quinta-feira, 27 de abril de 2023

China aproveita impasse na Guerra da Ucrânia e abre negociação

Um ano, dois meses e três dias depois da invasão da Ucrânia pela Rússia, a China enfim fez um movimento objetivo no tabuleiro geopolítico bagunçado pela guerra de seu aliado Vladimir Putin. Não é pouco, mas também não é garantia de paz à vista.

Durante todo esse período, Xi Jinping foi pressionado pelo Ocidente para usar sua influência sobre Putin para tentar abrir negociações de paz. Usando a proverbial paciência chinesa, calcada em quatro milênios de prática política, o líder esperou.

Agora, usa o impasse militar em solo para fazer a sua jogada, ao conversar por telefone com Volodimir Zelenski e enviar um representante para negociar ao vivo em Kiev. É bastante improvável que tal ação tenha sido feita sem consultas com Putin, ainda mais após a renovação de votos da "amizade sem limites" entre Moscou e Pequim com a visita do chinês ao colega no mês passado.

Xi aproveita sua posição única de país inescapável nas relações internacionais, dado o peso de sua economia, a maior parceira comercial de cerca de 120 dos 193 países membros da ONU, e a aliança com a Rússia -estabelecida formalmente 20 dias antes do início da guerra.

A especulação ocidental básica, de que Pequim apoiou o conflito visando um precedente para a retomada de Taiwan "manu militari" só para se arrepender depois, é tentadora, mas pouco alicerçada em fatos. Assim como a ideia de que os chineses enviaram, ou vão enviar, armas secretamente para o aliado.

Não que isso não possa ocorrer ou ter ocorrido, mas o comportamento de Xi sugere mais um jogo em seus termos, o que é péssima notícia para a beligerância ocidental liderada pelos Estados Unidos e acompanhada pelos membros mais agressivos da Otan (aliança militar ocidental).

Só no primeiro ano da guerra, os EUA responderam por cerca de 75% da ajuda militar direta a Kiev, segundo o Instituto para a Economia Mundial de Kiel (Alemanha). O bolo de quase US$ 50 bilhões, contudo, equivaleu a apenas 6% do orçamento de defesa de Joe Biden, o que sugere um bom negócio.

Central para o telefonema de Xi é a situação em campo. A Rússia falhou em conquistar o que lhe falta ocupar da província de Donetsk durante a violenta campanha de inverno (do Hemisfério Norte) na região. O "moedor de carne" de Bakhmut já é visto como um dos mais mortais enfrentamentos diretos desde a Segunda Guerra Mundial.

Moscou está perto de tomar a cidade estratégica há meses, e tudo indica que poderá fazê-lo. Mas há sérias dúvidas, entre analistas, sobre a viabilidade da continuidade da ofensiva na região, uma das quatro anexadas ilegalmente por Putin em setembro e aquela em que exerce menos controle.

Por outro lado, a esperada contraofensiva ucraniana, que observadores apontam como iminente e focada provavelmente na região de Kherson (sul), visando implodir a ponte terrestre estabelecida pela Rússia entre seu território e a Crimeia anexada em 2014, também levanta dúvidas.

Primeiro, os russos tiveram bastante tempo para se entrincheirar, e imagens de satélite mostram camadas sucessivas de linhas defensivas ao longo da frente. Segundo, a Ucrânia não parece ter força militar para retomar territórios de forma decisiva, apesar do reforço com algumas dezenas de tanques ocidentais de segunda mão e novos mísseis americanos.

Há, claro, a possibilidade de que Xi esteja ganhando tempo para Putin, justamente pelo temor de algum sucesso mais efetivo dos ucranianos, a exemplo do que aconteceu no segundo semestre de 2022 em Kharkiv (norte). Mas não é o cenário mais provável.

O impasse favorece a ação chinesa pela paz. Ganham com isso os atores secundários que quiseram aproveitar a crise para sair bem na foto, o francês Emmanuel Macron e o brasileiro Luiz Inácio Lula da Silva à frente.

Ambos estiveram recentemente com Xi e falaram sobre suas ideias pela paz, sendo devidamente criticados no Ocidente, até por lhes faltar musculatura diplomática para liderar o empreendimento. O papel de Lula foi especialmente vexatório, dado o vaivém de opiniões sobre o conflito ao gosto da plateia.

Como coadjuvantes do chinês, contudo, ambos poderão dar um certo troco nos críticos, aparecendo como promotores da paz, ainda que a reboque. Todos, afinal, apresentaram algum tipo de proposta de paz, sendo a de Pequim a mais salomônica, o que evidentemente desagrada a Kiev.

Seja como for, qualquer avanço, seja para congelar a guerra nas linhas do que ocorreu na península coreana em 1953 ou para uma paz mais duradoura, será um grande tento para Pequim na Guerra Fria 2.0 que trava com Washington.

 

Ø  Rússia diz que observa disposição da China em se envolver nas negociações de paz na Ucrânia

 

O Ministério das Relações Exteriores da Rússia disse nesta quarta-feira que observou a disposição da China de se envolver em negociações de paz na Ucrânia, depois que o presidente chinês, Xi Jinping, teve um telefonema com o líder ucraniano, Volodymyr Zelenskiy.

“Notamos a prontidão do lado chinês em fazer esforços para estabelecer um processo de negociação”, disse a porta-voz do Ministério das Relações Exteriores, Maria Zakharova.

·         Presidente chinês realiza primeira ligação com Zelenskiy desde invasão russa

O presidente da China, Xi Jinping, falou por telefone nesta quarta-feira com o líder ucraniano, Volodymyr Zelenskiy, pela primeira vez desde a invasão da Ucrânia pela Rússia no ano passado, após meses de pressão de Kiev por conversas.

Xi disse a Zelenskiy que a China enviará representantes especiais à Ucrânia e manterá o diálogo com todas as partes que buscam a paz, informou a mídia estatal chinesa.

Xi, o líder mundial mais proeminente que se absteve de denunciar a invasão russa à Ucrânia, fez uma visita de Estado à Rússia no mês passado. Desde fevereiro, ele tem promovido um plano de paz em 12 pontos para o conflito, que foi recebido com ceticismo do Ocidente, mas com cautela por Kiev.

A China se concentrará em promover negociações de paz e fará esforços para um cessar-fogo o mais rápido possível, disse Xi a Zelenskiy, de acordo com relatos da mídia estatal chinesa.

"Como membro permanente do Conselho de Segurança da ONU e um grande país responsável, não ficaremos de braços cruzados, nem jogaremos gasolina no fogo, muito menos buscaremos lucrar com isso", disse Xi.

A guerra que já dura 14 meses está em um momento crítico, com a Ucrânia se preparando para lançar uma contra-ofensiva nas próximas semanas ou meses, após uma ofensiva de inverno russa que fez apenas avanços incrementais, apesar dos combates mais sangrentos até agora.

As autoridades ucranianas há muito tempo pedem a Pequim que use sua influência sobre a Rússia para ajudar a acabar com o conflito.

A China emergiu como um grande comprador do petróleo russo, que não pode mais ser vendido na Europa, e um crítico firme das sanções ocidentais contra Moscou, mas evitou apoiar abertamente a invasão.

O país asiático diz que está posicionado para ajudar a mediar o conflito porque não tomou partido publicamente.

Os países ocidentais dizem que a proposta de paz de 12 pontos da China para a Ucrânia é muito vaga, não oferece um caminho concreto para o fim da guerra e pode ser usada pelo presidente da Rússia, Vladimir Putin, para promover uma trégua que deixará suas forças no controle de territórios ocupados.

·         Presidente da Ucrânia teve conversa "longa e significativa" com Xi Jinping

O presidente da Ucrânia, Volodymyr Zelenskiy, disse nesta quarta-feira que teve um telefonema "longo e significativo" com o presidente da China, Xi Jinping, e espera que isso dê impulso às relações com Pequim.

"Tive uma longa e significativa conversa telefônica com... o presidente Xi Jinping", escreveu Zelenskiy no Twitter. "Acredito que essa ligação, assim como a nomeação do embaixador da Ucrânia na China, dará um forte impulso ao desenvolvimento de nossas relações bilaterais."

Ele não forneceu imediatamente nenhum outro detalhe.

·         Telefonema entre Xi e Zelenskiy mostra posição objetiva e imparcial da China, diz chancelaria chinesa

O telefonema entre o presidente da China, Xi Jinping, e o presidente da Ucrânia, Volodymyr Zelenskiy, nesta quarta-feira, mostra a posição objetiva e imparcial da China em assuntos internacionais e seu senso de responsabilidade como um grande país, disse uma autoridade do Ministério das Relações Exteriores chinês.

“O que a China tem feito para resolver a crise na Ucrânia tem sido legítimo”, disse o vice-diretor do departamento para Eurásia da chancelaria chinesa, Yu Jun.

 

Ø  Caças da Otan interceptam aviões militares russos no mar Báltico

 

Caças da Alemanha e do Reino Unido interceptaram nesta quarta (26) três aviões militares russos sobre o mar Báltico. Os aparelhos de Moscou voavam, segundo a Força Aérea alemã, com o transponder, instrumento que permite a identificação das aeronaves, desligado.

Segundo a conta do Twitter da Luftwaffe, a Aeronáutica germânica, eram dois caças Sukhoi Su-27 a escoltar um antigo avião espião Iliúchin Il-20, um dos esteios desse tipo de operação das forças de Vladimir Putin.

O incidente ocorreu sobre águas internacionais, e seguiu o protocolo: os russos foram acompanhados pelos ocidentais à distância, até irem embora. Tais encontros são uma perigosa rotina em áreas de atrito entre potências no mundo todo: Báltico, mar Negro, estreito de Taiwan, mar do Sul da China, Ártico e Alasca são cenários de interceptações quase diárias.

A situação, claro, está agravada devido à Guerra da Ucrânia. Em setembro passado, o risco ficou evidente em um incidente no mar Negro, perto do teatro de operações militares da invasão iniciada por Putin em fevereiro de 2022.

Um outro Su-27 russo quase derrubou um avião espião RC-135 britânico. O episódio foi confirmado sem detalhes à época por Londres, mas o vazamento de papéis de inteligência nos EUA trouxe a versão de que o caça de Moscou chegou a atirar contra a aeronave de Londres, mas o míssil falhou.

Um caso clássico ocorreu em 2001, aquando um caça chinês abalroou um avião espião americano no mar do Sul da China. O avião de Pequim caiu, enquanto o de Washington teve de fazer um pouso forçado em território adversário, o que rendeu uma oportunidade para ser devidamente escrutinado pelo Exército de Libertação Popular.

No mês passado, um drone americano MQ-9 Reaper caiu no mar Negro após ser atingido na hélice por um outro Su-27, um episódio que foi esfriado pelos dois adversários devido ao risco de uma escalada imprevisível entre as maiores potências nucleares do mundo.

Na terça (25), a Rússia havia promovido um ameaçador voo de patrulha com dois bombardeiros estratégicos supersônicos Tupolev Tu-160, capazes de empregar armas nucleares. Eles foram escortados por interceptadores Mikoian-Gurevitch MiG-31K da Frota do Norte, baseada em Murmansk, no Ártico russo.

O voo transcorreu, com reabastecimento aéreo noturno, por 14 horas. Não houve incidentes.

No caso desta quarta, os caças da Otan, Eurofighters Typhoon em número não divulgado, participavam da chamada Patrulha Aérea do Báltico. Como os três Estados da região, as ex-repúblicas soviéticas Lituânia, Letônia e Estônia, são membros da aliança militar ocidental mas não têm caças, a vigilância de seu espaço aéreo é feita por parceiros.

O esquema funciona desde 2004 e foi intensificado em 2014, quando Putin anexou a Crimeia. Agora, é uma das linhas de frente do Ocidente ante o Kremlin. O desenho da segurança na área mudou brutalmente com a guerra, com a Finlândia sendo admitida na Otan e a Suécia, esperando na fila para o mesmo.

Os quatro países nórdicos, por sinal, também anunciaram a unificação de suas Forças Aéreas, ganhando assim uma musculatura operacional com quase 250 caças operando sob ordens iguais.

O Báltico segue um campo agitado. No começo do ano, bombardeiros nucleares americanos B-52 foram interceptados pelos russos na região durante um treino de ataque a São Petersburgo, segunda maior cidade russa que margeia o mar.

Após o início da guerra, a Rússia chegou a invadir o espaço aéreo da Suécia, em um episódio não confirmado de treino para um ataque nuclear tático -de potência limitada, contra alvos focados, como bases militares.

Em solo, o jogo de espera na Ucrânia continua, com relatos de que as forças russas seguem atacando com intensidade apenas na região de Bakhmut, em Donetsk, província do leste do país que foi declarada anexada por Putin em setembro passado.

Nas outras seções da frente, a expectativa é de uma contraofensiva de Kiev, que seria iminente segundo informes de inteligência de lado a lado. O líder do grupo mercenário Wagner, Ievguêni Prigojin, disse nesta quarta que a ação é "inevitável" e que deverá concentrar-se no flanco sul da área ocupada, em Kherson.

O objetivo ucraniano, na estimativa de analistas, pode ser retomar uma área próxima à Crimeia, que fica ainda mais ao sul de Kherson, cortando a ponte terrestre estabelecida no ano passado pelos russos entre seu território e a península, que tem sofrido ataques de drones e por mar.

 

Fonte: FolhaPress/Reuters

 

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