quarta-feira, 2 de abril de 2025

As acusações do governo Trump contra o Brasil antes de dia do tarifaço global

Na véspera do esperado anúncio do presidente americano Donald Trump de uma série de novas tarifas contra diversos países do mundo, o governo dos EUA divulgou um relatório detalhado no qual analisa as práticas comerciais de diversos países do mundo — inclusive o Brasil, que é acusado de "falta de previsibilidade" no documento.

O presidente americano se prepara para revelar uma enorme lista de impostos de importação nesta quarta-feira (2/4) para todos os países, não só aqueles com desequilíbrio comercial com os EUA.

Trump está chamando esse dia de "Dia da Libertação da América".

O departamento de comércio do governo americano (USTR, na sigla em inglês) publicou na terça-feira (31/3) seu relatório anual Estimativa Nacional de Comércio, no qual detalha as barreiras comerciais enfrentadas pelos exportadores americanos.

Advertisement

O relatório é usado para ajudar o governo americano a determinar sua política comercial com outros países.

"Nenhum presidente americano na história moderna reconheceu as barreiras comerciais externas abrangentes e prejudiciais que os exportadores americanos enfrentam mais do que o presidente Trump", disse diretor do USTR, Jamieson Greer, ao divulgar o relatório.

"Sob sua liderança, esta administração está trabalhando com diligência para abordar essas práticas injustas e não recíprocas, ajudando a restaurar a justiça e a colocar as empresas e os trabalhadores americanos em primeiro lugar no mercado global."

Os EUA já haviam anunciado nas últimas semanas tarifas de importação sobre alumínio e aço que tiveram impacto direto na indústria brasileira.

A postura mais dura de Trump aumentou o nervosismo sobre uma guerra comercial atingindo a economia global. Mercados de ações tiveram forte queda esta semana.

<><> 'Tarifas altas' e 'falta de previsibilidade'

O Brasil é destacado em seis das 397 páginas do relatório do governo americano.

"O Brasil impõe tarifas relativamente altas sobre importações em uma ampla gama de setores, incluindo automóveis, peças automotivas, tecnologia da informação e eletrônicos, produtos químicos, plásticos, máquinas industriais, aço e têxteis e vestuário", afirma o documento americano.

"Os exportadores dos EUA enfrentam incertezas significativas no mercado brasileiro porque o governo frequentemente modifica as taxas tarifárias dentro das flexibilidades do Mercosul."

"A falta de previsibilidade com relação às taxas tarifárias torna difícil para os exportadores dos EUA preverem os custos de fazer negócios no Brasil."

Há uma série de reivindicações específicas sobre os problemas da relação comercial entre EUA e Brasil, do ponto de vista de produtores americanos e do governo.

É o caso do etanol, por exemplo. O relatório Estimativa Nacional de Comércio diz que entre 2011 e 2017, o comércio do produto entre EUA e Brasil era praticamente livre de tarifas. Em setembro de 2017, o Brasil começou a impor tarifas. Desde 2024, o Brasil impõe tarifa de 18% sobre o etanol americano, segundo o relatório.

"Os Estados Unidos continuam se engajando com o Brasil para reduzir sua tarifa de etanol para fornecer tratamento recíproco ao comércio de etanol entre os EUA e o Brasil."

O relatório destaca alguns impostos do Brasil que têm impacto sobre produtos americanos:

  • IPI de 19,5% sobre bebidas alcoólicas (contra 16,25% de IPI sobre a cachaça);
  • impostos do setor audiovisual que incidem apenas sobre programas e filmes estrangeiros que passam nos cinemas e na televisão brasileira;

O governo americano também registra a reclamação de alguns setores americanos a regras de licenciamento de importação — produtos e serviços que precisam de uma autorização específica de ministérios e agências para poderem ser importados.

É o caso, por exemplo, de bebidas e farmacêuticos, que precisam de liberação do ministério da Agricultura e da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), respectivamente.

"Uma lista de produtos sujeitos a procedimentos de licenciamento de importação não automáticos está disponível no sistema de documentação informatizada da Secretaria de Comércio Exterior, mas informações específicas relacionadas a requisitos de licenciamento de importação não automático e explicações para rejeições de pedidos de licença de importação não automáticos não estão disponíveis", diz o governo americano.

"A falta de transparência em torno desses procedimentos é um impedimento para as exportações dos EUA."

O governo americano cita que há reclamações de exportadores americanos de calçados e vestuário e do setor automotivo.

"Para automóveis, atrasos na emissão de licenças de importação não automáticas afetam negativamente as exportações de automóveis e peças automotivas dos EUA para o Brasil."

"As empresas dos EUA continuam reclamando de requisitos de documentação inconsistentes para a importação de certos tipos de bens, como equipamentos pesados. Esses requisitos de documentação se aplicam mesmo se as importações forem temporárias e destinadas ao uso em outros países."

<><> Transferência de dados e combustíveis renováveis

Na parte de tecnologia, os americanos reclamam da Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD) do Brasil, que restringe a transferência de dados pessoais para fora do Brasil.

"Os regulamentos que implementam essas restrições foram publicados em agosto de 2024, com um período de transição de 12 meses para as empresas. A implementação tardia de mecanismos aprovados para transferências internacionais de dados (por exemplo, certificações, códigos de conduta e cláusulas contratuais) criou incerteza para as empresas e obstáculos ao processamento e compartilhamento rotineiros de dados para fins comerciais", diz o governo americano.

"Os EUA incentivaram o Brasil a trabalhar em estreita colaboração com empresas e organizações afetadas pela LGPD para resolver problemas de implementação e execução de forma razoável e consistente."

Sobre o programa RenovaBio, de promoção de energia renovável, o governo americano reclama que as empresas americanas não podem participar do mercado de créditos de carbono — um pleito dos EUA junto ao governo brasileiro.

Na agropecuária, os produtores americanos de carne suína pedem acesso ao mercado brasileiro.

"O mercado do Brasil ainda está fechado para carne suína fresca e congelada dos EUA devido às preocupações do Brasil de que os produtos de carne suína importados para os EUA da União Europeia aumentam os riscos associados à Peste Suína Africana", afirma o relatório.

"O Brasil não forneceu evidências científicas que apoiem a proibição e a ela parece ser inconsistente com os padrões internacionais da Organização Mundial de Saúde Animal. As discussões entre o departamento de Agricultura dos EUA e o ministério da Agricultura do Brasil estão em andamento, mas ainda precisam estabelecer acesso para exportações de carne suína dos EUA para o Brasil."

O governo americano reclama também:

  • das regras de licitações governamentais — que só incluem empresas estrangeiras quando não há alternativas disponíveis com mão-de-obra nacional;
  • da falta de penalidades e fiscalização sobre pirataria, tanto online como de produtos físicos;
  • da tarifa de 60% em cima de produtos importados pela Declaração Simplificada de Importação;
  • da obrigatoriedade de residentes no Brasil serem responsáveis por administrar instituições financeiras, como bancos.

<><>Reação do Brasil

O Brasil prepara uma resposta à guerra comercial de Trump.

Uma comissão do Senado deve votar nesta terça-feira (1/4) um projeto que cria a Lei da Reciprocidade.

O texto prevê que o Conselho Estratégico da Câmara de Comércio Exterior (Camex) seja o órgão responsável por medidas de retaliação a "ataques à soberania do Brasil".

O projeto de lei afirma que "as contramedidas previstas deverão ser, na medida do possível, proporcionais ao impacto econômico causado pelas ações, políticas ou práticas".

A Lei da Reciprocidade prevê que a Camex realize consultas públicas com partes interessadas, determine prazos para análise de reclamações e sugira contramedidas.

¨      Os temores do Brasil diante do imprevisível tarifaço de Trump

Governo e exportadores brasileiros aguardam com apreensão o anúncio de um novo tarifaço pelo governo Donald Trump que promete elevar impostos de importação nos Estados Unidos contra diversos países e produtos.

O anúncio está previsto para a quarta-feira (2/4), que está sendo chamada pelo republicano de "Liberation Day" (Dia da Libertação).

Na visão de Trump, encarecer as importações vai proteger e fortalecer a indústria doméstica, enquanto críticos afirmam que vai encarecer a produção americana e desatar uma guerra comercial global.

Até o momento, não está claro qual será o impacto para o Brasil, que tem os Estados Unidos como seu segundo maior parceiro comercial, atrás apenas da China.

Diferentes cenários estão no radar: desde o mais otimista, em que apenas o etanol teria aumento de tributação, até o mais pessimista, em que uma nova taxa de importação seria aplicada de forma linear a tudo que os EUA compram de exportadores brasileiros, dentro da nova "política de reciprocidade" de Trump.

Segundo essa política, a Casa Branca deve elevar suas tarifas de importação ao mesmo patamar dos tributos cobrados sobre seus produtos exportados — e o Brasil é um dos países que, segundo a avaliação da gestão republicana, tem barreiras comerciais mais duras, seja por meio de tarifas de importação mais altas ou por outras regras, como exigências sanitárias e burocráticas.

"Há muita especulação sobre o 2 de abril, ninguém sabe ao certo o que vai sair", disse à reportagem Welber Barral, ex-secretário de Comércio Exterior do Brasil e hoje consultor na área.

Em meio à incerteza, o Senado aprovou na terça-feira (01/04) um projeto que cria novas ferramentas para o Brasil reagir a barreiras comerciais de outros países.

A proposta, que ainda será apreciada na Câmara dos Deputados, tinha como foco inicial reagir a barreiras ambientais europeias ao agronegócio brasileiro, mas ganhou impulso diante da nova política tarifária dos EUA, reunindo amplo apoio no Congresso e no governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

Por enquanto, o principal impacto da gestão Trump para o Brasil veio da decisão de começar a aplicar, em 12 de março, uma taxa de 25% sobre todas as importações de aço e alumínio.

A medida é importante porque produtos derivados de ferro e aço são o segundo item brasileiro mais exportado para os EUA, tendo somado US$ 2,8 bilhões em vendas em 2024, ficando apenas atrás de petróleo (US$ 5,8 bilhões).

Além disso, há a previsão de que a taxa cobrada sobre o etanol brasileiro vendido aos EUA passe de 2,5% para 18% a partir de 2 de abril, para igualar a taxa cobrada do Brasil sobre o etanol comprado dos americanos — mas o produto tem menos relevância nas exportações brasileiras.

O governo do presidente Lula tenta evitar que essa taxação entre de fato em vigor, ao mesmo tempo em que negocia para que o país seja poupado de um amplo tarifaço, mas o cenário continua incerto.

Ele não descarta acionar a Organização Mundial do Comércio (OMC) ou retaliar os EUA com mais barreiras, caso as negociações não funcionem.

"Antes de fazer a briga da reciprocidade, ou de fazer a briga na Organização Mundial do Comércio, a gente quer gastar todas as palavras que estão no nosso dicionário para fazer um livre comércio com os Estados Unidos", disse Lula no sábado (29/03), durante viagem oficial ao Vietnã.

Já o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, tem dito que um tarifaço do governo Trump contra o Brasil seria "injustificável".

"Nossa conta é deficitária com os Estados Unidos. Então, nos causaria uma certa estranheza se o Brasil sofresse algum tipo de retaliação injustificada", reforçou na segunda-feira (31/03).

Esse tem sido o principal argumento do governo brasileiro nas negociações com a Casa Branca: destacar que, historicamente, o Brasil importa mais do que vende para os americanos.

Nos últimos dez anos (2015 a 2024), o país acumulou déficit de US$ 43 bilhões nas trocas comerciais com os EUA, segundo as estatísticas do Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços.

O rombo, porém, tem recuado. No último ano, o saldo ficou positivo para os americanos em cerca de US$ 300 milhões apenas, com o país de Trump comprando US$ 40,4 bilhões em produtos do Brasil (12% das exportações brasileiras) e vendendo US$ 40,7 bilhões para cá (15,5% das importações do Brasil).

"Caso as medidas [do tarifaço de Trump] sejam direcionadas apenas aos países com os quais os EUA têm grandes déficits comerciais ou que têm participação relevante no comércio norte-americano, o Brasil provavelmente não será impactado inicialmente", prevê relatório econômico do banco BTG Pactual, publicado em 26 de março.

"Contudo, se forem aplicadas tarifas generalizadas a setores específicos, como ocorreu recentemente com o aço, ou se os critérios incluírem países com barreiras comerciais superiores às americanas, o Brasil poderá ser diretamente afetado, possivelmente com impacto mais significativo neste segundo cenário", continua o relatório.

Segundo o BTG Pactual, os setores mais afetados por uma alta mais generalizada de tarifas sobre itens brasileiros seriam "produtos manufaturados e semimanufaturados que hoje entram com baixo imposto nos EUA".

"Exportações de bens de capital e automotivos (máquinas, equipamentos de transporte) poderiam sofrer leve retração na demanda nos EUA. No agronegócio, produtos como café e suco de laranja – dos quais os EUA são importantes compradores – enfrentariam encarecimento moderado no mercado americano, potencialmente levando a uma pequena perda de participação para concorrentes de outros países", analisa ainda o relatório.

A consultoria de risco político internacional Eurasia Group, por sua vez, acredita que o Brasil deve entrar na lista de países que receberão uma tarifa global sobre seus produtos.

Caso isso se confirme, a expectativa é que seja aplicada uma tarifa de 10% a 25% sobre as exportações brasileiras, disse à BBC News Brasil o diretor-executivo para as Américas da Eurasia Group, Christopher Garman.

Para ele, dois fatores devem contribuir para o Brasil entrar na lista ampla de taxação: a percepção do governo Trump de que o Brasil é um país protecionista contra os EUA, e o momento ruim na relação política dos dois países.

Ele lembra que a atual gestão da Casa Branca tem proximidade com a família do ex-presidente Jair Bolsonaro, opositor de Lula, e tem criticado o Brasil por decisões do Supremo Tribunal Federal contra redes sociais como o X, de Elon Musk, que integra o governo Trump.

"A relação bilateral política está numa situação bem precária", nota ele.

"Igualmente importante [do que o fator da reciprocidade tarifária], eu diria que é por razões políticas. O Brasil está na mira da Casa Branca, o Trump tem repetido usar o Brasil como um exemplo múltiplas vezes", reforçou.

<><> O Brasil, de fato, cobra tarifas maiores dos EUA?

A possibilidade de o Brasil ser alvo de um amplo tarifaço foi levantada por Trump em seu discurso ao Congresso Americano, no início de março.

"Outros países usaram tarifas contra nós por décadas e agora é a nossa vez de começar a usá-las contra esses outros países", declarou na ocasião.

"Em média, a União Europeia, China, Brasil, Índia, México e Canadá — vocês já ouviram falar deles? – e inúmeros outros países nos cobram tarifas muito mais altas do que cobramos deles", continuou.

Estatísticas de comércio exterior apontam que, de fato, o Brasil cobra, em média, tarifas de importação maiores sobre os produtos americanos do que o contrário.

Por outro lado, os itens com maior volume de importação têm tarifas menores ou mesmo zeradas.

De acordo com o governo brasileiro, entram no país sem pagar imposto produtos oriundos dos EUA como aeronaves e suas partes, petróleo bruto e gás natural.

Segundo levantamento do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (FGV Ibre) a partir de dados do Banco Mundial, a tarifa média simples aplicada pelo Brasil às importações dos EUA foi de 11,3% em 2022 (dado mais recente disponível).

Ou seja, era mais que cinco vezes a tarifa média simples cobrada dos EUA sobre as importações brasileiras (2,2%).

Já quando se calcula uma média ponderada pelo volume das importações, a taxa brasileira continua maior, mas a diferença cai.

Isso ocorre porque a tarifa média paga pelos exportadores, na prática, é menor, já que produtos com maior volume de importação dos dois lados têm tarifas mais baixas ou mesmo zeradas.

Considerando essa tarifa efetiva, o Brasil cobrou em média 4,7% sobre importações vindas dos EUA em 2022, informa a nota do FGV Ibre, a partir de dados do Banco Mundial.

Por outro lado, diz o documento, produtos brasileiros sofreram taxação efetiva média de 1,3% ao entrarem no mercado americano.

O governo brasileiro, por sua vez, diz que a tarifa média cobrada pelo Brasil de produtos dos EUA seria ainda menor, de 2,7%.

"No geral, é importante destacar que 74% das exportações dos EUA para o Brasil entram sem tributação, graças a vários regimes alfandegários e linhas tarifárias isentas de impostos", argumentou o Itamaraty em um documento protocolado em uma consulta pública do governo americano sobre as mudanças de política tarifária.

"Por exemplo, o Brasil aplica um imposto de importação zero sobre produtos-chave dos EUA, como petróleo, aeronaves, peças de aeronaves, gás natural e carvão. A tarifa média ponderada efetiva coletada é de apenas 2,73%, significativamente menor do que a tarifa nominal média do Brasil de 11%", dizia ainda o documento.

Um relatório sobre o tema publicado pelo departamento econômico do Bradesco em fevereiro estimou qual será o efeito caso o governo Trump decida igualar todas as tarifas de importação cobradas do Brasil com as que o país cobra de produtos dos EUA — ou seja, elevar sua tarifa média para 11,3%.

"Nesse exercício, encontramos uma redução de cerca de US$ 2,0 bilhões nas exportações (5% do total embarcado)", diz o relatório.

O impacto poderia ser reduzido em caso de nova desvalorização do real.

"Em um exercício hipotético, a depreciação equivalente do real, necessária para compensar essa perda, seria da ordem de 1,5%, com um impacto potencial estimado ligeiramente inferior a 0,1 ponto percentual no IPCA [índice de inflação], como resposta direta à depreciação cambial", afirma o banco.

A possibilidade de uma taxa global mais elevada, de 25%, também está no radar dos analistas, porque é o patamar que o governo Trump já anunciou para alguns produtos, como aço e automóveis, e países, como Canadá e México.

Para o banco BTG Pactual, isso representaria um "cenário extremo".

"Na prática, diversas exportações atualmente competitivas tornar-se-iam pouco viáveis comercialmente no mercado americano [com uma tarifa global de 25% sobre o Brasil], a não ser com substancial redução de preço pelo exportador brasileiro. No entanto, essa alíquota de 25% representa um cenário extremo", diz o relatório do banco.

Já a Eurasia Group não descarta esse cenário.

"A gente sabe que o presidente Trump está com o número 25 na cabeça, então a equipe [econômica dele] está tentando reduzir. Se vc colocar uma taxa dentro da ideia de reciprocidade, a tarifa do Brasil deveria ser bem menos que 25%. Por isso que a gente está com [previsão de que venha] um intervalo de 10% a 25%", afirma Christopher Garman.

"E aí, depois disso, você tenta negociar setor por setor, é um processo que vai ser difícil", continuou, em referência a possíveis reduções de tarifas setoriais ou cotas de importação (quantidades que poderiam ser vendidas com tarifa menor).

<>< > Etanol no alvo

Até o momento, os países que têm sido mais impactados pelas tarifas de Trump são China, México e Canadá.

Em meio à grande incerteza, Welber Barral, ex-secretário de Comércio Exterior do Brasil, acredita que a União Europeia deve ser um alvo importante no anúncio de quarta-feira.

"O que se sabe é que deve sair muitos anúncios com relação à União Europeia, principalmente, pois os Estados Unidos têm muito déficit com a União Europeia", disse à BBC News Brasil.

No caso brasileiro, avalia, a expectativa maior é sobre o etanol.

"Isso [a taxa de 18% cobrada do etanol pelo Brasil] já é uma reclamação americana antiga", ressalta.

Maiores produtores de etanol do mundo, o Brasil produz o seu combustível a partir da cana-de-açúcar, enquanto os EUA fazem do milho.

Segundo a União da Indústria de Cana-de-Açúcar e Bioenergia (UNICA), que representa o setor no Brasil, o etanol brasileiro é mais sustentável e, por isso, não deveria ser equiparado ao americano.

"A medida pretende colocar no mesmo patamar o etanol produzido no Brasil e nos Estados Unidos, embora possuam atributos ambientais e potencial de descarbonização diferentes, e portanto não faz sentido falar em reciprocidade. Se a medida se confirmar, será mais um passo dos Estados Unidos rumo ao abandono à rota de combate à mudança do clima", destacou a Única em comunicado em fevereiro, quando foi anunciado o possível aumento da tarifa.

Para Lia Valls, pesquisadora do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (FGV Ibre) e professora da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), a esperada elevação da tarifa americana sobre o etanol brasileiro não seria tão impactante.

"Hoje, o Brasil cobra 18% de tarifa e eles cobram 2,5%. Só que mexer nisso é uma maluquice porque os Estados Unidos não têm excesso de etanol pra exportar para o Brasil, nem o Brasil precisa importar tanto etanol assim", disse à BBC News Brasil no início de março.

<><> A possível reação brasileira

Em visita ao Japão na semana passada, Lula criticou a elevação de tarifas pelo governo americano e disse que o Brasil vai recorrer à Organização Mundial do Comércio (OMC) contra esse tipo de medida.

Segundo o presidente, caso não haja resultado nessa instância, o país vai impor taxas recíprocas aos EUA.

"Sinceramente, estou muito preocupado com o comportamento do governo americano, com essa taxação de todos os produtos de todos os países", afirmou Lula.

"Estou preocupado porque o presidente americano não é xerife do mundo. Ele é apenas presidente dos Estados Unidos", disse, sugerindo que Trump converse com os "políticos de outros países para tomar suas decisões".

O Congresso pode aprovar um projeto de lei que ampliaria os instrumentos de reação do governo brasileiro. Como a proposta foi aprovada na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado nesta terça-feira (01/04) de forma terminativa, seguirá direto para a Câmara sem passar no plenário.

"Falaremos com o presidente da Câmara dos Deputados, o deputado Hugo Motta, para que a Câmara possa apreciar essa matéria em caráter de urgência", defendeu o senador Renan Calheiros (MDB-AL), presidente da CAE.

Pesquisadora do FGV Ibre, Lia Valls ressalta que, segundo as regras atuais, as tarifas brasileiras não são fixadas de forma específica para um ou outro país, mas valem para produtos, independentemente da sua origem.

Isso só varia quando há acordos de livre comércio, como no caso do Mercosul.

De modo geral, explica, o Brasil protege pouco o setor agropecuário na comparação com outros países, mas há mais protecionismo para a indústria.

"Na área industrial, por exemplo, se você compara com a Índia, que também é muito protecionista, em alguns setores, o Brasil protege até mais do que a Índia, principalmente alguns tipos de bens de capital, de alguns bens eletrônicos", compara.

"Então, em termos de médias tarifárias, pensando em país grande, o Brasil tem tarifas médias mais elevadas. E existe todo um debate sobre se a gente deve reduzir essas tarifas, principalmente de bens de capital e bens intermediários, que têm um efeito direto sobre o custo de produção da indústria", nota a professora.


Fonte: BBC News Brasil

 

Nenhum comentário: