Compra de obuseiros de Israel contraria os
objetivos da política externa brasileira, notam analistas
Em entrevista à
Sputnik Brasil, especialistas analisam o imbróglio em torno da compra de
blindados de combate israelenses que colocou em lados opostos o ministro da
Defesa, José Mucio, e o assessor especial da Presidência da República para
assuntos internacionais, Celso Amorim.
A ofensiva israelense
na Faixa de Gaza repercutiu no Brasil na forma de impasse entre duas áreas
críticas para o governo: a defesa e as relações exteriores.
No cerne da
controvérsia está a compra de 36 obuseiros produzidos pela empresa israelense
Elbit Systems, que em abril venceu uma licitação de R$ 1 bilhão para fornecer
os veículos de combate ao Brasil.
Os obuseiros da Elbit
Systems compõem o projeto Atmos. Diferentemente dos modelos antigos, os
equipamentos militares ficam acoplados a viaturas blindadas de oito rodas — o
que permite movimentar a arma com mais facilidade e velocidade e substituiria
cerca de 300 obuseiros antigos das Forças Armadas.
A compra dos blindados
é defendida pelo ministro da Defesa, José Mucio, que aponta a aquisição como
necessária para a modernização da frota do Exército Brasileiro. Porém é
rechaçada pelo assessor especial da Presidência da República para assuntos
internacionais, Celso Amorim, que vem aconselhando o presidente Luiz Inácio
Lula da Silva a não adquirir os blindados de um país criticado pelo próprio
chefe de Estado por conta de sua ação militar na Faixa de Gaza, que o governo
brasileiro aponta como desproporcional. O principal temor é que a compra leve a
um constrangimento na diplomacia brasileira.
Recentemente, Mucio
procurou o Tribunal de Contas da União (TCU) para verificar se havia barreiras
na Constituição para a compra de armamentos vindos de países em guerra, como é
o caso de Israel, e foi informado de que não há restrições na lei que impeça a
aquisição.
Em entrevista à
Sputnik Brasil, Héctor Saint-Pierre, especialista em segurança internacional da
Universidade Estadual Paulista (Unesp), destaca que "a compra de armamento
de qualquer país ajuda a economia desse país".
"E nesse caso,
fazer essa compra de Israel significa dinamizar a economia de Israel em um
momento em que está em uma guerra colonial tanto contra palestinos em Gaza
quanto contra o Hezbollah no Líbano. Sem contar que é um país que não respeitou
nenhum dos 800 mandatos da ONU desde a sua criação, é um país suspeito de todos
os pontos de vista", afirma.
Saint-Pierre enfatiza
que quando se envolve a compra de armamentos, "nenhuma decisão estatal é
meramente técnica". Ele afirma que, particularmente nas decisões
governamentais, "quando se compra ou se vende qualquer tipo de
instrumento, mais especificamente armamentos, se está tomando uma decisão
política", e aponta que essa decisão estaria sendo tomada em um momento
que o mundo vivencia um estremecimento das estruturas internacionais.
"Há um confronto
com relação a modos de perceber o mundo: se dá neste momento uma resposta à
hegemonia norte-americana, que se entendia planetária, e neste momento há uma
situação na qual se corre o risco de uma Terceira Guerra Mundial. Isso não é pouca
coisa. É uma possibilidade que está colocada inclusive nos argumentos
norte-americanos."
Nesse contexto, ele
afirma que qualquer decisão na área de Defesa neste momento e neste ambiente é
uma questão que requer muita sensibilidade política, "coisa que não se
resolve com uma ida ao TCU". Segundo o especialista, a consulta de Mucio ao
TCU "é uma falácia".
"Independe disso
[a compra dos obuseiros], é uma decisão política que não depende de uma análise
jurídica. É óbvio que não se quer ter nenhuma contradição constitucional, mas
não é apenas isso. Sempre uma decisão política tem consequências políticas."
Saint-Pierre também
questiona qual o sentido da compra desse armamento neste momento pelo Exército
Brasileiro.
"Quais são as
ameaças contemporâneas ao Brasil que requerem a compra desse armamento
israelense? Qual é a urgência? Com relação à modernização, a modernização não é
uma coisa apenas instrumental, de compra de um instrumento; isso não
moderniza", ressalta.
Ele afirma que a
modernização da área de Defesa significa pensar a estrutura das Forças Armadas,
a chamada "forma da força", que compreende não apenas a aquisição de
armamentos, mas a estrutura hierárquica; a forma de recrutamento; e a definição
de como o armamento chega ao país, se por desenvolvimento tecnológico autóctone
ou por transferência de outros países — segundo ele, essa última não significa
uma melhor tecnologia, mas simplesmente um instrumento tecnológico que em
operações sempre vai depender daquele provedor.
"Como é o caso
dos mísseis de médio e largo alcance que estão na Ucrânia, mas que para seu
funcionamento eficiente dependem da localização do alvo e da condução desse
míssil até atingir o alvo. E essas duas características não estão no operador;
o operador não é ucraniano, é da OTAN. Isso significa os EUA, significa que o
emprego desse armamento é uma implicação dos EUA e da OTAN na guerra por
procuração contra a Rússia", explica.
• Política externa e de defesa devem estar
alinhadas
A política de defesa
brasileira não pode ser pensada de maneira separada da política externa. É o
que afirma Adriana Marques, professora do curso de defesa e gestão estratégica
internacional da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e coordenadora
do Observatório do Ministério da Defesa (OMD) e do Laboratório de Estudos de
Segurança e Defesa (LESD).
À Sputnik Brasil ela
enfatiza que esse alinhamento deve ser "a primeira premissa que deve
orientar a ação internacional de um país", e lembra que a política externa
do governo Lula no mandato atual é de aproximação com o Sul Global, repensando uma
nova configuração de poder mundial. Por conta disso, "é uma política que
não pode ficar refém de interesses corporativos das Forças Armadas
brasileiras".
"Obviamente que
na compra de equipamentos militares os requisitos técnicos devem ser
observados, mas não se faz uma licitação tendo só um país que pode oferecer
aquele tipo de equipamento. É feita uma licitação com vários países que podem
oferecer aquele tipo de equipamento justamente para permitir que o país escolha
o equipamento que se adeque à sua política externa. E a compra desses blindados
de Israel, neste momento, não atende aos objetivos da política externa
brasileira", explica.
Ela acrescenta que os
militares não podem querer ter autonomia "para escolher equipamentos
militares sem levar em conta a dinâmica da nossa inserção internacional, da
nossa política externa".
Marques afirma que
existem vários outros países que podem oferecer esse tipo de equipamento às
Forças Armadas brasileiras, e que o imbróglio atual é "uma oportunidade
para a gente discutir melhor como são elaboradas essas aquisições de
equipamentos militares no Brasil".
"Porque seria
importante ter uma discussão mais ampla sobre isso. A aquisição de equipamentos
militares tem que estar alinhada com a nossa política externa e deveria estar
vinculada às diretrizes da nossa política de defesa. E as diretrizes da nossa
política de defesa deveriam ser estabelecidas pelo poder político, não pelos
militares brasileiros, que majoritariamente agora dominam a elaboração desses
documentos, […] decidem os equipamentos militares que devem ser comprados e
ainda criam um constrangimento para a política externa brasileira."
Marques avalia que há
uma série de equívocos na elaboração da política de defesa no Brasil, e que uma
das consequências disso é "o ministro da Defesa tendo que fazer um
malabarismo para defender uma escolha que foi feita pelas Forças Armadas e que
não está levando em conta o contexto político da nossa política externa".
"Os países,
principalmente aqueles que podem pressionar os outros com a capacidade de
adquirir ou não equipamentos militares, fazem isso o tempo todo. Os EUA têm uma
gama enorme de sanções e de equipamentos que eles não compram ou que eles não
vendem por questões políticas. Por quê? Porque a política de defesa deles está
alinhada com a política externa. E assim também deveria ser no Brasil. É assim
que acontece nos países democráticos, e as Forças Armadas brasileiras deveriam
se adequar a esse procedimento", conclui.
• Bolívia recebe componentes para reator
de pesquisa nuclear instalado pela Rússia
A Bolívia recebeu 43
toneladas de componentes tecnológicos para o reator nuclear de pesquisa RB-01,
o qual a estatal russa Rosatom está instalando no Centro de Pesquisa e
Desenvolvimento em Tecnologia Nuclear (CIDTN), na cidade de El Alto.
A notícia foi
informada pela diretora-geral da Agência Boliviana de Energia Nuclear (ABEN),
Hortensia Jiménez Rivera.
"Chegou a Santa
Cruz um carregamento de 43 toneladas de equipamentos tecnológicos destinados ao
reator de pesquisa nuclear RB-01. Nos próximos dias, os componentes serão
transportados para a cidade de El Alto, em La Paz [departamento], onde está sendo
construindo o complexo de tecnologia no Centro de Pesquisa e Desenvolvimento em
Tecnologia Nuclear", explicou Jiménez Rivera em comunicado oficial.
O governo boliviano
planeja lançar o seu primeiro reator de investigação em meados de 2025, o qual
ficará localizado a mais de 4 mil metros acima do nível do mar, tornando-se a
instalação nuclear mais alta do mundo.
"O RB-01 tem como
objetivo promover a investigação científica em ciências nucleares, além de
formar recursos humanos altamente qualificados, promovendo o desenvolvimento de
uma comunidade científica nacional. O seu impacto vai se estender a setores como
saúde, mineração, gestão de recursos hídricos e agricultura", explicou
Jiménez Rivera.
O programa nuclear
boliviano é apoiado pela Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA) e
segue rigorosamente os padrões internacionais para o uso pacífico da tecnologia
nuclear.
O Centro Boliviano de
Pesquisas Nucleares é composto por quatro componentes: o Complexo Ciclotron de
Radiofarmácia Pré-Clínica (CCRP) e o Centro Polivalente de Irradiação (CMI),
ambos já em operação; os laboratórios de radioecologia e radiobiologia, próximos
de serem inaugurados; e o Complexo de Reatores de Pesquisa Nuclear, em
construção.
• Honduras quer aprofundar relações
comerciais com a Rússia, afirma ministro hondurenho
Honduras gostaria de
impulsionar as relações comerciais com a Rússia, disse o ministro das Relações
Exteriores do país latino-americano, Eduardo Enrique Reina, à Sputnik nesta
terça-feira (24), à margem da Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas
(ONU), em Nova York.
Quando questionado
sobre quais áreas são do interesse de Honduras nessa expansão dos laços com a
Rússia, Reina ressaltou o comércio como uma oportunidade.
"Acho que pode
ser importante como nossos produtos hondurenhos podem chegar à Rússia. Temos
produtos de exportação de altíssimo nível, como café ou frutos do mar",
disse.
No ano passado, Reina
se reuniu com seu homólogo russo, Sergei Lavrov, à margem da Assembleia Geral
da ONU. Os dois ministros discutiram questões regionais e globais, cooperação
bilateral e coordenação em organizações internacionais, incluindo a ONU.
Também no ano
anterior, o presidente russo, Vladimir Putin, disse que Honduras era o parceiro
mais importante da Rússia na América Central e sinalizou que Moscou já podia
desenvolver o diálogo político e expandir as relações comerciais com
Tegucigalpa.
Fonte: Sputnik Brasil
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