Fernando Nogueira da Costa: ‘Urbanização em
lugar de industrialização’
A tradição do
nacional-desenvolvimentismo foi a defesa da industrialização no Brasil para
tirar o atraso histórico. Uma parte da esquerda, nos anos 1950s, defensora do
“socialismo em um só país”, isto é, na URSS, chegou a defender ardorosamente a
aliança da classe operária com a burguesia nacional com esse propósito,
dispondo a aceitar os baixos salários reais sem reposição!
Outra parte, nos anos
1970s, fundadora da Escola de Campinas, antecedente do
social-desenvolvimentismo (“a socialdemocracia nos trópicos”), colocou o foco
no problema da especificidade do capitalismo periférico, destacando as
peculiaridades da industrialização aqui. Nossa história econômica deveria ser
reinterpretada como a de um “capitalismo tardio”.
A industrialização,
nessa etapa tardia, era contemporânea do capitalismo monopolista nos países
mais avançados. As diferentes características dela se deviam às forças
produtivas de cada fase do capitalismo serem distintas.
Havia então diferentes
bases técnicas das quais deveria partir a industrialização de cada país. A
historicidade das forças produtivas capitalistas levava à necessidade de o país
adotar um planejamento estratégico direcionado para a etapa da industrialização
pesada dar um salto tecnológico.
Envolvia problema de
escala, relacionado à ainda diminuta dimensão do mercado interno, dada a
concentração de renda. Exigia mobilização e concentração de capital suficiente
para o investimento na infraestrutura e indústria pesada, mas a acumulação de
riqueza financeira ainda não era disponível no sistema bancário comercial
brasileiro. Concedia apenas empréstimos para capital de giro.
Em seu quarto ensaio
sobre economia brasileira, no livro de 1972, Maria da Conceição Tavares mostrou
a estrutura dos haveres financeiros entre 1964 e 1970. no ano da reforma
bancária, pós-golpe militar, os ativos monetários representavam 88,4% deles, e
no ano do louvado “milagre econômico” baixaram para 61,1%. Papel-moeda foram de
18,8% para 10,9%, depósitos à vista de 69,6% para 50,2%.
Os ativos
não-monetários passaram de 11,6% para 38,9% nesses seis anos, surgindo aceites
cambiais (13,6%), ORTN (10,9%), depósitos a prazo (7,3%) e depósitos de
poupança (3,2%). A correção monetária permitiu o sistema financeiro manter o
valor real dos seus ativos e dos clientes em períodos de inflação alta.
Aplicações bancárias,
como cadernetas de poupança e títulos públicos, passaram a ser indexadas à
inflação, garantindo os depósitos e os investimentos preservarem seu poder de
compra. Isso atraiu mais poupança para o sistema bancário e ajudou a evitar a desintermediação
bancária, ou seja, a fuga de recursos para ativos não financeiros (como imóveis
ou dólar), típicos de ambientes inflacionários. Essa “desfinanceirização”
acontece até hoje na vizinha Argentina.
Ao garantir
rendimentos reais positivos, em período de inflação elevada, as aplicações
financeiras corrigidas monetariamente incentivaram a formação de funding (fonte
de financiamentos) interno. As pessoas e empresas passaram a manter seus
recursos dentro da rede bancária urbana, contribuindo para a acumulação de
capital e o crescimento das reservas financeiras nacionais.
Já é hora de a
esquerda rever seus conceitos – a direita nunca foi de estudar – quanto à
particularidade nacional. Terá sido a indústria “o carro-chefe” da economia
brasileira ou, de fato, o desenvolvimento foi mais urbano em lugar de
industrial? Os serviços urbanos – e não os poucos empregos na indústria
regionalmente centralizada – não foram o fator de atração para emigração
campo-cidade, além do grande fator de repulsão pelas péssimas condições sociais
rurais?
José Eustáquio Diniz
Alves publicou, digitalmente, o imperdível livro Demografia e economia, em
comemoração dos 200 anos da Independência do Brasil. Propicia dados e fatos
necessários para essa revisão histórica. Uso-os em seguida.
No século XX, a
população brasileira cresceu quase 10 vezes (de 17 milhões em 1900 para quase
170 milhões em 2000), representando uma taxa média de crescimento geométrico de
2,3% ao ano. Multiplicou-se 46 vezes nos 200 anos da Independência. As maiores
taxas de crescimento demográfico no Brasil aconteceram nas décadas de 1950 e
1960, ainda sem pílula anticoncepcional.
Os determinantes da
queda da mortalidade foram o enriquecimento do padrão nutricional, a melhoria
nas condições de higiene e saneamento básico, especialmente água tratada, e o
avanço da medicina e do acesso ao sistema de saúde. Os determinantes da queda da
natalidade foram o aumento da renda, a elevação do nível educacional, o acesso
ao trabalho assalariado principalmente com a urbanização em vez da
industrialização, a entrada da mulher no mercado de trabalho, a maior autonomia
feminina e a redução das desigualdades de gênero, o aumento e a diversificação
do padrão de consumo, a ampliação do sistema previdenciário, a universalização
do acesso aos métodos contraceptivos e a conquista dos direitos sexuais e
reprodutivos. Todos foram fenômenos urbanos!
Durante a maior parte
da história brasileira, as taxas de natalidade eram altas para se contrapor às
elevadas taxas de mortalidade e porque as famílias desejavam muitos filhos para
ampliar a força de trabalho no campo. Porém, com a “reversão do fluxo intergeracional
de riqueza”, os custos dos filhos subiram e os benefícios diminuíram. Os filhos
deixaram de ser um “seguro” para os pais, já contando com o sistema público de
proteção social e previdência, isso sem falar nos produtos financeiros criados,
inclusive no setor privado, como reservas de segurança.
O Brasil foi um dos
países do mundo com maior crescimento em termos populacionais e econômicos no
século XX. Esse crescimento, em sua maior parcela, ocorreu no meio urbano, dada
a criação da infraestrutura em transportes. As melhores décadas foram as de 1950
e 1970, época na qual a população ainda apresentava crescimento elevado e uma
estrutura etária jovem.
O pior desempenho
econômico ocorreu nas décadas de 1980, com o fim do Estado desenvolvimentista e
o advento do neoliberalismo, e de 2010. A primeira década do século XXI marcou
o melhor desempenho econômico pós-democratização. Mas a segunda década do século
foi também a segunda década perdida com a explosão da bolha de commodities, em
setembro de 2011, seguidas secas e inflação de alimentos, entre 2013 e 2016, e
o erro técnico do Banco Central elevar a taxa de juro contra a quebra de
oferta, provocando a desalavancagem financeira das empresas não-financeiras,
endividadas devido ao Plano de Aceleração do Crescimento.
O choque de juros se
somou ao choque do custo unitário do trabalho, choque cambial e tarifário em
2015, golpe semiparlamentarista em 2016. Provocou fuga de capital ou
repatriamento de capital estrangeiro aplicado em ações brasileiras.
Diante tudo isso, a
população brasileira sobrevive, principalmente, devido aos serviços urbanos. A
agroexportação, bem como os minerais e o petróleo, propiciam superávit
comercial para importação dos bens industriais necessários à montagem de bens
de consumo duráveis vendidos no mercado interno.
Não é suficiente para
cobrir o déficit no balanço de transações correntes com remessa de lucros,
pagamentos de juros e patentes. O Investimento Direto no País por acionistas
estrangeiros o cobre – e desnacionaliza ainda mais a economia.
Para entender a
estratégia de sobrevivência da maioria da população, temos de pesquisar e
estudar mais a dinâmica urbana. Em termos de grandes conglomerados urbanos, as
três maiores regiões metropolitanas brasileiras, segundo as estimativas
populacionais do IBGE de 2021, são as de São Paulo, com cerca de 22 milhões de
habitantes, a do Rio de Janeiro com cerca de 13 milhões e a de Belo Horizonte
com cerca de 6 milhões de habitantes.
Em 2021, o Brasil
registrou 17 municípios com mais de 1 milhão de habitantes, com uma população
de 46,7 milhões de habitantes, representando 21,9% da população nacional de
213,3 milhões de habitantes, segundo as estimativas do IBGE. Eram 326
municípios com mais de 100 mil habitantes, agrupando 123 milhões de habitantes,
representando 57,7% da população total do país.
A população brasileira
era de 51,9 milhões de habitantes em 1950, sendo 18,8 milhões (36,2%) no meio
urbano e 33,2 milhões (63,8%) no meio rural. A população rural continuou
crescendo em termos absolutos até 1970, quando chegou a 41 milhões de
habitantes, mas em termos percentuais caiu para 44,1% da população total. A
partir de 1970, a população rural iniciou uma trajetória de queda absoluta e
relativa, caindo para 29,9 milhões de pessoas ou 15,7% da população total.
A população urbana
cresceu continuamente durante todo o período e chegou a 160,9 milhões de
habitantes, segundo o Censo Demográfico de 2010, representando 84,3% da
população total. Portanto, conclui José Eustáquio Diniz Alves em seu
informativo livro, cuja leitura recomendo a todos dispostos a rever a narrativa
histórica tradicional, “o Brasil é um país predominantemente urbano e com um
peso enorme das grandes cidades e regiões metropolitanas”.
Principalmente através
de serviços urbanos, o PIB do Brasil cresceu 704 vezes entre 1822 e 2022,
enquanto a população cresceu 46,3 vezes no mesmo período. Em consequência, a
renda per capita cresceu 15,2 vezes no período. Um brasileiro médio recebe
atualmente, em um mês, uma renda equivalente àquela recebida por um indivíduo
médio de 1822 com cerca de 1 ano e 3 meses de trabalho. Melhorou, né? Também
pudera, era um país escravocrata e rural…
• Com foco em semicondutores, Alckmin
anuncia pacote de medidas para estimular indústria no Brasil
Pacote inclui
incentivo de R$ 3,4 bilhões. Pedidos para usufruir do benefício devem ser
encaminhados à Receita Federal e ao Ministério da Fazenda.
O vice-presidente
Geraldo Alckmin (PSB) anunciou nesta segunda-feira (23) um pacote de medidas
para impulsionar a competitividade da indústria brasileira e apoiar pequenas e
médias empresas.
As iniciativas,
divulgadas durante o evento na Federação das Indústrias do Estado de São Paulo
(FIESP), incluem implementação da depreciação acelerada e incentivos fiscais
para setores estratégicos, como o de semicondutores e energia fotovoltaica.
As ações fazem parte
de um esforço do governo federal para reverter décadas de baixo crescimento e
aumentar a produtividade do setor industrial.
Uma das principais
medidas destacadas por Alckmin foi a depreciação acelerada de máquinas e
equipamentos, que permite que companhias depreciem seus ativos em prazo mais
curto, de 15 para dois anos. Segundo o vice-presidente, a medida visa estimular
a renovação do parque fabril brasileiro, permitindo que as indústrias adquiram
novas tecnologias e modernizem suas operações.
"A depreciação
acelerada vem ao encontro de trazer mais investimento e melhorar a
produtividade. Em vez de depreciar uma máquina em 15 anos, a depreciação em
dois anos estimula a renovação de máquinas e equipamentos para ganho de
produtividade e eficiência."
Com investimento
inicial de R$ 3,4 bilhões, os pedidos para usufruir do benefício devem ser
encaminhados à Receita Federal e ao Ministério da Fazenda.
Além da depreciação
acelerada, o governo federal aprovou uma lei sancionada pelo presidente Luiz
Inácio Lula da Silva (PT), que garante estímulos fiscais de R$ 7 bilhões anuais
para a indústria de semicondutores e energia fotovoltaica.
O novo Programa de
Apoio ao Desenvolvimento Tecnológico da Indústria de Semicondutores (Padis)
visa fortalecer a produção de chips e componentes fotovoltaicos, essenciais
para a transição energética e a modernização da indústria brasileira.
"É um estímulo
importante. Quase toda a atividade industrial hoje usa toda a parte informática
e pode ser beneficiada pela nova lei de informática."
As medidas também
incluem redução em impostos, como o Imposto de Renda Pessoa Jurídica (IRPJ) e a
Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL), que visam aliviar a carga
tributária das empresas e fomentar o investimento em novos equipamentos.
Segundo ele, as iniciativas buscam corrigir o chamado "Custo Brasil",
apontado como um dos principais entraves ao crescimento da economia nacional.
"Quando a gente
verifica por que o Brasil tem um crescimento menor, especialmente na indústria,
a gente vai verificar que o custo do Brasil é de baixa produtividade e baixo
investimento."
Segundo ele, o pacote
de estímulos é uma resposta direta a esses desafios e pretende criar um
ambiente mais favorável para a indústria brasileira competir no mercado global.
"Ajudando as
pequenas e médias empresas, estamos também fortalecendo a base da nossa
economia", completou.
Fonte: A Terra é
Redonda/Sputnik Brasil
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