sexta-feira, 27 de setembro de 2024

Recurso do MPF busca garantir a demarcação e a titulação de território quilombola em Sergipe

O Ministério Público Federal (MPF) apresentou recurso extraordinário ao Supremo Tribunal Federal (STF) para que o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) e a União promovam a demarcação e a titulação do território quilombola Pirangy, localizado no município de Capela, em Sergipe. A comunidade aguarda há 17 anos o procedimento de regularização da área. Para seguir para instância superior é preciso que o recurso seja admitido pela vice-presidência do Tribunal Regional Federal da 5ª Região (TRF5).

O processo é fruto de ação civil pública ajuizada pelo MPF para que o Incra e a União finalizem o processo administrativo que trata da identificação, reconhecimento, delimitação, demarcação e titulação da área territorial reivindicada pela comunidade quilombola Pirangy. Na ação, o MPF pediu que a Justiça determinasse à autarquia a conclusão do procedimento no prazo de 24 meses, fixando-se multa diária de R$ 1 mil por dia de descumprimento. Outros requerimentos foram para que a União disponibilizasse verbas orçamentárias ao Incra para a realização da titulação do território e que o Incra e a União pagassem indenização por danos morais coletivos pela demora na regularização da área. A Justiça Federal em Sergipe julgou os pedidos improcedentes.

•        Demora

O MPF recorreu ao TRF5 sustentando que a tramitação do processo administrativo de regularização fundiária no Incra ultrapassa em muito uma duração considerada razoável, acarretando sérios prejuízos do ponto de vista de manutenção da cultura e usos tradicionais da comunidade, além de dar ensejo a conflitos fundiários. Também ressaltou que a autarquia não tem sequer previsão para a finalização do procedimento de regularização da área.

A Segunda Turma do TRF5 não acatou o recurso do MPF. De acordo com o acórdão, “muito embora o lapso de tramitação do processo administrativo seja evidentemente prolongado, não se pode afirmar que atualmente existe mora do Incra no desenvolvimento dos trabalhos, havendo grande dificuldade, a bem da verdade, de se estabelecer um prazo para a conclusão dos expedientes, até mesmo em vista a grande quantidade de etapas a serem cumpridas”.

•        Normas constitucionais

O procurador regional da República Adílson Paulo Prudente do Amaral Filho, responsável pelo caso na segunda instância, discorda dessa argumentação. Para ele, a decisão ofende normas constitucionais. “O acórdão recorrido, ao deixar de responsabilizar a União e o Incra, réus nesta demanda, pela conduta ilícita relacionada aos procedimentos de regularização fundiária do quilombo em questão, contraria as seguintes normas: artigo 5º, inciso XXXV; artigo 37, caput; artigo 216, parágrafo 5º; e artigo 68 do ADCT”, frisa. Segundo ele, tais normas dispõem sobre a garantia de duração razoável do processo administrativo, o princípio da eficiência, o acesso à Justiça e a inafastabilidade do controle jurisdicional para apreciar ameaça ou lesão a direito.

 

•        Caiana dos Crioulos é a primeira comunidade quilombola titulada pelo Incra na Paraíba

Aproximadamente 300 famílias da comunidade quilombola Caiana dos Crioulos, em Alagoa Grande e Matinhas, municípios do Agreste paraibano, comemoraram a conquista dos Títulos de Domínio (TD) dos três imóveis inseridos na área de 646 hectares do território. Trata-se da primeira comunidade quilombola da Paraíba a receber o título definitivo de suas terras.

Os documentos foram entregues em solenidade realizada em 19 de setembro (quinta-feira), em Alcântara (MA), pelas mãos do presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, durante ato de celebração da assinatura do Termo de Conciliação, Compromissos e Reconhecimentos Recíprocos relativo ao Acordo de Alcântara. Na ocasião, foram concedidos outros 18 títulos a comunidades quilombolas de todo o Brasil, além de 11 decretos de interesse social.

O Título de Domínio de terras quilombolas é coletivo, imprescritível e pró-indiviso concedido à comunidade, em nome da sua associação legalmente constituída. É gratuito e não pode ser vendido ou penhorado e, além da posse da terra, garante o acesso a políticas públicas como educação, saúde e financiamentos por meio de créditos específicos.

Atualmente, 36 processos para regularização fundiária de territórios quilombolas encontram-se em andamento no Incra na Paraíba. De acordo com informações da Associação de Apoio aos Assentamentos e Comunidades Afrodescendentes da Paraíba (Aacade), 49 comunidades remanescentes de quilombos no estado já possuem a Certidão de Autodefinição expedida pela Fundação Cultural Palmares.

•        Tradição e resistência

Caiana dos Crioulos, localizada a cerca de 130 quilômetros de João Pessoa, é uma das comunidades remanescentes de quilombos mais conhecidas da Paraíba. O grupo ainda mantém bem vivas as tradições herdadas de seus antepassados africanos e preserva vários traços de sua cultura e história. Entre as manifestações artísticas, estão os grupos de coco de roda e de ciranda, que se apresentam em eventos no estado e em outros lugares do país.

O Relatório Técnico de Identificação e Delimitação (RTID) da comunidade foi publicado pelo Incra em dezembro de 2015. Segundo o documento, a origem da Caiana dos Crioulos não é concludente. Alguns autores afirmam que a população descenderia de ex-escravizados que por lá se instalaram entre os séculos XVIII e XIX, rebelados quando do desembarque de um navio negreiro aportado em Baía da Traição, no litoral norte da Paraíba. Outros entendem que o agrupamento teria se originado pela chegada à Alagoa Grande de sobreviventes do massacre do Quilombo dos Palmares, o que justificaria a existência da localidade denominada Zumbi nas proximidades do município.

Embora nenhuma destas versões seja confirmada pelas pessoas da comunidade, porque a história de sua origem não foi transmitida entre as gerações, é possível afirmar, a partir de depoimentos dos mais velhos, que o grupo está estabelecido no local há mais de 150 anos.

As famílias do Caiana dos Crioulos vivem, principalmente, de culturas de subsistência, como feijão, fava, milho, mandioca, inhame, batata-doce, bem como da criação de animais e da fruticultura.

 

Fonte: MPF-SE/Incra PB

 

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