Medicamento injetável: Não é cosmético - quando as canetas para
obesidade são indicadas
Não é de hoje que as pessoas procuram a receita
milagrosa para emagrecer. Dietas super restritivas, tomar só sopa por alguns
dias, cortar todos os carboidratos, chás com várias ervas, água e limão em
jejum. E agora dois medicamentos: a semaglutida e a liraglutida – substâncias
muito parecidas com o hormônio GLP-1, que é produzido pelo nosso intestino, e
vendidas em forma de "caneta".
O que muita gente ignora (ou não sabe) é que essas
canetas não são emagrecedoras. Elas são utilizadas para dois tratamentos bem
definidos: diabetes tipo 2 e obesidade – duas doenças crônicas que precisam ser
controladas e supervisionadas por profissionais capacitados.
As pessoas estão vendo esses medicamentos como um
batom. Você chega na farmácia, compra, pergunta para o amigo como usa e pronto.
Não que os fins estéticos não sejam importantes, mas a obesidade é uma doença.
— Fabio Trujilho, endocrinologista e diretor do
Departamento de Obesidade da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e
Metabologia (SBEM)
Cynthia Valério, endocrinologista e diretora da
Associação Brasileira para o Estudo da Obesidade e da Síndrome Metabólica
(Abeso), acrescenta que o tratamento de obesidade é complexo, envolve múltiplos
fatores, além do uso de medicações.
"É um acompanhamento multidisciplinar e tem
que existir uma mudança de estilo de vida. A medicação é uma ferramenta
importantíssima que vai sustentar o processo, mas, quando utilizada de forma
isolada e sem acompanhamento, é como se estivesse usando uma ferramenta valiosa
de forma inútil", completa a endocrinologista.
👉 Os medicamentos têm a tarja vermelha, ou seja, a venda depende da
prescrição médica. Contudo, como a retenção da receita não é obrigatória, muita
gente consegue comprar mesmo sem o pedido do profissional de saúde.
🚨 A obesidade é uma doença multifatorial, com estilo de vida e fatores
genéticos que influenciam a composição corporal.
O Atlas Mundial da Obesidade 2023, publicado pela
Federação Mundial de Obesidade (World Obesity Federation), estima que mais da
metade do mundo terá obesidade ou sobrepeso até 2035. No Brasil, a doença deve
atingir 41% da população adulta.
• 1 -
Quem pode usar as canetas?
Como explicamos acima, existem medicamentos para
diabetes tipo 2 e para o tratamento de obesidade. Abaixo, falamos sobre as
canetas indicadas para essas doenças.
O Saxenda, que tem a liraglutida como princípio
ativo, está disponível e liberado para o uso diário. Já o medicamento com
semaglutida aprovado para obesidade no Brasil é o Wegovy, de uso semanal.
Como ele ainda não está disponível no país, pessoas
estão recorrendo ao Ozempic (usado para diabetes tipo 2), que contém a mesma
substância. No entanto, é sempre importante ressaltar que esse uso é off label,
ou seja, fora da bula. Por isso, deve ser acordado entre médico e paciente.
🔎 NA BULA: Os dois medicamentos são indicados como coadjuvantes à
redução de calorias e aumento da atividade física em adultos com Índice de
Massa Corporal (IMC) inicial maior ou igual a 30 (obesidade) ou maior ou igual
a 27 (sobrepeso), que tenha alguma comorbidade relacionada, como hipertensão,
diabetes, problemas respiratórios durante o sono, artrite.
Trujilho explica que, para ter indicação de uso das
substâncias, a pessoa tem que ter inicialmente tentado a perda de peso através
de mudança de estilo de vida. Se ela não conseguiu, se o resultado não foi
satisfatório, aí o medicamento pode ser recomendado pelo médico.
Uma avaliação médica pode enxergar que alguém com
IMC de 25, um sobrepeso discreto, tem um percentual de gordura muito grande e
que essa pessoa pode ter outras comorbidades que indiquem a perda de peso. Não
dá para chegar na farmácia e comprar, mesmo porque os medicamentos têm
contraindicações. — Fabio Trujilho, diretor da SBEM
<><> 2 - E quem NÃO pode usar?
• As
canetas são contraindicadas para pessoas que têm alergia a qualquer componente
do medicamento.
• Se a
pessoa ou alguém da família teve ou tem um tipo de câncer de tireoide chamado
carcinoma medular de tireoide (CMT) também é contraindicado.
• E
claro, ele não é indicado para grávidas e lactantes.
A bula traz outras advertências e precauções, como
a síndrome de neoplasia endócrina múltipla tipo 2 (NEM 2), e atenção se tiver
dor abdominal grave e contínua, retinopatia, problemas renais.
"Se a pessoa tem histórico de pancreatite,
precisa ter cuidado. Um histórico clínico bem detalhado vai avaliar se o
paciente é alguém que tem poucos riscos do uso do medicamento. Por exemplo, se
a pessoa tem síndrome do cólon irritável, ela não tem contraindicação absoluta,
mas, se for usar, se o médico achar que é uma boa opção, precisa ser mais
cuidadoso", explica o endocrinologista.
• 3 -
Ter estratégia para não gastar dinheiro à toa
"Precisamos ter cuidado quando falamos sobre
medicamentos para tratamento da obesidade. Ele precisa estar inserido em uma estratégia
de tratamento da doença chamada obesidade e separar de emagrecimento, que é
associado ao lado estético", ressalta Trujilho.
⚡ Os especialistas ouvidos pelo g1 fazem o alerta principalmente para
quem procura a semaglutida e a liraglutida apenas para emagrecer alguns
quilinhos para entrar no vestido, por exemplo.
Estudos mostraram a eficácia e segurança dos
medicamentos para os tratamentos previstos em bula, mas não há garantias que
ele vai funcionar para todo mundo.
As pessoas acreditam que vão utilizar a caneta por
uma, duas semanas e vão ter resultados milagrosos. Isso não se sustenta. O
tratamento deve ser crônico, a obesidade deve ser encarada como uma doença
crônica, como hipertensão, diabetes. Daí a importância do acompanhamento médico
e do aconselhamento. — Cynthia Valério, endocrinologista
Vale lembrar que nem todos irão responder aos
medicamentos. Algumas pessoas utilizam as canetas e acabam não perdendo peso.
Por isso, é muito importante planejamento antes de ir à farmácia comprar os
medicamentos.
💲 O g1 consultou os preços em três farmácias diferentes: o Ozempic 1 mg
(usado off label para obesidade) custa cerca de R$ 1 mil. Já o Saxenda
(liraglutida), em torno de R$ 700.
"Os pacientes que fazem uso sem acompanhamento
criam expectativas irreais, querem a mesma resposta do vizinho, do parente, do
amigo que utilizou a medicação. Mas a resposta é sempre individualizada. O parâmetro
para saber quem é o bom respondedor, o mais resistente, isso é determinado pelo
médico", diz a diretora da Abeso.
• 4 -
Reganho de peso
É comum encontrar relatos de pessoas que fizeram
uso dos remédios (com ou sem indicação médica), perderam peso, mas tiveram um
reganho depois de parar.
Os medicamentos devem ser usados como parte do
tratamento, que também conta com mudanças de estilo de vida (alimentação,
exercício físico, sono de qualidade), e não como uma fórmula mágica.
Se a pessoa não tiver uma estratégia bem definida
com os profissionais de saúde, ela vai gastar dinheiro à toa.
"As pessoas acham que vão tomar a semaglutida,
vão emagrecer e vão conseguir manter o peso sem acompanhamento médico. Quando a
pessoa perde peso, o organismo vai desencadear mecanismos para que ela tenha
reganho. É preciso ter um tratamento, uma estratégia para administrar a dosagem
do medicamento", completa o diretor da SBEM.
E o reganho de peso (ou efeito sanfona) é perigoso
para a saúde. O processo constante de emagrece-engorda tem um impacto negativo
no coração e pode provocar diabetes, hipertensão, doenças cardiovasculares e
alteração do metabolismo, mesmo para quem não está acima do peso.
O endocrinologista faz mais um alerta para quem
está usando as canetas:
Geralmente, vemos um bom resultado já no primeiro
mês. Se você usou o medicamento e em três meses não perdeu 5% do peso inicial,
talvez seja hora de mudar a estratégia, pois o remédio não funcionou para você.
Fonte: g1
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