Racha do Centrão é presente para Lula
Após
uma reorganização das alianças entre as bancadas da Câmara que dividiu o
Centrão, integrantes da articulação política do governo enxergam uma
oportunidade para tirar poder do presidente da Casa, Arthur Lira (PP-AL), e
atrair o Republicanos para a órbita do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. O
Palácio do Planalto ainda não conseguiu formar uma base consistente no
Congresso para aprovar propostas importantes.
Os
partidos que apoiaram a reeleição de Lira resolveram seguir caminhos separados.
PSD, Republicanos, MDB e Podemos se uniram em um bloco partidário que soma 142
deputados, o maior da Casa. Dessas siglas, apenas o Republicanos está afastado
governo. Ligada à Igreja Universal, a legenda formava o tripé do Centrão, ao
lado de PP e PL, base de sustentação da gestão do ex-presidente Jair Bolsonaro.
O
PP, partido de Lira, não está no novo bloco. Para não ficar isolado, o
presidente da Câmara procurou o União Brasil, PSDB, Cidadania, PSB e PDT para
formar um outro grupo, que teria 164 parlamentares, para fazer frente à aliança
parlamentar recém-formada. O acordo, contudo, ainda não foi firmado. Se isso
ocorrer, o PL, legenda de Bolsonaro e até aqui fiel a Lira, ficará escanteado.
Mesmo
que Lira consiga sacramentar a aliança que pretende, ele terá menos sustentação
e, consequentemente, poder de barganha nas negociações com o Executivo. Além do
rearranjo de forças na Câmara, o Planalto avalia que outros elementos
enfraqueceram o presidente da Casa. O principal deles foi o fim do orçamento
secreto, que deixou o deputado “desmonetizado”, nas palavras de um personagem
da Esplanada. O instrumento permitia a parlamentares destinar verbas da União a
seus redutos eleitorais sem serem identificados. Lira tinha voz ativa na
distribuição desses recursos entre seus pares.
O
cacique do PP também não tem conseguido vencer a batalha que trava com o
presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), em torno do rito das medidas
provisórias. Lira trabalha para ampliar o peso da Câmara na apreciação desse
tipo de projeto. Já Pacheco quer manter o formato atual de tramitação, em que as
MPs começam a ser analisadas por comissões mistas formadas pelo mesmo número de
deputados e senadores. Lira alega que, como no Congresso há 513 deputados e 81
senadores, sua Casa deveria ter mais representantes do que a outra nos
colegiados.
Nesse
cenário, o Planalto acredita que há mais espaço para estreitar o diálogo com o
Republicanos, oferecendo, inclusive, espaços no governo. O partido, que agora
caminhará junto na Câmara com legendas que já aderiram à gestão Lula, abriga
quadros importantes ligados à esquerda, como o deputado federal Silvio Costa
Filho (PE). Os petistas acreditam que o presidente do PSD, Gilberto Kassab,
pode desempenhar papel determinante nessa articulação.
Lula
e seus ministros estão convictos, porém, que uma eventual aproximação efetiva
levará tempo. O Republicanos tem algumas das principais lideranças
conservadoras do país, como os senadores Hamilton Mourão, ex-vice-presidente, e
Damares Alves, ex-ministra de Bolsonaro, além do governador de São Paulo,
Tarcísio de Freitas. Os dois primeiros, certamente, resistiriam à adesão ao
governo.
Sobre
a relação com Lira, a avaliação é que não haverá um enfrentamento aberto do
Executivo contra o presidente da Câmara. A estratégia é continuar atuando para
enfraquecê-lo aos poucos. Integrantes da articulação política avaliam que o
deputado “já não é um primeiro-ministro”, como era visto no governo Jair
Bolsonaro. Assim, terá mais dificuldade de impor sua vontade.
A
tarefa do governo para minar o poder de Lira não é simples, pois exige
prudência nas manifestações públicas. Não é por acaso que os partidos do novo
bloco do Republicanos fizeram o anúncio da formação após os líderes das
legendas tirarem uma foto ao lado do presidente da Câmara.
O
governo entende que, “para fora” do Congresso, houve a menção de que uma
possível federação entre União Brasil e PP — até aqui fracassada — justificaria
a aglutinação do grupo, no intuito de disputar relevância. Segundo os
articuladores, o quadro “real”, porém, é que MDB e PSD, que já possuem
ministérios, além das outras três siglas, agora formam uma frente com
capacidade de “defender o governo”. Em troca, o Planalto já sabe que será
cobrado por privilégios na relação, seja na ocupação de cargos ou espaço
político na agenda do Executivo.
Na
Câmara, o tamanho dos grupos é importante porque dá força para os partidos
reivindicarem relatorias de projetos relevantes e maior representação em
comissões da Casa, como a que elabora o Orçamento. Demonstrando um afastamento
de Lira, o presidente do Republicanos, deputado Marcos Pereira (SP), já havia
dito ao GLOBO que a decisão de ficar em um bloco separado foi tomada pelo
próprio PP.
—
Não fomos convidados (para o bloco com Lira) — disse o dirigente partidário.
Bolsonaro promete usar Congresso para
sabotar Lula
Noventa
dias após deixar o Brasil para passar uma temporada nos Estados Unidos, o
ex-presidente Jair Bolsonaro voltou nesta quinta-feira ao país e, nas primeiras
horas em solo nacional, rechaçou especulações sobre o futuro eleitoral de seu
filho, Eduardo Bolsonaro, e de sua mulher, Michelle, e reviveu a rivalidade com
o PT, ao reclamar do tratamento dado a ele pelo atual governo.
Entre
os primeiros compromissos no país, está uma consulta com o cirurgião Antônio
Luiz Macedo, em São Paulo, para avaliação da necessidade de nova cirurgia para
tratar o problema crônico de suboclusão intestinal, causado pelo atentado a
faca durante a campanha eleitoral de 2018. O ex-presidente também vai depor na
quarta-feira à Polícia Federal no inquérito que apura o caso das joias.
A
agenda política do ex-presidente, porém, ainda não foi fechada, mas ele indicou
várias vezes como pretende atuar daqui para frente, durante o seu primeiro dia
de volta ao país .
Bolsonaro
deu na quinta-feira sinais de que pretende emprestar o peso de seu nome nas
campanhas municipais de 2024. Ao ser perguntado se preferia o filho Eduardo ou
Ricardo Salles para disputar a prefeitura de SP, ele disse que o seu
ex-ministro é mais experiente.
Em
seu primeiro dia em solo brasileiro, o ex-presidente já sinalizou que o
presidente e o PT não terão vida fácil, embora tenha garantido que fará
oposição responsável.
Enquanto
não começa o tour pelo Brasil planejado pelo PL, o dia a dia de Bolsonaro deve
ser de casa, no Solar de Brasília, no bairro Jardim Botânico da capital
federal, para o trabalho, na sede do PL, no condomínio Brasil 21 — um percurso
de de 20 minutos de carro.
O
presidente do PL, Valdemar Costa Neto, e seu ex-vice Braga Netto, que tem a
missão de organizar o PL para as eleições de 2024, devem formar a trinca mais
constante com Bolsonaro.
• Em vez de explicar joias, Bolsonaro
ataca Lula
De
volta ao Brasil, após uma temporada de três meses nos Estados Unidos, o
ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) assumiu nesta quinta-feira, 30, o discurso de
líder da oposição, embora tenha contado com uma recepção aquém das expectativas
no aeroporto de Brasília. Pouco tempo após desembarcar, Bolsonaro criticou o
presidente Luiz Inácio Lula da Silva ao afirmar que os petistas “não vão fazer
o que bem querem com o destino da nossa Nação” e, apesar de dizer que seu papel
não será o de comandar o contraponto ao governo do PT, permaneceu no palanque
político.
Em
todas as manifestações, Bolsonaro puxou Lula para o confronto e chegou a prever
que o adversário “está por pouco tempo no poder”. O ex-presidente deixou o País
em 30 de dezembro do ano passado, sem passar a faixa para o sucessor e, desde
então, teve o nome associado aos atos golpistas de 8 de janeiro e ao escândalo
da entrada ilegal de joias no Brasil, recebidas da Arábia Saudita, como mostrou
o Estadão.
Ao
longo do dia, Bolsonaro citou o caso em conversas com correligionários e em
entrevistas. Disse que recebeu joias da Arábia Saudita “porque eles são
riquíssimos”. “A rainha da Inglaterra ganhou R$ 50 milhões. Eles (reino da Arábia
Saudita) têm dinheiro, pô! É o prazer deles dar o presente. Esse sheik me
convidou, eu fui na casa dele, fiquei na casa dele. Ele tem coisas que nós não
temos: três esposas, por exemplo. Eles são muito bem sucedidos. São
riquíssimos, e eles procuram agradar às pessoas. Mas sou um cara que continuo
com o meu reloginho aqui, graças a Deus”, afirmou ele, em entrevista à Jovem
Pan. A Polícia Federal intimou o ex-presidente a depor no inquérito que
investiga a entrada ilegal de joias no País, na próxima quarta-feira.
Ao
se reunir ontem com deputados e senadores do PL, na sede do partido, Bolsonaro
elogiou o perfil mais conservador do Congresso e sustentou que a atual
legislatura é melhor do que a anterior. Na prática, tenta reaglutinar seu campo
político – que se dividiu após sua ida para Orlando (EUA) – e aposta na
desconstrução de Lula.
“Eu
lembro lá atrás, quando alguém criticava o Parlamento, Ulysses Guimarães dizia:
‘Espera o próximo’. Desta vez, o próximo melhorou, e muito. O Parlamento nos
orgulhando pelas medidas, pela forma de se comportar, agir lá dentro, fazendo o
que tem que ser feito e mostrando para esse pessoal – que por ora, pouco tempo,
está no poder – (que) eles não vão fazer o que bem querem com o destino da
nossa Nação”, declarou.
Diante
dos rumores de que a ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro poderá ser candidata
em 2026, Bolsonaro disse, ainda, que ela não tem “vivência política” para
disputar um cargo no Executivo.
Horas
depois das críticas do ex-presidente ao governo, Lula fez a primeira aparição
pública desde que foi diagnosticado com pneumonia, há uma semana. No Palácio da
Alvorada, ao lado da primeira-dama Rosângela Silva, a Janja, e da ministra do
Esporte, Ana Moser, o presidente assinou decreto que cria a estratégia nacional
do futebol feminino. Foi um ato calculado para acenar às mulheres – faixa do
eleitorado que mais rejeitou Bolsonaro.
“Não
existe outro caminho para a humanidade senão a gente ser tratado como igual e
não fazendo a discriminação que é feita junto às mulheres em várias
atividades”, disse o presidente.
A
chegada de Bolsonaro também foi ofuscada pela apresentação do novo arcabouço
fiscal, medida considerada crucial por setores econômicos para o ajuste das
contas públicas. Foi diante desse cenário de polarização que Lula escalou o
ministro das Relações Institucionais, Alexandre Padilha, para ironizar os
poucos apoiadores à espera de Bolsonaro.
A
cúpula do PL estimava que cerca de 10 mil pessoas compareceriam ao aeroporto de
Brasília, mas havia aproximadamente 600. “Mais uma vez ele (Bolsonaro) se
demonstrou um líder de pé de barro, quando fugiu do País. Agora, fez uma semana
inteira de mobilização e (mesmo assim) flopou a recepção no aeroporto”, disse
Padilha, repetindo cinco vezes a gíria “flopar”. O termo escolhido pelo ministro
não foi à toa: a linguagem é usada nas redes sociais para se referir a eventos
frustrantes ou que não atingiram as expectativas.
Na
tentativa de se aproximar de eleitores de Bolsonaro que se sentiram abandonados
após sua saída do País, o governo monta agora uma estratégia para as mídias
digitais, recorrendo a palavras voltadas para o público jovem.
Saída de Lewandowski ajuda Bolsonaro no
TSE
O
anúncio do ministro Ricardo Lewandowski, do Supremo Tribunal Federal (STF), de
que vai se aposentar no dia 11 de abril, não apenas movimentou a disputa já
sangrenta nos bastidores quanto à sucessão pela sua cadeira, como também
produziu reflexos em outra Corte onde ele também atua, o Tribunal Superior
Eleitoral (TSE).
Atual
vice-presidente do TSE, Lewandowski ficará de fora dos julgamentos das 16 ações
que podem levar à condenação de Jair Bolsonaro e à sua inelegibilidade, o que
foi comemorado por aliados do ex-presidente.
Na
prática, é como se sumisse do mapa um “voto em potencial” para punir Bolsonaro
por abuso de poder político e uso indevido dos meios de comunicação.
Isso
porque, mesmo sendo um ministro de perfil garantista, Lewandowski havia
sinalizado nos bastidores que a inclusão da minuta golpista na ação que trata
dos sucessivos ataques de Bolsonaro ao sistema eleitoral agravava a
sobrevivência política do ex-ocupante do Palácio do Planalto.
Hoje,
o atual presidente do TSE, Alexandre de Moraes, conta com uma maioria no
plenário do TSE formada por Lewandowski, Cármen Lúcia e o corregedor-geral da
Justiça Eleitoral, Benedito Gonçalves. A saída de Lewandowski mexe com a
correlação de forças dentro da Corte.
Das
16 ações que investigam a fracassada campanha de Bolsonaro à reeleição, a mais
avançada de todas é a que trata justamente da reunião do então presidente da
República com embaixadores, em que ele fez diversos ataques infundados ao
sistema eleitoral.
Mesmo
adiantada, com a realização de uma série de depoimentos – inclusive o do
ex-ministro da Justiça Anderson Torres, em cuja casa a minuta golpista foi
achada –, a ação movida pelo PDT ainda não foi liberada para julgamento.
A
participação de Lewandowski nesse julgamento nunca foi uma certeza, mas com a
antecipação da aposentadoria para logo depois da Páscoa ela acaba de ser
sepultada.
O
TSE é um tribunal híbrido, formado por três ministros titulares oriundos do
STF, dois do Superior Tribunal de Justiça (STJ) e outros dois juristas,
escolhidos mediante lista tríplice encaminhada à Presidência da República. A
mesma proporção é seguida na composição dos ministros substitutos.
Com
a saída de Lewandowski, um ministro substituto do Supremo deve ser efetivado
para ocupar a vaga. Pela tradição, essa cadeira deve ficar com Kassio Nunes
Marques, indicado ao STF por Jair Bolsonaro em outubro de 2020.
Com
a confirmação da troca de Lewandowski por Kassio Nunes Marques, integrantes do
PL avaliam que Jair Bolsonaro vai “virar um voto” na Corte Eleitoral, trocando
um potencial voto pela condenação por um possível voto pela absolvição.
Mesmo
assim, nos cálculos de integrantes do PL, Bolsonaro perderia no TSE por 5 a 2,
contando a seu lado com os votos de Kassio Nunes Marques e de Raul Araújo.
A
expectativa com o voto da dupla se baseia no perfil conservador dos ministros –
e no histórico de decisões dos dois.
Em
uma polêmica decisão que foi interpretada como censura, Raul Araújo proibiu a
manifestação política de artistas no Lollapalooza no ano passado, o que foi
duramente reprovado pelos colegas e por entidades da sociedade civil.
Ele
também deu o único voto contra aplicar a multa de R$ 22,9 milhões imposta por
Moraes contra o PL após a sigla pedir a anulação de parte dos votos no segundo
turno. Araújo considerou o valor exagerado.
Nos
bastidores, integrantes do Supremo vêm especulando ao longo dos últimos meses
sobre a possibilidade de não efetivar Nunes Marques na vaga de titular. Seria
um movimento inédito, uma vez que até hoje os ministros- substitutos indicados
pelo STF vem sendo efetivados automaticamente no TSE, à medida que as vagas são
abertas.
Mas
ministros ouvidos reservadamente pela equipe da coluna têm dúvidas se a maioria
do Supremo estaria disposta a quebrar uma tradição, em um momento em que o
tribunal tenta se reerguer após os atentados terroristas de 8 de janeiro.
Fonte:
O Globo/Agencia Estado
Nenhum comentário:
Postar um comentário