Mulheres negras são
mais expostas ao racismo ambiental, diz quilombola
As
mulheres quilombolas são mais vulnerabilizadas aos efeitos das mudanças
climáticas e da falta de políticas públicas. A opinião é da
secretária-executiva da Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades
Negras Rurais Quilombolas (Conaq), Selma Dealdina.
A
indiferença com as comunidades tradicionais pode ser chamada de “racismo
ambiental”, segundo explica. Ela vai tratar do tema no Festival Latinidades,
nesta sexta (7), às 10h, no auditório 2 do Museu da República, em Brasília. O
evento contou com o apoio da Empresa
Brasil de Comunicação – EBC.
“Os
homens saem para as grandes cidades para trabalhar, enquanto que as mulheres
ficam para cuidar da roça. São mais vulneráveis aos efeitos das mudanças de
clima. Ainda são invisibilizadas no papel de quem deve cuidar da família e do
campo”, afirma. Ela avalia que o Latinidades é uma realização que garante
discussão de visibilidade das demandas das mulheres negras. “É um debate
importante do clima ao racismo ambiental”, opina.
A
coordenadora de Justiça Racial e de Gênero na Oxfam Brasil, Tauá Pires, que
também estará presente no Latinidades, entende que a responsabilidade das
mulheres nas comunidades tradicionais excede o campo do trabalho.
Ela
destaca que as mulheres têm uma liderança fundamental. Não somente na questão
do trato da terra, mas na dinâmica social, já que uma comunidade quilombola se
organiza de uma forma diferente do que ocorre em centros urbanos. Na lógica
comunitária, a terra não pertence a uma pessoa, mas às famílias.
Para
a pesquisadora, o que está em jogo não é só o desmatamento ou a derrubada da
floresta. “Mas é também como os recursos naturais são preservados e
utilizados para o bem social”, observa.
Nesse
sentido, o racismo ambiental é um fato. “Quando a gente observa as pessoas que
moram nesses territórios, são em sua maioria não brancas. A gente está falando
de comunidades tradicionais com maioria negra e mais atingidas pelas
emergências, como enchentes e secas”, enfatiza.
·
Responsabilidade
Ela
identifica que são as mulheres que assumem maior responsabilidade comunitária e
familiar porque cuidam, por exemplo, dos mais velhos e das crianças. “Então o
racismo acaba atingindo de maneira diferente as mulheres”, opina.
Nesse
sentido, Selma Dealdina salienta que as comunidades quilombolas buscam – a
partir do exemplo das pessoas mais velhas – explicar diariamente a necessidade
da preservação da natureza. “A gente tem que tentar sobreviver e enfrentar a
invasão do agrotóxico, do desmatamento, das queimadas…”.
Afinal,
as comunidades que vivem da agricultura familiar devem assimilar o cuidado como
prática viva. Segundo o último censo do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia
e Estatística), há 6,5 mil comunidades quilombolas em 24 estados do país.
É
possível, segundo Selma, constatar o racismo ambiental nas demonstrações
de injustiças nas proximidades de comunidades dos quilombolas.
“Por
que alguém coloca um aterro sanitário no território quilombola? Ou uma linha de
energia elétrica sem beneficiar a comunidade? Ninguém coloca um gasoduto
cortando a fazenda de um grande fazendeiro ou em um latifúndio brasileiro. Isso
é racismo”, exemplifica.
·
Resistência ambiental
Os
grupos quilombolas, diz Selma, são espaços de resistência. “Na minha comunidade
(na cidade de São Mateus, no Espírito Santo), o rio secou. Minha família não
parou de plantar e a água voltou a aparecer”. Foi plantando a bananeira às
margens do Rio Angelim e o rio reapareceu.
“Hoje,
as pessoas podem pescar e as crianças podem tomar banho”, comemora Selma. Ela
contextualiza que as mudanças climáticas afastaram os mais jovens do trabalho
no campo, inclusive com o avanço das plantações de eucalipto nas cercanias de
comunidades quilombolas.
“Entendo
que a gente precisa discutir como incentivar os jovens a ficar na roça e com
possibilidade de geração de emprego e renda. Esse é o nosso grande desafio”,
opina. Ela testemunha que houve, no campo, uma mudança de comportamento das
chuvas.
Para
a coordenadora da Oxfam Brasil, Tauá Pires, as comunidades quilombolas oferecem
exemplos de práticas ambientais. A pesquisadora diz que a resistência passa
pela influência da mulher. “Os povos e comunidades tradicionais, na
verdade, fazem um trabalho de preservação não só da floresta, mas da própria
vida. Estão ajudando para que a situação não fique pior”, finaliza.
Ø
Ato
reúne movimentos, artistas e lideranças em apoio ao MST e a deputadas ameaçadas
de cassação
Um
ato público neste sábado (8) vai reunir artistas, lideranças políticas e
representantes de movimentos populares em defesa do Movimento dos Trabalhadores
Rurais Sem Terra (MST) e das seis deputadas de esquerda que estão sendo
perseguidas na Câmara dos Deputados e estão sob ameaça de cassação de mandato.
A mobilização acontece no Galpão da Alameda Eduardo Prado, em frente à loja do
Armazém do Campo em São Paulo (SP).
Entre
as presenças confirmadas estão o padre Júlio Lancelotti, que atua em defesa da
população de rua na capital paulsita; da ativista indígena Txai Suruí e do
jornalista José Trajano. Parlamentares, ativistas, artistas e influenciadores
também vão comparecer.
Batizado
de “Lutar não é crime”, o encontro foi convocado por iniciativa da deputada federal
Sâmia Bomfim (PSOL-SP). Integrante da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI)
que investiga o MST, ela tem feito frente às investidas do bolsonarismo contra
o Movimento e, também por isso, é uma das deputadas sob ameaça de cassação.
Formalmente,
a acusação contra ela feita pelo PL, partido de Jair Bolsonaro, teve como base
discursos com críticas aos colegas durante a votação do PL 490, que trata sobre
marco temporal para demarcação de terras indígenas. Além de Sâmia, Célia
Xakriabá (PSOL-MG), Érika Kokay (PT-DF), Fernanda Melchionna (PSOL-RS), Juliana
Cardoso (PT-SP) e Talíria Petrone (PSOL-RJ) estão sendo perseguidas.
O
requerimento inicial contra as seis parlamentares foi acatado pelo presidente
da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), apesar de o regimento interno da Câmara
determinar que ações no Conselho de Ética devem ser individuais. Assim, o
presidente do PL, Valdemar da Costa Neto, retirou o pedido coletivo e
protocolou nova ação contra cada deputada.
“Com
celeridade recorde, cerca de quatro horas após o recebimento das ações pela
Mesa Diretora da Casa, Lira novamente deu aval para que o processo fosse
instaurado no mesmo dia. Não há precedentes na história do Parlamento
brasileiro para um fato misógino como esse”, destaca nota que convoca para o
ato deste sábado.
O
evento começa às 12h, com almoço oferecido a preços populares. As refeições
serão preparadas com ingredientes orgânicos, todos cultivados, colhidos e
preparados pelo MST. Além disso, será montada uma pequena feira de produtos
artesanais produzidos por mulheres.
Ø
Grupo
Mulheres do Brasil propõe ações contra desigualdade de gênero
Saúde,
bem-estar, carreira e empreendedorismo constituem temas que serão debatidos
neste sábado (8), a partir das 9h30, durante o Café das Pretas, dentro das
ações do Julho das Pretas do Grupo Mulheres do Brasil – Comitê de Igualdade
Racial, núcleo Rio de Janeiro. O evento ocorrerá na Faculdade Senac, localizada
na Rua Santa Luzia, 735, centro da capital do estado. Os ingressos têm preço
popular de R$ 15 e podem ser adquiridos no site. O Grupo Mulheres do Brasil é
liderado pela empresária Luiza Helena Trajano. Criado em 2013, tem mais de 115
mil participantes no Brasil e no exterior e atua em parceria com diferentes
esferas de poder para fomentar a adoção de políticas afirmativas e eliminar as
desigualdades de gênero, raça e condição social.
O
Café das Pretas será aberto com debate sobre Saúde e Bem-Estar. As convidadas
são Juliana Peres, médica e empresária, sócia fundadora da Ayo Saúde, clinica
médico-odontológica formada inteiramente por profissionais pretos. “Na Ayo,
acreditamos muito numa medicina e odontologia humanizadas, no tempo de escuta,
entendendo que cada paciente carrega consigo uma história”, salientou Juliana
Peres. Participarão também Marcelle Sampaio e Micheline Torres, criadoras do
Método Autoliderança Plena. Através do canal Quero Vida Plena, Marcelle e
Micheline propõem um amplo olhar sobre o autoconhecimento e afirmam que é
possível viver a vida de forma plena, integrando mente, emoção, vibração e espiritualidade
livre.
·
Empreender
A
especialista em ESG (governança ambiental, social e corporativa) Juliana Kaiser
(foto), professora da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e do curso
sobre Diversidade da Escola de Negócios da Pontifícia Universidade Católica do
Rio de Janeiro (IAG PUC-Rio), será a palestrante do painel Carreira e
Empreendedorismo. Ela afirma que mulheres negras no Brasil buscam o
empreendedorismo por falta de emprego formal. Juliana falará sobre o tema junto
com Tais Batista, fundadora da marca Preta Porter Cosméticos, e Shaienne
Aguiar, consultora em Narrativa de Marca e Cultura e fundadora.
Em
entrevista à Agência Brasil, Juliana explicou que, em geral, mulheres negras,
mesmo letradas, ou seja, com curso superior, tentam entrar no mercado de
trabalho e, muitas vezes, não são aprovadas no processo seletivo. Segundo o RH
(área de recursos humanos) das empresas, faltam a essas mulheres algumas
competências. O que ocorre é que, em geral, o RH não explica que competências
são essas.
“Como
elas não conseguem entrar no mercado de trabalho ou, quando entram, estacionam
em posições de analista e não conseguem subir a coordenadoras, gerentes e
diretoras, elas acabam por empreender. Estou falando de mulheres que fizeram
universidade”, destacou Juliana. Explicou que as mulheres negras que não
fizeram curso superior e são mais empobrecidas acabam fazendo o que, no Rio de
Janeiro, é chamado de corre. Ou seja, fazem empreendedorismo sem plano de
negócios, sem conhecer de finanças. “Muitas das vezes, são empreendedoras
informais ou microempreendedoras individuais (MEIs). Mas não fazem isso por
desejo. Não sonharam ser empreendedoras”.
A
professora da UFRJ e da PUC Rio explicou que essas mulheres não vão ter um
investidor anjo para aplicar recursos nos seus negócios, nem vão conseguir
empréstimos em bancos. Segundo Juliana, um dos grandes problemas do
empreendedorismo negro no Brasil é que os bancos vetam, na grande maioria das
vezes, acesso a crédito. Por isso, sinalizou que as mulheres negras no Brasil
empreendem por uma força das circunstâncias que se denomina racismo estrutural.
·
Dicas
Para
as mulheres letradas que estão no mercado de trabalho, não conseguem ascender e
acabam optando por empreender, Juliana disse que a maior dica é que façam curso
de capacitação em instituições que apoiam empreendedores, para que desenvolvam
um planejamento estratégico, um plano de negócios, a fim de terem acesso a
conhecimento relacionado a finanças, por exemplo, porque esses são os maiores
entraves. “Para mulheres letradas, esse é o melhor caminho para que consigam
ter negócios que são perenes, sustentáveis, já que são mulheres que acabam
empreendendo com recursos próprios. Elas dependem que esse negócio gire rápido,
porque não há um capital de giro”.
De
outro lado, para mulheres não letradas, que necessitam empreender, que
cozinham, costuram ou têm pequenos negócios, Juliana lembrou que existem várias
organizações do Terceiro Setor que apoiam,“mesmo que elas não tenham
conhecimento técnico, e tenham mais dificuldade com a língua portuguesa, para
que consigam minimamente se organizar, fazer estoque, precificar produtos,
entre outras coisas.
Estudo
feito pelo Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae)
com base em dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua do
Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), referente ao segundo
trimestre de 2022, mulheres negras empreendedoras são donas de negócios de
menor porte e atuam, em sua maioria, sem apoio de funcionários. Apenas 8%
dessas empresárias contratam empregados mas, quando se trata de empreendedores
negros, o índice sobe para 11%. Já entre mulheres brancas donas de negócio, 17%
fazem contratações de funcionários e, entre empresários brancos, o percentual é
de 20%.
·
Fundo Agbara
Juliana
Kaizer abordará também o mercado de trabalho, no dia 12 deste mês, às 18h45,
durante evento online pelo Julho das Pretas, organizado pelo Fundo Agbara, cujo
tema é Mulheres Negras em Marcha por Reparação e Bem Viver. Junto com a
psicóloga e pesquisadora Winnie Santos, do Centro de Estudos das Relações de
Trabalho e Desigualdades (Ceert), Juliana indicará como ampliar caminhos,
soluções e visibilizar mulheres negras. No debate, os atuais desafios,
barreiras e possíveis caminhos de solução e construção de oportunidades para as
mulheres negras.
Fonte:
Agência Brasil/Brasil de Fato
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