Juliana
Passos: Pelo direito de descansar
É
fácil perceber ao nosso redor que a população brasileira está no caminho do
envelhecimento. Enquanto as famílias decidem por um menor número de filhos, a
expectativa de vida tem se prolongado. Se em 1960, a média de filhos era de
seis por família, agora é inferior a dois. E se quem nascia em 1980 vivia, em
média, até os 62 anos, agora esse tempo se expande até os 76. Os resultados do
Censo Demográfico de 2022 trouxeram novas projeções para esse envelhecimento e
o que se imagina é que, em 2070, a média de idade da população brasileira seja
de 51 anos, enquanto hoje é de 35. A pesquisadora do Instituto de Pesquisa
Econômica Aplicada (Ipea) Ana Amélia Camarano alerta que o envelhecimento
populacional não deve ser entendido como um problema e defende que a sociedade
deve produzir políticas públicas para todas as configurações demográficas. “A
sociedade escolheu investir nas condições de vida, na melhoria do acesso à
saúde e à vacinação.
Quando
o país tinha uma alta natalidade, diziam que as crianças eram um ônus, agora
[que já estão] em idade de trabalhar, dizem que são bônus. Houve investimento
nessas pessoas. É preciso aprender a lidar com essas escolhas. E um desses
aspectos é o mercado de trabalho”, diz. Envelhecer com qualidade de vida e
poder se aposentar com um salário que ofereça tranquilidade financeira para
pagar as necessidades básicas, incluindo o direito ao lazer, não é uma tarefa
fácil. A cobertura da previdência social para pessoas acima de 60 anos é
superior a 80% em todo o país, de acordo com o Anuário Estatístico da
Previdência Social de 2023. Mas, além do desafio da inclusão de todos os
brasileiros, os valores pagos são baixos e, em sua maioria, se limitam a um
salário-mínimo, o que significa, em 2024, uma renda mensal de R$ 1.412. Na
contramão das contas que enfocam o déficit previdenciário e uma suposta
necessidade de aumentar a idade mínima para a aposentadoria, esta reportagem
vai mostrar a dificuldade de encontrar emprego no período pré-aposentadoria, o
perfil das aposentadorias e pensões pagas no país e os desafios de os
trabalhadores alcançarem uma segurança financeira quando param de trabalhar.
• Onde estão os
trabalhadores com mais de 50 anos?
Um
levantamento do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) informa que o país tem
cerca de 13 milhões de pessoas com mais de 50 anos trabalhando, sendo a maioria
delas alocadas em postos como assistentes administrativos, porteiros e
trabalhadores da limpeza. Os dados foram coletados a partir da Relação Anual de
Informações Sociais (Rais) 2022, divulgada em 2023. A maior parte – cerca de 10
milhões de pessoas – tem entre 50 e 59 anos. A variação de ocupações muda pouco
com o avançar da idade, mas o número de pessoas no mercado de trabalho cai
expressivamente: o país tem 2,7 milhões de trabalhadores por volta dos 60 anos,
na faixa etária dos 70 são cerca de 300 mil e, a partir dos 80 anos, 21 mil.
Essas informações fornecidas pelo MTE referem-se apenas a trabalhadores
formais, mas além de continuarem trabalhando, a maioria dessas pessoas está na
informalidade, segundo dados do Centro de Estudos Sindicais e de Economia do
Trabalho (Cesit) da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), sistematizados
a partir da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) Contínua do
segundo trimestre de 2024. De acordo com esse levantamento, entre os
trabalhadores com mais de 60 anos, mais de cinco milhões estão na condição de
informais, o que representa quase 70% dos vínculos daqueles que continuam
trabalhando nessa faixa etária. Ao somar trabalhadores formais e informais,
temos uma população de cerca de sete milhões de pessoas acima dos 60 anos que
continua trabalhando, em um universo de 32 milhões, de acordo com o Censo de
2022.
A
redução da participação dessa parcela da população no mercado de trabalho é
esperada porque, em sua maioria, eles já têm acesso ao direito à aposentadoria.
Por outro lado, a faixa etária entre os 50 e 59 ainda não tem acesso a esse
direito nem tem muito espaço no mercado de trabalho – a participação cai de 80%
entre aqueles que têm entre 30 e 49 anos para 68% de 50 a 59, segundo dados do
Anuário Estatístico do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE)
referentes a 2022. Para o pesquisador do IBGE, José Eustáquio Alves, nessa
faixa etária há uma maior quantidade de desalentados, aqueles que simplesmente
desistiram de procurar emprego, apesar de o Instituto não divulgar essa
segmentação. “A pessoa para de procurar trabalho porque não vai encontrar”,
diz.
Um
dos poucos estudos relacionados ao segmento de quem não está aposentado nem
trabalha foi publicado por Ana Amélia Camarano em 2019 e mostra que a elevação
da idade mínima para a aposentadoria acarretou um aumento da população de
homens de 50 a 64 anos ‘nem-nem’: entre 1984 e 2017, esse número subiu de 3,5%
para 10,2%. “O sistema é muito seletivo e busca extrair ao máximo as energias
da força de trabalho”, diz o coordenador do Centro de Estudos Sindicais e de
Economia do Trabalho e professor da Unicamp, Dari Krein.
A
diminuição da participação dos mais velhos no mercado formal é corroborada por
uma pesquisa realizada pela consultoria Maturi, que entrevistou 200 empresas no
Brasil em 2022. De acordo com o estudo, 78% das empresas assumem que são
etaristas e têm em sua força de trabalho apenas 10% de pessoas acima de 50
anos. “Se você tem uma função sênior com 50 anos de idade, com um salário mais
alto, mas sem cargo de direção, tem mais chances de sair da empresa. Isso não
só por conta da remuneração, mas também do preconceito. Entende-se que o
trabalhador mais velho não tem mais o mesmo nível de engajamento, conhecimento
em tecnologia ou que não está mais aberto a mudanças. Essa é uma visão
distorcida que as empresas têm”, avalia a consultora Aline Zanini, autora de uma
dissertação sobre o tema pela Universidade de São Paulo (USP). Em sua pesquisa,
ela observou que as empresas não possuem programas que incentivem os
trabalhadores mais velhos a continuarem no emprego, o que ela vê como medida
necessária para o combate ao etarismo no mercado de trabalho.
Camarano
concorda que o preconceito é fator importante na dificuldade de contratação de
pessoas mais velhas e que deve ser enfrentado, além de defender que é papel da
sociedade como um todo garantir o bem-estar dessa população devido à maior
probabilidade de sua saúde física ser afetada por comorbidades e pelas
dificuldades da vida cotidiana. “É preciso investir em capacitação continuada
como saúde, saúde ocupacional e melhoria de transporte. Por quê? Porque alguém
que passa uma hora e meia no transporte público terá sua produtividade afetada.
E se for uma pessoa mais velha, o impacto será maior”, exemplifica.
Na
contramão da ideia da falta de engajamento dos mais velhos, há diversos estudos
de mercado responsáveis por comparar culturas geracionais, enfocando na
valorização da força de trabalho mais experiente. Zanini comenta que há uma
dificuldade das empresas em lidar com a geração Z (formada por aqueles com
idade entre 27 e 12 anos) que não tem o trabalho como central em suas vidas.
Uma pesquisa realizada pela consultoria United Nations mostrou que enquanto 71%
dos brasileiros declararam estar motivados com seus trabalhos, para os
trabalhadores dessa geração, a satisfação cai para 28%. Entre os motivos para o
desânimo estão a necessidade de maior flexibilidade e maior cuidado com a saúde
mental. A pesquisa foi divulgada em agosto de 2024 e ouviu dois mil trabalhadores
em 14 países diferentes. “De forma positiva, os trabalhadores das gerações mais
novas entendem que o trabalho precisa oferecer a chance de se ter uma
alimentação saudável, uma vida saudável de sono, praticar exercício físico, ter
tempo para as relações pessoais. Então, as empresas ainda estão aprendendo a
lidar com esse equilíbrio, que é uma demanda dos mais jovens”, completa.
• Insegurança financeira
Questões
geracionais à parte, o sentimento majoritário é o de insegurança financeira.
Pelo menos é o que mostra uma pesquisa realizada pelo Centro Brasileiro de
Análise e Planejamento (Cebrap) em três capitais brasileiras: São Paulo,
Salvador e Porto Alegre, onde foram entrevistadas 500 pessoas por cidade, entre
setembro e novembro de 2021. Em todos os casos, o grau de satisfação com o
trabalho e a sensação de segurança financeira ficaram abaixo da média das
outras variáveis avaliadas, como percepção da saúde, inclusão digital e
autoestima. Nas três capitais, segundo esses dados, cerca de 40% das pessoas
com mais de 50 anos continuam trabalhando e na interpretação dos pesquisadores
há um afastamento antecipado do mercado de trabalho diante da dificuldade de
ser empregado. Entre aqueles que continuam na ativa, em Salvador e São Paulo,
53% não ganham o suficiente para viver. Já em Porto Alegre o sustento está
garantido em 72% dos casos. No entanto, a insatisfação com as horas trabalhadas
avança com a idade na capital gaúcha e em SP. Na maior cidade do Brasil, 36% da
faixa etária até 50 anos diz trabalhar mais tempo do que gostaria, esse número
sobe para 59% entre aqueles com 60, cai para 41% na faixa dos 70 e alcança 84%
entre aqueles com mais de 80 anos. Em dados de Porto Alegre, na faixa etária
dos 50 anos, 22% dizem trabalhar mais horas do que gostariam, no entanto, esse
índice sobe para 72% na faixa dos 60 anos e 64% acima dos 70.
Em
âmbito nacional, uma pesquisa encomendada pela Serasa, instituição responsável
por gerenciar informações de crédito e inadimplência, mostrou que seis em cada
dez aposentados continuam trabalhando para pagar as contas (59%) ou ajudar na
renda familiar (19%). A pesquisa ouviu 2.894 pessoas em janeiro de 2024.
• Aposentadoria e pensões
Em
agosto de 2024, foram pagos cerca de 40 milhões de benefícios por parte do
Regime Geral da Previdência Social. Desses, 32 milhões referem-se à
aposentadoria por idade, pensão por morte, aposentadoria por tempo de
contribuição e invalidez e o Benefício de Prestação Continuada, o BPC.
A
previdência social no Brasil é baseada na contribuição prévia, o que significa
que os ganhos são referentes a uma proporção dos valores médios que a pessoa
conseguiu contribuir ao longo da vida. O valor médio é R$ 1.944,44 para os
trabalhadores urbanos e R$ 1.415,55 para os rurais e 85% das pensões pagas são
de até dois salários-mínimos. Apenas 6,5% superam três salários. Os dados são
do Boletim Estatístico da Previdência Social (BEPS). Para a professora da
Universidade Federal do Rio de Janeiro Ivanete Boschetti, esses valores são
baixos e as regras previdenciárias penalizam muito os trabalhadores. “Eu quero
um trabalho com igualdade, com valores que permitam às pessoas garantirem a
reprodução de suas vidas para que, quando elas não tiverem condições de
trabalhar, possam ter uma previdência com valores que sejam pelo menos os
mesmos que tinham quando trabalhavam”, defende.
Essa
equivalência salarial ficou ainda mais distante dos trabalhadores com a
aprovação da Reforma da Previdência em 2019, por meio da Emenda Complementar
103. Com as novas regras, a aposentadoria por tempo de contribuição deixou de
existir e a idade mínima para requisição do direito é, no caso de trabalhadores
urbanos, de 62 anos para as mulheres e 65 para os homens. Os professores da
rede básica de ensino têm direito a reduzir cinco anos de cada um desses
limites. Nas áreas rurais, a idade mínima também cai: as mulheres podem
requerer a aposentadoria com 55 anos e os homens com 60. E em uma medida ainda
mais dura, o benefício pago está limitado a 60% da média simples das
contribuições feitas ao longo de 20 anos. Esse valor sobe dois pontos
percentuais por ano que exceder o mínimo de duas décadas. Isso significa que só
conseguirá o valor integral o trabalhador que contribuir por 40 anos para a
previdência. “Essas medidas tornaram o acesso à aposentadoria e a um valor
digno ainda mais difíceis”, diz Boschetti.
Para
pessoas de baixa renda que não conseguiram contribuir com previdência, existe o
BPC, concedido a idosos a partir de 65 anos no valor de um salário-mínimo e, ao
contrário das aposentadorias, não prevê pagamento de 13º salário nem é passível
de pensão por morte. Mas é preciso provar que não é capaz de prover o próprio
sustento e ter renda familiar per capita de até um quarto do salário-mínimo. Em
dados de agosto de 2024, o número de idosos que recebem o Benefício é cerca de
3 milhões de pessoas. O BPC também é pago a pessoas com deficiência, que somam
um contingente similar de beneficiários. “Esse é um benefício que está
permanente sob análise, há diversos critérios para entrada e está
constantemente ameaçado de desvinculação do salário-mínimo. Embora, conforme
prevê a Constituição de 1988, nenhuma aposentadoria possa ser inferior ao
salário-mínimo”, diz a professora da UFRJ. Em junho de 2024 o presidente Luiz
Inácio Lula da Silva precisou vir a público para garantir que o governo não vai
propor essa desvinculação.
Ivanete
Boschetti chama a atenção ainda para a necessidade de olhar os dados de
contribuição da previdência e trajetórias no mercado de trabalho de forma
desagregada por gênero e, principalmente, raça. “A questão da previdência e
benefícios assistenciais fica ainda mais grave porque as pessoas negras estão
nos postos inferiores, recebem salários mais baixos e estão em maior proporção
entre os informais”, diz. Enquanto 70% da população branca contribui para a
previdência, essa taxa cai para 60% da população negra. A taxa de informalidade
na faixa etária dos 50 anos também é maior para as pessoas negras: 54% ante 49%
dos brancos. Assim como as de desemprego: 22% entre negros e 9% entre brancos.
Já acima de 60 anos, essa diferença é de 17% para 4%. No quesito média
salarial, as diferenças também são gritantes. O rendimento médio dos homens
brancos foi de R$ 2.182 no segundo trimestre de 2024, as mulheres brancas
receberam RS 1.658, enquanto os homens negros alcançaram R$ 1.260 e as mulheres
negras R$ 1.009. Os dados foram elaborados pelo Cesit/Unicamp a partir da Pnad
Contínua do segundo trimestre de 2024.
Para
além das desigualdades salariais e taxa de informalidade, há outra barreira que
impede as mulheres de alcançarem um maior período de contribuição: as
obrigações domésticas e familiares. Responsáveis por cuidar da casa, dos filhos
e muitas vezes dos pais, na maioria das vezes são as mulheres que se afastam do
trabalho remunerado para garantir o desenvolvimento dos filhos e o cuidado com
os mais velhos. “O Estado tem que participar urgente das políticas de cuidado.
Muitos idosos vão envelhecer sem ter família para cuidar. Os sistemas de
cuidado precisam para que as mulheres não continuem sendo penalizadas. Podemos
observar a chamada geração sanduíche, quando as mulheres cuidam das suas
crianças e dos seus pais idosos. Temos gerações de avós que cuidam dos seus
netos e também dos seus pais”, defende a professora da Universidade Federal do
Rio Grande do Norte Luana Myrrha.
A
professora lembra que o reconhecimento da diferença de jornadas existe na
Previdência, uma vez que as mulheres podem requerer sua aposentadoria cinco
anos antes dos homens, mas ela entende que não é suficiente. “O custo dessa
divisão social do trabalho é muito alto para as mulheres. Há consequências não
apenas para a vida presente, mas para a futura também. Porque a aposentadoria
você só alcança se contribuir. E para além disso, o valor da contribuição é
super importante e determina o valor da sua aposentadoria”, diz Myrrha.
Em
meio a regras cada vez mais rígidas para a garantia da aposentadoria e as altas
taxas de informalidade no país, que levam a não contribuição à Previdência,
Krein avalia o sistema previdenciário brasileiro como um estranho à estrutura
econômica. “A previdência é baseada em um mercado estruturado, mas a realidade
é um mercado desestruturado”, diz.
• Arrecadar sem penalizar
os trabalhadores
Diante
da relação direta entre o histórico de salários e a capacidade de garantir ou
não certa segurança financeira na velhice, os entrevistados desta reportagem
são unânimes em afirmar que é preciso melhorar a qualidade dos postos de
trabalho e investir no aumento da escolaridade dos trabalhadores brasileiros
para que cheguem à velhice com segurança financeira e sem serem penalizados com
novas regras que dificultem seu merecido descanso.
Um
dos primeiros pontos a serem enfrentados, de acordo com Krein, é a incapacidade
de o país gerar um grande contingente de empregos bem remunerados e com
garantias de direitos. Ele atribui essa dificuldade ao modelo de
desenvolvimento brasileiro, incapaz de incorporar setores complexos da
economia, como a indústria de alta tecnologia. “O desafio é conseguir
implementar um modelo de desenvolvimento para viabilizar uma economia mais
complexa, com uso mais intensivo de tecnologia, que respeite o meio ambiente. E
a partir de uma maior geração de riqueza, esses recursos seriam responsáveis
por financiar uma série de outras atividades essenciais para a vida
comunitária, em uma outra frente de geração de postos de trabalho”, defende,
lamentando que o governo federal não venha tendo sucesso no enfrentamento desse
desafio. “Tudo gira em torno do ajuste fiscal, da quantidade de gasto público,
então qualquer perspectiva de elevação de gasto é condenada e essa postura
impede o país de ter um processo de movimento econômico autônomo. Há um certo
sequestro do Estado e da possibilidade de poder fazer qualquer política pública
mais coordenada”, diz, citando como exemplo de obstáculo as altas taxas de
juros que vêm sendo mantidas pelo Banco Central.
Um
país muito citado como exemplo dos caminhos que o Brasil deveria seguir é a
Coreia do Sul. Esse sucesso é muitas vezes atribuído ao bom aproveitamento do
chamado bônus demográfico, período no qual a maior parte da população está em
idade para trabalhar, que corresponde exatamente à situação atual do Brasil.
“Para aproveitar esse bônus, não basta ter muita gente em idade de trabalhar,
tem que ter emprego. Se houver muita gente em idade de trabalhar e não tiver
emprego, você vai ter um problema social grande”, diz José Eustáquio Alves. Ele
acrescenta que a vantagem demográfica não é a única forma de impulsionar o
crescimento de um país e que o investimento elevado em tecnologia também é uma
modalidade de bônus em direção ao desenvolvimento e aumento da renda média.
Krein
explica que a variável demográfica é apenas um dos motivos para o avanço
econômico e industrial do país e cita outras em jogo, como o grau de
industrialização mais elevado no país asiático, além da definição de blocos
prioritários para desenvolvimento por parte do Estado, adotada pelo governo do
país na década de 1960, medida que o Brasil também deveria adotar. Outro ponto
de destaque foi o alto investimento em educação para a incorporação dos
profissionais na indústria que se desenvolvia, o que garantia uma melhor
posição salarial. Para se ter uma ideia da diferença salarial pelo grau de
escolaridade, vamos voltar para a realidade atual brasileira. De acordo com a
Relação Anual de Informações Sociais (Rais) 2023, com dados de 2022 e que traz
apenas informações do setor formal, os salários médios para aqueles com Ensino
Fundamental ou Ensino Médio completos estão em torno de R $ 2,5 mil, diante da
média de R$ 7,4 mil para aqueles com Ensino Superior. Mas as críticas ao modelo
adotado não são poucas e uma das principais é a alta média de horas trabalhadas
na Coreia do Sul no passado e que se mantém. Atualmente a legislação permite
uma jornada de 52 horas semanais, e em 2023, o governo tentou aprovar uma lei
que elevava esse número para 69 horas, caminho oposto ao que propõe Dari Krein.
• Redução da idade para
aposentadoria e criação de ocupações sociais
Para
ajudar a vislumbrar saídas que levem ao aumento da qualidade de vida dos mais
velhos e da população brasileira como um todo, o professor lança mão do
histórico de construção do Estado de Bem-Estar Social dos países europeus de
renda média mais elevada. “Obviamente, não temos como voltar a esse período,
porque isso não foi uma construção política em um contexto muito particular,
ocorrido depois de uma crise econômica e duas guerras mundiais, mas meu ponto
está em olhar a capacidade de geração de ocupações”, diz Krein.
Ao
longo do século 20, países como a França adotaram a redução da jornada de
trabalho e a diminuição da quantidade de indivíduos aptos a trabalhar como
forma de incorporar um maior número de profissionais no mercado de trabalho. “O
aumento salarial conquistado pelas lutas sindicais e essa incorporação dos
trabalhadores foi responsável por um aumento de consumo com importantes
desdobramentos. Esses trabalhadores passaram a consumir, por exemplo, lazer,
cultura e outros serviços que até então não consumiam. Porque houve um aumento
real do seu poder de compra”, diz Krein. Aliado a isso, houve um grande
investimento em políticas públicas na área de saúde, educação e habitação,
responsáveis por gerar inúmeros postos de trabalho.
Mas,
na contramão do que o país tem feito desde a década de 1990, o professor
defende também a redução da idade de aposentadoria para que mais pessoas
ingressem no mercado de trabalho, ao mesmo tempo em que é preciso garantir
estabilidade para que aqueles que estão próximos de aposentar possam ter esse
direito garantido. E a medida significa excluir as pessoas mais velhas da
sociedade? Pelo contrário: ele defende que sejam previstas ocupações sociais
para os aposentados, de modo a facilitar a sua convivência em sociedade e que
se sintam úteis, mas que elas não estejam relacionadas à necessidade de geração
de renda. Apesar de reconhecer que há profissões, especialmente aquelas não
relacionadas ao grande esforço físico, em que as pessoas gostariam de passar mais
tempo trabalhando, Dari Krein é categórico: “Esses casos são raros, exceções”.
Fonte:
EPSJV/Fiocruz
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