sexta-feira, 28 de abril de 2023

Tereza Cruvinel: O que esperar da CPMI do golpe

Vem ai a CPMI do golpe de Estado fracassado de 8 de janeiro, que não será como as outras que já vimos. Os bolsonaristas, em minoria, e diante de um pelotão qualificado de governistas, não conseguirão reinventar a verdade dos fatos e poderão sair dela mais enlameados, deixando mais expostas as responsabilidades de Bolsonaro e auxiliares. Mas a verdade para eles é secundária.  O que eles querem é fazer da CPI uma arena da luta política, para realimentarem a extrema-direita ressabiada desde a derrota do ano passado.

O Brasil inteiro sabe que houve uma tentativa de golpe contra o presidente legitimamente eleito e contra os outros dois poderes da República. Sabe que o governo anterior e seus apoiadores estiveram envolvidos nisso até o pescoço. O inquérito comandando pelo ministro Alexandre de Morais não está deixando pedra sobre pedra. Então qual é a narrativa que eles querem criar? Ficarão o tempo todo repetindo que o general G. Dias não preparou o palácio para repelir os terroristas? Mas como, se o GSI ainda era comandando exatamente pelas turma deles?

Será cansativo, será exasperante, porque desta vez eles irão a limites impensáveis na negação da verdade, na distorção dos fatos, na inversão das responsabilidades. Se na CPI da Pandemia vimos o negacionismo científico ao vivo, agora veremos o espetáculo da pós-verdade em todas as suas cores.

Vai depender da competência dos governistas impedir ou limitar o espetáculo. Com maioria, os governistas e os democratas poderão selecionar os depoentes. Tendo o relator, terão o controle sobre os interrogatórios. Quem sabe teremos o prazer de ver Bolsonaro tentando explicar todas as manifestações golpistas que fez ao longo dos últimos dois anos, preparando suas falanges para o 8 de janeiro. Ele não estava aqui? Isso é o de menos. Quem semeou o golpe foi ele.  Ou dirá Bolsonaro que estava dopado também nos dois 7 de Setembro em que pregou o golpe, ou na reunião com embaixadores em que difamou nosso sistema eleitoral?

Os bolsonaristas poderão mesmo se arrepender de terem inventado a CPI,  mas não nos iludamos. Com as sessões sendo transmitidas ao vivo, eles estarão de olho é nos 35% (algo em torno disso) da população ainda identificados com a extrema direita. Eles vão usar a CPI para energizar esta base social que anda deprimida desde a derrota eleitoral do ano passado, tratando de mantê-la coesa e alinhada para as novas disputas.

Durante quatro anos foi Bolsonaro que alimentou a extrema-direita com seus discursos, suas lives, suas motociatas, suas declarações estarrecedoras. Mas ele agora está ferido de morte, pode ficar inelegível,  pode ser condenado penalmente, pode ir para a cadeira. O bolsonarismo precisa continuar sem Bolsonaro, e eles enxergam na CPI uma chance de  se reconectarem com este universo, produzindo novos discurso e novas mentiras.

As forças democráticas saem em vantagem mas não podem se iludir. O jogo vai ser baixo e bruto.

 

Ø  CPI vai triturar, expor e dividir oposição a Lula. Por Luiz Costa Pinto

 

Por 28 anos, a eternidade de uma geração, Jair Bolsonaro ocupou uma vaga de deputado federal pelo Rio de Janeiro na Câmara. Ignorante e despreparado, portou-se como um traste sujo e imprestável por todo o tempo. Nunca liderou as bancadas da meia dúzia de siglas pelas quais passou no Parlamento. Jamais presidiu quaisquer das comissões temáticas permanentes, nem mesmo comissões especiais. Não relatou um único projeto de lei relevante em plenário. Era um entulho e devia ter enfrentado processos de cassação de mandato e suspensão de direitos políticos em ao menos três oportunidades: 

  • quando agrediu uma parlamentar e jornalistas mulheres com laivos misóginos, 
  • quando enalteceu no púlpito da Casa do Povo o nome infame de um torturador abjeto,
  • quando levou ao Congresso um coronel dos porões da ditadura para que ele mentisse e enxovalhasse a biografia de outros parlamentares que haviam lutado contra o regime dos generais de 1964.

Ao longo dos quatro trágicos anos do governo do pai, o deputado Eduardo Bolsonaro e o senador Flávio Bolsonaro, foram figuras acessórias no trato de temas sérios no Congresso Nacional. Arrivista e boçal, o deputado só ameaçou brilhar como investigado e processado pelo Conselho de Ética. Porém, o comando do Parlamento não teve nem coragem, nem destemor, para cassá-lo quando perfilou mais de uma vez contra as instituições democráticas e o Estado de Direito. Igualmente boçal e dado a flertes pragmáticos (senão, ao usufruto) com o mercado jurídico de Brasília, o senador não conseguiu sequer traçar uma linha de defesa para o pai na CPI da Covid no Senado. Ou seja, a dupla de “Bolsonaros Minions” do Congresso não passa de um dueto de trapalhões empertigados. Não compreendem os ritos e os manuais do Parlamento, nem têm qualidades para usá-los.

A Comissão Parlamentar Mista de Inquérito que investigará o golpe de Estado dado e derrotado no dia 8 de janeiro de 2023 teve seu requerimento lido e acatado em sessão conjunta da Câmara e do Senado no Congresso Nacional. Na próxima semana os líderes de partidos e bancadas devem indicar os 32 integrantes titulares - 16 senadores e 16 deputados. O Governo terá maioria - ou com um placar de 21 x 11 ou de 20 x 12, a depender da compreensão regimental do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD), acerca da boa jogada regimental promovida pelos governistas ao trocarem o senador Randolfe Rodrigues (Rede) de bloco. Essa maioria teórica só se revelará folgada na prática com alinhamento e fina sintonia entre a base do Palácio do Planalto e os parlamentares que gravitam em torno dos presidentes da Câmara e do Senado. Mas, os governistas estão conscientes da relevância da missão, da importância do desafio e do papel que o destino lhes reservou neste momento: expor, triturar, dividir, empacotar e despachar para o inferno a oposição desqualificada e tacanha que os bolsonaristas aloprados (talvez isso seja pleonasmo) fazem ao presidente Lula.

A turma de jagunços do ex-presidente, um homem covarde que ao vislumbrar e antever o xilindró à espreita por ter estimulado o badernaço antidemocrático de 8 de janeiro escondeu-se sob o manto de uma “inimputabilidade medicamentosa” patologicamente cretina e possivelmente falsa, não possui nem temperança nem preparo técnico-legislativo para fazer frente ao time já pré-selecionado pelo Governo. Os Bolsonaro integram um clã caquistocrático (Kakistocracia, em grego casto, significa “governo dos piores”) e já se arrependem do cacife empenhado na compra das fichas dessa Comissão Parlamentar Mista de Inquérito. A eles interessava o enredo, falso, de ter o Palácio do Planalto trabalhando contra a Comissão por “medo” das investigações. Como não havia temor algum, e sim um cálculo prático de quem está no poder - CPIs que turvam o Parlamento e atrasam as agendas de votações, polarizando teoricamente a energia midiática, atrapalham governos - pagaram para ver e estão, agora, de calças arriadas ante os crupiês dos tapetes verde e azul do Congresso.

Será um espetáculo, e não podemos perder nenhum dos capítulos. A não ser que os oposicionistas recuem e esvaziem a CMPI acusando o golpe de terem sido derrubados pelas estratégias palacianas. Pode ser que isso aconteça - daí, será como assistir a um bando de trombadinhas fazendo arrastão e gritando “assalto! assalto!” ao tentarem confundir o público para se safar da polícia. 

 

Ø  Bolsonaristas querem criar 'versão alternativa da verdade' em CPMI, afirma cientista política

 

Criar "uma versão alternativa da realidade": este é o objetivo do bolsonarismo com a Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) dos atos democráticos no Congresso. Quem afirma é a cientista política Mayra Goulart, professora da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), que participou, nesta quinta-feira (27), do programa Central do Brasil, de produção do Brasil de Fato.

Na entrevista, Goulart destacou que os parlamentares que compõem a base de apoio do agora ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) vão tentar criar cenas que, apresentadas de maneira recortada e distorcida, farão com que seus apoiadores embarquem nessa versão alternativa.

Mesmo o governo tendo sido vítima de uma tentativa de golpe no último dia 8 de janeiro, parte da oposição embarcou, desde o início, na ideia de realização da CPMI. E, nesse contexto, é bastante provável que o tema gere desconforto para o entorno do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

"Toda CPI causa desgastes para o governo. Mesmo essa, que é sobre um acontecimento feito contra o governo. Porém, ela cria um espaço para pautas negativas na mídia, e também desvia a atenção daquilo que precisava estar sendo objeto da atenção, que são as negociações em termos de aprovação de políticas públicas", apontou Mayra Goulart.

 

Ø  O líder amorfinado desmoraliza o golpe. Pot Moisés Mendes

 

Bolsonaro já seria, antes da versão do transe da morfina, a grande atração da CPMI do Golpe. Agora, não há como não convocá-lo para que conte como continuava incitando o golpismo sob efeito de um opióide.

Numa cena inimaginável do teatro do absurdo criado pelo bolsonarismo, ele e o general Gonçalves Dias poderiam depor ao mesmo tempo, lado a lado, para narrar suas experiências sensoriais.

Bolsonaro contaria como tomou morfina e apertou o botão errado, compartilhando nas redes sociais um vídeo golpista ao invés de enviá-lo para um arquivo no celular.

E o general poderia contar como, sem tomar nada, não apertou botão algum e permitiu que o Palácio do Planalto, que ele deveria proteger, fosse invadido pela turma de Bolsonaro.

No Brasil do imponderável, o general encarregado de cuidar de Lula não sabia o que se passava ao lado do gabinete do presidente, enquanto a turba quebrava tudo e pedia água, porque estava sob apagão.

E o ex-presidente doidão, sob o efeito de um remédio, não sabia que havia propagado mais uma fake news. Ambos, o golpista e o general, não tinham o controle das suas vontades.

Acredite quem quiser nas duas versões. Chegamos ao ponto em que um golpista juramentado recorre a uma desculpa que o desqualifica. E um general se auto deprecia por não ter conseguido ser general.

É um quadro que começa a se firmar como a imagem do Brasil que não se livra dos efeitos do fascismo. Chegamos ao limite das definições para o que se passa desde o golpe de 2016.

Absurdo, inacreditável, irracional, espantoso, assombroso, ofensivo, indecente. Não há mais o que dizer para situações em que nenhum adjetivo será capaz de definir o cenário com a extrema direita ainda no palco.

O Bolsonaro fisicamente frágil, psicologicamente vacilante e moralmente deplorável, esse Bolsonaro diz agora que fica mentalmente vulnerável se tomar morfina.

Cercado como golpista, assumido como golpista, denunciado e processado como golpista, o sujeito aperta um botão que reafirma sua condição de golpista, mas só porque estaria dopado.

Bolsonaro desmoraliza a própria base. Gente que se assumiu como golpista, pôs a língua para a Justiça e acabou presa na Papuda leva um tapa na cara com a história da morfina.

Quer dizer que a insistência na tese das urnas fraudadas era uma barbeiragem de alguém amorfinado?

O ministro Alexandre de Moraes já observou, depois de uma visita à Penitenciária da Papuda, que se confirma, numa observação ligeira, a existência entre os presos de gente que teve alucinações no 8 de janeiro.

Metade do Brasil, na eleição de outubro, esteve sob o efeito de algum tipo de droga do fascismo.

Mas quem acredita mesmo que a morfina foi culpada por uma, e apenas mais uma manifestação golpista, logo depois de um golpe frustrado?

Há quem acredite, mas será alguém da polícia ou do sistema de Justiça?

Quem vai embarcar na canoa da morfina de Bolsonaro numa hora dessas, às vésperas de uma CPI que pode finalmente enquadrar os que agem desde 2016 e agora se acovardam? Quem?

 

Fonte: Brasil 247/Brasil de Fato

 

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