Brasil
pode virar alvo de 'tarifaço' de Trump por estar nos Brics?
O
presidente eleito dos EUA, Donald Trump, ameaçou na semana
passada (30/11) impor tarifas de importação de 100% sobre produtos dos países
do Brics, grupo de economias emergentes do qual
o Brasil faz parte, caso tentem substituir
o dólar por outra moeda em transações
comerciais internacionais.
"A
ideia de que os países do Brics estão tentando se afastar do dólar enquanto nós
ficamos parados assistindo ACABOU", escreveu o republicano na Truth
Social, sua plataforma de mídia social.
"Exigimos
um compromisso desses países de que não criarão uma nova moeda do Brics, nem
apoiarão nenhuma outra moeda para substituir o poderoso dólar americano, ou
enfrentarão tarifas de 100% e devem esperar dizer adeus às vendas para a
maravilhosa economia dos EUA", disse Trump.
"Eles
podem procurar outro 'otário'! Não há chance de o Brics substituir o dólar
americano no comércio internacional, e qualquer país que tente deve dizer adeus
aos Estados Unidos."
Além
do Brasil, o Brics inclui África do Sul, China, Índia, Rússia, Egito, Irã,
Emirados Árabes Unidos e Etiópia. O Brasil vai assumir a presidência do bloco a
partir de 1° de janeiro de 2025.
Os
EUA são o segundo principal destino das exportações totais brasileiras, atrás
da China, e o principal destino das exportações brasileiras de produtos
manufaturados.
Em
2023 as exportações do Brasil aos EUA somaram US$ 36,9 bilhões (cerca de R$ 223
bilhões), pouco mais de um terço dos US$ 104,3 bilhões (cerca de R$ 630
bilhões) exportados para a China. As importações dos EUA para o Brasil
totalizaram US$ 38 bilhões (cerca de R$ 230 bilhões).
Caso
Trump levasse adiante a ameaça, as novas tarifas dificultariam a entrada de
produtos brasileiros no mercado americano.
A
equipe de transição do presidente eleito não ofereceu detalhes sobre os planos.
O Brasil também não se pronunciou oficialmente sobre as declarações do
americano.
"A
declaração gera preocupação", diz à BBC News Brasil o presidente executivo
da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB), José Augusto de Castro.
"Quando
você fala 100% de tarifa, é como se dobrasse o preço do produto. E dobrando o
preço, certamente a demanda vai ser retraída."
No
entanto, Castro afirma que acha pouco provável que os EUA realmente decidam
adotar um percentual tão elevado.
As
declarações de Trump fazem parte de uma série de pronunciamentos recentes
ameaçando tarifas sobre parceiros comerciais.
O
presidente eleito, que toma posse em 20 de janeiro, disse que poderá impor
tarifas de 25% sobre todos os produtos que entrarem nos EUA vindos do Canadá e
do México, além de adicional de 10% sobre produtos da China, para forçar esses
países a deter a entrada de drogas e imigrantes ilegais no território
americano.
O
primeiro mandato de Trump (2017-2021) foi marcado por uma guerra comercial com
a China.
·
Debate sobre
desdolarização
A
menção ao Brics ocorre em um momento em que o bloco vem discutindo a desdolarização,
em meio a críticas ao sistema financeiro internacional e à governança de
instituições como o Banco Mundial e o Fundo Monetário Internacional (FMI).
A
dominância do dólar dá aos EUA vantagens econômicas e geopolíticas. O interesse
em uma alternativa ao dólar aumentou ainda mais desde que os EUA endureceram
sanções financeiras após a invasão da Ucrânia pela Rússia, em 2022.
A
criação de uma moeda para transações comerciais dentro do Brics reduziria a
dependência da divisa americana, mas por enquanto a discussão está mais focada
no incentivo ao uso das moedas locais no comércio.
O
Brics tem seu próprio banco, o Novo Banco de Desenvolvimento, que financia
projetos em moedas locais e é comandado pela ex-presidente brasileira Dilma
Rousseff, que já criticou o "uso do dólar como arma".
No
entanto, apesar das críticas à primazia do dólar no comércio internacional e do
objetivo de diminuir a dependência da moeda americana, não há perspectiva de
adoção de alternativas nas transações do bloco no curto prazo.
A
criação de uma nova moeda não é nem mesmo mencionada nas declarações das
cúpulas do Brics. Após as ameaças de Trump, o governo da África do Sul
ressaltou que não há planos de criar uma moeda do Brics.
Diante
desse cenário, a advertência de Trump foi criticada por sugerir falta de
confiança no dólar.
"A
moeda do Brics é apenas uma ideia, não é realidade", diz à BBC News Brasil
o professor Daniel McDowell, da Universidade de Syracuse, autor do livro
"Bucking the Buck: US Financial Sanctions and the International Backlash
Against the Dollar", sobre sanções financeiras dos EUA e a reação
internacional contra o dólar.
"Se
você acha que a única maneira de manter os países usando o dólar é com ameaças,
essa seria uma situação ruim. Não acho que é a situação do dólar. Os EUA não
precisam fazer ameaças para que o dólar continue a ser a moeda mais popular e
importante do mundo", afirma McDowell.
Não
há sinais de que a dominância do dólar nas finanças e no comércio internacional
esteja ameaçada, especialmente em um momento em que a economia americana mostra
desempenho robusto e em que o cenário geopolítico global apresenta riscos
elevados.
O
dólar continua sendo a principal moeda de reserva internacional. Segundo o FMI,
bancos centrais ao redor do mundo têm quase US$ 7 trilhões (equivalente a mais
de R$ 42 trilhões) em reservas na moeda americana. O montante é equivalente a
58% do total e o triplo das reservas em euro, que aparece em segundo lugar.
"A
posição dos Estados Unidos e a importância do dólar são tão fortes que é muito
difícil para os países se afastarem", diz à BBC News Brasil o economista
Alan Deardorff, professor da Universidade de Michigan.
"Se
Trump usar todas as tarifas que citou, há o risco de cortar os Estados Unidos
da economia mundial até certo ponto e tornar o dólar menos útil para outros
países. Isso poderia reduzir a dependência do dólar, que é exatamente o que ele
diz que não quer que aconteça", afirma Deardorff.
China
e Rússia estão entre os membros do Brics que reagiram às ameaças do presidente
eleito dos EUA.
Um
porta-voz do Kremlin disse que se os EUA recorrerem a "força
econômica" para obrigar os países a usarem o dólar isso poderia
"fortalecer ainda mais a tendência de mudança para moedas nacionais (no
comércio internacional)".
Um
porta-voz da Embaixada da China nos EUA disse à imprensa americana que "os
EUA há muito tempo" usam a hegemonia do dólar "como ferramenta
geopolítica", o que "prejudica a estabilidade econômica e financeira
internacional e perturba a ordem internacional".
·
Negociação e impactos
A
retórica de Trump costuma fazer parte de seu arsenal de negociação e é usada
para persuadir outros países a seguirem os interesses dos EUA. Logo após as
ameaças contra o Canadá e o México, os líderes daqueles países se apressaram em
conversar com o presidente eleito.
"Trump
tem um histórico de realmente usar tarifas, e fez isso de forma muito dramática
em seu primeiro mandato. Mas ele também usa as ameaças para tentar obter
respostas de outros países", destaca Deardorff.
"Acho
que, neste caso (do Brics), é mais provável que isso aconteça. Tarifas de 100%
seriam muito extremas, e por uma razão tão mal definida. Não me parece
plausível, e me surpreenderia se ele realmente levasse (a ameaça)
adiante", ressalta o professor da Universidade de Michigan.
Segundo
Deardorff, o mais provável é que Trump tente obter algum tipo de promessa
desses países.
"Promessas
que seriam difíceis de fazer cumprir. Mas ele poderia dizer que obteve uma
vitória ao usar essa ameaça", salienta.
McDowell
também considera improvável que os EUA imponham tarifas de 100% contra os
países do Brics ou qualquer outro país.
"Não
diria que é uma ameaça vazia, porque Trump tem um histórico de usar tarifas
como ferramenta de negociação. Mas acho que é provavelmente (uma ameaça) muito
exagerada", diz o professor da Universidade de Syracuse.
"É
possível que ele saiba que (o risco de uma moeda do Brics) não é real, mas
queira fazer uma ameaça agora. E, dentro de alguns meses, poderá dizer 'Veja, a
moeda do Brics não vai acontecer (graças à ameaça)", afirma McDowell.
"Ele
gosta de contar vitórias, e isso pode ser parte do jogo."
Segundo
Castro, da AEB, "ainda que possa haver um pouco de exagero nas declarações
(de Trump), é um cenário que gera preocupação como um todo".
"O
Brasil não tem preços competitivos, uma sobretaxa faria com que nossos produtos
se tornem mais caros ainda. Com isso, deixaríamos de exportar produtos,
principalmente manufaturados", afirma.
Castro
salienta ainda que a guerra comercial dos EUA com a China impacta o Brasil, que
"poderia ser invadido por produtos chineses". "A China vai
transferir o que venderia aos EUA para outros mercados, como o Brasil",
observa.
Caso
os EUA fossem adiante com a ideia de tarifar os produtos do Brics, o impacto
negativo também seria sentido na economia do país, fortalecendo o dólar e
encarecendo os produtos americanos, o que poderia aumentar o déficit comercial.
Isso
se traduziria em preços mais altos para os consumidores americanos, alimentando
o risco de inflação e, assim, a necessidade de aumento das taxas de juros.
"É
sempre verdade que, se e quando usamos tarifas sobre importações, isso aumenta
o preço desses produtos importados para nossos compradores nos EUA, muitos dos
quais não são consumidores, mas empresas que utilizam insumos importados para
sua própria produção", ressalta Deardorff.
"Aumenta
os custos e, portanto, os preços, não apenas dos bens importados em si, mas dos
bens produzidos nos EUA."
"Também
haveria retaliação, e países afetados por essas tarifas provavelmente
responderiam com suas próprias tarifas", diz McDowell, lembrando que isso
ocorreu em relação à China a partir de 2018.
"Isso
poderia levar a uma guerra comercial maior entre os países. Não seria bom para
ninguém."
¨
Deep State quer deixar
Trump em um caminho sem volta. Por Eduardo Vasco
Após
a vitória de Trump, Joe Biden e o Deep State aceleraram freneticamente um
processo de escalada do intervencionismo mundial. Permitiram que Zelensky
utilizasse os ATACMS em território russo e, não por coincidência, pouco depois
Zelensky declarou que poderia aceitar um congelamento na guerra sob a condição
de que a OTAN praticamente ocupasse a Ucrânia.
Concomitantemente,
no mesmo dia em começou a vigorar o cessar-fogo entre Israel e Hezbollah,
terroristas apoiados pelos Estados Unidos iniciaram a maior ofensiva em anos na
Síria. E o episódio mais recente: a tentativa de autogolpe militar na Coreia do
Sul. Essa escalada ocorre em três pontos nevrálgicos das tensões bélicas
internacionais, todos adjacentes à Rússia.
Os
comandantes do establishment americano não aceitam de modo algum que Donald
Trump possa colocar em prática as suas ameaças de reduzir o papel dos EUA –
inclusive militar – pelo mundo. São muitas as declarações de preocupação com
essa possibilidade. O que o imperialismo americano precisa é manter as suas
posições, que lhe garantem a hegemonia geopolítica global por meio da
exploração das nações que ele subjuga com sua presença militar, de inteligência
e seu poderio econômico.
<><>
O caso Hunter Biden
Outra
medida tomada por Biden, embora não seja tão relevante e impactante como as
outras, chamou a atenção pelo nepotismo escancarado ao perdoar seu próprio
filho, Hunter Biden, por duas acusações criminais contra ele. E Hunter é um
personagem envolvido justamente com o regime ucraniano.
De
2013 a 2018, Hunter Biden arrecadou cerca de 11 milhões de dólares como
advogado e membro de conselhos, incluindo empresas ucranianas e chinesas
envolvidas em investigações de corrupção. Em 2020, Hunter revelou ser alvo de
uma investigação federal sobre impostos. Ele foi aconselhado a corrigir sua
declaração fiscal devido a uma renda não declarada de US$ 400 mil da Burisma,
empresa ucraniana acusada de suborno. A análise de seus dados revela gastos
excessivos com luxos e vícios, enquanto enfrentava dificuldades financeiras,
incluindo dívidas fiscais e pessoais.
A
Burisma, uma empresa de gás que nomeou Hunter para uma lucrativa cadeira no
conselho, tinha como uma de suas representantes a Blue Star Strategies, uma
empresa de lobby administrada por democratas. Em agosto, foi revelado que
Hunter buscou ajuda do governo americano (através do embaixador em Roma) para o
estabelecimento de contratos da Burisma na Itália em 2016.
As
investigações levantaram questões nos Estados Unidos sobre ética e segurança
nacional, uma vez que empresas estrangeiras poderiam usar esses vínculos para
obter influência. Hunter afirma que cooperou integralmente com as investigações
e nega ilegalidades, destacando que usou seus ganhos para pagar dívidas e
sustentar a família.
Republicanos,
especialmente no Senado, exploraram o caso para investigar possíveis conexões
financeiras entre Hunter e o presidente, mas, até agora, não encontraram provas
conclusivas. Hunter enfrenta críticas por seu histórico de dependência química,
que ele mesmo admite ter influenciado seus gastos e decisões financeiras.
O
diplomata ucraniano Andrei Telizhenko, que trabalhou na embaixada da Ucrânia
nos EUA a partir de 2015, também foi funcionário da Blue Star, a empresa de
lobby da Burisma. Em entrevista ao Grayzone, ele acusou a família Biden de
estar envolvida em esquemas de corrupção pessoal na Ucrânia. Curiosamente,
Telizhenko foi alvo de sanções pelo Departamento do Tesouro dos EUA por
"ter se envolvido direta ou indiretamente, patrocinado, ocultado ou de
outra forma sido cúmplice de influência estrangeira em uma eleição nos Estados
Unidos".
Os
democratas e os serviços de inteligência dos EUA – como, aparentemente, o
próprio Tesouro – tentaram deslegitimar as denúncias contra Hunter Biden,
tachando-as de simples “desinformação russa”.
Mas
depois apareceram novas informações, ainda mais preocupantes, sobre o
envolvimento de Hunter Biden com os ucranianos. Em março de 2022, a Newsweek
repercutiu uma acusação do governo russo, de que Hunter Biden era sócio de um
fundo de investimentos, Rosemont Seneca, que financiava dezenas de laboratórios
biológicos por toda a Ucrânia. Os russos também denunciaram o próprio governo
dos Estados Unidos por estar por trás desses laboratórios, que seriam
utilizados para pesquisar doenças que poderiam ser transmitidas para a
população russa do Donbass.
"Materiais
recebidos nos permitiram traçar o esquema de interação entre órgãos do governo
dos EUA e os biolaboratórios da Ucrânia", disse à época Igor Kirillov, o
chefe das tropas de defesa radiológica, química e biológica da Rússia. Ele
adicionou que a Rosemont Seneca atraiu atenção devido a um suposto
"relacionamento próximo" com os principais fornecedores para
"biolaboratórios do Pentágono ao redor do mundo". A USAID e a Open
Society também estariam envolvidas.
Tulsi
Gabbard, ex-congressista democrata e nomeada por Trump para ser sua diretora de
Inteligência Nacional, reconheceu na época que os EUA financiavam laboratórios
biológicos na Ucrânia.
Os
casos ATACMS e Hunter Biden vieram acompanhados de uma série de medidas tomadas
pelo presidente dos EUA de saída relacionadas à guerra na Ucrânia. Dentre elas,
• Informou ao Congresso
planos de cancelar US$ 4,65 bilhões da dívida da Ucrânia, segundo a Bloomberg;
• Solicitou recretamente
ao Congresso um adicional de US$ 24 bilhões para reabastecer os estoques do
Pentágono destinados à Ucrânia;
• Intensificou as entregas
de armas a Kiev, com um novo pacote de ajuda no valor de US$ 725 milhões, que
incluirá possivelmente armas antitanque, minas terrestres, drones, mísseis
Stinger, munições para os Sistemas de Foguetes de Artilharia de Alta Mobilidade
(HIMARS) e munições de fragmentação para sistemas de lançamento múltiplo
guiado.
• Impôs sanções ao maior
banco russo que ainda não havia sido designado, o Gazprombank.
Por
um lado, o indulto de Biden a seu filho repete o nepotismo já visto quando
Trump perdoou Charles Kushner (pai de Jared Kushner, casado com Ivanka Trump)
por inúmeras acusações de evasão fiscal e outras ilegalidades, em 2020. Por
outro, os republicanos fingem que não se lembram daquele caso e já se animam
com a possibilidade de Trump utilizar o indulto de Hunter como desculpa para
perdoar, por exemplo, os seus apoiadores que invadiram o Capitólio em 2021.
Contudo,
a ação do atual presidente indica que é de importância fundamental para os
Estados Unidos a manutenção da guerra na Ucrânia pelo fato de os empresários do
país colherem enormes lucros com a dependência de Zelensky da ajuda militar.
Não apenas as companhias que produzem e fornecem armas, mas de todos os ramos,
tanto pela privatização das indústrias e bancos ucranianos quanto pela venda de
terras onde existem abundantes riquezas naturais.
Soma-se
a isso o aspecto geopolítico: a Ucrânia é uma campo de batalha chave para a
manutenção da atual ordem imperialista “baseada em regras” e dominada pelos
Estados Unidos. O Deep State sabe que se perder a guerra o colapso da sua
dominação mundial pode se acelerar, uma vez que a intervenção russa de 2022 já
levou a grandes mudanças e contestações a essa dominação. Por isso é preciso
que o governo Biden termine deixando uma herança maldita para Trump, a fim de
que ele não possa voltar atrás e fique preso às necessidades de guerras e
intervenções do aparato do Estado americano.
Fonte:
BBC News Brasil/Brasil 247
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