O homem em sua dualidade
A noção de humanidade
é muito ampla e muito aberta, para se definir o que se configura ser homem em
apenas uma definição
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Ao analisar a
trajetória humana, enquanto espécie do ponto de vista biológico, foram
discutidas diferentes teses para se definir o que é o homem. Até chegarmos na
atual e mais aceita denominada “homo sapiens sapiens” (homem que sabe). Desta
forma, nas ciências humanas, que também é um campo científico de conhecimento,
não poderia ser diferente. O que levou a sua criação enquanto ciência para
definir o que é o homem e produzir teorias.
Diante disso, podemos
dialogar com alguns autores para desenvolver sínteses. Segundo Francis Wolff,
há quatro diferentes tipos de concepções na história da filosofia para se
definir o homem, sendo elas: A concepção antiga, formulada ainda pelos gregos
na personificação de Aristóteles, que define o homem como animal pensante. A
concepção clássica, defendida por René Descartes na idade moderna, que define o
homem como ser pensante “cogito, ergo sum” (Penso, logo existo).
A concepção das
Ciências Humanas, defendida majoritariamente no século XX, e exemplificada por
Michel Foucault, em sua obra As palavras e as coisas, que cita: “Antes do
século XVIII o homem não existia” (FOUCAULT, 1981, p. 362-363) o que leva o
homem a se auto estudar, e se autoconhecer, deixando o homem ambíguo,
tornando-o sujeito e objeto de conhecimento. E por último a concepção das
Ciências cognitivistas, já propagadas no século XXI, onde o homem não tem o
privilégio dentre os objetos de estudo, onde tudo é muito natural, onde o homem
apenas é mais um ser na natureza, estando todos em um mesmo patamar horizontal
diante dos outros seres.
Assim, cabe acentuar
Michel Foucault, que faz uma árdua análise e dialoga de forma direta a
formatação das ciências humanas enquanto estudo do homem. Michel Foucault, em
suas pesquisas diz que antes do século XVIII, ninguém discutiu propriamente o
“homem”, só usaram titulações para definir o ser. Entretanto, em dado momento
foi necessário parar, refletir e se pensar: o que é o homem?
Como cita o autor a
seguir: “Nessas condições, era necessário que o conhecimento do homem surgisse,
com seu escopo científico, como contemporâneo e do mesmo veio que a biologia, a
economia e a filologia, de tal sorte que nele se viu, muito naturalmente, um
dos mais decisivos progressos realizados, na história da cultura européia, pela
racionalidade empírica. Mas, como ao mesmo tempo a teoria geral da
representação desaparecia e impunha-se, em contrapartida, a necessidade de
interrogar o ser do homem como fundamento de todas as positividades, não podia
deixar de produzir-se um desequilíbrio: o homem tornava-se aquilo a partir do
qual todo conhecimento podia ser constituído em sua evidência imediata e
não-problematizada; tornava-se, a fortiori, aquilo que autoriza o
questionamento de todo conhecimento do homem”. (FOUCAULT, 1981, p. 362-363).
Portanto, surge com o
objetivo de compreender e explicar o homem nas Ciências Humanas, a dualidade:
deixando o homem como cientista enquanto dirigente da pesquisa e como objeto de
pesquisa para a composição de seu trabalho seja como antropólogo, sociólogo ou
pedagogo e outras áreas de estudo sobre o homem.
• Desenvolvimento
No contexto de
conhecimento, há quem afirme que em toda cultura há órgãos que têm como
objetivo coordenar as reflexões sobre a ordem de dados assuntos, por mais
diversos que sejam esses, sejam nas áreas das exatas, sejam nas áreas das
linguagens e outras. Desta forma, estando em consonância com o filósofo Michel
Foucault, que relata sobre a falta de um grupo específico até o século XVIII,
para se discutir o que é o homem, pois há diferentes formas de entender o
homem, talvez um médico para entender o funcionamento do corpo humano? Ou quem
sabe um biólogo para entender o ponto de vista da vida humana? Ou talvez um
filósofo existencialista, para questionar a existência do ser?
Neste âmbito, podemos
adentrar as teorias Immanuel Kant que afirma existir três perguntas básicas
para chegar à pergunta final “O que é homem?”, que são: “O que devo fazer?” do
ponto de vista ético e moral. “O que posso saber?” de um ponto especulativo, ou
então “O que posso esperar?” segundo uma visão metafísica ou religiosa. E assim
propor a definição mais plausível para tal, de acordo com as respostas obtidas
pelas perguntas acima.
Ainda segundo Kant, o
homem é entendido como uma criatura singular, que possui alta capacidade de
criar para si o seu caráter. Entretanto, entre os seres humanos de diferentes
regiões e culturas, também fomentam questionamentos sobre o que é ser homem, o
que é ser humano. Quando analisamos o contexto do holocausto alemão contra o
povo judeu em decorrência do Nazismo, vemos que o povo judeu fui subjugado
sobre a definição humana. Visto assim, apenas o povo ariano, era considerado
como homem realmente, o povo judaico era uma espécie de sub-humanos.
Outrossim podemos
caracterizar nos dias atuais, a discussão do que é ser homem, o que é ser
humano no mundo moderno e sobretudo no Brasil atual, pois temos o massacre
diário de povos originários, pessoas LGBTQIA+, mulheres, negros, pessoas em
situação de rua e tantas outras classes minoritárias que precisam de leis para
assegurar e afirmar que também são humanas e merecem sua dignidade.
Desta forma,
sintetizando Francis Wolff, é possível dialogar com as ideias das Ciências
cognitivistas, onde o homem perde sua essência enquanto humano e passa a ser
apenas mais uma peça da natureza, pouco se importando sua condição humana, o
que converge com o antigo conceito de cinismo, trazido pela filosofia grega,
materializado em Diógenes, que alega que pode-se viver a vida tal como ela
seja, sem preocupar com nada, e apenas existir.
Trata-se de uma ideia
de evolução humana do ponto de vista social, como por exemplo o “esquecimento”
dos caracteres que compõem os humanos, pela qual muitas vezes são julgados e
tendo viés preconceitos assim como o gênero, sexualidade, classe econômica, raça
ou credo seriam apenas mais traços do homem, tal qual como existem cachorros
pretos, brancos e caramelos e isso não é motivo de distinção entre eles, apenas
aspectos físicos que compõem a natureza de cada um deles.
Ainda que no período
da ascensão do homem, as minorias sociais já eram esquecidas e infelizmente
continuam até os dias atuais, desta forma nas Ciências Cognitivistas tudo passa
a ser tão natural, que esquecemos que na composição social, nem todos estão alinhados
de forma horizontal, mas sim de forma vertical criando agrupamento de pessoas
por similaridade, o que acaba gerando uma pirâmide na estrutura social, onde
poucos estão no topo e a maioria na base, abrindo um espaço para que todos
sejam colocados em patamares equivalentes na pirâmide social, sem uma divisão
entre eles.
Assim, as Ciências
Cognitivistas, resgatam a ideia de tudo ser apenas elementos que compõem a
natureza, o que de certa forma é muito positivo para sociedade, pois quebra
todo paradigma de certo ou errado, moral ou imoral em determinadas pautas como
gênero, sexualidade, outras, que pautam discussões atualmente gerando críticas
positivas ora negativas, o que também foram trabalhadas por Michel Foucault em
seu tempo.
Não obstante, Michel
Foucault ainda vai afirmar que a figura do homem ainda que criada muito
recente, tem o seu fim muito próximo. Como cita o mesmo: “O homem é uma
invenção, e a arqueologia do seu pensamento mostra bem sua origem e talvez o
seu fim”. Para o autor, o homem começa a aparecer enquanto conceitos de
definição, apenas no século XIX, mas o seu apogeu se dá no século XX, sobretudo
na década de sessenta, que o mundo apresentou grandes revoluções como na moda,
no social, no político, no filosófico e outros. Contudo, as revoluções se
transformam em arquivos da história humana e por consequência tangem para o
fim, que para o autor está próximo, talvez ainda no século XXI com a ascensão
das Ciências Cognitivistas proclamadas por Francis Wolff.
Diante disso, podemos
arriscar a parafrasear de forma singela o filósofo alemão Friedrich Nietzsche,
que debate em sua obra A gaia ciência, “Deus está morto”. Morto sim, não pelo
sentido existencial que deixa de existir ou padece da morte, mas sim pelo fator
que as pessoas não necessitam de Deus mais para atender suas demandas como a
água, a comida, e suas necessidades cotidianas; o que deixa a morte como
metáfora para insignificante.
Portanto, o homem
também vai morrer, não pelo fato da extinção humana ou do fato de estar sujeito
à morte, mas sim sobre o fato de importância, o homem deixa de ser importante,
e se tornar o mais natural possível, apenas como mais um animal da natureza. Deixando
também de ser objeto de pesquisa, senhor da natureza e não se enquadrando em
nenhuma configuração para as ciências humanas.
• Conclusão
Portanto, pode-se
concluir que as concepções e formatações de homem, podem ser as mais variadas
possíveis e mudam ao longo do tempo. O que parte da finalidade de dar
diferentes significados para o mesmo ser. Contudo, os seres humanos desde que
firmam a sua existência ainda que por uma consagração mundial sejam denominados
humanos, muitas das vezes são subjugados ao sentido de humanidade, padecendo
sobre mazelas e estigmas sociais por mais diversos que sejam ora o preconceito,
ora a estereotipação do ser, ora pela falta de compreensão da cultura do outro
e afins.
Assim, vale salientar
que a noção de humanidade é muito ampla e muito aberta, para se definir o que
se configura ser homem em apenas uma definição. O que deixa cada vez mais
vívida a afirmativa que o homem esteja próximo ao seu fim, naturalizando cada
vez mais, como um mero ser da natureza. Ainda que haja um vasto debate para se
definir o que foi, o que é, ou que vai ser o homem ao longo da história. E como
cita o próprio Michel Foucault em As palavras e as coisas, o homem não é o mais
velho problema e nem o mais constante que se tenha colocado ao saber humano.
Desta forma, podemos
concluir e afirmar que o homem busca esvaziar da sua finalidade, deixando cada
vez mais o ser desabitado de si, mais natural em sua criação, sendo aquele que
não se encaixa em lugar nenhum, mas está inserido a todos os lugares, aquele
que não serve para nada mas ao mesmo tempo fomenta tudo. Este é o homem
moderno, propagado pelas Ciências Cognitivistas e desenquadrado de si. Visto
assim, o homem não tem a obrigação de se definir para fazer sentido, mas apenas
existir.
Fonte: Por João
Gabriel do Nascimento Pires, em A Terra é Redonda
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