Violência contra indígenas explodiu durante era Bolsonaro
O ano de 2022 marcou o fim de um ciclo de ataques
contra os povos indígenas do Brasil. Sob a presidência de Jair Bolsonaro, de
2019 a 2022, a média de casos registrados foi de 373,8 ocorrências de violência
contra a pessoa por ano – um salto de 54%. Nos quatro anos anteriores, sob os
governos de Michel Temer e Dilma Rousseff, a média foi de 242,5 casos anuais.
O número de indígenas assassinados no Brasil entre
2019 e 2022 chegou a 795. Só no ano passado, foram 180. Já os conflitos
territoriais registraram um aumento de 567%.
O levantamento foi divulgado nesta quarta-feira
(26/07) como parte do relatório Violência Contra os Povos Indígenas do Brasil,
produzido anualmente pelo Conselho Indigenista Missionário (Cimi).
"O que mais causou asco e indignação, ao longo
deste período, foi perceber a satisfação dos agressores naquilo que se fazia
contra os povos indígenas. Nada os continha. Ao contrário. Aqueles que deveriam
agir e pôr fim às agressões, na verdade, as incentivavam. A morte era uma
predileção. Parecia uma caçada aos originários filhos e filhas do Brasil”,
afirma no documento Dom Roque Paloschi, presidente do Cimi.
A categoria "violência contra pessoa”, segundo
metodologia adotada no levantamento, inclui, além de assassinatos, abuso de
poder, ameaça de morte, ameaças várias, homicídio culposo, lesões corporais
dolosas, racismo e discriminação étnico-cultural, tentativa de assassinato e
violência sexual.
Para o Cimi, os números registrados nos últimos
quatro demonstram que o governo Bolsonaro atuou para proteger agressores e
criar um ambiente de impunidade como parte de um projeto.
"O crime organizado dentro dos territórios
indígenas passou a ter no Estado um aliado fundamental, que lhe assegurou um
ambiente de impunidade e uma expectativa espe-
culativa de regulamentação da atividade ilegal. O
avanço da violência e o aumento de sua crueldade, de forma sistemática, eram
parte do projeto em curso”, analisam os pesquisadores Corrado Dalmonego e Luis
Ventura.
Na visão dos autores que participaram do relatório,
"a intensidade e a gravidade desses casos não podem ser compreendidas fora
do contexto de desmonte da política indigenista e dos órgãos de proteção
ambiental a que o Estado esteve submetido durante
os quatro anos sob o governo de Jair Bolsonaro.”
O último governo foi marcado por episódios brutais,
como os assassinatos do indigenistaBruno Pereira e do jornalista britânico Dom
Phillips, em junho do ano passado, na região da Terra Indígena (TI) do Vale do
Javari, no Amazonas. Os impactos da desassistência na área de saúde,
mortalidade na infância, invasão do garimpo na TI Yanomami e em outros
territórios são apontados como causas para o agravamento da violência no período.
• O
retrato de 2022
A categoria que mais apresentou aumento de casos em
2022, segundo a metodologia do relatório do Cimi, foi "violência contra
patrimônio”. Foram 158 registros de conflitos ligados a direitos territoriais e
309 casos de invasões, exploração ilegal de recursos e danos ao patrimônio.
Alguns desses conflitos resultaram em assassinatos
de indígenas com participação de agentes policiais atuando como "segurança
privada” para fazendeiros, afirma o relatório. Em setembro do ano passado, um
garoto pataxó de 14 anos foi morto durante um dos ataques a tiros na TI
Comexatibá, no sul da Bahia, onde indígenas buscam recuperar uma parte do
território ancestral onde, atualmente, há uma fazenda.
"A postura declarada e intencionalmente omissa
do governo Bolsonaro em relação à demarcação de terras indígenas redundou no
aprofundamento de conflitos por direitos territoriais, em muitos casos com
situações de ameaças, ataques armados e assassinatos de lideranças”, aponta o
Cimi, ressaltando a ausência de demarcações de TIs durante o mandato do
ex-presidente.
Na categoria "violência contra a pessoa”,
foram contabilizados 416 registros em 2022. Eles incluem abuso de poder (29);
ameaça de morte (27); ameaças várias (60); assassinatos (180); homicídio
culposo (17); lesões corporais dolosas (17); racismo e discriminação
étnico-cultural (38); tentativa de assassinato (28); e violência sexual (20).
Como nos três anos anteriores, Roraima (41), Mato
Grosso do Sul (38) e Amazonas (30) foram os estados com maior número de assassinatos
de indígenas.
Dentre as mortes, está a de uma adolescente
yanomami de 12 anos. Ela foi estuprada e morta por garimpeiros numa comunidade
na região de Waikás, uma das mais atingidas pela invasão na TI Yanomami.
De 2019 a 2022, foram contabilizados 795
assassinatos de indígenas no Brasil, uma média de 198,75 por ano.
• Vida
de crianças ameaçadas
Em todo o Brasil, 3.552 mortes de crianças
indígenas de 0 a 4 anos foram registradas entre 2019 e 2022. A maioria ocorreu
no estado de Amazonas (1.014), Roraima (607) e Mato Grosso (487), segundo dados
da Secretaria Especial de Saúde Indígena, Sesai, sistematizados na categoria
"violência por omissão do poder público”.
O impacto sentido na TI Yanomami, assolada por uma
onda de invasão que levou msis de 20 mil garimpeiros à região, foi
desproporcional. O território, que abriga cerca 4% do total de indígenas que
vivem no Brasil, concentrou 17,5% de todas as mortes, com 621 óbitos no
período.
Para os autores do relatório, a realidade pode ser
ainda mais grave do que o apontado pelos dados oficiais, já que parte da
estrutura de saúde da TI foi apropriada por garimpeiros, em regiões isoladas e
de difícil acesso.
"Crianças morrem por desnutrição, a malária se
alastra, a população indígena é obrigada a ingerir água contaminada por
mercúrio, crianças e mulheres são violentadas, a dependência do álcool e de
drogas ilícitas se alastra. Tudo isso diante de tamanha desestruturação social
gerada pela presença de invasores, principalmente, em razão da prática do
garimpo ilegal”, apontou a causa do elevado número de mortes entre os yanamomi
o relatório da então deputada Joenia Wapichana, que presidiu a comissão externa
da Câmara dos Deputados para investigar a situação.
"Mais que uma inércia e um estímulo indireto
dos representantes eleitos ao cometimento de crimes em territórios indígenas,
verifica-se um apoio direto à intervenção ilícita, o que indica uma
participação das elites financeiras e dos representantes eleitos no sistema de
exploração ilegal”, conclui a relatora, que atualmente preside a Fundação
Nacional dos Povos Indígenas, Funai.
• Recomeço
A política anti-indígena declarada de Jair
Bolsonaro foi alvo de diversas denúncias apresentadas a autoridades fora do
país. A última foi apresentada pela Articulação dos Povos Indígenas do Brasil
(Apib), em novembro passado, na Organização das Nações Unidas (ONU).
O documento, que foi assinado também pela Conectas
Direitos Humanos, o Instituto Socioambiental (ISA), o Observatório do Clima e o
WWF-Brasil, pontua diversas ações que levaram à destruição do meio ambiente e
violações a direitos humano e pede ajuda da ONU para que o Estado repare os
danos causados.
A derrota de Bolsonaro nas últimas eleições
presidenciais e a chegada de Luiz Inácio Lula da Silva ao governo, em 2023, a
expectativa do movimento indígena é de mudanças.
"Que os novos governantes busquem reparar o
mal, garantindo aos povos indígenas seu direito fundamental à terra e aos seus
modos de ser e viver nas diferenças”, diz Dom Roque Paloschi.
Mineração,
mudanças climáticas e o círculo vicioso de destruição amazônica
A mineração pode causar a extinção de espécies
raras e até desconhecidas pela ciência em regiões da Amazônia brasileira. Isso
porque entre as áreas-alvo da atividade minerária na Amazônia estão regiões das
mais ricas em espécies de plantas frutíferas (angiospermas), que também possuem
maior endemismo [ocorrem exclusivamente em uma região], além de artrópodes,
como insetos e aracnídeos.
Essas são as conclusões de um estudo realizado por
pesquisadores da UFMG, em parceria com a Universidade de Queensland, na
Austrália, publicado na revista Diversity and Distributions. A pesquisa
pretende avaliar os riscos potenciais da mineração para a biodiversidade,
informa o g1.
O levantamento aponta que em áreas com mineração
houve uma redução significativa na diversidade biológica, em relação a áreas
onde não há atividade, conclusão destacada pela CNN. Além disso, foi verificada
uma limitação da variabilidade genética entre indivíduos de uma mesma espécie e
uma redução no número de espécies exclusivas [endêmicas] daquelas localidades.
“O principal risco é que a exploração está sendo
feita em uma região pouco conhecida. Em vastas áreas da Amazônia, o
conhecimento é limitado. A gente está perdendo espécies que a ciência nem
conhece, que não foram identificadas e mapeadas”, afirma o pesquisador Britaldo
Silveira Soares Filho, da UFMG.
Recentemente, pesquisadores da ESALQ/USP apontaram
que a atividade minerária legal no Brasil poderá liberar nada menos que 2,55
gigatoneladas de CO2 na atmosfera nas próximas décadas, se os projetos forem
adiante. Ou seja, além dos estragos na biodiversidade da Amazônia e em outras
regiões do país, a mineração ainda contribui sensivelmente para o aquecimento
global e, por consequência, para as mudanças climáticas, que também afetam a
floresta.
Pesquisadores da UFPA, da UFRA e do Museu Paraense
Emílio Goeldi usaram modelos numéricos em estudo para avaliar os efeitos das
mudanças climáticas sobre Unidades de Conservação e Terras Indígenas dos nove
países pan-amazônicos até 2050. E verificaram que muitos microclimas amazônicos
tendem a desaparecer. Como as plantas e os animais da região vivem no limite,
qualquer alteração climática pode ter grandes efeitos, detalha o Um só planeta.
Na natureza, as espécies lentamente migram à medida
que mudam as condições climáticas às quais estão adaptadas. Se o clima muda
depressa demais, a maioria não acompanha e desaparece. Estima-se que a
velocidade média de migração de diversos grupos de plantas seja de 2 km/ano.
Mas na Amazônia, mostram os pesquisadores, as espécies necessitariam migrar a
7,6 km/ano até 2050 para acompanhar a velocidade das mudanças no clima.
Investigação
da PF revela tráfico de meninos indígenas para a Turquia
Depois das investidas de igrejas evangélicas sobre
os Povos Originários, numa reedição da catequização promovida por católicos nos
tempos da invasão do Brasil, nos séculos 16 e 17, agora é a vez de o Islã
tentar converter indígenas. A ação, porém, vai além de conversão religiosa e
envolve tráfico humano.
Jovens e crianças indígenas recebiam lições das
línguas árabe e turca, do Alcorão e do Islã em uma associação em Manaus, no
Amazonas, com a promessa de estudos com tudo pago na Turquia. Mas a
investigação da Polícia Federal aponta para um esquema de doutrinação religiosa
e tráfico de pessoas.
Cinco rapazes indígenas que participavam do
programa foram deportados da Turquia recentemente. Sem visto de permanência,
ficaram três semanas detidos em Istambul até embarcarem de volta ao Brasil com
o turco Abdulhakim Tokdemir, apontado como líder da Associação Solidária
Humanitária do Amazonas, a Asham, que chegou ao estado em 2019, informa o
Fantástico. Coincidentemente ou não, a ação de Tokdemir se inicia justo no
primeiro ano do governo do inominável.
As primeiras denúncias sobre a ação da Asham em São
Gabriel da Cachoeira (AM), a cidade com a maior população indígena do país, na
fronteira entre a Colômbia e a Venezuela, foram feitas pelo Metrópoles em
abril. O grupo islâmico doutrinava e levava indígenas de diferentes etnias para
a Turquia. Com a promessa de que os jovens teriam estudos pagos, pais
entregaram seus filhos para a organização.
Ao menos oito pessoas, entre turcos e brasileiros,
são suspeitas de envolvimento com o esquema. Segundo o Estadão, Tokdemir teve
seu passaporte, computador e celular apreendidos e os sigilos fiscal e bancário
quebrados.
“São indígenas em situação de absoluta
vulnerabilidade e que se tornam, portanto, presas fáceis para essas
organizações criminosas. A apresentação era feita como uma proposta de estudo
na Turquia, a fim de que tivessem a possibilidade de se tornarem médicos,
advogados, teólogos, engenheiros, quando, na verdade, o processo era de
servidão, de imposição religiosa, de doutrinação”, explica o superintendente da
PF no Amazonas, Umberto Ramos.
Além da vulnerabilidade social, São Gabriel da
Cachoeira, onde crianças e jovens indígenas eram aliciados, sofre com o consumo
descontrolado de bebidas alcoólicas, informa o g1. O Conselho Tutelar do
município aponta que a cultura do consumo desenfreado dessas bebidas afeta até
mesmo crianças.
Um indígena de 14 anos, da etnia Dessana, relatou
que sofreu agressões dentro do internato ilegal da Asham em Manaus, que foi
fechado em fevereiro deste ano. O adolescente disse que o então responsável
pelo local – o turco Hakan Ugurlu, de 22 anos – havia o repreendido e empurrado
contra a parede, sob a justificativa de que estaria “brincando” no momento da
oração.
O adolescente relatou o caso à Fundação Nacional
dos Indígenas (FUNAI) em outubro do ano passado, como consta em um relatório ao
qual o Metrópoles teve acesso. O documento ainda relata que crianças e
adolescentes indígenas realizavam a limpeza do internato e o preparo dos
alimentos. “A alimentação se restringe a arroz e feijão, e em algumas vezes
macarrão, sem presença de proteína de origem animal”, informa o relatório.
Fonte: Deutsche Welle/ClimaInfo
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