César
Fonseca: Classe média fortalecida sinaliza opção social-democrata lulista para
2026
O fortalecimento do poder de
compra da classe C, classe média, que ganha de R$ 3,4 mil a R$ 8 mil, conforme
pesquisa da Consultoria Tendências, reforça a percepção do segmento
correspondente a 50,1% da população, majoritário formador de opinião, segundo o
qual o caminho político no país, sob o governo Lula, aponta para a
social-democracia, em contraposição ao neoliberalismo radical fascista
bolsonarista.
Essa tendência se acentuaria
ainda mais se, nos dois últimos anos do lulismo, 2025 e 2026, a prioridade
seguir fortalecendo essa classe social com o cumprimento da promessa de isentar
do IR quem ganha até R$ 5 mil, bem como de taxar os mais ricos, distribuindo
melhor a renda nacional para combater a desigualdade social.
O rumo político que essa
melhor distribuição da renda aponta afasta posições extremistas, seja à
direita, seja à esquerda, nos dois últimos anos do terceiro mandato do
presidente Lula, podendo favorecer sua reeleição no próximo ano.
À esquerda, tal
possibilidade está distante, dada a desmobilização social, em processo
acentuado desde o golpe neoliberal, que fragilizou as forças sindicais, com o
fim, por exemplo, do imposto sindical, sem o qual aos sindicalistas faltam
recursos materiais para a organização política.
Haja vista o que aconteceu
com a complacência dos trabalhadores diante da decisão do Congresso na votação
do pacote fiscal, que prejudicou a política de salário mínimo, base para a
valorização da escala salarial, em geral, das categorias trabalhistas.
Não se verificou acirramento
político da luta de classes, sem o chamamento às greves, como se imaginaria no
processo de agitação social.
Com a direita ocorreu,
igualmente, uma posição de conformidade com a política econômica, porque o
governo atendeu amplamente seus segmentos organizados.
Tanto o agronegócio quanto o
setor industrial se beneficiaram com a política de sustentação de gastos
públicos, na casa dos 5% a 7% do PIB ao longo de 2023 e 2024, responsável por
manter mais do que satisfatória a oferta de empregos, com taxa de desemprego
baixa, embora com redução salarial decorrente da reforma trabalhista neoliberal
herdada do fascismo bolsonarista.
PACTO SOCIAL
O comércio, os serviços, a
agricultura e a indústria ganharam sustentabilidade, o que produziu recuperação
relativa da classe média, favorecida pela manutenção da demanda estatal, que
sustentou o PIB na casa dos 3% nos dois últimos anos.
Com esse quadro econômico
conjuntural, que poderia ter sido bem mais vantajoso para a sociedade se o
Banco Central não tivesse, claramente, feito a opção neoliberal pelos juros
altos, os investimentos poderiam ser mais vigorosos.
Não é à toa que a
Confederação Nacional da Indústria (CNI), interessada no fortalecimento da
classe média, que favorece a política industrial mediante um mercado interno
consumidor mais forte, lança a palavra de ordem favorável a um pacto social,
estratégia capaz de reforçar a produção e o consumo relativamente ao status
quo especulativo, que trava os investimentos.
Os empresários, com o pé no
freio por causa das incertezas, optaram por jogar a maior parte da sua receita
nas aplicações financeiras, onde ganham mais do que nas atividades produtivas,
sustentando a taxa de lucro capaz de garantir a reprodução do seu capital.
Portanto, a conjuntura se
mantém na expectativa de crescimento da economia para 2025, no mesmo nível de
2023 e 2024, reclamando, agora, uma participação maior do setor produtivo como
ator do desenvolvimento para se contrapor ao setor financeiro, cujo faturamento
exagerado na especulação jurista, patrocinada pelo Banco Central, precisa ser
atenuado.
A classe média, sem dúvida,
fortalece esse pacto social defendido pelos industriais, sinalizando maior
engajamento dos setores produtivos no processo de desenvolvimento.
BC KEYNESIANO À VISTA?
Espera-se que o Banco
Central, sob nova direção com Gabriel Galípolo, de orientação econômica mais
ligada à heterodoxia da escola econômica de Campinas, de viés keynesiano, faça
com que as taxas de juros caiam e os negócios ganhem mais impulso.
Afinal, Keynes, do qual
Galípolo é discípulo, diz que a única variável econômica verdadeiramente
independente no capitalismo é a quantidade da oferta de moeda na circulação
capitalista determinada pela autoridade monetária.
Quando a autoridade
monetária, o governo, age nesse sentido, produz quatro fatores simultâneos:
1 – Reduz os juros,
diminuindo a dívida pública e aumentando os investimentos;
2 – Perdoa a dívida dos
capitalistas contraída a prazo;
3 – Eleva relativamente os
preços; e
4 – Diminui, também relativamente,
os salários.
A combinação desses fatores,
diz Keynes, produz, consequentemente, o aumento da eficiência marginal do
capital, isto é, os lucros.
Nesse sentido, caso o BC dê
um breque na especulação desenfreada que mantém a economia em permanente
semiestagnação em relação aos investimentos, com baixa oferta de crédito à
produção e ao consumo, devido ao receio do consumidor quanto ao seu
endividamento, continuará, em 2025, o fortalecimento da classe média.
Estaria sendo, portanto,
materializado o ideal perseguido pelo presidente Lula, como certificou a
pesquisa da Consultoria Tendências, publicada pelo Globo no
domingo.
Politicamente, tal processo
econômico contribui para restabelecer a força da social-democracia frente ao
neoliberalismo financeiro, com reflexos políticos previsíveis para a reeleição
do presidente Lula em 2026, caso ele seja novamente candidato.
¨ Mesmo com aumento
real do salário mínimo, poder de compra do brasileiro seguirá estagnado até
2026, mostra estudo
O salário mínimo no
Brasil passou
a ser de R$ 1.518,00 em 2025, valor R$ 106 maior do que o de 2024, e
correspondente a um reajuste de 7,5%.
Mas, com o dólar nas alturas e a
perspectiva de continuidade da alta do preço dos
alimentos este
ano, não deve haver aumento do poder de compra do brasileiro em relação ao
preço da cesta básica, aponta estudo da consultoria LCA 4intelligence.
E o cenário não
muda em 2026, quando o poder de compra dos brasileiros seguirá estagnado e
abaixo do nível pré-pandemia.
Isso ajuda a
explicar o mau humor dos
brasileiros com a economia, mesmo num cenário de desemprego na
mínima histórica e
renda em alta, dizem analistas.
Na terça-feira
passada (31/12), uma pesquisa Datafolha mostrou que 61% dos brasileiros
acreditam que a economia do país está no caminho errado, ante 32% que
consideram a trajetória econômica positiva e 6% que não souberam responder.
O quadro também
impõe um desafio ao projeto de reeleição do presidente Luiz Inácio Lula da
Silva (PT) em 2026, num cenário inflacionário que tem penalizado outros
mandatários nas urnas — em países como Estados Unidos, Reino Unido, Coreia do Sul, Portugal e Uruguai, partidos de
oposição de diferentes ideologias chegaram ao poder ou conquistaram maioria no
Congresso no ano passado.
Procurado para
comentar a tendência de estagnação do poder de compra mostrada pelo estudo, o
Ministério da Fazenda não respondeu até a publicação desta reportagem.
<><> 'Não
voltaremos ao poder de compra pré-pandemia'
Para realizar o
estudo, o economista Bruno Imaizumi, da LCA 4intelligence, usou a série
histórica do valor da cesta básica na cidade de São Paulo produzida pelo
Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese) e
o salário mínimo vigente.
Ele então projetou
as duas séries à frente, a partir da estimativa da LCA para inflação de
alimentos em domicílio em 2025 e 2026 e para o reajuste do salário
mínimo segundo a nova regra.
Desde 2023, o
salário mínimo é corrigido pela soma da inflação medida pelo Índice Nacional de
Preços ao Consumidor (INPC) em 12 meses até novembro e do crescimento do
Produto Interno Bruto (PIB) de dois anos anteriores.
A diferença é que
agora há um teto de reajuste de 2,5% acima da inflação, a fim de adequar o
crescimento do salário mínimo aos limites de gastos públicos definidos
pelo novo arcabouço
fiscal.
Desde 1998, início
a série histórica da cesta básica do Dieese em São Paulo, até 2010, houve um
ganho no poder de compra do brasileiro, mostram os dados.
Passando de um
pouco mais de uma cesta básica por salário mínimo para 2,2 cestas básicas em
janeiro de 2010.
No período entre
2010 e 2019, melhor momento para o poder de compra do brasileiro, o salário
mínimo comprou em média 2,1 cestas básicas.
"O que o
estudo mostra é que perdemos poder de compra a partir de 2020, quando entra a
pandemia e os preços de alimentos ficam muito caros", observa Imaizumi.
A partir de 2022,
há a guerra entre Rússia
e Ucrânia,
com forte impacto sobre o preço global dos grãos, além de uma série de episódios
climáticos cada vez mais extremos, que reduzem a oferta de alimentos,
elevando preços mundialmente.
Com isso, o poder
de compra do salário mínimo caiu para 1,5 cesta básica em abril de 2022.
Desde então, se
recuperou ligeiramente, para 1,7 em novembro de 2024, mas sem retomar o nível
anterior à pandemia.
"Os níveis de
preços permaneceram muito elevados e, olhando para as nossas projeções, que
estendem para frente as métricas de poder de compra, vemos que não há uma
recuperação [nos próximos dois anos]", diz o economista da LCA.
"Não
voltaremos a patamares [de poder de compra] pré-pandemia, então o brasileiro
ainda se sente lesado. Ele não consegue comprar o mesmo que comprava antes da
pandemia, porque os níveis de preços permanecem muito altos."
Imaizumi observa
que, mesmo considerando a regra antiga de cálculo de reajuste do salário
mínimo, o cenário pouco mudaria.
"O que pode
ajudar para que haja uma recuperação um pouco mais contundente do poder de
compra é uma valorização do real", avalia o
economista.
"Para isso, o
governo vai precisar mostrar que está comprometido com a questão do ajuste
fiscal, porque a trajetória das contas públicas brasileiras no médio e longo
prazo é preocupante, o que afeta expectativas de investimento, consumo e
crescimento a longo prazo do país."
O analista lembra
que, em 2024, a inflação de alimentos ficou bem acima da alta da inflação em
geral medida pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA).
Isso ocorreu em
grande medida devido ao excesso de chuvas, seca e queimadas que afetaram as
safras não só no Brasil, mas também em outros grandes países produtores
de commodities agrícolas.
Para 2025 e 2026,
Imaizumi espera que IPCA e a inflação de alimentos tenham variações mais
próximas.
"Mas os preços
de alimentos vão continuar elevados", prevê o economista.
"Por mais que
a gente tenha [em 2025] a perspectiva de uma safra próxima do recorde de 2023,
o real desvalorizado incentiva a
exportação, o que reduz a oferta de produtos no mercado doméstico."
Além disso, diz
ele, o real desvalorizado também afeta o valor
das commodities negociadas em dólar no mercado internacional.
E as expectativas
de inflação desancoradas em meio às preocupações fiscais também acabam
influenciando a inflação de alimentos, lembra Imaizumi.
<><> Efeito
pêndulo
Para o economista,
a permanência dos preços em patamar elevado após a pandemia pode ser um dos
motivos que têm levado ao que é chamado na análise política de "efeito
pêndulo", ou a tendência de vitória da oposição em eleições recentes pelo
mundo.
"O presidente
de uma determinada ideologia se elege, mas não consegue recuperar poder de
compra ou fazer a economia crescer de maneira robusta e sustentável, então não
consegue se reeleger, mesmo com a máquina pública operando", afirma.
Creomar de Souza,
cientista político e diretor-executivo da consultoria de risco político Dharma
Politics, avalia que, se as projeções de estagnação do poder de compra na
segunda metade do mandato de Lula se confirmarem, ele pode de fato enfrentar
dificuldades nas eleições de 2026.
"Tem uma frase
que diz: 'Se a geladeira está cheia, o voto é no governo. Se está vazia, o voto
é na oposição'. Então o grande desafio da administração Lula na atual
conjuntura é convencer as pessoas de que a economia está funcionando", diz
Souza.
"E esse não é
só um desafio de comunicação. O desemprego está diminuindo, os salários estão
aumentando, mas as pessoas não estão sentindo isso no mercado. Esse é o
ponto."
Souza ressalta, no
entanto, que as causas do problema podem estar além da capacidade do governo de
remediá-lo e destaca que a inflação influenciou recentemente a eleição nos
Estados Unidos, vencida por Donald Trump.
"Ou seja, é um
problema global — os preços não voltaram ao que eram antes da pandemia aqui, na
Europa, nos Estados Unidos, em todos os lugares", diz o cientista
político.
Souza observa ainda
que a economia não é o único fator que ajuda a explicar a avaliação negativa
que parte da população faz do governo Lula — no Datafolha mais recente, 35%
dizem aprovar o governo petista, enquanto outros 34% reprovam, e 29% avaliam a
gestão como regular.
O país segue
profundamente fraturado politicamente, avalia o analista.
"Uma parcela
importante da sociedade que não gosta do Lula, se o governo conseguir fazer
chover maná do céu, vai continuar não gostando do Lula", diz Souza.
"Isso gera uma
dificuldade para o país como um todo, porque vai erodindo os consensos. Há uma
dificuldade de transposição de dados positivos para a percepção de um número
grande de eleitores."
Diante desse
dilema, o governo tem dois caminhos possíveis para o fim de mandato, na visão
de Souza: tentar resolver o desafio fiscal que tem gerado uma crise de
confiança nos mercados, impactando o câmbio e as expectativas de inflação, ou
"jogar mais lenha na caldeira" e acelerar os gastos no fim do mandato
mirando a reeleição — como tentou o ex-presidente Jair
Bolsonaro (PL) e fracassou.
"O dilema para
o governo Lula é frear as expectativas negativas, e isso passa por o governo
ser mais homogêneo, ter mais consensos e ter sinalizações muito claras acerca
do que quer fazer", diz Souza.
Lembrando da crise
de confiança durante o governo de Dilma Rousseff (PT), ele afirma que o passado
recente mostra que não é uma boa ideia ir à guerra contra as forças de mercado.
"O Congresso e
as forças políticas em Brasília sentem o cheiro de algo dando errado muito
rapidamente — de fraqueza, de desgovernança ou de falta de consenso", diz.
"À medida que
esse cheiro é sentido, as forças políticas vão tentar tirar o proveito máximo
disso, então, para cada medida que o governo precisa aprovar, o preço vai
ficando mais caro. E um governo que gasta muito recurso no processo de
negociação fica desprovido de recursos para fazer outras questões que importam."
Fonte: Brasil
247/BBC News Brasil
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