domingo, 9 de julho de 2023

Tereza Cruvinel: Vitória do Brasil. Derrotado e isolado, só Bolsonaro

São muitos os vitoriosos da noite de quinta com a aprovação da reforma tributária, em dois turnos, pela Câmara: Lula, Haddad e o governo; o presidente da Câmara Arthur Lira; os 375 deputados que votaram a favor (contando apenas os votos no segundo turno da madrugada); os governadores que se mobilizaram a favor, em particular o de São Paulo, Tarcísio de Freitas, porque era contra e soube se reposicionar, mesmo trombando com Bolsonaro; o relator, que trabalhou e negociou com afinco, Aguinaldo Ribeiro (PP-BA); o deputado Baleia Rossi (MDB-SP), autor da proposta original de 2019; o secretário especial da Fazenda para o tema Bernardo Appy, exímio tributarista que foi de extrema dedicação; os empresários e economistas e todos os que, na sociedade, apoiaram a reforma.

Isolado e derrotado mesmo ficou apenas Bolsonaro, que foi contra a reforma só para ser contra Lula, e viu confirmada sua desimportância. Afora o apoio de Tarcísio e outros governadores, tidos como bolsonaristas, a reforma teve o voto de 20 deputados de seu PL. Seu, nem tanto.

Em quatro décadas de acompanhamento da atividade política e legislativa, vi muitas propostas de reforma tributária morrerem na praia. Vi a Constituinte não conseguir mudar o velho sistema. Lembro-me do esforço de José Serra e Francisco Dornelles pela simplificação que nunca vinha porque faltava consenso. Lembro-me da reforma de Palloci, que morreu na praia. E depois também a de Guido Mantega.

Não foi coisa pouca, ou uma reformazinha. Se o Senado confirmar a votação da Câmara, teremos uma mudança na economia comparável à que foi trazida pelo Plano Real e o fim da hiperinflação.

Chegará ao fim uma era de atraso, com impostos incidentes em cascata, que tornam tudo mais caro para o consumidor; com impostos em profusão, que oneram e complicam a vida das empresas; com a falta de transparência sobre o que é cobrado dos consumidores; com alíquotas que variam de estado para estado permitindo, entre outros males, a guerra fiscal. A lista dos males é longa.

Resumidamente, ficaremos assim: em vez de IPI, Pis e Cofins recolhidos pela União, teremos apenas a CBS (Contribuição sobre Bens e Serviços). Em vez de ICMS e ISS cobrados por estados e municípios, teremos apenas o IBS (imposto sobre Bens e Serviços).

Vale recordar que essa reforma não trata de imposto de renda. Essa é outra mudança que precisa ser feita para que tenhamos mais justiça tributária, para que os ricos paguem mais, para que os dividendos bilionários passem a ser tributados, para que os assalariados que ganham menos tenham uma tabela justa. Mas cada batalha tem seu momento.

Calculou o IPEA que 90% da população pagará menos impostos, com o fim da "cascata" e a redução em 50% para transportes públicos, serviços médicos e educacionais, aviação regional, produtos de higiene e insumos agrícolas (fala-se em redução para agrotóxicos mas isso veremos na regulamentação).

Projeta-se crescimento adicional de 12% para a economia nos 15 anos seguintes à plena implementação do novo sistema, e a geração de 12 milhões de empregos, afora facilidade maior para investimentos, inclusive estrangeiros.

Este novo sistema só estará plenamente implantado lá por 2030. Logo, o governo Lula pode até não colher frutos diretos da reforma, mas a mudança de ambiente, a positividade criada com a aprovação, já será uma grande alavanca a favor do governo. Todos nós sabemos: o êxito do governo Lula depende da economia. E do êxito deste governo de normalização depende o futuro da democracia brasileira, o não retorno da extrema direita.

O grande mérito de Lula e Haddad foi esse: abraçaram um projeto necessário ao país, não ao governo. Este legado já é reconhecido, e representa aumento de capital político do governo.

Da mesma forma, acho que é preciso reconhecer o papel de Lira, como fez Haddad, e não reduzir seu empenho à necessidade de se descolar de denúncias recentes. Antes disso, ele já estava comprometido com a reforma, seja porque as elites às quais é ligado a desejavam, seja por ter visto nela uma oportunidade de marcar indelevelmente sua gestão.

Agora falta o Senado, e será preciso aprovar depois um grande número de leis regulamentadoras. Entre elas, a que pode instituir o cash back, a devolução, em dinheiro, de parte dos impostos pagos pelos mais pobres ao comprar qualquer quilo de feijão. Isso é justiça tributária, assim como a zeragem de impostos sobre a cesta básica.

Há dificuldades e batalhas pela frente mas a força que impulsionou a votação de agora foi tão grande que eve garantir também a vitória do Brasil racional nos próximos embates.

 

       Bolsonaro foi o grande perdedor. Por Alex Solnik

 

Bolsonaro resolveu colocar à prova sua liderança na direita. E talvez no país. Ou no planeta. Tentou levantar os deputados do PL contra a reforma tributária.

 “Se o partido ficar unido, não aprovam”, propalou, em reunião, ontem, em Brasília, interrompendo o discurso de seu pupilo, Tarcísio de Freitas que defendia a reforma. 

   Também entrou em rota de colisão com seu ex-aliado Arthur Lira, que fez das tripas coração para aprovar a proposta que ele tentava demolir. E disse, da tribuna, ter votado no ex-presidente em 2022, mas que o vencedor foi Lula.

   Outro, o ex-ministro Ciro Nogueira, reprovou Bolsonaro. “O projeto é do país”.

   À medida em que a perspectiva de poder de Bolsonaro se esvai, e as punições se aproximam, os ex-aliados o abandonam. Ou vice-versa. E o que diz entra por um ouvido e sai pelo outro.

   Foi péssimo para ele ter entrado nessa briga. Perdeu uma ótima oportunidade para ficar calado. O PL não caiu na sua lábia. Vinte deputados, de 95, acompanharam Lira, Haddad e Lula e a maioria que deu 382 votos à reforma no primeiro turno e 377 no segundo.

   Bolsonaro mostrou, sem que ninguém tivesse pedido, que não lidera coisa alguma. Nem seu partido, nem a direita. Sem a caneta é um zero à esquerda. Em vez de unir, divide a direita.

   E provou mais uma vez que onde pisa não nasce grama. É campeão em criar desafetos. Briga com a própria sombra. Suas alianças têm prazo de validade.

   Também demonstrou não estar disposto a dividir seu eleitorado com algum forasteiro, nem que seja seu pupilo. O que reforça a impressão de que não vai apoiar ninguém a presidente em 2026, a não ser sua mulher - se é que em 2026 ele terá o eleitorado de 2022.  E alguém vai querer associar seu nome ao dele depois de todas as punições que certamente vai receber até lá.

     Lula ganhou, Lira ganhou, Haddad ganhou. O Brasil ganhou.

     O grande perdedor foi Bolsonaro. E tudo indica que daqui em diante vai acumular derrota após derrota.

 

       Em seis meses de Governo, Lula faz Brasil enterrar pauta de ódio e olhar para a frente desnorteando bolsonarismo. Por Luiz Costa Pinto

 

Não foi o placar que tangenciou os 400 votos favoráveis à Reforma Tributária, levando-a a ser aprovada na Câmara dos Deputados ainda no 1º semestre do ano, como o presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, haviam prometido, e começando a promover a maior alteração do capítulo tributário da Constituição de 1988 desde que a Carta foi promulgada.

Não foi o ambiente de intensas e produtivas reuniões entre os três poderes da República, suas lideranças e formadores de opinião, investidores daqui mesmo e do exterior e instituições regulatórias e fiscalizadoras, criado nos dois últimos meses, em torno da pauta econômica do Brasil e da reinserção do País nos pólos de decisão do mundo em torno de transição energética e preservação ambiental (entre outros).

Não foi apenas a intersecção dessas duas agendas no âmago das discussões reais e das prioridades em Brasília e de lá para o resto do território nacional. Não!

A grande e velha novidade do Brasil nesse primeiro ciclo de seis meses do 3º mandato de Lula é ver o conjunto desses temas, aliado ao transcurso em plena normalidade do julgamento que decretou a inelegibilidade do trágico personagem “Jair Bolsonaro” na Corte eleitoral e ao pleno funcionamento das instituições democráticas e republicanas - atacadas e vilipendiadas no dia 8 de janeiro de 2023 - reconstruírem tijolo a tijolo seus prédios e seus espíritos e propósitos assentados no Estado de Direito com a apuração de culpas e a incriminação dos responsáveis pela Grande Infâmia da tentativa de golpe.

Depois de vencer o golpismo atroz tentado pelo bolsonarismo, cevado pelo ódio e pelos recalques dos discursos desconexos do ex-presidente, derrotado nas urnas, e da choldra de militares, ex-militares, policiais militares e ex-PMs, capangas, jagunços, milicianos, e até “inocentes” úteis (e inúteis também), o presidente da República eleito em outubro do ano passado tratou de reorganizar o País internamente e restaurar os mais marcantes programas sociais e de transferência de renda que tivemos em pleno funcionamento entre 2003 e 2016. Em paralelo, soube identificar quais os gargalos legislativos que travavam o crescimento e o bom ambiente de negócios - reviu-os todos. E voltamos a andar, como Nação, olhando para a frente aqui dentro e de cabeça erguida lá fora.

Há muito o que fazer ainda, sobretudo aprovar a Reforma Tributária no Senado e promulgá-la, de fato, até o fim do ano, e tempo escasso para tantas vitórias. Porém, o Brasil do Governo Lula abre o calendário do segundo semestre de 2023 como um País com rumo e que sabe onde quer chegar. Acima de tudo, com uma equipe de comando - o presidente, seu vice Geraldo Alckmin, a liderança da área econômica personificada em Fernando Haddad (mas, também, necessário destacar o empenho colaborativo da ministra Simone Tebet, o foco total de ministros como Wellington Dias, do Desenvolvimento Social, Flávio Dino, da Justiça e Marina Silva, do Meio Ambiente) - que tem rumo e não chegou à Esplanada e à Praça dos Três Poderes por estarem a passeio ou por serem aventureiros. Não. Em seis meses de Governo, Lula e sua equipe fizeram o Brasil enterrar a pauta de ódio e olhar para a frente desnorteando o bolsonarismo e o trágico mito deles.

 

Fonte: Brasil 247

 

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