quinta-feira, 27 de julho de 2023

Os 3 desafios da economia mundial, segundo o FMI — e um dado positivo para o seu bolso

A economia global segue enfrentando desafios importantes passada a pandemia de covid, segundo o Fundo Monetário Internacional (FMI).

A organização apresentou esta semana uma atualização da economia em seu mais recente relatório "World Economic Outlook" e observou que os países continuam se recuperando gradualmente da crise de saúde causada pela covid-19 e do impacto da invasão da Ucrânia pela Rússia.

"No entanto, muitos desafios ainda obscurecem o horizonte e é muito cedo para comemorar", escreveu o economista-chefe do FMI, Pierre-Olivier Gourinchas.

Segundo o FMI, há três aspectos nos quais os países devem se concentrar.

·         1. Queda no crescimento econômico

Por um lado, o relatório indica que a economia global crescerá menos em 2023 e 2024 do que em 2022: passando de 3,5% no ano passado para 3% em ambos os anos.

"Crescem os sinais de que a atividade global está perdendo força", disse Gourinchas, em parte devido ao aperto das políticas monetárias na luta contra a inflação.

Apesar de elevar a previsão de crescimento para este ano em 0,2 ponto percentual em relação à previsão feita em abril, a agência destacou que a economia "continua fraca" frente à média deste século, de 3,8%.

Esse menor crescimento é explicado principalmente pelo desempenho das economias desenvolvidas, onde o crescimento cairá de 2,7% em 2022 para 1,5% em 2023.

Em contraste, os países emergentes vão acelerar sua taxa de crescimento de 3,1% no ano passado para 4,1% neste ano e no próximo.

Isso se deve à força das economias asiáticas, especialmente China e Índia.

A América Latina e o Caribe, no entanto, terão uma queda mais forte do que a média mundial, segundo as previsões do FMI, de 3,9% em 2022 para 1,9% em 2023 e 2,2% em 2024.

"Muitos produtores de matérias-primas vão sofrer uma queda nas receitas de exportação", explicou Gourinchas.

O Brasil também terá queda na atividade econômica: 2,1% em 2023 e 1,2% em 2024 — contra 2,9% do ano passado. Ainda assim, o FMI revisou para cima sua previsão de crescimento da economia brasileira para este ano, de 1,2% para 2,1%.

·         2. O problema da inflação

O segundo desafio mundial é reduzir ainda mais a inflação.

Embora a alta dos preços ao consumidor tenha ficado abaixo da máxima registrada no ano passado — 8,7% na média mundial — e neste ano a agência espera que seja de 6,8%, o núcleo da inflação (que não leva em conta produtos voláteis como alimentos e energia ) irá "diminuir mais gradualmente".

"Mais preocupante, o núcleo da inflação nas economias avançadas deve permanecer inalterado a uma taxa média anual de 5,1% este ano, antes de cair para 3,1% em 2024. Claramente, a batalha contra a inflação ainda não está vencida", disse o chefe economista.

O FMI disse que deveria ter revisado para cima sua previsão de inflação para 2024.

No Brasil, o IPCA vem caindo há um ano. A taxa anualizada de inflação caiu de 11,89% em junho de 2022 para 3,16% no mês passado.

·         3. Garantir a estabilidade financeira

O terceiro desafio lançado aos países pela organização internacional é garantir a estabilidade financeira, depois de ter superado com sucesso as turbulências em algumas instituições bancárias nos Estados Unidos e na Suíça nos primeiros meses do ano.

"Os bancos centrais devem continuar a se concentrar em restaurar a estabilidade de preços e fortalecer a supervisão financeira e o controle de risco", disse o FMI em seu relatório.

O relatório afirma ainda que "devem ser construídos buffers fiscais, com a composição do ajuste fiscal garantindo apoio específico aos mais vulneráveis".

·         Recuperação do poder de compra

Além dos alertas do FMI, Gourinchas destacou um indicador relevante para a população em geral que deve melhorar.

Nos últimos anos, o crescimento dos salários não acompanhou a inflação — pela média mundial — e, embora os mercados de trabalho tenham permanecido aquecidos, com altas taxas de emprego e baixo desemprego, isso provocou uma redução dos salários.

"Se os mercados de trabalho permanecerem fortes, devemos esperar aumentos reais nos salários", disse Gourinchas.

O economista-chefe disse que isso significa que o crescimento dos salários nominais permanecerá forte por um tempo. "De fato, a diferença entre os dois começou a diminuir", acrescentou.

"Continuo confiante de que há espaço para acomodar a recuperação dos salários reais sem desencadear uma espiral de inflação."

 

Ø  Os interesses da Rússia no Brics para tentar 'driblar' sanções

 

A ex-presidente brasileira e atual chefe do New Development Bank (NDB) - conhecido como "Banco do Brics" -, Dilma Rousseff, se reuniu nesta quarta-feira (26/7) com o presidente da Rússia, Vladimir Putin.

Dilma acompanha as atividades da Cúpula Rússia-África, um fórum econômico que reúne diversos líderes mundiais em São Petersburgo, e aproveitou para marcar reuniões bilaterais com Putin e o presidente da África do Sul, Cyril Ramaphosa.

Segundo sua equipe, o objetivo dos encontros é discutir a próxima Cúpula do Brics, marcada para 22 a 24 de agosto em Joanesburgo, e temas como a expansão de membros do NDB.

Instituída para ser uma alternativa às fontes tradicionais de financiamento, a organização inclui os membros do grupo (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul), além de Bangladesh, Egito e Emirados Árabes Unidos.

Em nota, Dilma negou que um dos tópicos discutidos no encontro com Putin seja a concessão de empréstimos a Moscou pelo NDB.

Mas afinal, qual o interesse atual da Rússia com o banco e o próprio Brics?

Segundo analistas consultados pela BBC News Brasil, o principal laço que une o Kremlin aos demais membros é econômico: isolados desde a invasão da Ucrânia, o governo russo tem contado com China e Índia para mitigar os efeitos das fortes sanções econômicas impostas pela Europa Ocidental e pelos Estados Unidos.

Além disso, Putin vê no Brics uma boa oportunidade para tentar difundir sua narrativa sobre o atual conflito e encontrar novos parceiros.

"Considerando a atual situação volátil da Rússia, que está isolada e precisa de aliados, os (países do) Brics se tornam mais importantes", diz Junuguru Srinivas, professor da Universidade Woxsen, na Índia, e estudioso do tema.

·         Driblar as sanções

Segundo Srinivas, como a Rússia está impossibilitada de receber ajuda direta devido às sanções e pressão da comunidade internacional, precisa de parceiros dispostos a fazer negócios.

"A única fonte de recursos financeiros da Rússia hoje é a venda de energia. E quais países são hoje extremamente dependentes da energia russa? China e Índia", diz.

Moscou teria oferecido descontos a Pequim em seus preços de petróleo e gás, o que abriu aos russos um enorme mercado até então não explorado.

A Rússia também se voltou para a Índia: antes da invasão da Ucrânia, apenas 1% das suas exportações de petróleo eram destinadas ao país. Em maio de 2022, elas já correspondiam a 18%.

Em 19 de junho, em discurso virtual durante a abertura do fórum de negócios do Brics, Putin deixou claro que enviar seus produtos para os demais membros do grupo, especialmente os dois vizinhos asiáticos, é a estratégia da Rússia para driblar as sanções.

Enquanto vende derivados de petróleo a chineses e indianos, Putin citou a possibilidade de aumentar a presença de carros chineses no país e a abertura de lojas de uma rede indiana de supermercados.

"As entregas de petróleo russo para China e Índia estão aumentando. E a cooperação agrícola tem se desenvolvido dinamicamente", disse Putin, o principal responsável pelas remessas de fertilizantes para os países do Brics.

Além disso, junto aos demais membros do bloco, os russos têm avançado para diminuir sua dependência financeira de dólar e euro nas transações internacionais.

Em janeiro deste ano, as reservas internacionais da Rússia, em moeda estrangeira e ouro, chegaram a níveis recordes, valendo mais de US$ 630 bilhões.

Essa é a quarta maior reserva do mundo e poderia ser usada para ajudar a sustentar a moeda da Rússia, o rublo, por um tempo considerável.

Nos últimos anos, o governo tem reduzido consideravelmente a porcentagem de divisas mantidas em dólares, justamente para proteger a Rússia de sanções ao máximo possível.

Segundo Cristian Nitoiu, professor da Universidade Loughborough Londres, esse é um ponto de convergência entre Moscou e os demais membros do Brics.

O grupo tem debatido alternativas à dependência do dólar e, em maio deste ano, o presidente brasileiro Luiz Inácio Lula da Silva disse "sonhar" com uma moeda comum para o bloco.

"Os países do Brics têm sido bastante transparentes sobre sua intenção de abandonar o dólar", diz Nitoiu. "Há dois ou três anos, a moeda ainda era usada em transações entre Rússia e Índia e até Rússia e China. Isso não acontece mais, obviamente."

Especialistas, porém, não acreditam que o grupo de países conseguirá abandonar a moeda americana tão cedo.

"Os cinco países têm muito possivelmente visões diferentes sobre como esse objetivo pode ser alcançado, assim como interesses diferentes com isso, o que pode dificultar", diz Cristian Nitoiu.

·         Difusão de uma narrativa

Os analistas consultados pela reportagem afirmam acreditar também que a relação russa com os demais países do Brics é vista como mais uma oportunidade para o Kremlin projetar sua política externa e disseminar sua própria visão de mundo.

"A Rússia está isolada e esses países são ativos importantes para as relações internacionais nesse momento", diz Junuguru Srinivas.

Desde o início da guerra na Ucrânia, Pequim é vista como o principal parceiro de Moscou.

Para além da aliança econômica, o governo chinês aposta em um discurso de amizade e troca de elogios com os russos, ao mesmo tempo em que reforça seu apoio à paz e à defesa da soberania.

A Índia também vem se abstendo em fóruns internacionais durante discussões de propostas de condenação à Rússia.

Já Brasil e África do Sul adotam uma postura mais neutra, com declarações do presidente Lula que provocaram fortes reações negativas por parte de Estados Unidos e União Europeia.

"Enquanto China e Índia são apontados como aliados mais ativos, Brasil e África do Sul são neutros. Mas de toda maneira, nenhum deles faz parte do grupo que condena vocalmente a atuação russa, o que já é uma abertura", explica Srinivas.

Tanto que Vladimir Putin cogitava comparecer presencialmente à cúpula de Joanesburgo no final de agosto, mas confirmou que participará apenas virtualmente para evitar conflitos envolvendo o Tribunal Penal Internacional (TPI).

Em março, o TPI emitiu um mandado de prisão contra Putin, acusando-o do crime de guerra em casos de deportação de crianças da Ucrânia. E como membro da corte, a África do Sul teoricamente teria que cumprir a ordem de detenção.

Por isso, apenas o ministro das Relações Exteriores da Rússia, Sergey Lavrov, deve comparecer presencialmente como representante do país.

"A Rússia conta mais com Índia e China para o apoio econômico, mas Brasil e África do Sul também são importantes, até porque eles poderiam servir como porta-vozes da narrativa do Kremlin em seus respectivos continentes", diz Cristian Nitoiu.

"É uma forma de reunir legitimidade."

 

Fonte: BBC News Brasil

 

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