O país onde
agências 'casamenteiras' são esperança contra baixa natalidade e governo
organiza encontros de paquera
Min Jung já estava
se relacionando há três anos com o seu então namorado quando ele disse, do
nada, que não imaginava se casando.
A sul-coreana ficou
arrasada. "Sempre pensei que nos casaríamos em algum momento", lembra
ela, hoje com 30 anos.
"Eu estava
deitada na cama, de bobeira olhando meu celular, quando vi um
anúncio de uma agência que promove encontros de casais que querem o matrimônio.
Pensei: 'Por que não?'"
Foi essa decisão no
calor do momento que levou a jovem de 30 anos a conhecer Tae Hyung, que agora é
seu marido.
Eles estão há quatro meses casados — não foi exatamente amor
à primeira vista, mas os dois tinham química.
"Cheguei ao
nosso primeiro encontro de ressaca, porque teve uma festa de trabalho no dia
anterior. Então eu não estava na minha melhor forma quando conheci minha
esposa", lembra Tae Hyung.
"Mas gostei do
sorriso dela; tivemos uma boa conversa. Eu queria uma segunda chance — tive que
me esforçar para passar uma impressão melhor de mim depois daquele primeiro
encontro."
Os casamenteiros da
agência sul-coreana organizam cada detalhe do primeiro encontro de seus
clientes.
Mas, antes disso,
eles coletam informações pessoais de cada pretendente.
Detalhes como
idade, ocupação, ativos financeiros e histórico familiar precisam ser
preenchidos.
Os clientes são
então classificados com base em seus perfis. Por exemplo, médicos e advogados
provavelmente receberão as notas mais altas para ocupação, enquanto
trabalhadores de escritório em grandes corporações ficam abaixo disso.
Algumas pessoas
acham que esse sistema de classificação é problemático, dizendo que ele é
materialista e dá muito valor às posições sociais.
Mas, para Min Jung,
encontrar alguém "semelhante" a ela era importante.
Tae Hyung também
esperava que as informações que ele deu aos especialistas casamenteiros
possibilitassem encontrar alguém compatível com ele.
A agência fez seu
trabalho.
Min Jung e Tae
Hyung, que trabalhavam em escritórios em Seul, estão agora abrindo mais um novo
capítulo em suas vidas: estão se tornando coproprietários de uma loja de vinhos.
"Minha vida
teria se tornado monótona como funcionário de escritório, com uma vida
rotineira", diz Tae Hyung, enquanto segura a mão da esposa.
"Mas, agora,
estou fazendo algo novo e construindo uma vida junto com ela. É muito
divertido."
·
Crescimento
das agências no pós-pandemia
As agências de
casamento na Coreia do Sul relatam crescimento da demanda nos últimos anos. Há
quase mil operando em todo o país.
"Menos
oportunidades de encontros espontâneos durante a pandemia de covid-19 fizeram com
que mais pessoas recorram às agências", diz Han Ki Yeol, vice-presidente
da N.Noble, uma empresa do setor de alto padrão.
De acordo com ele,
o sucesso entre esses clientes da era covid levou a uma "mudança de
percepção" que favorece as agências de encontros.
"No passado,
os jovens pensavam que essas agências eram só para aqueles que não conseguiam
se casar", diz ele.
"Agora, eles
as veem como uma maneira de encontrar alguém que corresponda às suas
necessidades."
Uma médica de 32 anos
que é cliente de uma agência e pediu para não ser identificada diz que muitas
de suas amigas já contrataram esse tipo de serviço.
"Eu costumava
pensar negativamente sobre essas agências, mas agora parece normal", ela
diz.
"Encontros às
cegas marcados por amigos eram um fardo muito grande para mim. É difícil
recusar alguém quando você tem conhecidos em comum. Os casamenteiros tiram essa
pressão."
Min Jung se lembra
do dia que contou aos pais sobre se inscrever na agência.
"Foi um pouco
constrangedor. A percepção geral de usar uma agência de encontros não é muito
positiva", ela diz.
"Por exemplo,
pode parecer que as pessoas estão sendo julgadas por seus perfis e se casando
sem amor."
E objetivo final,
arranjar um namoro ou casamento, tampouco é atingido por todos.
O custo de usar uma
agência é outro motivo pelo qual os clientes se sentem pressionados. As taxas
variam de cerca de R$ 8,5 mil a R$ 42 mil, o que pode fazer com que alguns
pretendentes hesitem a contratar o serviço ou demorem a renovar os pagamentos,
em caso de necessidade de encontros adicionais.
Uma professora de
36 anos, que também pediu para permanecer anônima, usou uma dessas agências há
dez anos, mas não conheceu ninguém que considerou adequado.
"As pessoas que
conheci por meio de casamenteiros eram pessoas com defeitos significativos ou
tinham perfis perfeitos, mas exigências muito altas", ela lembra.
"Era muito
frustrante."
"E não é
romântico. É algo que você quer realizar de forma perfeita, sem erros no caminho."
·
Encontros
promovidos pelo... governo
A queda nas taxas
de casamento e natalidade é um
problema na Coreia do Sul há muito tempo. Apesar do recente aumento nos
serviços de encontros, os números de matrimônios e filhos permanecem em níveis
recordes de baixa.
Em 2023, o número
de casamentos foi 40% menor em comparação a uma década atrás.
A taxa de fecundidade do país — o número médio
de filhos que uma mulher terá em seus anos reprodutivos — atingiu uma baixa
histórica de 0,72, a mais baixa do mundo.
Especialistas
atribuem esses números às longas horas de
trabalho na
Coreia do Sul, que em 2017 foram as segundas mais altas do mundo, depois do
México.
O equilíbrio
difícil entre vida profissional e pessoal, os altos custos de moradia e de
gastos com crianças também tornam desafiador para as mulheres retornarem ao
trabalho após o parto.
A Organização para
Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) diz que a taxa de fecundidade de
um país precisa estar em torno de 2,1 para manter uma população estável.
Em uma tentativa de
aumentar essa taxa, o governo sul-coreano está se movimentando.
Agora, ele está
assumindo até o papel de casamenteiro, organizando eventos de encontros para
ajudar as pessoas a achar um amor.
Seongnam, uma
cidade a sudeste de Seul, recentemente sediou um evento do tipo pela sétima vez
este ano. O prefeito de lá, Shin Sang Jin, diz que o interesse por esses
encontros está crescendo cada vez mais.
Cem jovens
solteiros, com idades entre 27 e 39 anos e morando em Seongnam, reuniram-se em
um pub com música, jogos, comida e bebidas.
"Vim aqui sem
pensar muito, mas agora estou nervoso", desabafou Mu Jin, participante de
32 anos. "Sinto meu coração batendo forte."
Como muitas
pessoas, ele acha difícil encontrar alguém quando entra no mercado de trabalho.
"Meu emprego
tem sido muito agitado e, agora que passei dos 30, não há tempo nem lugar para
conhecer pessoas novas", conta
"Mas a cidade
proporcionou uma boa oportunidade para isso."
Apesar de ser
sediado pelo governo, o evento foi animado e casual; os participantes foram
encorajados a se movimentar pela sala, cumprimentar-se quando conheciam alguém
novo e dar as mãos enquanto conversavam.
O anfitrião dava
instruções e sugestões de perguntas para manter as pessoas conversando.
Yoo Sun, na casa
dos 30 anos, foi ao evento esperando encontrar um parceiro.
"Quando você
tem um grupo grande como esse, com cem pessoas, é um pouco difícil formar
conexões profundas, mas é uma ótima chance de conhecer gente", diz ela.
O governo afirma
que esses eventos são extremamente bem-sucedidos, com 43% dos participantes já
tendo encontrado um par e dois casais subindo ao altar.
Sung Jin, que
também participou, diz: "Não é fácil organizar algo assim, mas também
mostra que há uma questão social por trás disso."
O governo
sul-coreano também vem investindo em estímulos para futuras famílias, com maior
suporte em creches e empréstimos imobiliários com juros baixos para
recém-casados.
"Nos últimos
20 anos, todas as políticas para aumentar a taxa de natalidade falharam",
diz o prefeito Shin Sang Jin.
"É por isso
que estamos tentando ajudar os jovens a se conhecerem."
Mas alguns
argumentam que o governo está ultrapassando seus limites ao interferir na vida
privada das pessoas. Críticos dizem que as autoridades deveriam priorizar o
apoio a mães que voltam ao trabalho e medidas para conter os altos custos.
"No final dos
nossos 20 anos e início dos 30, estamos construindo carreiras, mas a sociedade
nos pressiona a começar famílias até os 35", diz Min Jung.
"Com os
desafios no trabalho, como perder empregos após a licença-maternidade, os
pedidos para que as pessoas se casem e tenham bebês não parecem
convincentes."
"Sem resolver
essas questões, apenas dizer que as pessoas devem se casar ou ter filhos parece
fora de contexto."
Apesar das pressões
sociais, seu marido, Tae Hyung, diz que o casamento foi uma escolha sua.
"Estou vivendo
uma vida feliz, passando momentos emocionantes com minha esposa. Me casei
porque eu queria, não por causa da pressão social."
Fonte: BBC News
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