Marcelo Castañeda:
Junho de 2013 e seus ecos
Vou
começar esse texto pelo fim e dizer que junho nos reforçou um repertório de
ação, conceito elaborado pelo sociólogo Charles Tilly, que mobilizei em minha
tese de doutorado, defendida em 2014, sobre a Avaaz, na qual já esboçava a
ideia de um repertório digital de protesto que se somava ao repertório moderno,
envolvendo formas de desempenhar uma ação coletiva, seja uma manifestação de
rua, um protesto, uma greve. Com o ciclo de protestos que se iniciou em 2010,
na Tunísia, gerou a Primavera Árabe, os Indignados espanhóis e o Occupy Wall
Street, esse repertório digital passou a compreender as redes sociais e
aplicativos de mensagens instantâneas, que estavam nascendo e se incorporando
às formas de coordenação e organização de protestos ou mesmo das ocupações de
praças. Bom destacar que a relação da internet com movimentos sociais,
protestos e a política de um modo além do discurso remonta ao levante
neozapatista de 1994 e aos protestos altermundistas (antiglobalização
neoliberal) entre 1999 e 2002, ou contra a Guerra do Iraque em 2003. É preciso
deixar desde o início da minha exposição essa ideia do repertório de ação para
pensar o lugar de junho de 2013 na conjuntura atual, ao menos no que quero
contribuir no debate.
Cabe
buscar a definição de repertórios de ação na perspectiva de Charles Tilly.
Pode-se dizer que os repertórios de ação designam formas de interação entre
partes ou conjuntos maiores de atores. São formas estabilizadas nas quais os
pares de atores fazem e recebem demandas considerando o interesse dos outros.
Um conjunto de interação simples consiste em um ator coletivo que constrói
demandas coletivas, acompanhado de um outro ator que se torna objeto destas
demandas.
Uma
análise dos repertórios deve considerar, de um lado, o conjunto formado pelas
relações sociais, significados e ações padronizadas; e, de outro, requisitos
para deflagrá-las, tais como o conhecimento, a memória e as conexões sociais.
Cada rotina de um repertório estabelecido consiste na interação entre duas ou
mais partes, de forma que o repertório pertence a um conjunto de atores em
conflito.
Enquanto
indivíduos e grupos conhecem e implantam as ações em um repertório, estas ações
conectam conjuntos de indivíduos e grupos. Essa perspectiva de Tilly pode ser
vista como repertório moderno, ao passo que um repertório digital pode ser tido
como uma inovação do repertório, o que não acontece de forma efêmera, o que nos
permite inferir que o repertório de ação reflete um determinado tempo
histórico.
A
partir disso, recupero alguns antecedentes que são de conhecimento público
sobre junho de 2013.
Estruturais
1)
crise financeira de 2008 que levou à plataformização e precarização (não foi
marolinha, sentimos seus efeitos até hoje);
2)
esgotamento de um ciclo de commodities favorável ao Brasil;
3)
Conectividade e mobilidade: redes sociais e smartphones no cotidiano;
4)
Governabilidade petista então apoiada há 10 anos, no PMDB, forte desde o
mensalão, e Centrão, desde 2003, gerando uma estabilidade que passou a ser
contestada, em especial à esquerda.
Conjunturais
1)
Ciclo de protestos globais (2010-2014);
2)
busca por um Brasil Maior (megaprojetos + megaeventos) em contraste com
serviços públicos que não tinham o tal “padrão FIFA”, o que foi destacado em
tantos cartazes, inclusive o transporte “público” nas metrópoles (digo entre
aspas porque são máfias e essas foram enfrentadas, ao menos no contexto carioca
que vivenciei);
3)
Uma onda de greves no Brasil entre 2012 e 2013, com ápice neste ano (inclusive
uma greve da pós-graduação stricto sensu em 2012);
4)
Adiamento do aumento de preços de passagens de janeiro para junho (abril em
Porto Alegre, que registrou os primeiros protestos).
Não
se pode dizer que era um céu de brigadeiro que estava em curso. E vou seguir
direto para o mês que nos suleia ou norteia...
• Junho de 2013
Precisamente
falamos de duas semanas de um modo geral (6 a 20 de junho). No Rio de Janeiro,
que acompanhei mais de perto e do qual posso falar mais: junho “segue” até
outubro (potente greve dos educadores) ou seria até fevereiro de 2014 (que teve
a morte do cinegrafista Santiago Andrade) ou seria até a final da Copa de 2014
(os jogos foram acompanhados de protestos, inclusive a final da Copa, mesmo com
a prisão de 23 ativistas um dia antes).
Participei
da primeira manifestação em 10/06 e fui até o dia 20/06, acompanhando o
contexto até outubro e mais adiante, até a morte do cinegrafista Santiago
Andrade, em fevereiro de 2014, que a meu ver foi o estancar do processo na
cidade do Rio de Janeiro, ainda que contasse com as manifestações contra a Copa
até a final do evento esportivo em julho, das quais também participei.
As
manifestações em junho de 2013 ganharam corpo a partir de uma faísca, o aumento
das passagens de ônibus, que seriam em janeiro, mas foram “transferidas” a
pedido do governo federal de então, comandado por Dilma Rousseff. A ideia de
faísca e contágio talvez tenha sido uma das coisas mais certas que elaborou
Castells sobre as manifestações do ciclo global de lutas entre 2010-2013. Bom
ressaltar que essa faísca não traduzia algo espontâneo, como pode parecer numa
leitura apressada. Em minha opinião e de autores como Rodrigo Nunes, era
composta de vetores organizacionais que hoje já são bem conhecidos, como o MPL
a partir de São Paulo, o Fórum de Lutas no Rio de Janeiro e assim Brasil afora.
Esses
vetores organizacionais contavam, na perspectiva de Nunes, com “lideranças
distribuídas” e o desempenho de “funções-vanguarda” para ficar nos termos do
autor, que contesta a ideia de manifestações horizontais e espontâneas.
As
manifestações de junho de 2013 foram plurais em sua composição e organização:
foram muitos Junhos nas duas semanas, sendo que o objetivo inicial foi
atingido, com destaque para a revogação do aumento das passagens em São Paulo e
Rio de Janeiro, ambos no dia 19/06 por articulação dos dois prefeitos que até
ali negavam a possibilidade, o que foi seguido por outras localidades. Essa pluralidade
deu abertura para que, em especial a partir do dia 13/06, se formasse uma
composição heterogênea e de disputa de posições.
Na
minha visão, há uma divisão temporal clara no Junho das vertentes que mais
concentraram atenção e nas quais acompanhei mais de perto (Rio e São Paulo) e
isso traduz desde já uma deturpação do todo (aliás, uma agenda de pesquisa que
busque integrar e contrapor esses diferentes junhos é algo por demais
interessante, e iniciativas como parece ser a de Roberto Andrés em livro recente
mostram essa possibilidade, bem como Angela Alonso em livro também recente ou
os pesquisadores Tatiana Tramontani e Glauco Rodrigues, que atuam no campo da
Geografia na UFF de Campos).
Mas
qual era a divisão? Até o dia 13/06 tínhamos um junho à esquerda, sofrendo
oposição da mídia corporativa (pois, de um modo geral, “atrapalhava o
trânsito”). Arnaldo Jabor fez crítica feroz famosa à época e basta consultar os
arquivos dos grandes meios de comunicação para saber como se posicionaram. Além
disso, havia óbvia oposição dos governos, que contavam com aparato repressivo –
bastante acionado.
A
partir das agressões a jornalistas de veículos de comunicação como a Folha de
São Paulo no dia 13/06 houve o que eu e muitos chamam de “virada midiática”
(com um amplo apoio, Jabor pede desculpas, e o crescimento do discurso “não são
apenas 20 centavos”), possibilitando um crescimento exponencial e
heterogeneidade nas manifestações dos dias 17 e 20/06. No Rio de Janeiro,
acredito que tenha saltado de 10 mil para 100 mil e um milhão nessa semana,
“encerrando” com muita repressão e terror no dia 20/06.
Houve
forte repressão em todos os dias dessas duas semanas com manifestações
acontecendo segundas e quintas, convocadas pelas redes sociais, em especial o
Facebook. Resta lembrar que o Facebook de então não era o mesmo de hoje, um
exemplo era a possibilidade de convidar todos os seus amigos para um evento (de
protesto). O ápice da repressão foi em 20/06, mas no Rio de Janeiro essa
continuou de forma permanente, bem como a criminalização de quem continuou
protestando, houve uma comissão específica para a judicialização (CEIV –
Comissão Especial de Investigação de Atos de Vandalismo em Manifestações
Públicas, de 22/07/2013 a 26/09/2013), abertura de vários inquéritos (muitos baseados
no que se postava no Facebook) e um clima de perseguição permanente.
O
papel das redes sociais já foi por demais mapeado e ressaltado, mas é preciso
dizer que a infraestrutura técnica (3G, smartphones, conectividade) facilitou a
contaminação (viralidade) das pessoas pelos protestos, que, se atingiram seu
objetivo inicial, geraram fissuras significativas no sistema político então
estruturado, em especial quando houve uma extrapolação dos objetivos iniciais
das manifestações, que pela sua imprevisibilidade, foram duramente reprimidas
no dia 20/06.
Há
um ponto importante que deve ser destacado quanto ao aspecto organizacional: na
minha visão, o saldo organizativo dos múltiplos junhos me parece muito
incipiente, para não dizer que foi bem tímido, ao menos para o campo da
esquerda. No entanto, em termos de repertório de ação, com o conceito
sociológico definido por Charles Tilly, ouso dizer que junho de 2013
estabeleceu no Brasil um padrão sociotécnico que combina o repertório moderno
com um emergente repertório digital, mantendo-se nas manifestações que se
seguiram, ainda que as mais impactantes não tenham sido no campo da esquerda.
Vale
dizer que esse repertório de ação é compartilhado globalmente, ou seja, ele já
estava disponível no espírito do tempo como uma série de recursos que podem ser
acessados por quem organiza ações coletivas, sendo acessado a partir de junho
de 2013. E vejo que para procurar junho de 2013 na conjuntura atual, precisamos
ter em mente esse conceito, até para sair de um debate que, a meu ver, explica
muito pouco, isto é, se junho teve influência no golpe, na eleição de
Bolsonaro, no governo Lula etc.
Pelo
falto de se constituir como um fato anterior é muito tentador que uma
causalidade simples seja elaborada, mas creio que ao trazer um conceito
sociológico e analisar as forças que estavam em disputa, podemos enxergar junho
de 2013 até os dias que correm e talvez isso não seja agradável nem para quem
critica o acontecimento nem para quem o defende incondicionalmente.
• O que veio depois no campo
institucional?
Poderia
dividir em golpe e eleição de Bolsonaro, ainda que seja importante destacar que
Dilma é reeleita em 2014, apesar de junho. Afinal, o acontecimento era muito
mais próximo da reeleição de Dilma do que do golpe que a afastou e muitos
escolhem não mencionar as eleições de 2014 nas análises. Mas então, qual o
papel de junho de 2013 em relação ao golpe e à eleição de Bolsonaro?
De
início, não vejo uma causalidade direta entre os fenômenos. O fato de terem
simplesmente acontecido depois traduz um simplismo analítico. A influência de
junho de 2013 deve ser vista principalmente em estabelecer um repertório de
ação, que, por ser do tempo histórico, não pertence a um campo político
específico e foi apropriado com maestria, em 2015-16 pelo MBL (que faz um
trocadilho, fagocitando o MPL) e Vem pra Rua, em que pese as diferenças no
formato das manifestações, ressaltando o uso de carro de som, as cores da
bandeira que traduziam uniformidade (que não existia em junho de 2013), fotos
com policiais (que passaram de amigos a inimigos), a proximidade com partidos
que então eram de oposição, em especial o PSDB (enquanto em junho os partidos
eram contestados, evitados e até mesmo afastados de manifestações, como no dia
20/06).
Mas
trata-se de um acesso ao repertório que ficou evidente em junho de 2013, não
era uma continuidade. Esse repertório envolve, para reforçar, a articulação do
digital com as ruas, sendo que em alguns momentos o digital continua o que as
ruas materializam, mantendo o clima.
Aliás,
uma reflexão que faço é que, depois de tanta repressão em junho de 2013 e sobre
quem permanecer nas ruas depois, como no Rio de Janeiro, o campo de esquerda
mais radical e combativa estava fora do jogo, quando não extenuado de tanta
bomba e porrada, respondendo processos como no caso dos 23 ativistas no Rio de
Janeiro, presos um dia antes da final da Copa. Ainda assim, há que se destacar
a greve dos garis de 2014 como uma continuidade de junho de 2013, ganhando
aumento e agindo por fora do aparato sindical, mas mobilizando o repertório de
ação que combinava o digital com as ruas.
Consumado
o golpe entre abril e agosto de 2016, quero ressaltar o papel fundamental
desempenhado anteriormente pela Operação Lava Jato, como bem destacado em livro
pelo cientista político Fernando Limongi. Concordo com ele, um
institucionalista, em relação ao principal processo que influenciou tanto o
golpe contra Dilma quanto a eleição de Bolsonaro. Mas será que não existe
relação entre junho de 2013 e a Lava Jato? Creio que com certeza existe, mas
não a vaga relação que procuram estabelecer como se Moro e Dallagnol estivessem
caminhando ao lado dos manifestantes nos protestos de 2013. Existe um mecanismo
que foi decisivo para a Lava Jato ganhar a expressão que ganhou e, a meu ver,
esse mecanismo foi a delação premiada, cuja designação legal foi elaborada em
agosto de 2013 por José Eduardo Cardozo, então ministro da Justiça de Dilma,
como resposta às manifestações, visando até mesmo contê-las. Para quem quiser
saber mais, consulte a Lei 12.850/2013, de 2 de agosto do mesmo ano. É nesse
mecanismo que se apoiaram Moro et caverna. As coisas não são tão simples quanto
parecem.
Daí
temos a eleição de Bolsonaro, que teve um forte componente tecnológico e
provocou uma ruptura ao ser eleito sem tempo de TV, contando com uma facada que
uniu seu corpo digital, como bem destaca a antropóloga Letícia Cesarino. A
relação com junho de 2013 estava mais distante, a meu ver, mas o repertório de
ação continuou a operar. Ainda que com algumas manifestações presenciais
coordenadas tecnologicamente a favor de Bolsonaro, sua máquina digital operou
de forma estratégica, subvertendo inclusive o Movimento #EleNão, organizado por
mulheres, que foi às ruas no final de setembro de 2018.
Enquanto
muitos dizem que esse movimento foi responsável pela vitória de Bolsonaro,
penso que graças a essas mulheres as eleições presidenciais de 2018 contaram
com um segundo turno. Enfim, diferenças de interpretação. Vale lembrar que o
#EleNão também se apoiou no repertório de junho de 2013, bem como as saudosas
ocupações secundaristas de 2015-16, manifestações que, talvez por concorrerem
com o momento de ruptura institucional, ainda têm pouca visibilidade nas
análises mais institucionalizadas, mas foram importantíssimas. Na perspectiva
que adoto aqui, esse repertório, que combina coordenação de redes e plataformas
digitais com ações de rua, é o principal legado de junho de 2013.
Junho
mora onde na conjuntura atual?
Tive
que responder essa pergunta no evento “Junho mora onde?”, organizado pela
UFF/Campos e UENF, que contribuiu para gerar o texto que agora compartilho,
pois seria a fala que faria, mas segui outro caminho na hora.
Primeiro,
precisamos problematizar a análise de conjuntura, pois parece que ficamos
tentando considerar a genialidade de Marx no 18 do Brumário e isso não é
possível atualmente. Enfim, vou elencar alguns pontos abaixo, mas vejo que
considerar a conjuntura, que muda a cada dia de forma veloz, é tarefa coletiva
e cada vez mais distante.
No
entanto, junho mora nas manifestações que acontecem. Vejam o exemplo contra o
Marco Temporal, lembro até dos Mudukurus que se manifestaram em abril de 2013,
num prenúncio indígena de junho de 2013. Segundo, ouvi muito, desde junho de
2013, em especial no período Bolsonaro, a pergunta “onde estão os manifestantes
de junho de 2013?”. Em que pese a pandemia, junho de 2013 esteve presente nos
antifascistas que foram às ruas em 2020, nas manifestações entre maio e outubro
de 2021 contra o governo Bolsonaro, o repertório de ação estava lá, pelo que
percebi muitos manifestantes também. Na atual greve dos professores estaduais
do Rio de Janeiro também. Da mesma forma, com muito incômodo e sem igualar,
vejo que é importante ressaltar que esse repertório é acessado nas ocupações
bolsonaristas após as eleições de 2022, quiçá até mesmo na tentativa de golpe
não efetivada no 8 de janeiro de 2023.
Isso
nos faz pensar que Junho de 2013 traduz sobretudo ambiguidade, em especial pelo
que denominei como sua segunda semana, e pensar no repertório de ação coletiva
ajuda a ver o que emerge como ação coletiva na contemporaneidade dos diferentes
contextos políticos brasileiros que combinam digital e ruas. Ao mesmo tempo,
junho de 2013 trouxe instabilidade a cena política brasileira, algo como um incômodo
que não passou. Não está mais dado que a única forma de manifestação coletiva é
de esquerda. O que podemos refletir talvez seja sobre as condições que fizeram
com que uma extrema direita se arrogue hoje ser contra o sistema e a esquerda
novamente à frente do governo federal se posicione como defensora da ordem.
Essa
inversão, a meu ver, teve seu início em junho de 2013, já que a esquerda estava
no poder no governo federal e se colocou como ordem, inclusive reprimindo
fortemente, e essa posição vem se consolidando no momento atual. Se isso vai
levar ao fortalecimento ou ao desaparecimento da extrema direita, cabe a nós
nos organizarmos, refletirmos sobre esses processos que continuam tendo eco na
conjuntura e atuarmos nela. Por exemplo, Bolsonaro inelegível ou preso consegue
emplacar um “herdeiro” ou seus seguidores (termo advindo do digital, das redes)
vão se espraiar pelo tecido social antes de conseguirem se reunir em um novo
corpo digital do rei como em 2018? Pergunta a refletir.
Agora
fica outra pergunta: será que 14 dias de manifestações ocorridas há 10 anos têm
seu lugar na conjuntura atual? No que percebo no campo da esquerda que voltou
ao poder, vejo que as manifestações de junho de 2013 são continuamente
reavivadas como uma espécie de espantalho, forçando associações simplistas,
algumas que tentei desfazer com esse texto, como se qualquer revolta fosse
ilegítima e pudesse fragilizar o governo, ainda mais depois de todo retrocesso
bolsonarista.
Como
se junho de 2013 tivesse também golpeado Dilma e elegido Bolsonaro, creio que
esse medo difuso propagado por alguns perfis e ícones da esquerda nas redes e
fora delas, nas mesas de bares onde também ocorrem discussões acaloradas, esse
medo reflete menos uma incapacidade analítica do que uma estratégia de brecar
qualquer tipo de revolta que tome forma, como se fosse possível controlar o
início das revoltas. Mas as revoltas não costumam respeitar essas estratégias,
elas tomam forma e, quando menos se espera, ocorrem por motivações diferentes e
organizadas diferentemente.
Por
outro lado, não me encaixo entre aqueles que esperam um retorno redentor de
junho de 2013 como uma insurreição revolucionária que irá modificar
positivamente os rumos da nossa história. Me situo hoje tão somente como alguém
que viveu aquele momento histórico e que hoje tenta, com algum distanciamento,
refletir sobre o mesmo.
Para
finalizar, a ambiguidade de junho de 2013, que faz do acontecimento uma esfinge
que abrange discursos contraditórios, antagônicos, paixões, cisões, brigas,
novas amizades, sociabilidades, reflete nosso tempo plataformizado em que cada
nicho parece ter seu naco de razão. Meu objetivo aqui foi tentar traduzir essa
ambiguidade, vindo de alguém que já foi apaixonado por junho de 2013, mas que
hoje o tem como um amigo de facebook de quem eu curto algumas coisas e não
outras. E junho vai chegando ao fim, 10 anos depois, é inverno...
Fonte:
Correio da Cidadania
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