sexta-feira, 10 de janeiro de 2025

As riquezas da Groenlândia por trás de interesse de Trump pela ilha

presidente eleito dos Estados UnidosDonald Trump, ventilou, nas últimas semanas, intenções expansionistas contra múltiplos alvos.

O republicano disse que o Canadá deveria se tornar o 51º Estado dos EUA, chamou o Canal do Panamá de "Canal dos Estados Unidos", e sugeriu rebatizar o Golfo do México de "Golfo da América". Mas nenhum território parece ter recebido tanta cobiça quanto a Groenlândia.

Em coletiva de imprensa em Mar-a-Lago na terça-feira (7/1), Trump chegou a dizer que não poderia descartar o uso de força militar para obter controle da Groenlândia ou do Canal do Panamá.

"Precisamos de ambos por razões econômicas", disse Trump.

Mas, no caso da Groenlândia, Trump foi além: "Precisamos da Groenlândia para fins de segurança nacional".

A ilha - a maior do mundo - é um território autônomo da Dinamarca, que colonizou a região.

republicano argumenta que o país europeu deveria abrir mão da ingerência sobre o território para, nas palavras dele, "proteger o mundo livre" e ameaçou impor tarifas à Dinamarca, um aliado da Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan), se o país não cedesse.

"É um negócio que tem que acontecer", sugerindo estar disposto a uma espécie de compra de território.

Nas redes sociais, enquanto compartilhava fotos de seu filho, Donald Trump Jr., visitando a capital da Groenlândia, Nuuk, Trump adaptava o próprio slogan político para aplicar à ilha: "Faça a Groenlândia grande de novo".

Em que pese a reação negativa dinamarquesa, reafirmando que o território não está à venda, o primeiro-ministro da Groenlândia Múte Egede afirmou que é hora de a Groenlândia romper com "as algemas da era colonial", em uma referência à Dinamarca. Mas também afirmou que a população de menos de 60 mil pessoas da ilha "luta por independência".

Os planos de Trump em relação à Groenlândia não são exatamente novos. "Seria um grande negócio imobiliário", ele disse em 2019, durante seu primeiro mandato, quando declarou pela primeira vez seu interesse na ilha.

Na ocasião, porém, disse que a aquisição da área não era sua prioridade.

À época, o então conselheiro econômico da Casa Branca, Larry Kudlow, em uma entrevista no "Fox News Sunday", foi mais claro sobre o que a administração Trump via na ilha.

É "um lugar estratégico" com "muitos minerais valiosos", disse Kudlow.

Expoentes da gestão chegaram a sondar os dinamarqueses para tentar fechar negócio, o que não aconteceu.

·        Terras Raras

Se a ideia já existia antes, a quantidade de menções feitas por Trump ao assunto agora, em um momento em que está formando seu governo para tomar posse em 20 de janeiro, sugere que a Groenlândia subiu posições em importância nos planos futuros do republicano.

Especialistas apostam que isso tem a ver com o recente mapeamento das riquezas minerais da Groenlândia e com a mudança da dinâmica econômica em relação a elas.

Historicamente, o território recebeu atenção de autoridades americanas pela sua posição estratégica. Primeiro, como forma de conter o avanço global dos nazistas durante a Segunda Guerra Mundial. Depois, durante a Guerra Fria, para controle de rotas de navegação entre a Europa e a América do Norte e pela proximidade com o Ártico.

Os militares dos EUA já operam há décadas a Base espacial de Pituffik, antigamente conhecida como Base Aérea de Thule, entre os oceanos Atlântico e Ártico. A base é usada como um posto avançado de observação de mísseis balísticos.

Mas um relatório publicado em meados de 2023 pelo Geological Survey of Denmark and Greenland estimou que o território de 400 mil km2 da ilha atualmente não cobertos por gelo possui depósitos moderados ou altos de 38 minerais da lista de materiais críticos elaborada pela Comissão Europeia.

Além de aparentes altas concentrações de cobre, grafite, nióbio, titânio e ródio, estariam ali também grandes depósitos das chamadas terras raras, como o neodymium e o praseodymium, cujas características magnéticas peculiares os tornam fundamentais na fabricação de motores de veículos elétricos e de turbinas eólicas.

"A Groenlândia poderia conter até 25% de todos os recursos de elementos de terras raras do mundo", afirmou à BBC News Brasil o geólogo Adam Simon, professor da Universidade de Michigan.

Isso equivaleria a cerca de 1,5 milhão de toneladas dos materiais.

·        Disputa com a China

As terras raras se tornaram um artigo de alta demanda em um contexto de transição energética em busca de formas limpas e renováveis de energia - para conter as mudanças climáticas - e têm lançado diferentes potências globais em disputas por grandes minas destes elementos ao redor do mundo.

"Em 2024, utilizamos globalmente cerca de 4.500% mais elementos de terras raras do que usávamos em 1960", afirma Simon, que continua: "mesmo que as extrações na Groenlândia se tornem viáveis em um curto período de tempo, ainda precisaremos de mais reservas de terra rara para dar conta da atual demanda do mercado".

Atualmente, a China domina o mercado de mineração e beneficiamento de terras raras. Os chineses são responsáveis por cerca de das reservas conhecidas, 60% da extração e 85% do processamento desses produtos. Mas a dominância dos chineses sobre este mercado já chegou ao patamar de 95% em 2010, o que deu a Pequim um significativo poder político e econômico sobre cadeias de produção centrais para a Europa e os Estados Unidos.

Atualmente, as duas mineradoras que prospectam terras raras na Groenlândia são australianas, mas uma delas tem como investidor a China's Shenghe Resources, uma mineradora estatal chinesa.

China tem há anos tentado aprofundar sua presença na Groenlândia. Xi Jinping definiu que a China deve ser um país "próximo ao Ártico", ainda que o país esteja a quase 1,5 mil quilômetros da região e, além de projetos culturais e tecnológicos, têm tentado fincar raízes na ilha por meio de obras de infraestrutura batizadas de Rota da Seda Polar, um braço do massivo projeto de investimentos ao redor do mundo de Xi chamado de Cinturão e Rota.

No âmbito deste programa, construtoras chinesas tentaram erguer ao menos dois aeroportos na Groenlândia, mas acabaram preteridas por empresas dinamarquesas, em uma disputa na qual Washington teria feito pressão pró-Dinamarca.

Todos esses movimentos chineses na área alarmaram os Estados Unidos, que têm na China seu principal antagonista global. Em seu primeiro mandato, a administração Trump incluiu as terras raras entre os materiais críticos para a segurança nacional americana e firmou acordos de cooperação para desenvolvimento tecnológico e científico entre a Groenlândia e os Estados Unidos.

O aumento da presença de cientistas, pesquisadores, políticos e oficiais militares nos últimos anos na região não parece estar sendo suficiente para garantir qualquer exclusividade americana aos recursos naturais da ilha, nem a atual administração Biden parece ter perseguido tal intento.

Há 12 dias de deixar o posto, o atual secretário de Estado Antony Blinken disse que os planos de Trump sobre a Groenlândia "não vão se concretizar" e que seria desperdício de tempo discutir o assunto.

·        Musk e o destino manifesto

Se o interesse sobre terras raras e a Groenlândia já estavam claros no primeiro mandato, o fato de que os rumos da segunda gestão Trump estejam sendo profundamente influenciados pelo bilionário Elon Musk, CEO da Tesla, uma das maiores fábricas de carros elétricos do mundo, não deve ser ignorado.

"Certamente, a Tesla tem interesse na disponibilidade mundial de elementos de terras raras, além de lítio, cobre, níquel e grafite. Então é razoável pensar em um conflito de interesses se o CEO de uma empresa que depende da disponibilidade de minerais críticos estiver em uma posição política de autoridade para tomar decisões que podem impactar a disponibilidade global desses minerais", afirma Simon.

A mesma prudência, no entanto, também recomenda cautela nos limites dos benefícios imediatos a Musk, e ao próprio Trump, na investida sobre a Groenlândia.

"No atual estágio de exploração das minas, é altamente improvável que tenhamos mineradoras capazes de uma produção comercial consistente na Groenlândia em menos de 10 anos", afirma Simon.

"Enquanto governos atuam com horizontes de 4 anos, essas grandes mineradoras planejam seus negócios com vistas a 40 anos", completa o geólogo.

Ainda que seja possível acelerar muito a mineração em áreas da ilha, um segundo desafio seria escoar a produção com grandes navios em uma região relativamente remota e crivada de icebergs e outros desafios náuticos. Assim, é improvável que Trump possa se orgulhar de extrair terras raras em escala da Groenlândia mesmo que ele supere os enormes desafios geopolíticos da tarefa.

A chave para entender a motivação de Trump no assunto pode estar em outro elemento histórico da política internacional americana: a doutrina do Destino Manifesto. É o que argumentava ainda em 2019 o editor da revista de direita "The American Conservative" James P. Pinkerton.

A noção do Destino Manifesto, articulada no século 19, enunciava que dado seu "excepcionalismo", os EUA tinham o dever e o direito de avançar sobre territórios estrangeiros para garantir o desenvolvimento e a expansão do experimento de liberdade e auto-governo que o país preconizava. Isso incluía garantir recursos para sustentar a economia e garantir a segurança do país.

Foi o Destino Manifesto a ideologia por trás da expansão dos americanos das 13 colônias em direção ao Oeste, que, entre outras coisas, retirou de suas terras boa parte das populações nativo-americanas, o que levou ao genocídio de muitas delas.

A ordem mundial estabelecida após as Grandes Guerras, com a criação de órgãos multilaterais para mediar disputas entre nações (alvos frequentes das críticas de Trump) e com a fixação de fronteiras claras entre os países, parecia ter colocado um fim à expansão territorial propalada pelo Destino Manifesto.

Um dos maiores exemplares desse movimento foi Andrew Jackson, o sétimo presidente americano, que governou entre 1829 a 1937. Não é mera coincidência que Trump declare ter por Jackson grande admiração.

Em seu primeiro mandato, uma das primeiras modificações do republicano no Salão Oval, o tradicional escritório dos presidentes americanos, foi pendurar um quadro de Jackson na sala.

Agora, em seu segundo mandato, Trump parece ter reservado a Jackson muito mais do que um lugar na parede.

¨      Dinamarca diz que aceita independência da Groenlândia, mas não anexação dos EUA

O ministro das Relações Exteriores da Dinamarca, Lars Loekke Rasmussen, disse que a Groenlândia poderá se tornar independente se seus habitantes assim desejarem, mas que não se tornará um estado norte-americano.

A declaração foi dada em coletiva nesta quarta-feira (08/01), um dia depois o presidente eleito nos Estados Unidos Donald Trump não descartar o uso da força militar para se apossar da ilha que ele já tentou comprar.

“Reconhecemos plenamente que a Groenlândia tem suas próprias ambições. Se elas se materializarem, pode tornar-se independente, mas dificilmente com a ambição de se tornar um estado federal dos EUA”, disse o ministro dinamarquês.

Apesar disso, ele foi conciliador e declarou que considerava legítimas as crescentes preocupações dos EUA com a segurança no Ártico por causa do aumento da atividade russa e chinesa na região.

<><> Abertos a negociações

“Não estamos em uma crise de política externa. Estamos abertos dialogar com os norte-americanos sobre como cooperar mais estreitamente para que suas ambições se cumpram”, disse ele.

Os EUA já mantêm uma base militar na Groenlândia desde a Segunda Guerra Mundial. A primeira-ministra dinamarquesa Mette Frederiksen disse não acreditar na possibilidade de uma intervenção militar de Washington na ilha.

Nem todos os países europeus, entretanto, foram tão conciliadores diante das ameaças de Trump de anexar a Groenlândia.

O ministro das Relações Exteriores da França, Jean-Noel Barrot, advertiu Trump contra ameaças às “fronteiras soberanas” da União Europeia (UE).

<><> União Europeia defenderá suas fronteiras

“Não há dúvida alguma de que a União Europeia não permitirá que outras nações do mundo, sejam elas quem forem, ataquem suas fronteiras soberanas”, disse o ministro francês na terça-feira (07/01) em entrevista de mais de uma hora à rádio France Inter.

Embora não acredite que os EUA vão invadir a Groenlândia, Barrot lembrou que “entramos numa era em que vemos a volta da lei do mais forte”.

No mês passado, Trump declarou que a posse da ilha era uma “necessidade absoluta” para a “segurança econômica e militar” dos Estados Unidos. A Dinamarca e a própria Groenlândia, que é um território autônomo com sua própria primeira-ministra, responderam que a ilha não está a venda.

<><> A maior ilha do mundo quer independência

Com apenas 57 mil habitantes, a Groenlândia é a maior ilha do mundo. Foi colonizada por vikings noruegueses e pertence a Dinamarca desde 1814 (sendo que Dinamarca e Noruega eram uma nação só até 1814).

Com a invasão da Dinamarca pelos nazistas durante a Segunda Guerra, a Dinamarca se aproximou comercialmente dos EUA e do Canadá.

Em 1979, a ilha tornou-se estado autônomo do Reino da Dinamarca. Muitos groenlandeses, como a atual primeira-ministra, almejam a independência e a possibilidade de um referendum para isso está em discussão.

Além de sua localização estratégica, a Groenlândia é uma ilha muito rica em recursos naturais raros e essenciais à várias tecnologias de ponta.

¨      Lista de 'empresas chinesas proibidas' do Pentágono pode prejudicar bancos dos EUA

Há tempos esperando para desempenhar um papel maior nas listagens de Hong Kong, os bancos de Wall Street podem encontrar um revés significativo após o Departamento de Defesa dos EUA adicionar uma importante fabricante de baterias para veículos elétricos da China à lista de "empresas proibidas".

A maior fabricante mundial de baterias para veículos elétricos (VEs) e fornecedora da Tesla, a CATL, buscava expandir para o exterior abrindo participação para bancos estrangeiros, um passo que movimentaria cerca de US$ 7,7 bilhões (aproximadamente R$ 47,02 bilhões), segundo estimativa do Morgan Stanley divulgada pelo Financial Times (FT).

Porém, a ação do Pentágono de adicionar a fabricante a uma lista de empresas sancionadas acusadas de possuir ligações com as Forças Armadas da China junto a outras — como a gigante da tecnologia Tencent e a Cosco — ameaça mudar o cálculo de risco-recompensa dos bancos daqui para frente. Isto significa que, ao aceitar transações relacionadas às empresas de listas desta natureza, os bancos estão assumindo riscos de mercado.

A inclusão na lista "não tem o mesmo peso de uma sanção, mas é próxima o suficiente para que os bancos [possam] cortar preventivamente a exposição aos nomes apenas para evitar manchetes negativas", disse Han Shen Lin, diretor para a China da consultoria norte-americana The Asia Group, à apuração do FT.

As crescentes tensões EUA-China têm prejudicado diversas relações comerciais, adicionando um grau de incerteza importante aos atores envolvidos. Não está claro, agora, se os bancos dos EUA vão continuar seu envolvimento após a ação do Pentágono.

Segundo a apuração, a empresa controladora da gigante da tecnologia pagou US$ 524 milhões (mais de R$ 3,1 bilhões) em taxas de banco de investimento entre 2004, o ano de sua oferta pública inicial, e 2023, de acordo com números do London Stock Exchange Group, beneficiando investidores de peso como Morgan Stanley, BofA, Goldman e Citi. A partir da medida, o Pentágono obriga esses bancos a repensar seus negócios ou arcar com futuros prejuízos caso a situação escalone ainda mais.

Apesar de a CATL e a Tencent estarem planejando uma ação legal para contestar sua inclusão na lista do Pentágono, caso as negociações com o Departamento de Defesa dos EUA fracassem, justificando que suas baterias estão em carros de diversas fabricantes globais, é pouco provável que os EUA evitem acentuar as tensões com Pequim.

 

Fonte: BBC News/Sputnik Brasil

 

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