Por que a geração Z e os millennials não
atendem mais o telefone
"Olá, esta é a
caixa postal de Yasmin Rufo. Por favor, não deixe mensagem, pois não vou ouvir,
nem ligar de volta."
Infelizmente, esta não
é a mensagem da minha caixa postal. Mas eu certamente gostaria que fosse, bem
como a maior parte dos jovens da geração Z (nascidos entre 1995 e 2010) e dos
millennials (nascidos entre 1981 e 1995).
Uma pesquisa recente concluiu
que 25% das pessoas com 18 a 34 anos de idade nunca atendem o telefone. Os
participantes responderam que ignoram o toque, respondem por mensagens de texto
ou pesquisam o número online se for desconhecido.
A pesquisa do site
Uswitch envolveu 2 mil pessoas. Ela também concluiu que cerca de 70% das
pessoas com 18 a 34 anos preferem mensagens de texto a chamadas telefônicas.
Para as gerações mais
velhas, falar ao telefone é normal. Meus pais passaram a adolescência brigando
com seus irmãos pelo telefone fixo no corredor, o que só fazia com que toda a
família ouvisse as suas conversas.
Já a minha
adolescência foi passada em mensagens de texto. Fiquei obcecada por elas desde
o momento em que ganhei meu Nokia cor-de-rosa de presente de aniversário, com
13 anos de idade.
Eu passava todas as
noites depois da escola redigindo textos de 160 caracteres para os meus amigos.
Eu retirava todas as
vogais e espaços desnecessários, até que a mensagem parecesse um grupo de
consoantes aleatórias que os próprios serviços de inteligência teriam
dificuldade de decifrar. Afinal, eu nunca iria pagar a mais para escrever 161
caracteres.
E, em 2009, as
ligações telefônicas do meu celular custavam uma fortuna. "Nós não demos
este telefone para você fofocar com suas amigas a noite inteira",
relembravam meus pais sempre que recebiam minha conta telefônica, todos os
meses.
Foi assim que surgiu
uma geração de pessoas que só se comunicam por texto. As ligações por telefone
celular eram para emergências e o telefone fixo era usado raramente para falar
com os avós.
A psicóloga Elena
Touroni explica que, como os jovens não desenvolveram o hábito de falar ao
telefone, ”agora parece estranho, pois não é o normal".
Por isso, os jovens
podem esperar o pior quando o telefone começa a tocar – ou se iluminar em
silêncio, já que ninguém com menos de 35 anos de idade tem o toque configurado
no seu telefone.
Mais da metade dos
jovens que responderam à pesquisa do Uswitch reconheceram acreditar que uma
ligação inesperada significa más notícias.
A psicoterapeuta
Eloise Skinner explica que a ansiedade em torno das ligações vem de "uma
associação com algo de ruim – uma sensação de pavor ou mau presságio".
"À medida que as
nossas vidas ficam mais atribuladas e os cronogramas de trabalho mais
imprevisíveis, temos menos tempo para ligar para um amigo, simplesmente para
saber como ele está", explica ela. "Por isso, as ligações telefônicas
ficam reservadas para as notícias importantes das nossas vidas, que, muitas
vezes, podem ser difíceis."
Para Jack Longley, de
26 anos, "é exatamente isso". Ele nunca atende ligações de números
desconhecidos, pois "ou é golpe, ou é marketing. É mais fácil simplesmente
ignorar as ligações, em vez de procurar saber quais delas são verdadeiras."
Mas não falar ao
telefone não significa que os jovens não mantenham contato com seus amigos.
Nossos grupos de bate-papo se movimentam o dia inteiro, com uma série de
mensagens corriqueiras, memes, fofocas e, mais recentemente, mensagens de voz.
Muitas dessas
conversas, agora, acontecem nas redes sociais, particularmente no Instagram e
no Snapchat, onde é mais fácil enviar imagens e memes ao lado dos textos. E,
mesmo com o consenso de que as ligações telefônicas são indesejadas, o uso de
mensagens de voz divide as gerações mais jovens.
Na pesquisa do
Uswitch, 37% das pessoas com 18 a 34 anos de idade declararam que as mensagens
de voz são sua forma preferida de comunicação. Por outro lado, apenas 1% dos
participantes com 35 a 54 anos preferem mensagens de voz em vez de ligações
telefônicas.
"A mensagem de
voz é como falar ao telefone, só que melhor", afirma a estudante Susie
Jones, de 19 anos. "Você tem o benefício de ouvir a voz dos seus amigos,
mas sem pressões. Por isso, é uma forma mais educada de comunicação."
Mas, para mim, é
difícil ouvir mensagens de voz de cinco minutos de uma amiga contando as
novidades sobre a vida dela. Elas devaneiam, as mensagens ficam repletas de
palavras como "tipo" e "ahn" – e toda a história poderia
ser contada em duas mensagens de texto.
As mensagens de texto
e de voz permitem que os jovens participem das conversas no seu próprio ritmo.
E eles podem responder de forma mais atenciosa e ponderada.
• Fobia do telefone no trabalho
Mas até que ponto a
fobia das chamadas telefônicas na sua vida pessoal afeta o lado profissional?
O advogado Henry
Nelson-Case tem 31 anos de idade. Ele também é criador de conteúdo – e é
terrivelmente fácil se identificar com sua série de vídeos sobre
"millennials devastados".
As cenas incluem a
angústia de enviar um e-mail para toda a empresa, como se recusar educadamente
a trabalhar além do horário e, é claro, um vídeo que mostra um funcionário
fazendo de tudo para evitar uma ligação telefônica.
Ele afirma que "a
ansiedade associada a conversas em tempo real, possíveis constrangimentos, não
ter as respostas e a pressão para responder imediatamente" fazem com que
ele odeie falar ao telefone.
"As ligações
telefônicas nos expõem mais e exigem um nível de intimidade mais alto, enquanto
as mensagens de texto são mais distanciadas e permitem que você se conecte sem
se sentir vulnerável ou exposto", explica Elena Touroni.
A advogada Dunja
Relic, de 27 anos, conta que evita as ligações no local de trabalho porque
"elas podem ser demoradas e atrasar as tarefas". Eloise Skinner
descreve isso como o sentimento de que "poderia ter sido um e-mail".
"Existe um senso
cada vez maior de proteção do nosso tempo", explica ela. "Ligar para
alguém exige que a pessoa que recebe a chamada faça uma pausa no seu dia e
dedique atenção à conversa – algo difícil para os multitarefas."
O empresário James
Holton, de 64 anos, conta que seus funcionários mais jovens raramente respondem
às ligações telefônicas: "ou eles têm uma mensagem padrão dizendo que
estão ocupados, ou colocam meu número em redirecionamento, de forma que a
chamada nunca é recebida".
"Eles sempre têm
uma desculpa na manga", segundo Holton. "A mais comum é 'meu telefone
está em modo silencioso, de forma que não vi a chamada e me esqueci de ligar
mais tarde'."
Ele conta que precisou
se adaptar, depois que observou que havia "uma clara dificuldade de
comunicação". "Se os funcionários são mais confortáveis com textos, é
minha responsabilidade respeitar a decisão deles."
Mas será que a
preferência pela comunicação escrita e a tendência de trabalhar em casa estão
nos fazendo perder a capacidade de manter conversas informais e não
programadas?
Para Skinner, se a
tendência atual continuar, "poderemos perder a sensação de proximidade ou
conexão".
"Quando nos
comunicamos verbalmente, nós nos sentimos mais alinhados, emocional,
profissional ou pessoalmente", explica ela. "Esta conexão pode gerar
maior sensação de realização, especialmente no ambiente de trabalho."
Mas a gerente de
supermercado Ciara Brodie, de 25 anos, contraria a tendência. Ela diz que
"adora e reconhece quando meus chefes do trabalho ligam para mim".
"É algo mais
atencioso do que a mensagem de texto, pois exige um certo nível de esforço, que
faz com que você realmente saiba que seu gerente valoriza sua informação",
explica ela.
Ela gosta
particularmente de conversar com os colegas pelo telefone nos dias em que
trabalha em casa. "Pode ser solitário, de forma que é bom permanecer
conectada."
Algumas pessoas podem
dizer que esta nova tendência de comunicação é mais uma prova de que somos a
"geração floco de neve". Mas, na verdade, estamos muito longe disso.
É mais uma questão de
adaptação. É claro que, 25 anos atrás, as pessoas eram resistentes à mudança do
fax para o e-mail, mas a mudança tornou a nossa comunicação muito mais
eficiente.
Talvez tenha chegado a
hora de reconhecer o poder do texto e, da mesma forma que aposentamos a máquina
de fax nos anos 1990, podemos deixar as temidas ligações telefônicas para trás
em 2024.
Fonte: BBC News Brasil
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