Mundo se prepara para guerra comercial após
tarifas de Trump
Países
em todo o mundo se preparam, nesta quinta-feira (03/04), para responder à mais
generalizada rodada de tarifas até o momento, anunciada pelo presidente
dos Estados Unidos,Donald Trump, ontem, no que o republicano chamou de
"Dia da Libertação".
Trump
impôs uma sobretaxa mínima de 10% a todas as importações ao país, mas adotou
um conceito de reciprocidade que se traduziu
em alíquotas de quase 50% em alguns casos.
A
reação dos governos mais afetados se limitou a promessas e comunicados até
agora, enquanto autoridades calibram as respostas com base no alcance das
taxas. No entanto, os mercados financeiros amanheceram com fortes perdas
globalmente, diante da avaliação de que a comunidade internacional já começa a
"se armar" para uma custosa guerra comercial.
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Europa prepara pacote de medidas
A União Europeia(UE) confirmou que
prepara um pacote de medidas em contraposição à tarifa de 20% da qual é alvo,
mas demonstrou estar aberta a negociações para evitar uma disputa mais ampla. O
bloco já vinha finalizando planos de taxar o equivalente a 26 bilhões em produtos
americanos, na esteira de sobretaxas ao aço e ao alumínio iniciadas em março
por Trump.
A
presidente da Comissão Europeia, Ursula Von der Leyn, classificou a
situação como um "grande golpe à economia mundial".
"Parece não haver ordem na desordem. Nenhum caminho claro através da
complexidade e do caos que está sendo criado à medida que todos os parceiros
comerciais dos EUA são atingidos", afirmou, durante cúpula com líderes da
Ásia Central no Uzbequistão.
Além
dos anúncios da véspera, também entram em vigor nesta quinta-feira tarifas de 25% sobre veículos
importados pelos
americanos. A Associação da Indústria Automotiva da Alemanha, que têm os EUA
como principal mercado, pediu a UE que "mantenha a cabeça
fria" para evitar "uma escalada que apenas agravaria os
danos".
Fora do
bloco europeu, o Reino Unido dispõe de "uma ampla gama de
instrumentos e não hesitará em usá-los", mas "permanece calmo e
comprometido", de acordo com o ministro de negócios, Jonathan Reynolds. Os
EUA cobrarão uma tarifa recíproca de 10% dos britânicos.
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China promete resposta, mas não detalha planos
Outro
alvo central da Casa Branca, a China exortou os EUA a "cancelarem
imediatamente" a ofensiva tarifária e prometeu impor
"contramedidas resolutas" por meio de comunicado do ministério
do Comércio. Pequim, porém, não detalhou os planos. "Não há vencedores
em uma guerra comercial, e não há saída para o protecionismo", ressalta a
nota.
Para o
país asiático, tarifas recíprocas de 34% serão acrescidas a sobretaxas já
existentes de 20%. O total, de 54%, se aproxima da alíquota de 60% prometida
por Trump durante a campanha eleitoral.
No
Japão, o ministro do Comércio, Yoji Muto, exortou Washington a desistirem da
tarifa de 24% aplicadas aos produtos do país asiático. Já o presidente interino
da Coreia do Sul, Han Duck,
reconheceu que uma "guerra tarifária global se tornou uma realidade".
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Especialistas consideram tarifas agressivas
As
palavras duras refletem a percepção de que as tarifas foram agressivas, embora
ainda haja incerteza sobre a implementação. Para o estrategista Jim Reid,
do Deutsche Bank, as taxas cumpriram as expectativas mais pessimistas.
"No
geral, o tamanho das tarifas aumentou a sensação de um impulso para uma
reorganização política radical pela nova administração dos EUA", escreveu
Reid em relatório a investidores. Mas elas "não aumentaram muito a
confiança de que haja um plano de implementação estratégica aprofundado".
O
economista-chefe da consultoria britânica Capital Economics, Neil Shearing,
também considerou as alíquotas mais altas que o esperado, particularmente para
China e outros países asiáticos. Por outro lado, o Brasil está entre os
"vencedores" por ter sido alvo apenas da tarifa mínima de 10%,
na visão dele.
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"Impacto mínimo na economia brasileira”
Antes
parceiros indispensáveis, EUA e Brasil se tornaram concorrentes diretos no
comércio global em setores como agricultura e energia, explica à DW o chefe da
Moody's Analytics para América Latina, Jesse Rogers. O resultado é que os
embarques brasileiros para a maior economia do mundo são relativamente
limitados, em comparação com Europa e Ásia.
"As
tarifas recíprocas terão impacto mínimo na economia brasileira, já que o país
não importa muito dos EUA", resume Rogers.
O
economista vê potencial impacto no setor de energia, uma vez que o Brasil é
grande exportador de petróleo refinado. Mas o mercado americano pode ser
facilmente substituído por praças asiáticas e do Oriente Médio, de acordo com
ele. Os efeitos devem ser mais indiretos. "Se as tarifas desacelerarem as
economias chinesa e global, o Brasil e a América do Sul sentirão o
impacto", especula.De qualquer forma, o Congresso aprovou um projeto de lei
que prevê mecanismos para
reciprocidade comercial. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva indicou que o
país pode recorrer à Organização Mundial do Comércio (OMC).
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União Europeia se diz
pronta para responder tarifaço de Trump
Chefe
do Executivo da União Europeia, Ursula von der Leyen, afirmou que o bloco está
"pronto para responder" às tarifas recíprocas anunciadas por Donald Trump nesta quarta-feira (2).
"Estamos
preparando pacotes de medidas para proteger os nossos interesses", disse.
"Nós permaneceremos juntos, nossa união é a nossa força".
Apesar
do tom de confronto, von der Leyen também afirmou que a UE pretende negociar
com os Estados Unidos e que ações
serão tomadas caso a negociação falhe.
Segundo
Trump, as tarifas recíprocas serão metade das alíquotas cobradas por outros
países. Além disso, os EUA imporão uma alíquota mínima de 10% aos seus
parceiros comerciais, incluindo o Brasil.
Desde o
anúncio na tarde desta quarta (2), líderes mundiais têm exposto suas reações.
Alguns países mostraram cautela e vontade de negociar.
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Veja a repercussão:
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Reino Unido
O
secretário de Comércio do Reino Unido, Jonathan Reynolds, disse que o país não
vai repensar suas regras fiscais por causa dos Estados Unidos. O representante
também afirmou que os EUA permanecem com o status de "amigos" mesmo
após as taxas.
Mais
cedo, Reynolds disse que a reação inicial era ter calma.
"Os
EUA são nossos aliados mais próximos, então nossa resposta é manter a calma e o
comprometimento em fazer um acordo, que esperamos que mitigue o impacto do que
foi anunciado hoje", disse Reynolds.
"Temos
uma gama de ferramentas à nossa disposição e não hesitaremos em agir.
Continuaremos a nos envolver com as empresas do Reino Unido, inclusive em sua
avaliação do impacto de quaisquer medidas adicionais que tomarmos."
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Alemanha
O
ministro das Finanças da Alemanha afirmou que a União Europeia precisa reagir
de forma contundente às tarifas dos Estados Unidos, mas que o bloco comercial
permanece aberto a buscar um acordo.
"Seria
ingênuo pensar que, se apenas ficarmos parados e deixarmos isso acontecer, as
coisas irão melhorar, então espero uma resposta forte da União Europeia",
disse Joerg Kukies.
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China
A China
solicitou aos EUA que cancelem as tarifas imediatamente e afirmou que pretende
tomar contramedidas para proteger seus próprios interesses.
Segundo
o Ministério do Comércio chinês, a medida dos EUA desconsidera o equilíbrio de
interesses alcançado em negociações comerciais multilaterais ao longo dos anos
e o fato de que o país tem se beneficiado grandemente do comércio
internacional.
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Taiwan
O
gabinete de Taiwan classificou as tarifas recíprocas como "muito
irracionais" e afirmou que irá tratar do assunto com o país.
O órgão
afirmou que a taxa de tarifa proposta não reflete a real situação do comércio
entre Taiwan e os Estados Unidos.
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Coreia do Sul
O
Ministério da Indústria da Coreia do Sul informou que Seul buscará consultas
com autoridades norte-americanas, tanto em nível sênior quanto operacional,
sobre as tarifas.
O órgão
disse ainda que pretende analisar seu impacto específico nas indústrias e
preparar medidas emergenciais de apoio o mais rápido possível.
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Noruega
O
primeiro-ministro do país afirmou que tem a pretensão de negociar com os EUA se
tiver a oportunidade.
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França
O
presidente da França, Emmanuel Macron, disse que se reunirá com os setores
afetados pelas tarifas nesta quinta-feira (3).
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Suíça
A
associação empresarial Economiesuisse afirmou que as tarifas dos Estados Unidos
sobre as importações suíças são prejudiciais e injustificadas.
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Austrália
Anthony
Albanese, premiê da Austrália, outro aliado próximo dos EUA, disse que a
decisão de Trump não é "o ato de um amigo", mas disse que seu país
não vai adotar tarifas recíprocas em resposta.
"É
o povo americano que pagará o maior preço por essas tarifas injustificadas. É
por isso que nosso governo não buscará impor tarifas recíprocas. Não entraremos
em uma corrida para o fundo do poço que leva a preços mais altos e crescimento
mais lento."
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Irlanda
"A
União Europeia e a Irlanda estão prontas para encontrar uma solução negociada
com os EUA. Negociação e diálogo são sempre o melhor caminho a seguir",
declarou o ministro do Comércio, Simon Harris.
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Espanha
Destoando
da maioria das respostas, de tom mais conciliatório, o premiê espanhol, Pedro
Sánchez, disse que o país "protegerá suas empresas e trabalhadores e
continuará comprometido com um mundo aberto."
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Itália
A
primeira-ministra italiana, Georgia Meloni, prometeu "fazer tudo o que
pudermos para trabalhar em prol de um acordo com os Estados Unidos, com o
objetivo de evitar uma guerra comercial que inevitavelmente enfraqueceria o
Ocidente em favor de outros atores globais."
"De
qualquer forma, como sempre, agiremos pelo interesse da Itália e de sua
economia, também nos envolvendo com outros parceiros europeus",
acrescentou.
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Suécia
"Não
queremos barreiras comerciais crescentes. Não queremos uma guerra
comercial", disse o primeiro-ministro, Ulf Kristersson. "Queremos
encontrar nossa rota de volta para um caminho de comércio e cooperação junto
com os EUA, para que as pessoas em nossos países possam desfrutar de uma vida
melhor."
Reproduzir
vídeo
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União Europeia
Mais
cedo, a UE informou que a expectativa do anúncio já havia provocado reações
antes mesmo do discurso do republicano na Casa Branca. Ursula von der Leyen
disse na terça que a União Europeia tem um "plano forte" para
retaliar as tarifas impostas por Washington.
"Não
queremos necessariamente retaliar. Mas se for necessário, temos um plano forte
para retaliar e o usaremos", afirmou, num discurso ao Parlamento Europeu
em Estrasburgo. "Nosso objetivo é uma solução negociada. Mas é claro que,
se necessário, protegeremos nossos interesses, nosso povo e nossas
empresas."
Os EUA
anunciaram uma tarifa de 20% sobre produtos europeus.
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Primeiro trimestre de Trump deteriora economia americana,
reorganiza dinâmicas globais e acelera surgimento de ordem multipolar
A
combinação de políticas protecionistas agressivas, realinhamentos geopolíticos
disruptivos e deterioração econômica resume o primeiro trimestre de 2025 dos
EUA e, consequentemente, de todo o mundo.
Enquanto
o presidente americano reorganiza as relações internacionais através de tarifas
punitivas e de uma abordagem agressiva na diplomacia, os indicadores econômicos
domésticos pintam um quadro preocupante: as bolsas americanas acabam de fechar
seu pior trimestre desde 2022, com S&P 500
recuando 4,6% e Nasdaq despencando 10,4% no primeiro trimestre de 2025.
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Ainda
há uma tendência de piora nestes dados econômicos, tendo em vista o pacote de
tarifas que serão anunciadas nesta quarta-feira (2), o “dia da libertação” da
economia norte-americana, nas palavras do próprio presidente. O mercado
internacional espera mais detalhes sobre o tamanho e a agressividade do
conjunto de medidas econômicas para dimensionar danos e, aí sim, refletir em
indicadores.
O setor
tecnológico, motor da economia americana nas últimas décadas, foi
particularmente castigado: ações da Nvidia caíram 13,2%, Meta 13,7%, e a Tesla
chegou a despencar 15,4% em um único dia após declarações ambíguas de Trump
sobre a economia.
As
tarifas sobre insumos críticos como aço e alumínio já pressionam os custos de
produção, enquanto a ameaça de sobretaxar os "15 Sujos" - países
considerados com piores práticas comerciais - cria um ambiente de paralisia
decisória entre investidores.
Este
cenário, somado às diversas ameaças que Donald Trump e seus assessores próximos
vêm fazendo a países nos quatro cantos do mundo, vem afastando parceiros
históricos dos EUA da dinâmica econômica ocidental, que nos habituamos a chamar
de globalização.
A
reunião entre China, Japão e Coreia do Sul em Tóquio, neste domingo (30), por
exemplo, representa um sintoma claro desta nova realidade. As três gigantes
economias asiáticas estão buscando aprofundar uma cooperação econômica
regional, em conjunto, em busca de uma alternativa ao sistema ocidental.
Quando
o chanceler japonês Takeshi Iwaya fala em "ponto de virada na
história", em seu discurso na ocasião, refere-se ao reconhecimento de que
a ordem liderada pelos EUA já não oferece a estabilidade de outrora. Portanto,
é preciso olhar para os vizinhos como canais de cooperação econômica mais
viáveis.
Já a
União Europeia se vê forçada a repensar sua dependência econômica e estratégica
de Washington. Sob o impacto de sobretaxas de 25% sobre veículos europeus e
ameaças de medidas similares em outros setores, o bloco acelera planos para
reduzir vulnerabilidades, desde incentivos à indústria local até a
diversificação de parcerias comerciais com China e Mercosul.
Os
primeiros meses do governo Trump 2.0 revelam uma contradição fundamental:
enquanto suas políticas buscam reafirmar a hegemonia americana, seus efeitos
imediatos minam as bases econômicas dessa mesma liderança. A OCDE já revisou
para baixo as previsões de crescimento global, de 3,3% para 3,1% em 2025,
citando justamente as "barreiras comerciais" e "incertezas
políticas" geradas por Washington.
Neste
novo tabuleiro geopolítico, onde Trump trata soberanias como ativos
negociáveis, os países são forçados a repensar suas alianças e estratégias. O
risco é que, ao buscar fortalecer o poder americano através da força bruta
econômica, a administração Trump acabe catalisando justamente o surgimento de
uma ordem multipolar onde os EUA terão, no máximo, um assento à mesa - não a
cadeira de comando.
Fonte: DW Brasil/g1/Brasil 247
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