sábado, 7 de dezembro de 2024

Síndrome de Down: 45% a 50% nascem com cardiopatia, alerta especialista

No Brasil, a população com Síndrome de Down equivale a 350 mil pessoas e, a cada ano, surgem 8 mil novos casos. Desse total, aproximadamente 45% a 50% nascem com uma cardiopatia, ou seja, doença do coração. É o que alerta Zan Mustacchi, geneticista e pediatra do Hospital Darcy Vargas.

A doença é causada por uma alteração genética que leva a formação de um cromossomo 21 a mais, resultando em deficiência intelectual e características físicas como baixa estatura, raiz nasal achatada, mãos pequenas e dedos curtos, entre outras.

Segundo Navarro, é importante que a detecção de cardiopatias em pessoas com a síndrome seja realizada ainda no período fetal. “Essas crianças devem ser abordadas precocemente, e devem ter seu diagnóstico de preferência feito no período fetal. O ideal é que elas sejam operadas em torno de 4 a 6 meses de vida para não evoluírem para uma condição complexa que se chama hipertensão pulmonar”, afirma.

“Nós temos um fato técnico-científico relativamente recente, que nós conseguimos fazer a partir da coleta do sangue da mãe, como se fosse colher um hemograma, o Nipt, um exame não invasivo de diagnóstico pré-natal. A gente consegue uma margem de segurança de aproximadamente 98%”, explica Mustacchi.

O geneticista afirma que este exame, quando associado aos dados de ultrassonografia e do ecocardiograma fetal, são eficazes. Recentemente, o Nipt foi incluído como obrigatório no pré-natal, mas sua realização ainda não é acessível a todas as gestantes.

“É um exame simples, mas o acesso é difícil”, afirma Navarro. “Pensando na população em geral, normalmente temos a dificuldade do aparelho, dificuldade técnica…”, elenca a cardiologista, referindo-se também à falta de capacitação profissional para realização do exame.

Por este e outros fatores, nem sempre é feito o diagnóstico intrauterino, como seria o ideal. Nestes casos, Navarro defende também maior preparo da equipe médica para lidar com o momento de conversar com os pais a respeito.

“É muito comum dar a notícia que a criança tem T21 no parto, logo que tirou o bebê. Então, a mãe ainda está lá, sendo operada, no meio da cesárea… Ter essa sensibilidade para conversar com a mãe, esperar estar o pai, o companheiro, alguém junto. Não ter urgência para dar a notícia”, diz Navarro.

<><> Quais são os fatores de risco associados à síndrome de Down?

Durante o programa, os especialistas comentam sobre os fatores de risco para a trissomia do 21. O principal e mais conhecido deles é a idade materna avançada, mas esse não é o único.

“Se eu tenho alguém na família com T21, é um fator de risco aumentado. Se eu tenho alguém na família com a frequência de Alzheimer, é um fator de risco aumentado. Hipotireoidismo, especificamente autoimune, de uma forma que a gente chama de Hashimoto, também tem um risco aumentado. O ruim de a gente falar ‘aumentado’ é que parece 50%, 20%, 30%. Não, esse ‘aumentado’ é 1% a mais, 0,5% a mais”, explica Mustacchi.

Segundo o geneticista, os sinais são sempre relacionados aos ligamentos, sistema osteomuscular e desenvolvimento neuromotor. “Então, o bebê firma o pescoço? Claro que firma. Mas em vez de firmar com dois meses, isso acontece com dois e meio a três meses. O que não faz muita diferença”.

O especialista, no entanto, faz questão de afirmar que a condição do T21 não é impedimento para nada, desde que as pessoas tenham oportunidades e respeito.

“Infelizmente a população está habituada a ouvir que existem graus entre as pessoas. Nós não temos variedades de grau nenhum. Aqui no país, nós temos três palavras que sustentam hoje a questão do T21: oportunidade, respeito e segurança é a tríade de sustentação de qualquer indivíduo que tente viver adequadamente”, afirma.

<><> Redes sociais amplia a visibilidade sobre inclusão e representatividade

Navarro acrescenta que o uso das redes sociais alavancou a representatividade de pessoas com síndrome de Down em diferentes áreas.

“Hoje, com o advento das redes sociais, são os influencers digitais que mostram que eles estão indo para a faculdade, que eles estão indo trabalhar, que eles estão indo para a balada. Porque, na hora que nasce um bebê, por mais que a gente converse com essa família, explicando o que é, nada melhor do que uma mãe, uma família olhar e ver um João indo para a faculdade, uma Maju desfilando, os meninos trabalhando… Isso é fantástico”, diz, referindo-se aos modelos Maju de Araújo e João Vitor Paiva, que também é o primeiro conselheiro jovem T21 do Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef).

“Nada sobre nós, sem nós” é o lema deles, segundo Mustacchi. Para o geneticista, os portadores de T21 assumirem a narrativa da própria história é a melhor mudança que tem ocorrido nos últimos anos.

 

•                        Pesquisadores mapeiam risco de Alzheimer em pessoas com síndrome de Down

Pessoas com síndrome de Down apresentam envelhecimento acelerado e grande incidência da doença de Alzheimer na velhice. Pesquisadores da Universidade de São Paulo (USP) mapearam nessa população, por meio de técnicas de medicina nuclear, a presença de neuroinflamação e de um marcador importante desse tipo de demência: a placa beta-amiloide – formada por fragmentos de peptídeo amiloide que se depositam entre os neurônios causando inflamação e interrompendo a comunicação neural.

“Este foi o primeiro estudo no mundo a observar como se dá a neuroinflamação nessa população por meio de tomografia por emissão de pósitrons [PET, na sigla em inglês], com uso de radiofármacos específicos”, contou à Agência FAPESP Daniele de Paula Faria, pesquisadora do Laboratório de Medicina Nuclear (LIM43) do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP (HC-FM-USP).

A investigação foi conduzida no âmbito de um projeto desenvolvido em parceria com o Instituto Jô Clemente, o que possibilitou aos pesquisadores avaliar o cérebro de indivíduos com síndrome de Down de diferentes faixas etárias.

“Já se sabia que o processo de envelhecimento nessa população ocorre cerca de 20 anos adiantado, com menopausa precoce e o diagnóstico de doença de Alzheimer já após os 40 anos, por exemplo. Um aspecto importante é que o gene da proteína precursora amiloide [APP] está localizado no cromossomo 21, que é triplicado na síndrome de Down. Portanto, já era sabido que esses indivíduos produzem mais beta-amiloide que aqueles sem a síndrome. Nosso estudo foi importante, pois ainda não havia um entendimento aprofundado sobre os padrões de neuroinflamação no cérebro vivo de pessoas com síndrome de Down”, explicou a pesquisadora para a Agência FAPESP.

Os pesquisadores também acompanharam, ao longo de dois anos, a progressão da neuroinflamação e das placas beta-amiloide em camundongos modificados geneticamente para desenvolver uma condição semelhante à síndrome de Down. Vale lembrar que o ciclo de vida dos roedores é mais curto que o dos humanos e, portanto, um animal de dois anos equivaleria a um humano de 80.

“Conseguimos avaliar, com um equipamento específico para pequenos animais, toda a progressão da doença nos roedores. O estudo com os camundongos, somado ao feito com o grupo de indivíduos com síndrome de Down, nos trazem respostas importantes sobre o processo de envelhecimento dessa população”, afirmou a pesquisadora.

<><> Por dentro do cérebro

Esses dados ainda não publicados foram apresentados por Faria durante o Simpósio de Imagem Molecular, realizado nos dias 11 e 12 de setembro no Instituto de Radiologia do HC-FM-USP. Um dos objetivos do evento foi comemorar os dez anos da primeira imagem amiloide obtida no Brasil, o que foi possível com a compra dos equipamentos que produzem os radiofármacos (11C-PIB e 11C-PK11195) usados para visualizar as placas e a neuroinflamação no cérebro humano vivo. A aquisição ocorreu por meio de um Projeto Temático liderado por Geraldo Busatto Filho, coordenador do LIM21 (leia mais em: agencia.fapesp.br/30540).

Como explica Faria, moléculas marcadas com radioisótopos (chamadas de radiofármacos) são injetadas no cérebro para sinalizar as regiões em que há acúmulo de peptídeo beta-amiloide. Na sequência, é possível visualizar as placas e o avanço da neuroinflamação pela tomografia por emissão de pósitrons, equipamento de imagem parecido com uma ressonância magnética.

A metodologia foi validada no Brasil pelo grupo da USP e, aliada a outras análises, constitui uma ferramenta importante para diferenciar casos de doença de Alzheimer de outros tipos de demências. Também permite estudar como a doença progride em populações específicas, como os indivíduos com síndrome de Down ou com esclerose múltipla.

Na palestra de encerramento do simpósio, Marco Antonio Zago, presidente da FAPESP, afirmou que o projeto é um exemplo da solidez da ciência produzida no Estado de São Paulo. “Isso se deve a três fatores essencialmente. Um deles é o financiamento estável. Essa estabilidade nos permite fazer programas de pesquisa de dez anos, que podem render avanços, nos diferenciar e dar força ao desenvolvimento do Estado. O segundo ponto é o corpo de pesquisadores capacitados. O terceiro é que temos instituições de excelência, como é o caso das universidades dos institutos de pesquisa que têm um grande papel na história e no desenvolvimento de São Paulo. Tudo isso faz com que a estrutura de suporte à ciência e tecnologia se destaque e possa servir de exemplo para o restante do país”, disse.

O presidente da Fundação também apresentou oportunidades de financiamento de pesquisa, sobretudo para os jovens cientistas que participavam do evento. “Atualmente vivemos uma crise de formação de recursos humanos e uma crise de interesse dos nossos jovens pela vida universitária. Então é muito bom fazermos uma conversa sobre possibilidades de financiamento para atrairmos talentos e novos projetos importantes”, acrescentou.

Além de celebrar os dez anos do início da realização de imagens PET amiloide no Brasil e de apresentar os resultados obtidos no período com o uso da técnica, o simpósio teve o objetivo de discutir os aspectos mais atuais da pesquisa em neuroimagem molecular em doenças neurodegenerativas com especialistas nacionais e internacionais.

Entre os presentes estavam Tharick Pascoal, da University of Pittsburgh School of Medicine (Estados Unidos), que falou sobre o uso de biomarcadores em pesquisa; David Jones, da Mayo Clinic (Estados Unidos), que abordou o uso de inteligência artificial nos estudos com imagem molecular; e Juan Fortea, do Hospital de la Santa Creu i Sant Pau (Espanha), que explicou como a síndrome de Down pode ser um modelo de estudo para doenças neurodegenerativas.

 

Fonte: CNN Brasil

 

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