Após início falho
no Congresso, governo Lula termina semestre com saldo positivo
Após
mais de sete meses desde que assumiu o Palácio do Planalto, Luiz Inácio Lula da
Silva (PT) conseguiu emplacar uma vitória econômica histórica no Congresso
Nacional na última semana, com a reforma tributária aprovada na Câmara dos
Deputados.
Depois
de cerca de 15 horas de sessão, a matéria da PEC 45/2019 passou em dois turnos
com aprovação folgada: foram 382 votos favoráveis e 118 votos contrários no
primeiro turno. No segundo, foram 375 a favor e 113 contra.
A
aprovação da matéria, que começou a ser apreciada ainda na quinta (6/7) e
atravessou manhã, tarde, noite e o início da madrugada de sexta (7/7), é um
pontapé na mudança de arrecadação tributária adotada na década de 1960 no país.
A
pauta era uma das prioridades do governo Lula e mostrou saldo positivo após
meses de articulação política falha dentro do Congresso Nacional,
principalmente na Câmara dos Deputados.
Moeda
de troca
Até
meados de abril, o governo não contava com uma base alinhada no Congresso. Os
governistas reclamavam da falta de organização para negociações políticas
governamentais dentro do Parlamento e aprovação das matérias.
Além
disso, siglas de centro demonstravam insatisfação com o atraso na distribuição
de emendas e nomeações para cargos na Esplanada dos Ministérios. Por essa
razão, a garantia de que as pautas econômicas seriam aprovadas ficou instável.
Para
garantir saldo positivo, Lula precisou entregar o comando do Ministério do
Turismo para o União Brasil. A expectativa é que, na próxima semana, a então
ministra Daniela Carneiro seja substituída pelo deputado Celso Sabino
(União-PA).
Além
disso, somente entre quarta (5/7) e quinta-feira (6), dias que antecederam a
aprovação da reforma tributária na Câmara, Lula autorizou o empenho de R$ 7,5
bilhões em emendas parlamentares. O esforço teve resultado positivo com a
aprovação da reforma e de outra matéria econômica: o projeto de lei (PL) que
retoma o voto de qualidade do governo no Conselho Administrativo de Recursos
Federais (Carf) — tribunal administrativo que julga causas tributárias.
• Fator Lira
A
reforma tributária enfrentou grande resistência, mas, sob a articulação do
presidente da Casa Baixa, Arthur Lira (PP-AL), conseguiu ser emplacada na
Câmara dos Deputados. O texto agora vai ao Senado.
A
alteração no modelo tributário é discutida há cerca de 20 anos no Legislativo.
Em busca de agenda positiva também para si, Lira montou uma “supersemana” na
pauta da Casa para aprovar a matéria relatada pelo deputado Aguinaldo Ribeiro
(PP-PB).
Apesar
da sinalização clara do governo, em especial do ministro Fernando Haddad, da
Fazenda, a favor da reforma tributária, Lira e os parlamentares que defendiam a
proposta investiram no discurso de que a pauta interessa ao país, e não a
partidos políticos.
Tanto
o presidente da Casa quanto o relator tentaram frisar que o tema não se tratava
de uma briga entre Lula e o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL). Ambos buscaram
minimizar a politização em torno da proposta.
Para
viabilizar a aprovação do texto da reforma tributária, o presidente da Câmara
fez uma série de negociações com objetivo de destravar a matéria. Em movimento
simbólico, na noite de quinta, Lira foi à tribuna para um manifesto favorável à
proposta.
“Estamos
vivendo um momento histórico para o país e para as nossas vidas parlamentares.
O país olha para este plenário esperando uma resposta nossa para a aprovação de
uma reforma tributária justa, neutra, que dê segurança jurídica e promova o
desenvolvimento econômico e social. Não podemos nos furtar a essa
responsabilidade”, disse.
O
governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), também se
posicionou favoravelmente ao texto e quebrou resistência de outros
governadores, além de os galvanizar pela aprovação da matéria.
Tarcísio,
inclusive, por causa da pauta, entrou em rota de colisão direta com o
ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), de quem foi ministro e que o apoiou na
candidatura ao Governo de São Paulo. Em reunião com parlamentares do PL para
falar a respeito da pauta, na quinta, Bolsonaro foi ríspido com Tarcísio várias
vezes. O ex-presidente ficou contra a reforma, mas alguns deputados de seu
próprio partido chancelaram a aprovação.
A
reforma
A
reforma tributária aprovada prevê a criação de um único imposto sobre consumo:
o Imposto de Valor Agregado (IVA) dual, com duas frentes de cobrança, para
substituir cinco tributos.
Neste
caso, os modelos atuais dos tributos federais (IPI e PIS/Cofins) seriam
substituídos por uma frente chamada Contribuição Sobre Bens e Serviços (CBS).
Já os impostos estadual (ICMS) e municipal (ISS) seriam substituídos pelo
Imposto Sobre Bens e Serviços (IBS).
• Carf na mira
O
projeto de lei do Carf foi encaminhado pelo governo ao Congresso em maio, em
meio a um acordo para que a medida provisória sobre o assunto perdesse validade
e o tema fosse tratado por um PL. A matéria foi colocada em pauta na última
segunda-feira (3/7) e votada apenas na sexta, após negociações intensas entre o
presidente da Câmara, líderes governistas e demais parlamentares.
O
ministro da Fazenda também participou das conversas em torno da proposta na
sexta (7/7). O texto teve relatoria do deputado Beto Pereira (PSDB-MS), que
apresentou parecer sobre o projeto na segunda.
O
governo contava com o texto do Carf, que restabelecerá o voto de qualidade em
favor da União em caso de empate no julgamento de litígios tributários, para
aumentar a arrecadação e, com isso, ajudar a viabilizar a meta de resultado
primário igual a zero no próximo ano. O Executivo prevê o aumento da
arrecadação em até R$ 50 bilhões com o retorno do voto de qualidade.
Criado
em 2009, o Carf é um órgão colegiado formado por representantes do Estado e da
sociedade civil e tem a atribuição de julgar, em segunda instância
administrativa, processos de caráter tributário e aduaneiro. O órgão é
paritário: tem representantes da Fazenda Nacional e dos contribuintes, o que
cria a possibilidade de empate nas decisões.
Na
prática, a retomada do voto de qualidade permite que os conselheiros
representantes da Fazenda Nacional, que presidem as turmas e câmaras do Carf,
possam desempatar as votações a favor da União em litígios tributários. Desde
2020, sob o governo de Jair Bolsonaro (PL), a legislação estabelecia que, em
caso de empate, os contribuintes fossem beneficiados.
Senado
Agora,
os temas vão ao Senado Federal. A tendência é que sejam apreciados no segundo
semestre, pois o Congresso entrará em recesso.
Ainda
que o governo tenha encontrado menos resistência na Casa Alta até o momento, a
aprovação das pautas vai depender de novas negociações.
As
articulações passarão, inclusive, pelas indicações dos responsáveis pelas
relatorias de reforma tributária e Carf.
Em
caso de mudanças, os projetos retornam para a Câmara dos Deputados para serem
votados novamente.
Governo Lula deixa parados R$ 350 milhões
para Funai, Ibama e outros órgãos
O
governo Lula ainda não conseguiu executar um crédito extraordinário de R$ 640
milhões aberto por uma medida provisória em abril. A MP vence em 30 de julho,
mas o dinheiro está parado em vários órgãos. Até agora, R$ 286 milhões foram
empenhados. Ou seja, cerca de R$ 350 milhões se encontram parados.
Na
Fundação Nacional do Índio (Funai), por exemplo, foi aberto um crédito de R$
146,7 milhões, mas apenas R$ 13 milhões foram empenhados (autorizados para
pagamento) até o dia 4 de julho, ou seja, 9% do total.
A
verba deve ser usada na ação de “regularização, demarcação e fiscalização de
terras indígenas e proteção dos povos indígenas isolados”.
A
situação é semelhante no Ibama, que conseguiu usar R$ 10 milhões dos R$ 63,8
milhões liberados pela MP (16%), verba para fiscalização ambiental. No
instituto, houve reunião na última sexta-feira (7/7) para deliberar sobre como
será usado o crédito da MP.
No
Ministério do Desenvolvimento e Assistência Social, foram empenhados só R$ 37
milhões (26% do disponível) para distribuição de alimentos, e na Polícia
Federal, R$ 42,8 milhões (47%) para combate ao tráfico de drogas.
No
total, foram empenhados R$ 286 milhões da MP.
Procurada,
a Funai respondeu que processos administrativos de licitação e contratação de
serviços demandam tempo e todas as etapas estão sendo cumpridas. “A (Funai) tem
se empenhado na execução do crédito extraordinário recebido, seguindo as
diretrizes e ações estabelecidas. Essas medidas incluem processos de consulta,
desintrusão e restabelecimento da posse plena e do usufruto exclusivo das
terras indígenas”, disse o órgão.
“Na
Terra Indígena Yanomami, por exemplo, estão em andamento reformas de pistas de
pouso que visam melhorar o apoio às comunidades indígenas da região, tanto em
relação ao acesso à saúde e outros direitos sociais, quanto no âmbito da
proteção do território”, afirmou a Funai.
O
Ministério do Desenvolvimento e Assistência Social pontuou que “as ações
governamentais demandam uma série de procedimentos administrativos, que
asseguram o estrito cumprimento das leis e a lisura das políticas públicas” e
disse que a Conab, companhia de abastecimento, está preparando leilões de
compra de alimentos.
Líder do União Brasil não foi consultado
sobre “rebelião” de deputados
A
guerra de notas oficiais que tomou conta de Brasília na noite de ontem (06/07)
se desenrolou sem o conhecimento do líder do União Brasil na Câmara, Elmar
Nascimento (União Brasil-BA). Cerca de 40 deputados da sigla assinaram uma
carta pedindo o adiamento da votação da reforma tributária, entre eles o
presidente do União Brasil, Luciano Bivar, e o futuro ministro do Turismo,
Celso Sabino.
A
nota foi uma forma de pressão contra o presidente Lula (PT), que havia adiado a
demissão da ministra Daniela Carneiro como garantia da votação da Proposta de
Emenda à Constituição. O cargo não seria entregue até que o Centrão se
comprometesse a votar a favor do texto.
Coube
a Paulo Pimenta, ministro da Secretaria de Comunicação Social, dizer que
Daniela do Waguinho ficaria no cargo por pelo menos mais uma semana. “Vamos
concluir esse debate das questões que estão no Congresso […] e retomar essa
discussão sobre composição e eventuais mudanças no governo na semana que vem”,
disse o ministro.
O
tiro saiu pela culatra. O diretório nacional do União Brasil decidiu colocar
uma pressão no Planalto. Em movimento organizado por Bivar e Sabino, o grupo de
38 deputados fez uma reunião às pressas na Câmara e soltou uma nota pedindo
“mais tempo para estudar” o texto da reforma tributária. Tudo isso sem
consultar o líder do partido na Casa, Elmar Nascimento. Ele não estava na
reunião.
Nem
30 minutos mais tarde, o ministro das Relações Institucionais, Alexandre Padilha,
divulgou nota agradecendo os trabalhos de Daniela Carneiro e confirmando a
troca por Celso Sabino. “O presidente Lula e eu nos reuniremos com o presidente
e os líderes do União Brasil para receber a indicação de Celso Sabino, que vai
liderar a pasta do Turismo […]”, lê-se.
No
final das contas, a maioria do União Brasil votou favoravelmente à reforma.
Foram 48 votos favoráveis, e 11 contrários –esses 11 assinaram a nota.
• Com posse de Sabino, União Brasil quer
turbinar orçamento do Turismo
A
bancada do União Brasil no Congresso Nacional já se movimenta para que Celso
Sabino (PA), deputado do partido e futuro ministro do Turismo, receba o
ministério com o orçamento turbinado.
Nos
bastidores, parlamentares do União articulam para que a Lei de Diretrizes Orçamentárias
(LDO) de 2024 aumente consideravelmente o orçamento da pasta que será comandada
por Sabino.
A
ideia, explicam, seria triplicar o orçamento do Ministério do Turismo no
próximo ano para cerca de R$ 2,5 bilhões. Em 2023, as áreas de Turismo e Cultura
têm orçamento previsto de R$ 692 milhões.
Com
o orçamento turbinado, o União Brasil espera que Sabino assuma uma pasta mais
“encorpada”, podendo, assim, atender aos pedidos da bancada do partido no
Congresso, que tem 59 deputados e oito senadores.
O
União, vale lembrar, está à frente da relatoria da LDO de 2024, por meio do
deputado federal Danilo Forte (CE). Procurado via assessoria de imprensa, ele
não quis comentar o assunto.
Temor
no Planalto
Lideranças
de governo dizem que o Planalto já se prepara para enfrentar uma “guerra
orçamentária” com o Congresso Nacional no segundo semestre.
O
principal motivo seria a ambição de caciques partidários para aumentar a
impositividade do orçamento. Ou seja, a obrigação do governo federal empenhar e
executar as decisões do Congresso.
Fonte:
Metrópoles
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