celulares apreendidos antes de marcar depoimento de Braga Netto

A Polícia Federal pretende concluir a análise de dois celulares apreendidos na casa de Walter Braga Netto antes de marcar o depoimento do general, informa O Globo. Braga Netto foi preso no último sábado (14) por tentar interferir nas investigações sobre uma tentativa de golpe de Estado no país após as eleições de 2022.

O militar foi preso em Copacabana, na Zona Sul do Rio. Em seguida, foi encaminhado à 1ª Divisão de Exército, na Vila Militar, no Rio, onde está sob custódia do Exército. 

No relatório em que pede a prisão de Braga Netto ao Supremo Tribunal Federal (STF), a PF afirma que o ex-ministro tentou conseguir "informações sobre o acordo de colaboração" do tenente-coronel Mauro Cid, ex-ajudante de ordens do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL). Essa tentativa teria ocorrido por meio de contatos com os pais de Cid. 

Em sua delação, Mauro Cid afirmou que Braga Netto entregou dinheiro para financiar operações de um grupo composto por militares “kids pretos”. Esse grupo planejava a execução do plano Punhal Verde e Amarelo, que visava os assassinatos do presidente Lula (PT), do vice Geraldo Alckmin (PSB) e do ministro Alexandre de Moraes, do STF. Após os homicídios, Braga Netto comandaria, junto ao general Augusto Heleno, um gabinete de gestão de crise, dando início a uma ditadura bolsonarista no país.

 

Fonte: Brasil 247/Metrópoles

 

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