quinta-feira, 10 de abril de 2025

Familiares de Nabhan Garcia, ‘braço direito’ de Bolsonaro, entram na Lista Suja

ENTRE OS 155 NOVOS EMPREGADORES incluídos na atualização da Lista Suja do trabalho escravo, publicada nesta quarta-feira (9) pelo governo federal, estão os empresários do agronegócio Marco Aurélio Parzianello, de 64 anos, e seu filho, Marco Aurélio Parzianello II, de 36. Pai e filho submeteram cinco trabalhadores a condições análogas às de escravos na fazenda Arizona, em Ipixuna do Pará (PA), segundo o cadastro oficial do MTE (Ministério do Trabalho e Emprego).

Os dois têm relações familiares com o ex-secretário de Assuntos Fundiários do governo de Jair Bolsonaro (PL), Luiz Antônio Nabhan Garcia, “braço direito” do ex-presidente na relação com o agronegócio e inimigo declarado dos movimentos de luta pela reforma agrária. Nabhan Garcia é casado com a médica Marisa Ângela Parzianello Nabhan Garcia, irmã de Marco Aurélio e tia de Marco Aurélio II.

A Repórter Brasil procurou o Grupo GMP, empresa dos Parzianello, por e-mail e mensagem de celular, mas não obteve resposta. Nabhan Garcia também foi contatado, porém, não retornou. O texto será atualizado, caso posicionamentos sejam recebidos.

De acordo com os autos de infração registrados por auditores fiscais do Ministério do Trabalho, motoristas de caminhões que transportavam milho colhido na fazenda Arizona dormiam nas boleias, faziam suas necessidades no mato e tomavam banho em um chuveiro improvisado ao ar livre, sob vigilância de câmeras. Um deles relatou aos auditores fiscais que desligava a iluminação da ducha para evitar ser filmado nu.

Durante o dia, não havia abrigo contra o sol ou a chuva, nem instalações sanitárias ou locais apropriados para as refeições. Os trabalhadores comiam sentados no chão ou embaixo das carrocerias dos caminhões.

A operação que culminou com a inclusão dos dois empresários na Lista Suja foi realizada em junho de 2023, com apoio do Ministério Público do Trabalho e da Polícia Federal. Diante das violações constatadas, a fiscalização determinou a retirada imediata dos trabalhadores da fazenda, o pagamento dos direitos trabalhistas e o retorno de cada um à sua cidade de origem.

Os autos de infração também mostram que, após as 7h, os trabalhadores não tinham mais acesso ao café da manhã, mesmo permanecendo em campo até o fim do dia. Não havia controle de jornada, e os únicos banheiros disponíveis ficavam distantes das frentes de trabalho e não contavam com chuveiros. Por isso, os motoristas realizavam toda a rotina de trabalho, alimentação, descanso e higiene no mesmo caminhão em que transportavam as cargas.

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Quem é Nabhan Garcia, ex-secretário de assuntos fundiários do governo Bolsonaro

Antes de atuar no governo Bolsonaro, Nabhan Garcia ficou conhecido como presidente da UDR (União Democrática Ruralista), entidade que ganhou notoriedade por sua oposição ao MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra).

A aproximação de Nabhan com Jair Bolsonaro começou ainda durante a campanha eleitoral de 2018, quando o então candidato intensificou o discurso em defesa do agronegócio e da propriedade privada. Nabhan foi responsável por abrir as porteiras do agro para Bolsonaro.

Em um encontro com 40 produtores rurais na casa do ex-presidente, em 2018, durante a campanha eleitoral, Nabhan defendeu mudanças na punição ao trabalho escravo. “Se algum produtor aqui eventualmente comete uma arbitrariedade na questão trabalhista, ele não pode ser transformado em um escravagista”, discursou, conforme noticiado pelo Valor.

“Como é que quem está gerando emprego, produzindo, trabalhando, pagando imposto pode ser considerado escravagista? O que tivemos aí nos governos anteriores, em especial do PT, são instituições que foram transformadas em órgãos de perseguição ideológica. Isso não pode existir”, afirmou na ocasião.

Em 1997, durante sua gestão na UDR, a entidade foi acusada de financiar e treinar seguranças armados para a desocupação de uma fazenda em Sandovalina, no interior de São Paulo, deixando oito trabalhadores rurais feridos. O episódio foi investigado pela CPMI (Comissão Parlamentar Mista de Inquérito) da Terra. Nabhan, no entanto, não chegou a ser indiciado.

Com a vitória de Bolsonaro, Nabhan assumiu a Secretaria Especial de Assuntos Fundiários do Ministério da Agricultura. Durante sua gestão, o Incra (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária) suspendeu a aquisição de novas terras para assentamentos e passou a focar na titulação de lotes já existentes. A mudança de orientação foi acompanhada por alterações administrativas que reduziram a atuação da autarquia em programas de reforma agrária.

Com forte inserção no meio rural e apoio de setores do agronegócio, Nabhan também manteve articulações políticas com deputados e lideranças do agro envolvidas em conflitos de terra e episódios de violência, conforme mostrou a série de reportagens Ogronegócio: milícia e golpismo na Amazônia, publicada pela Repórter Brasil em agosto de 2024.

A esposa de Nabhan Garcia, Marisa Ângela, é filha de Alcides Juraci Parzianello, de Tenente Portela (RS), que migrou para o Mato Grosso do Sul na década de 1970. Na década seguinte, ele comprou 67 mil hectares de terras indígenas em Diamantino e Tangará da Serra, no Mato Grosso, segundo publicou o De Olho nos Ruralistas.  

“Continuar trabalhando com excelência, crescendo, contribuindo para o país, gerando emprego nas regiões que estamos entrando”, definiu como seu objetivo o sobrinho de Marisa, Marco Aurélio Parzianello II, em entrevista a um portal especializado na cobertura do agronegócio, em setembro de 2024.

Na entrevista, Marco Aurélio II relata que o pai seguiu os passos do avô e foi para o norte do Mato Grosso para “fazer as aberturas”, como são chamadas as derrubadas de florestas nativas para a formação de fazendas. Atualmente, eles têm propriedades com plantações de soja, milho, algodão e eucalipto.

Formado em economia agrícola pela Universidade de Illinois, nos Estados Unidos, Marco Aurélio II é CFO (Chief Financial Officer) do Grupo GMP, com cinco unidades produtivas. Três estão localizadas no norte do Mato Grosso (Nova Ubiratã, Sorriso e Ipiranga do Norte), uma no Mato Grosso do Sul  (Campo Grande) e outra no Pará, na região de Tailândia), onde fica a fazenda fiscalizada.

O avô de Marco Aurélio II, Alcides Parzianello, foi caminhoneiro — mesma ocupação dos cinco trabalhadores resgatados na fazenda da família.

¨      Trabalhador com jornada de 20h diárias é resgatado em granja fornecedora da JBS

UMA OPERAÇÃO EM Nova Ponte, no Triângulo Mineiro, resgatou do trabalho escravo um homem recrutado para cuidar dos aviários de uma granja com capacidade para abrigar até 40 mil aves. De acordo com o Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), ela abastecia uma unidade da Seara Alimentos, empresa do grupo JBS e uma das líderes nacionais na produção de frangos e carnes processadas.

O resgate ocorreu em janeiro, após uma denúncia recebida pela Polícia Federal relatando que a vítima era mantida no local contra a sua vontade. Segundo o MTE, que participou da operação, o dono da granja se aproveitou da situação de vulnerabilidade do trabalhador para oferecer serviços apenas em troca de comida e alojamento. O órgão afirma que ele havia sido dispensado da empresa onde trabalhava com reciclagem e estava na iminência de ser despejado de sua moradia.

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O resgatado passou então a habitar um cômodo precário da fazenda, de acordo com o relatório da fiscalização, acessado pela Repórter Brasil. No alojamento, segundo o MTE, não havia cama ou qualquer tipo de mobiliário. Além disso, o ministério apurou que as tarefas impostas à vítima eram realizadas dia e noite, chegando a 20 horas ininterruptas. Suas obrigações incluíam manter os bebedouros da granja constantemente cheios, inclusive de madrugada, queimar lenha para aquecer os aviários e deles retirar as aves mortas.

Ainda segundo o MTE, o empregador Vilson Aguiar Ribeiro pagou à vítima R$ 5,5 mil em salários e verbas rescisórias.

<><> Contrato com o grupo JBS

A fiscalização apurou que o empregador possuía um contrato de parceria com a Seara Alimentos. Pelo acordo, ele recebia da empresa os pintinhos recém-nascidos. Posteriormente, os frangos engordados na fazenda eram encaminhados para o abate.

O relatório da fiscalização ressalta que, segundo o depoimento do trabalhador, representantes da JBS iam ao local semanalmente para avaliar a qualidade dos animais. No entanto, nunca teriam feito questionamentos sobre as condições de trabalho e moradia no local.

O documento destaca que a JBS divulga em seu site manter um diálogo constante com fornecedores sobre direitos humanos e leis trabalhistas. Mas tal afirmação, segundo o relatório, “não passa de uma mera ficção retórica para ludibriar clientes e certificadoras, uma vez que durante o período de labor a empresa esteve completamente alheia às graves violações de direitos trabalhistas sofridas pelo trabalhador”.

Procurada, a JBS não respondeu até o momento da publicação. O empregador responsabilizado pelo caso não foi localizado. O espaço segue aberto para manifestações.

<><> Resgate de indígenas

Este não foi o único caso de trabalho escravo flagrado em 2025 em atividades ligadas à indústria avícola. Em março, 35 indígenas oriundos de Amambaí (MS) foram resgatados em Pedreira (SP), onde prestavam serviços em várias granjas da região. Eles haviam saído do município de origem há 15 dias e trabalhavam na apanha dos frangos que são colocados em caminhões para serem encaminhados ao abate.

Segundo o Ministério Público do Trabalho (MPT), o grupo foi submetido a condições degradantes de alojamento em uma casa com apenas três dormitórios, um chuveiro e dois vasos sanitários. Parte deles, segundo o órgão, dormia na varanda, na garagem, no corredor e na cozinha da casa. O MPT afirma ainda que a alimentação dos trabalhadores era precária, composta apenas de arroz.

O órgão diz também que a empresa terceirizada responsável pela contratação dos indígenas presta serviços para um grande frigorífico no interior de São Paulo. O MPT, no entanto, não divulgou o nome do frigorífico.

 

Fonte: Repórter Brasil

 

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