quarta-feira, 26 de julho de 2023

QUEM MANDOU MATAR MARIELLE? Braga Netto levou Exército à cena do crime e tem perguntas a responder

Em meio às novas revelações sobre o assassinato da vereadora Marielle Franco e do motorista Anderson Gomes cinco anos depois do crime, uma figura crucial, que ganhou notoriedade na mesma época, permanece calada, apesar de ter muitas perguntas a responder.

General da Reserva do Exército desde 29 de fevereiro de 2020, quando entrou definitivamente para a política partidária, e candidato a vice na chapa de Jair Bolsonaro (PL) em 2022, depois de comandar os ministério da Casa civil e da Defesa, Walter Souza Braga Netto foi nomeado interventor na segurança pública do estado do Rio de Janeiro pelo golpista Michel Temer (MDB) no dia 16 de fevereiro de 2018.

Menos de um mês depois, em 14 de março do mesmo ano, o ex-sargento da PM Ronnie Lessa efetuou os 13 disparos com a metralhadora MP5, furtada de um batalhão do Bope, as forças especial da Polícia Militar fluminense, durante um incêndio, segundo o também ex-PM e comparsa no crime, Élcio Queiroz. Antes disso, Lessa já planejava assassinar Marielle e não foi, nem um pouco, intimado pela presença de fardados na capital fluminense.

Na data do assassinato, Braga Netto exercia "o controle operacional de todos os órgãos estaduais de segurança pública previstos no Art. 144 da Constituição e no Título V da Constituição do Estado do Rio de Janeiro”, incluindo as polícias civis e militares, que já se encontravam sob seu comando.

Durante os 10 meses e meio em que permaneceu à frente da intervenção, Braga Netto se esquivou de quaisquer responsabilidade sobre a investigação.

Ao mesmo tempo, sua gestão praticamente ignorou a atuação das milícias, organizações paramilitares formadas principalmente por PMs da ativa e da reserva, e que estão ligadas diretamente à ascensão de Bolsonaro na política - em 2018, o ex-presidente obteve 75% dos votos da Baixada Fluminense, área de maior atuação dos milicianos.

Durante a intervenção de Braga Netto, as milícias passaram incólumes e seguiram aumentando sua área de influência, como já havia sido detectado pelo Ministério Público do Rio de Janeiro, que monitorou um crescimento exponencial das milícias ao mesmo tempo em que seu braço político, capitaneado pelo clã Bolsonaro, ganhava expressividade promovendo politicalha.

Em entrevista à Reuters em junho de 2018, Braga Netto adiantou que a investigação sobre o assassinato de Marielle não teria prazo para acabar. “Mesmo que eu tenho suspeito é preciso ter provas, bem firmadas, porque senão podemos acusar alguém e a pessoa ser solta. Trabalhamos na obtenção de provas concretas, mas não temos prazo", disse na ocasião.

Na mesma entrevista, desdenhou da "simpatia" das Forças Armadas pela candidatura de Bolsonaro, já em curso.

“Bolsonaro para mim é um candidato como outro qualquer. Merece meu respeito como os outros candidatos. Caxias disse o seguinte: minha espada não tem partido. Nossa espada não tem partido”, disse, referindo-se ao patrono do Exército, Duque de Caxias.

•        Da espada ao partido de Bolsonaro

Mesmo com várias suspeitas de envolvimento do clã Bolsonaro com o crime - entre elas um bate-boca de Carlos Bolsonaro com um assessor de Marielle -, Braga Netto deixou a intervenção no Rio em janeiro de 2019 e foi alçado diretamente para o comando do Estado-Maior do Exército pelo "capitão" que chegara à Presidência.

Um ano depois, entrou para a reserva para assumir a Casa Civil de Bolsonaro, fazendo "carreira" na Defesa até escantear o colega, General Hamilton Mourão, e ganhar o posto de candidato a vice na chapa de Bolsonaro em 2022, já devidamente nos quadros do PL, partido do qual é hoje Secretário Nacional de Relações Institucionais.

A espada foi definitivamente deixada de lado por Braga Netto ao se entrincheirar na tentativa de golpe de Bolsonaro após a derrota nas eleições presidenciais de 2022.

No entanto, o passado obscuro de interventor, quando ainda ostentava a farda, ainda paira sobre Braga Netto. Ele não mais tocou no assunto sobre o assassinato de Marielle, que teve as investigações obstruídas por Bolsonaro.

•        Exército na cena do crime

No comando da intervenção na segurança pública fluminense, Braga Netto poderia solicitar a qualquer momento informações sobre as investigações em curso - assim como quando esteve à frente da Casa Civil e do Ministério da Defesa.

Mas, um pacto de silêncio é mantido por ele e por militares que estiveram a seu lado durante a intervenção. E que foram agraciados com cargos nos últimos anos, quando o fascismo miliciano tomou o poder de assalto no país.

Ao custo de R$ 1,2 bilhão somente em recursos federais, a intervenção foi oficialmente encerrada em 31 de dezembro de 2018. Com resultado pífio, que resultou principalmente no fechamento das Unidades de Polícia Pacificadoras (UPPs) - projeto do governo Lula para aproximar a população de comunidades dos agentes de segurança -, a intervenção seguiu de forma extraoficial durante o governo Bolsonaro, ao custo de mais de R$ 1 milhão ao ano e servindo de cabide para ao menos 13 militares da ativa.

Já os generais que atuaram ao lado de Braga Netto no comando da intervenção ganharam cargos e status durante o aparelhamento militar patrocinado por Bolsonaro.

Sub-chefe da secretaria da intervenção, o general de Brigada Paulo Roberto Rodrigues Pimentel, assumiu o comando da Academia Militar das Agulha Negras, a Aman, em 12 de abril de 2022.

A Aman, ondo o ex-presidente estudou entre 1974 e 1977, é considerada o berço do bolsonarismo e um dos principais polos políticos de influência de militares ligados a Bolsonaro.

Chefe da Secretaria de Administração e Finanças da intervenção, o general de divisão Laélio Soares de Andrade ocupa atualmente a chefia de gabinete da Presidência do Tribunal de Contas do Estado do Rio de Janeiro (TCE-RJ).

Laélio Soares de Andrade foi o responsável, entre outros, por um contrato suspeito de compras de armas Glock no valor de R$ 46 milhões durante a gestão das finanças da intervenção.

A empresa que vendeu as pistolas semiautomáticas ao gabinete comandado por Braga Netto, a Glock America, é representada no Brasil por Franco Giafonne, amigo de Eduardo Bolsonaro (PL-SP), filho de Jair e um dos principais lobistas da indústria de armamentos.

Outro fato curioso é que a Glock America não fabrica armas. A sede da empresa fica na Áustria. Durante o mandato do pai, Eduardo tentou, sem sucesso, fazer lobby para instalar uma fábrica da indústria austríaca em Goiás.

O silêncio de Braga Netto e de generais que atuaram na intervenção federal no Rio de Janeiro é ensurdecedor diante das novas informações sobre o crime brutal que virou símbolo da atuação da milícia e do fascismo no Brasil.

Vale lembrar que Marielle era relatora da comissão criada na Câmara Municipal do Rio para acompanhar eventuais abusos na recém formada intervenção federal na segurança pública. A mesma instalada menos de um mês antes de seu assassinato.

Nascida e criada na favela da Maré, na zona Norte do Rio, Marielle conhecia como poucos a atuação da milícia. E a cobertura dada a eles pelos agentes do Estado - sejam civis ou militares.

Braga Netto e os militares têm muitas perguntas a responder. A principal delas é: quem mandou matar Marielle Franco e por quê?

 

       Moro tenta se meter no caso Marielle, fala besteira e é detonado nas redes

 

O ex-ministro da Justiça Sergio Moro (União Brasil-PR) decidiu criticar as investigações da Polícia Federal que conseguiram obter a confissão e a delação de Élcio Queiroz como um dos participantes do assassinato da vereadora Marielle Franco, em 14 de março de 2018.

Através do seu Twitter, o senador prestes a perder seu mandato afirma que o governo vai "morder a língua" com as delações premiadas.

Moro acha que o governo é contra as delações premiadas e não contra o método de delação utilizado pela Operação Lava Jato, que foi acusada de ter um modus operandi de tortura contra os investigados e falsificação de testemunhas para consecução de objetivos políticos.

"Espero, aliás, que identifiquem o mandante e mordam a língua. Foram delatores que também revelaram a roubalheira na Petrobras durante os governos do PT", diz o ex-juiz, ecoando uma entrevista que deu à Folha de São Paulo.

O instrumento de delação não só não foi criticado pelo PT como foi criado pelo mesmo, quando a presidente Dilma Rousseff assinou a lei da delação premiada, em 2 de agosto de 2013.

O procedimento, se usado com parcimônia e dentro do devido processo legal, pode ajudar a polícia a encontrar os mandantes do assassinato de Marielle Franco, maior crime político dos últimos anos no Brasil.

Sérgio Moro foi o ministro da Justiça e comandante da Polícia Federal em 2019, durante o primeiro ano de governo Bolsonaro, e não deu celeridade às investigações.

Ele foi duramente criticado nas redes sociais, assim como o ex-deputado-federal Deltan Dallagnol, cassado e ficha-suja, que também criticou a prisão dos criminosos envolvidos na morte de Marielle Franco.

"Delação agora é prova? Até ontem, o PGR tava desdenunciando e o STF tava desrecebendo denúncias adoidado contra corruptos sob o fundamento de que apenas a delação não é suficiente. Alguma lei deve ter mudado… Ou o que mudou foi a capa dos autos?", ironizou o ex-procurador.

O deputado federal Rogério Correia (PT-MG) afirma que Moro está com medo: "Sobre o assassinato de Marielle, o que fez @SF_Moro, enquanto Ministro da Justiça, para elucidar o caso? Ameaçou punir o porteiro que informou sobre as ligações do assassino com o vizinho Bolsonaro. Por isto está preocupado agora, pode sobrar pra ele", disse.

 

       Repórter da Band para Bolsonaro antes de falar sobre Marielle: “o senhor está entre amigos”

 

Imagens da TV Bandeirantes que não foram ao ar – e conseguidas com exclusividade pelo DCM – mostram o jornalista Caiã Messina, da redação de Brasília, bajulando o então presidente Jair Bolsonaro (PL) poucos minutos antes de gravar uma entrevista exclusiva com ele em 30 de outubro de 2019.

Na conversa, o jornalista diz a Bolsonaro ele está “entre amigos”, e que tanto ele quanto o cinegrafista haviam votado no ex-presidente nas eleições de 2018.

A entrevista, que foi ao ar naquele mesmo dia, foi concedida por Bolsonaro durante viagem a Jerusalém. O ex-ajudante de ordens de Bolsonaro, Mauro Cid, que está preso pela PF, aparece o tempo todo.

“Quem liberou foi o “seu Jair”

A TV Globo havia acabado de veicular informações sobre as investigações a respeito do assassinato de Marielle Franco, ocorrido um ano antes. O Jornal Nacional mostrou o porteiro do condomínio Vivendas da Barra implicando Bolsonaro no caso.

No dia do crime, Élcio Queiroz, comparsa de Ronnie Lessa, que também morava no local, esteve no condomínio. Segundo o porteiro disse à Polícia Civil do Rio de Janeiro na época, Queiroz, na hora de se identificar na portaria, disse que iria para a casa 58, de Bolsonaro. O funcionário declarou em depoimento que quem liberou a entrada teria sido o “seu Jair”.

Bolsonaro passou a entrevista quase toda criticando a Globo e o então governador do Rio de Janeiro, Wilson Witzel (PMB).

Veja abaixo a transcrição do diálogo de Messina com Bolsonaro antes da entrevista:

Caiã Messina (Jornal da Band): Antes de começar eu quero dizer para o senhor o seguinte: o senhor está entre amigos. Eu tenho vergonha, como jornalista (do vazamento de trechos da investigação na TV Globo), eu e o D* (apontando para o cinegrafista) votamos no senhor. O pessoal conhece meu trabalho.

Caiã Messina fala da suposta elegância de Bolsonaro, arruma sua gravata, questiona se Bolsonaro havia conseguido “descansar um pouquinho” e, finalmente, dizendo:

Caiã Messina: Então, o senhor fica tranquilo. As perguntas que eu vou fazer é mais para que o senhor esclareça.

Jair Bolsonaro: Tá certo, eu tenho uma narrativa aqui. Posso Falar da rede Globo?

Caiã Messina: Pode falar o que o senhor quiser. A entrevista é do senhor.

 

       ONDE ESTÁ O PORTEIRO?

 

Alberto Jorge Ferreira Mateus era o porteiro do condomínio Vivendas da Barra, no Rio de Janeiro, no dia 14 de março de 2018. No local moravam o ex-presidente Jair Bolsonaro e o sargento da reserva da Polícia Militar, Ronnie Lessa.

Na data fatídica, dia em que a então vereadora Marielle Franco foi assassinada a tiros, o réu confesso Élcio Queiroz esteve no local para visitar Lessa que, segundo ele, foi o autor dos tiros que mataram Marielle. De acordo com depoimento de Élcio, em delação premiada, os dois saíram de lá e cometeram o crime.

O porteiro Alberto Jorge afirmou na época, em um primeiro depoimento, que quem autorizou a entrada de Élcio no local foi “seu Jair”, morador da casa 58, o endereço do então deputado federal Jair Bolsonaro.

Élcio teria dito na portaria que iria na casa de Bolsonaro, mas se dirigiu à casa de Lessa.

Naquele dia, Bolsonaro estava no Congresso em Brasília, segundo o registro da presença dos parlamentares.

•        Depoimento divulgado pelo JN

O depoimento do porteiro à Polícia Civil foi divulgado pelo Jornal Nacional, da TV Globo, no dia 29 de outubro de 2019. Um dia depois, o já devidamente nomeado ministro da Justiça e Segurança Pública, Sergio Moro, pediu à Procuradoria Geral da República e à Polícia Federal que investigassem o depoimento do porteiro.

A procuradora do Ministério Público Simone Sibilio, chefe do Grupo de Atuação Especial no Combate ao Crime Organizado (GAECO), afirmou no mesmo dia à revista Veja que o porteiro mentiu em seu depoimento.

Quem teria autorizado a entrada de Élcio Queiroz no condomínio do presidente, segundo ela, seria Ronnie Lessa.

De acordo com a Veja, o porteiro prestou dois depoimentos, nos dias 7 e 9 de outubro e 2019. No primeiro, teria dito que ligou para casa de Bolsonaro. No segundo, ao ser confrontado com registro em áudio da chamada feita no horário informado, manteve sua versão, mas os investigadores colocam em questão sua veracidade.

"O porteiro mentiu, e isso está provado por prova técnica", afirmou Simone Sibilio, segundo a revista.

Antes disso, em ofício, enviado ao procurador-geral da República, Augusto Aras, Moro diz que a presença de Bolsonaro em Brasília "sugere possível equívoco na investigação conduzida no Rio de Janeiro ou eventual tentativa de envolvimento indevido do nome do Presidente da República no crime em questão, o que pode configurar crimes de obstrução à Justiça, falso testemunho ou denunciação caluniosa, neste último caso tendo por vítima o Presidente da República, o que determina a competência da Justiça Federal e, por conseguinte, da Polícia Federal e do Ministério Público Federal".

"Para que os fatos sejam devida e inteiramente esclarecidos, por investigação isenta, venho através desta solicitar respeitosamente a V.Ex.ª que requisite a instauração de inquérito para apuração, em conjunto, pelo Ministério Público Federal e Polícia Federal, perante a Justiça Federal, de todo o ocorrido e de todas as suas circunstâncias", diz Moro no ofício.

Em seu ofício, no entanto, Moro se esqueceu de destacar que a tecnologia permite que a autorização por interfone seja feita de qualquer lugar do planeta, desde que ele esteja conectado a um telefone celular.

À Folha de S. Paulo, o procurador-geral da República Augusto Aras afirmou que o episódio é um "factoide" e que remeterá ao Ministério Público Federal pedido feito por Moro para que se investiguem as circunstâncias do depoimento do porteiro do condomínio.

•        A gravação da portaria

Uma gravação do interfone da portaria aponta que foi Lessa quem autorizou a entrada do ex-PM, afirma perícia do Ministério Público do Rio de Janeiro.

Essa análise foi usada pela Promotoria para contradizer o depoimento do porteiro.

O jornal Folha de S.Paulo revelou, contudo, que a perícia do Ministério Público não avaliou a possibilidade de algum arquivo ter sido apagado ou renomeado antes de ser entregue às autoridades. Ela tinha como único objetivo instruir a ação penal contra os acusados de matar Marielle e Anderson, provando o encontro dos dois réus.

•        A misteriosa mudança de depoimento

Em um depoimento no mês seguinte, em 19 de novembro de 2019, o porteiro afirmou que anotou errado no caderno de registros o número da casa para a qual o visitante disse que iria. Em vez de escrever casa 66, anotou “58”. De acordo com o colunista de “O Globo”, Lauro Jardim, ele disse à Polícia Federal, corrigindo dois depoimentos dados anteriormente à Polícia Civil, que se sentiu pressionado por ele próprio pelo “erro” e resolveu inventar a versão sobre a conversa com o “seu Jair”.

Os investigadores, porém, ainda têm dúvidas de por que ele apresentou versões diferentes nos depoimentos e se teria sido pressionado – e por quem – a mentir.

 

Fonte: Fórum

 

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