Síndrome
de Down: 45% a 50% nascem com cardiopatia, alerta especialista
No
Brasil, a população com Síndrome de Down equivale a 350 mil pessoas e, a cada
ano, surgem 8 mil novos casos. Desse total, aproximadamente 45% a 50% nascem
com uma cardiopatia, ou seja, doença do coração. É o que alerta Zan Mustacchi,
geneticista e pediatra do Hospital Darcy Vargas.
A
doença é causada por uma alteração genética que leva a formação de um
cromossomo 21 a mais, resultando em deficiência intelectual e características
físicas como baixa estatura, raiz nasal achatada, mãos pequenas e dedos curtos,
entre outras.
Segundo
Navarro, é importante que a detecção de cardiopatias em pessoas com a síndrome
seja realizada ainda no período fetal. “Essas crianças devem ser abordadas
precocemente, e devem ter seu diagnóstico de preferência feito no período
fetal. O ideal é que elas sejam operadas em torno de 4 a 6 meses de vida para
não evoluírem para uma condição complexa que se chama hipertensão pulmonar”,
afirma.
“Nós
temos um fato técnico-científico relativamente recente, que nós conseguimos
fazer a partir da coleta do sangue da mãe, como se fosse colher um hemograma, o
Nipt, um exame não invasivo de diagnóstico pré-natal. A gente consegue uma
margem de segurança de aproximadamente 98%”, explica Mustacchi.
O
geneticista afirma que este exame, quando associado aos dados de
ultrassonografia e do ecocardiograma fetal, são eficazes. Recentemente, o Nipt
foi incluído como obrigatório no pré-natal, mas sua realização ainda não é
acessível a todas as gestantes.
“É
um exame simples, mas o acesso é difícil”, afirma Navarro. “Pensando na
população em geral, normalmente temos a dificuldade do aparelho, dificuldade
técnica…”, elenca a cardiologista, referindo-se também à falta de capacitação
profissional para realização do exame.
Por
este e outros fatores, nem sempre é feito o diagnóstico intrauterino, como
seria o ideal. Nestes casos, Navarro defende também maior preparo da equipe
médica para lidar com o momento de conversar com os pais a respeito.
“É
muito comum dar a notícia que a criança tem T21 no parto, logo que tirou o
bebê. Então, a mãe ainda está lá, sendo operada, no meio da cesárea… Ter essa
sensibilidade para conversar com a mãe, esperar estar o pai, o companheiro,
alguém junto. Não ter urgência para dar a notícia”, diz Navarro.
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Quais são os fatores de risco associados à síndrome de Down?
Durante
o programa, os especialistas comentam sobre os fatores de risco para a
trissomia do 21. O principal e mais conhecido deles é a idade materna avançada,
mas esse não é o único.
“Se
eu tenho alguém na família com T21, é um fator de risco aumentado. Se eu tenho
alguém na família com a frequência de Alzheimer, é um fator de risco aumentado.
Hipotireoidismo, especificamente autoimune, de uma forma que a gente chama de
Hashimoto, também tem um risco aumentado. O ruim de a gente falar ‘aumentado’ é
que parece 50%, 20%, 30%. Não, esse ‘aumentado’ é 1% a mais, 0,5% a mais”,
explica Mustacchi.
Segundo
o geneticista, os sinais são sempre relacionados aos ligamentos, sistema
osteomuscular e desenvolvimento neuromotor. “Então, o bebê firma o pescoço?
Claro que firma. Mas em vez de firmar com dois meses, isso acontece com dois e
meio a três meses. O que não faz muita diferença”.
O
especialista, no entanto, faz questão de afirmar que a condição do T21 não é
impedimento para nada, desde que as pessoas tenham oportunidades e respeito.
“Infelizmente
a população está habituada a ouvir que existem graus entre as pessoas. Nós não
temos variedades de grau nenhum. Aqui no país, nós temos três palavras que
sustentam hoje a questão do T21: oportunidade, respeito e segurança é a tríade
de sustentação de qualquer indivíduo que tente viver adequadamente”, afirma.
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Redes sociais amplia a visibilidade sobre inclusão e representatividade
Navarro
acrescenta que o uso das redes sociais alavancou a representatividade de
pessoas com síndrome de Down em diferentes áreas.
“Hoje,
com o advento das redes sociais, são os influencers digitais que mostram que
eles estão indo para a faculdade, que eles estão indo trabalhar, que eles estão
indo para a balada. Porque, na hora que nasce um bebê, por mais que a gente
converse com essa família, explicando o que é, nada melhor do que uma mãe, uma
família olhar e ver um João indo para a faculdade, uma Maju desfilando, os
meninos trabalhando… Isso é fantástico”, diz, referindo-se aos modelos Maju de
Araújo e João Vitor Paiva, que também é o primeiro conselheiro jovem T21 do
Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef).
“Nada
sobre nós, sem nós” é o lema deles, segundo Mustacchi. Para o geneticista, os
portadores de T21 assumirem a narrativa da própria história é a melhor mudança
que tem ocorrido nos últimos anos.
• Pesquisadores mapeiam
risco de Alzheimer em pessoas com síndrome de Down
Pessoas
com síndrome de Down apresentam envelhecimento acelerado e grande incidência da
doença de Alzheimer na velhice. Pesquisadores da Universidade de São Paulo
(USP) mapearam nessa população, por meio de técnicas de medicina nuclear, a
presença de neuroinflamação e de um marcador importante desse tipo de demência:
a placa beta-amiloide – formada por fragmentos de peptídeo amiloide que se
depositam entre os neurônios causando inflamação e interrompendo a comunicação
neural.
“Este
foi o primeiro estudo no mundo a observar como se dá a neuroinflamação nessa
população por meio de tomografia por emissão de pósitrons [PET, na sigla em
inglês], com uso de radiofármacos específicos”, contou à Agência FAPESP Daniele
de Paula Faria, pesquisadora do Laboratório de Medicina Nuclear (LIM43) do
Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP (HC-FM-USP).
A
investigação foi conduzida no âmbito de um projeto desenvolvido em parceria com
o Instituto Jô Clemente, o que possibilitou aos pesquisadores avaliar o cérebro
de indivíduos com síndrome de Down de diferentes faixas etárias.
“Já
se sabia que o processo de envelhecimento nessa população ocorre cerca de 20
anos adiantado, com menopausa precoce e o diagnóstico de doença de Alzheimer já
após os 40 anos, por exemplo. Um aspecto importante é que o gene da proteína
precursora amiloide [APP] está localizado no cromossomo 21, que é triplicado na
síndrome de Down. Portanto, já era sabido que esses indivíduos produzem mais
beta-amiloide que aqueles sem a síndrome. Nosso estudo foi importante, pois
ainda não havia um entendimento aprofundado sobre os padrões de neuroinflamação
no cérebro vivo de pessoas com síndrome de Down”, explicou a pesquisadora para
a Agência FAPESP.
Os
pesquisadores também acompanharam, ao longo de dois anos, a progressão da
neuroinflamação e das placas beta-amiloide em camundongos modificados
geneticamente para desenvolver uma condição semelhante à síndrome de Down. Vale
lembrar que o ciclo de vida dos roedores é mais curto que o dos humanos e,
portanto, um animal de dois anos equivaleria a um humano de 80.
“Conseguimos
avaliar, com um equipamento específico para pequenos animais, toda a progressão
da doença nos roedores. O estudo com os camundongos, somado ao feito com o
grupo de indivíduos com síndrome de Down, nos trazem respostas importantes
sobre o processo de envelhecimento dessa população”, afirmou a pesquisadora.
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Por dentro do cérebro
Esses
dados ainda não publicados foram apresentados por Faria durante o Simpósio de
Imagem Molecular, realizado nos dias 11 e 12 de setembro no Instituto de
Radiologia do HC-FM-USP. Um dos objetivos do evento foi comemorar os dez anos
da primeira imagem amiloide obtida no Brasil, o que foi possível com a compra
dos equipamentos que produzem os radiofármacos (11C-PIB e 11C-PK11195) usados
para visualizar as placas e a neuroinflamação no cérebro humano vivo. A
aquisição ocorreu por meio de um Projeto Temático liderado por Geraldo Busatto
Filho, coordenador do LIM21 (leia mais em: agencia.fapesp.br/30540).
Como
explica Faria, moléculas marcadas com radioisótopos (chamadas de radiofármacos)
são injetadas no cérebro para sinalizar as regiões em que há acúmulo de
peptídeo beta-amiloide. Na sequência, é possível visualizar as placas e o
avanço da neuroinflamação pela tomografia por emissão de pósitrons, equipamento
de imagem parecido com uma ressonância magnética.
A
metodologia foi validada no Brasil pelo grupo da USP e, aliada a outras
análises, constitui uma ferramenta importante para diferenciar casos de doença
de Alzheimer de outros tipos de demências. Também permite estudar como a doença
progride em populações específicas, como os indivíduos com síndrome de Down ou
com esclerose múltipla.
Na
palestra de encerramento do simpósio, Marco Antonio Zago, presidente da FAPESP,
afirmou que o projeto é um exemplo da solidez da ciência produzida no Estado de
São Paulo. “Isso se deve a três fatores essencialmente. Um deles é o
financiamento estável. Essa estabilidade nos permite fazer programas de
pesquisa de dez anos, que podem render avanços, nos diferenciar e dar força ao
desenvolvimento do Estado. O segundo ponto é o corpo de pesquisadores
capacitados. O terceiro é que temos instituições de excelência, como é o caso
das universidades dos institutos de pesquisa que têm um grande papel na
história e no desenvolvimento de São Paulo. Tudo isso faz com que a estrutura
de suporte à ciência e tecnologia se destaque e possa servir de exemplo para o
restante do país”, disse.
O
presidente da Fundação também apresentou oportunidades de financiamento de
pesquisa, sobretudo para os jovens cientistas que participavam do evento.
“Atualmente vivemos uma crise de formação de recursos humanos e uma crise de
interesse dos nossos jovens pela vida universitária. Então é muito bom fazermos
uma conversa sobre possibilidades de financiamento para atrairmos talentos e
novos projetos importantes”, acrescentou.
Além
de celebrar os dez anos do início da realização de imagens PET amiloide no
Brasil e de apresentar os resultados obtidos no período com o uso da técnica, o
simpósio teve o objetivo de discutir os aspectos mais atuais da pesquisa em
neuroimagem molecular em doenças neurodegenerativas com especialistas nacionais
e internacionais.
Entre
os presentes estavam Tharick Pascoal, da University of Pittsburgh School of
Medicine (Estados Unidos), que falou sobre o uso de biomarcadores em pesquisa;
David Jones, da Mayo Clinic (Estados Unidos), que abordou o uso de inteligência
artificial nos estudos com imagem molecular; e Juan Fortea, do Hospital de la
Santa Creu i Sant Pau (Espanha), que explicou como a síndrome de Down pode ser
um modelo de estudo para doenças neurodegenerativas.
Fonte:
CNN Brasil
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